O espectro de Jesus
Redação
Reformador (FEB) 16 de Agosto de 1925
A propósito de um
dos episódios verificados no Congresso Espírita que recentemente se celebrou em
Lisboa, com o objetivo de congregar os elementos esparsos, embora de valor, com
que conta o Espiritismo em Portugal e de imprimir orientação eficiente ali à prática
e a propaganda da Doutrina dos Espíritos. A Asa, revista que como órgão do
Centro Espiritualista “Luz e Amor”, se publica na capital portuguesa, inseriu
na primeira página do seu número de Julho e sob o título acima, o artigo que. Data
vênia, aqui transcrevemos e de cuja particular significação para nós diremos
num Eco de nossa presente edição.
Não fui ao 1º Congresso Espírita Português devido a causa
que fiz saber a uma pessoa por mim deveras estimada. Todavia, pelo relato dos jornais,
eu soube da marcha dos trabalhos.
Por uma leal franqueza, própria de meu temperamento e
educação positiva, direi que, o que ali mais me interessou foi a afirmação do Sr.
Garcia,
pessoa que não conheço, mas cuja coragem me satisfez.
Não terá ele defendido com brilho o seu asserto, mas pelo
menos saiu-se com uma ideia com a qual plenamente concordo e que deve ser discutida
com serenidade e sem fanatismo. Sim, sem esse fanatismo dogmático que foi, é e
está sendo a ruína da seita que tem por chefe o Bispo de Roma.
Custa, bem sei, ver cair ideias antigas; a época, porém,
é de verdades e é com as verdades que ao constrói o edifício, o templo augusto
da razão.
O Sr. Garcia disse uma verdade eterna: Jesus, o Cristo,
o
Apóstolo imenso da verdade, não teve vida
corpórea.
Estou vendo daqui o sobrancenho carregado dos críticos e
ouvindo
o anátema lançado com celeuma por confrades meus.
Venho, porém, aqui, não com a atitude de sábio, ou com a filáucia
(amor desmedido por si mesmo) soberba de magister,
mas argumentar com a razão, a lógica, com fatos apoiados na insuspeita opinião
de apóstolos e evangelistas.
Não aceito nunca, a olhos fechados, tudo quanto leio ou
me dizem.
O meu sensorial é ávido de Razão e jamais escravo das opiniões
alheias.
A minha opinião sobre a não corporeidade de Jesus não é
antiga. Pressentia há poucos lindos anos depois que fui espectador de um caso
que para aqui não tem cabida. Vi-a confirmada depois de ter tomado umas notas
pessoais.
Comecei então a estudar encarniçada e afincadamente o
assunto, analisando-o sob todas as formas da Lógica. Não é branda a tarefa, que
nem em meio vai ainda; porém, é tal o meu desejo de saber a verdade, que tenho
consultado não só a tradução mais completa da Bíblia, que é a de Osterwald, teólogo
suíço de grande qualidade, mas aquela que passa por ser também uma das mais
corretas: a grega,
de que há uma magnífica tradução francesa anotada.
Não convém aos homens que gostam do maravilhoso que se
descubra a verdade. Assim procederam sempre aqueles que uniram as religiões de
qualquer espécie... Apesar das mutilações que os fariseus da nova era fizeram
no
Velho e no Novo Testamento, o véu não cobriu a verdade...
Assim,
sem quererem talvez,
deixaram aos vindouros os meios de descobrirem tudo!
Sabemos
todos muito bem que grandes foram as diligências dos fariseus e
príncipes dos sacerdotes
hebraicos para haver às mãos a pessoa que eles consideravam sediciosa, irritante, equivocada e herética...
Nunca conseguiram (enquanto Jesus o julgou preciso) por lhe
a mão. Quando iam apedreja-lo ou colhe-lo pela túnica, ele - effugit velut umbra (fugia como a sombra...)
Ora eu, funcionário policial, não acredito que de uma
casa cercada e guardada até ao telhado, possa fugir alguém sem cumplicidade, a
não ser que tenha asas como Ícaro, com mil recomendações para não voar muito
alto por causa do sol que lhe derretia a cera com que as pegara...
Eu não invento isto. Veja-se o Evangelho de João (o mais claro,
terminante e melhor redigido), cap. VII, v. 44; cap. VIII, v. 59; cap. X, v.
