A
Bíblia
por Amaral Ornellas
Reformador
(FEB) Julho 1919
A Bíblia é um livro primoroso, que,
atravessando séculos, se tem imposto à literatura de todos os tempos.
Esse admirável conjunto de belezas
enfeixado no livro dos livros, poemas esparsos pela multidão que os repetia de
boca em boca, como os rapsodos (é o nome dado a um artista popular ou cantor que, na
antiga Grécia, ia de cidade em cidade recitando poemas (principalmente epopeias
de Homero)
os versos de Homero, constitui um manancial de virtudes e de poesia, onde todas
as literaturas têm ido haurir o Belo, onde todas as religiões se têm abeberado
da Verdade.
Encontram-se na Bíblia os fastos
históricos, narrados segundo os costumes da época, obedecendo a crença e nos hábitos
daqueles povos ainda na infância, episódios que ora aumentados pela imaginação
ora desvirtuados pelo paganismo reinante, envoltos naquela misteriosa poesia do
Oriente, se reuniram para formar esse códice precioso, onde a parte celeste,
vestindo a túnica da lenda, se promiscui com os fatos terrenos, muitas vezes
despidos de eloquência na sua simplicidade ingênua, e várias outras cobertos
pelos andrajos humanos.
Da Bíblia devemos separar as leis
onde se acha impresso o sinete divino dos preceitos firmados pelos homens para
servirem de norma à conduta de um povo escravizado e inculto como era o de
Israel.
A parte humana foi apagada pelo
surto luminoso do progresso; a divina ficou a
irradiar-se
pelas épocas em fora.
Se podemos olhar com os olhos do
espírito para as ordenações que embalaram os primeiros vagidos da humanidade do
passado, devemos fazê-lo para que nós possamos embrenhar na história dos nossos
ancestrais e dela tirarmos o suco da fé que nos alimenta a vida.
Mas, se para essas páginas santas olharmos
com os olhos da carne, não procuremos jamais interpretá-las, pois conduzidos
seremos aos mesmos desatinos que afastaram a Igreja de Roma do Redentor da
Humanidade.
À sombra do Velho Testamento armaram-se
fogueiras, em cujo fogo ainda nos abrasamos. São de ontem e bem de ontem os
soluços das vítimas.
Não lentemos ressuscitar esse pretérito
lúgubre.
A Bíblia, nos tempos presentes, deve
ser estudada e lida pelos olhos da espiritualidade.
Ela é um livro de símbolos, e como tal
deve ser aberta à luz do século que nos ilumina.
Aferrados à letra da Bíblia, alheios
aos prejuízos oriundos das suas interpretações errôneas, os inimigos da luz
fazem dela um espantalho com que procuram apavorar aqueles que, trôpegos ainda,
procuram palmilhar a estrada da Verdade.
Torcem e retorcem a seu modo os velhos
símbolos colecionados nos livros santos, cheios de entusiasmo pelas asperezas
da forma que os reveste e de manifestos rancores pela essência que dos mesmos
se desprende.
Moisés é a cada momento lembrado para
esmagar os seus inimigos. Não meditam sobre o caráter da sua missão em face da
humanidade endurecida daquela época.
Eles bem sabem que na Bíblia há decretos
de caráter transitório e preceitos imutáveis como as leis da natureza. Preferem,
porém, simular ignorância, apontando aos neófitos os textos bíblicos
interpretados a seu talante, onde a alma sedenta de luz, encontra o vácuo e a
treva.
Mas, à frente das suas investidas
perniciosas encontrarão eles os denodados apóstolos da Fé Nova, abrindo aos
olhos dos incautos as páginas da história criminosamente deslembradas.
Jesus, - o espírito máximo em
relação ao nosso planeta -, veio dar exato cumprimento à pura lei emanada do
Alto e sempre lembrada pelos profetas, como registra a Bíblia. No entretanto,
os decretos de caráter transitório, suscetíveis de modificação como todas as
constituições políticas dos povos, quando não mais satisfazem as suas condições
de vida, envolveram-no nas suas malhas de ferro, conduzindo-o ao mais execrando
dos suplícios.
Dizia Moisés ao povo para o qual legislava:
“Se se levantar no meio de ti um profeta e predisser algum sinal ou prodígio e
suceder assim como ele falou, e te disser: Vamos, sigamos os deuses estranhos que
não conheces, não ouvirás as palavras do tal profeta que será entregue à morte. Não estejas pelo que ele te diz, mas
logo o matarás”.
Jesus aos olhos pasmos de toda a Judeia
operava prodígios. Jesus vinha pregar um Deus estranho. Eles conheciam o deus
do extermínio; Jesus falava em nome de um Deus de Doçura. Era um falso profeta!
E se os doutores de outrora conduziram
o Mestre dos mestres ao cimo do Gólgota sob o patrocínio da letra da lei, não é
de estranhar que os teólogos de agora procurem esmagar o Consolador por ele
prometido à humanidade escrava das suas impurezas, sob a autoridade desses
mesmos decretos.
Mas outros são os tempos. Vinte séculos
de progresso trazem a experiência e o amadurecimento da razão.
Podem eles erguer a Bíblia como um grande
espantalho no meio dos simples.
Os
simples terão olhos para ver, a luz que da mesma se irradia.
Os próprios versículos bíblicos
dirão com sabedoria e eloquência: Esses crucificariam de novo o Cristo, se Ele
descesse dos píncaros da sua glória ao inferno paul (pantanoso) das nossas misérias.
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