39).
Jesus
largava a sua corporeidade quando queria (cap. X, v. 18).
Só um Espírito de grade poder e de larga envergadura
operaria assim!
E o que é a vinda do Mestre sobre a Terra senão uma série imensa
de prodígios?
Poderemos atribuir a um homem tantos poderes de incorporação,
dissociação, telepatia, visão a distância,
previsão, etc., etc.?
Os médiuns mais completos que têm vindo ao mundo não
fizeram a milésima parte do que fez Jesus (Jeanne d'Arc - Antônio de Lisboa,
conhecido por santo Antônio de Pádua - etc.)
Um Espírito de luz poderá fazer
o que em linguagem vulgar
se chama prodígios: um homem não,
nunca!
Mas de
que se espantam os espíritas?
Acaso
não conhecem as assombrosas experiências do Doutor William Crookes? Não conseguia ele
materializar até ao ponto de ouvir
as pulsações de miocárdio do espectro dede Mistress Katie King?
Não teve o grande sábio
inglês, durante longos minutos, nos seus braços,
arfando e respondendo, o Espírito
materializado que se compunha,
desfazia e recompunha a pedido do ínclito físico
britânico,
para convencer-se e convencer os inúmeros assistentes a essas memoráveis
sessões?
Então se o Espírito de Mistress Katie King, muito longe da perfeição, pode conseguir isso,
porque o não faria um dos mais ilustres e altíssimos Espíritos da Eternidade
como é Jesus, nosso grande e ínclito Irmão?
Já o dogma romano dele nascer de uma virgem (que virgem ficou!)
dá a perceber que há uma extraordinária razão do asserto.
Se Mistress Katie
King apareceu com a sua deslumbrante c esplêndida beleza indo-europeia e se
prestou a todas as experiências até aquela que demonstrava o seu sexo (o que se
fez com toda compostura, recato e cortesia); se ela permitiu que várias senhoras
lhe metessem a mão no seio para
verificarem e darem mais essa prova testemunhal honrada, leal e franca, para que
admiramo-nos de Jesus materializar-se?
O ato de coragem do Sr. Garcia é simpático, nobre e digno.
Se ele falou, é porque alguém do Além o determinou.
Fiquemos certos disto. Falou
porque é chegado o tempo.
A
apoteose que lhe fizeram foi uma pateada, dizem os jornais... (I)
Pois eu se lá estivesse abundava nas suas ideias, defendia-o,
amparava-o, animava-o, por que gosto dos
homens de ânimo e de coragem.
Disse em voz alta o que muitos pensam... a medo.
Deus manda sempre que a verdade refulja, (brilhe) de repente,
no
meio da treva e pela boca do humilde.
É de
todos os tempos, é de todas as religiões, de todas as filosofias, e princípios
Leiamos S. Paulo, os Evangelistas, os Atos dos Apóstolos
e veremos todos que Jesus não era deste mundo...
É forte atirar com os ídolos abaixo, é; mas é uma necessidade
repor o Mestre no pedestal que lhe é devido e não andar com ele, inventando
dogmas como a religião católica de Roma, que dele se apropriou como tabuleta para
suas habilidades.
Para a Humanidade basta saber que
foi um Espírito de luz que baixou à Terra.
Estávamos no Congresso,
presenciamos o incidente a que o nosso prezado colaborador se refere e que
muito nos contristou; mas devemos dizer que nos passou inteiramente
despercebida essa manifestação “pateal”(ruído
que se faz com os pés), a que os jornais se referiram, e que, pelos modos,
só existiu na imaginação dos repórteres. N. da D.
Continuação
Noutra
pagina deste número do Reformador transcrevemos
o artigo que na revista “A Asa”, de Lisboa, publicou o nosso confrade Júlio
Costa, propósito de ideias expendidas no Congresso Espírita que recentemente se
reuniu na capital portuguesa. Nas linhas com que encabeçamos a transcrição,
dizemos que num “Eco” especial nos ocuparíamos do artigo transcrito.
Reportando-nos aqui ao escrito de Júlio Costa,
de acordo com a promessa formulada, fazemo-lo, não para comentar as ponderações
e comentários do distinto confrade português, mas apenas par sublinhar um fato,
ou, melhor, uma circunstância que, do ponto de vista em que nos achamos colocados,
com relação ao assunto versado, apresenta para nós importância capital.
Quem conhece, de leitura atenta e não
somente por ouvir dizer, a Revelação da revelação, de Roustaing, e lança os
olhos sobre o artigo de que vimos tratando, deduz naturalmente, ao chegar às últimas
linhas, que o articulista, conhecedor bastante daquela obra, é um dos muitos em
cujo Espírito calou fundo a revelação, com que ali se depara, feita pelos
Evangelistas, quando a ditaram do plano espiritual, acerca da aparição do Cristo
na terra, ou, para dizermos a coisa segundo a única forma de linguagem de que
os antagonistas da aludida obra - acerca
da natureza do corpo com que Jesus desempenhou entre os homens a sua missão messiânica.
Entretanto, ao artigo se segue uma nota
escrita pela própria pena
que o traçou e que reza assim:
Já
tinha composto esse artigo, quando uma ilustre pessoa amiga me fez saber que a matéria
está discutida em Roustaing, por maneira semelhante ou quase...
Empenho a minha palavra de honra de
homem de bem e de espírita que nunca li esse autor.
Essa
a circunstância relevante que queríamos assinalar. Que nos mostra ela? Que, estudando
os Evangelhos à luz da doutrina espírita, meditando os ensinamentos e os atos
do SaIvador, apreendendo, através desse estudo e dessa meditação, a grandeza, a
excelsitude, a sublimidade desse Espírito ultra luminoso e de pureza absoluta,
o autor do artigo teve, por intuição, como outros a têm tido,
a revelação que
colhemos na obra roustainguiniana.
E porque a teve? Porque estudou e meditou realmente os Evangelhos,
guiado pela doutrina dos Espíritos, não se limitando a lê-los perfunctoriamente.
Porque, buscando sinceramente a verdade, os estudou e meditou
sem ideias preconcebidas
ou sem haver antes esposado,
às pressas, opiniões que se não formaram pelo
estudo e pela meditação.
Porque
assim fez, recebeu a iluminação interior, que lhe facultou encontrar a verdade
procurada. E, pois que isso não constitui privilégio seu, nem o é de qualquer
outro, visto que nos olhos de Deus não há privilegiados, não estando nenhum de
seus filhos excluído das graças e misericórdias que Ele a alguns concede,
todos, seguindo a mesma trilha, poderão chegar a idêntico resultado e
reconhecer também que menos distantes da verdade estão as seitas regalistas, quando
divinizam o Cristo, do que quantos o amesquinham com o reduzi-lo, em sua
natureza, à misérrima condição de um homem qual os que perambulam neste obscuro
e ínfimo planeta.
Nem só, porém, pela boca do congressista a quem Júlio
Costa se refere no seu interessante artigo, a racionalidade e, portanto, a
veracidade da revelação roustaingniana foi proclamada no seio do Congresso
Espírita de Lisboa.
Um outro de seus membros. se apresentou sustentando a
mesma corrente de ideias: o Dr. Antônio Freire, de quem diz “A Asa” que “se revelou orador empolgante e fluentíssimo, acrescentando que, de
todas as vezes que se fez ouvir a ao palavra arrebatadora, foi escutado como um
apóstolo
e no meio da uma atenção profunda, mesmo religiosa.”
Segundo a revista, donde extraímos esta notícia, o Dr.
Antônio Freire afirmou que a base da doutrina espírita se encontra
perfeitamente compendiada nos Quatro
Evangelhos, de Roustaing, e nas “Novas
Elucidações” publicadas pelo Centro “Luz e Caridade”, de Braga, afirmação esta, assinala a citada revista, que
o Congresso acolheu entusiasticamente.
Voltaremos
a apreciar as orações pronunciadas pelos dois ilustres confrades, quando compulsarmos
o volume em que vão ser publicados os trabalhos do
Congresso Espírita Português
de 1925.
Por enquanto, limitemo-nos, para encerrar este Eco, a
repetir estas palavras que se leem do artigo que José Augusto T. Romero
publicou no último número do Reformador:
“O futuro, não muito longínquo, fará ruir
com fragor os argumentos, destituídos de lógica, que ainda se opõem aos indestrutíveis
ensinamentos da “Revelação da Revelação”, os quais, à proporção que forem
estudados e meditados,
melhor compreendidos serão.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário