O
poder da Bondade –
parte 1 de 2
por Sra. Iveta Ribeiro
Reformador (FEB) Julho 1925
(Conferência lida na FEB a 24 de Maio de 1925)
Bendito seja Deus que permite, mais
uma vez, possa a sua humilde filha ser a intérprete da Divina Vontade, através
das instruções de um dos seus filhos diletos. Bendito seja Jesus que deu forças
à sua obscura imperfeita discípula, para transmitir as sugestões do bom amigo
do Além. Bendito seja o meu guia espiritual, sob cuja inspiração preciosa tenho
lavrado obras que só na essência tem valor, pois que, na forma são por demais
rudes, pela deficiência de um cérebro incompetente.
Benditos sejam vós, meus
queridos amigos, pela vossa presença aqui; pela vossa boa vontade em ouvir-me;
pelo conforto spiritual que me tendes dado, animando-me nos meus labores. Bendito
seja este teto amigo, que agasalha irmãos e congrega almas voltadas para Jesus.
Mais uma vez me encontro a ocupar
a atenção preciosa dos meus irmãos de doutrina, dos meus irmãos do coração. A
alegria que sinto por estar em comunhão com almas leais só se perturba pelo receio
que tenho de não poder transmitir com justeza as ideais e as sugestões do meu
guia. Quando a máquina é imperfeita e perra (emperra),
não há operário capaz de com ela fazer obra completa, acabada. Sou essa máquina
tosca, que submissa obedece ao impulso do obreiro abençoado, mas que não pode
produzir a obra perfeita que ele deseja criar.
Dessa forma, peço-vos perdão da
minha insuficiência mental; da minha imperfeição mecânica; e rogo-vos que busqueis
nos vossos corações a benevolência precisa para aceitar o meu esforço, compreendendo,
através dele, o espírito real da palavra do meu guia vosso amigo.
***
Foi o “Poder da Bondade”,
o tema escolhido para esta palestra de hoje, tema cuja vastidão é Infinita e
que não poderá ser esgotado nunca. Sobre ele bordou o meu inspirador as páginas
cuja leitura ides ouvir, páginas singelas e nuas, sem o brilho da forma, que o
meu cérebro não lhes pode dar, mas cheias de verdade e de pureza, porque
sugeridas, ditadas por um abençoado e abnegado Espírito, aquele sob cuja direção
tenho trabalhado.
Bondade! Excelsa virtude divina
que só em partículas penetras no coração da humanidade e que, mesmo em partículas,
crias maravilhas e constrói obras de grandiosidades sublimes! Bondade! Raio divino
do amor supremo de Deus! Auréola luminosa que ilumina a fronte divinal de Jesus!
Bondade! Poesia sagrada que reveste de beleza a negrura triste da vida terrestre!
Fonte de todos os consolos, de todas as graças, de todas as luzes que aclaram a
alma enegrecidas pelo egoísmo, pela ambição; de todas as bênçãos que refrigeram
as almas que sofrem, as almas que choram, as almas que gemem...
Sob o influxo divino de tua força,
oh! Bondade, apagam-se vulcões de amarguras e desesperos; as rochas abrem o seio
de pedra fria, para a agasalhar amorosamente os animais e os homens; secam rios
de lágrimas doridas, deixando nos seus leitos, não os negros calhaus sobre que rolava o pranto, mas as
flores perfumosas da esperança; serenam tempestades de ódios destruidores e a
bonança vem acariciar os desatinos dos furacões indomados; aplacam-se medonhas
tormentas e as vagas bravias se transmudam em marulhantes (barulhentas) ondulações,
que vão beijar de mansinho, carinhosamente, a praia, cobrindo de brancas espumas
rendilhadas os restos dos naufrágios que causaram; extinguem-se fogueiras
abrasantes, que tudo tentam devorar em as enroscadas línguas flamejantes,
deixando no chão requeimado o tênue manto de cinzas frias, que cobrem misericordiosamente
o escombros denegridos; tristes escombros de ilusões desfeitas!..
Sob a força prodigiosa
que de ti dimana, desabrocham flores onde só havia espinhos; sussurram as fontes,
a embalar os ninhos órfãos da asa amiga que o caçador abateu; frutificam árvores
estéreis, onde não cantavam pássaros, nem zumbiam douradas abelhas; aplanam-se
caminhos íngremes e pedregosos, onde os viajores cansados deixam pegadas de sangue
e por onde depois caminha sem tropeços: perdem-se ao longe os rugidos medonhos
das feras, confundidos com o murmúrio das águas que encobrem abismos sem fundo;
iluminam-se noites tenebrosas, que viviam de almas rudes, mudando-se em suaves madrugadas,
promissoras da luz radiosa do sol!
Sob a influência divina do teu
supremo poder, as avezinhas implumes a que o tufão desfez o ninho e a que o caçador
roubou os pais, encontram de novo outro ninho, outra asa protetora que não as
deixa morrer no desamparo, sem um grãozinho que as alimente, sem uma gota d’água
que lhes mate a sede...
O viajor fatigado que
chega, cambaleante, ao fim da jornada, com o bornal vazio, as vestes rotas e os
pés descalços, encontra, na irradiação abençoada de tua luz, um teto amigo que
o abriga das intempéries, uma veste simples que agasalha o seu pobre corpo decrépito,
um pedaço de pão que lhe restaura as forças, um leito branco onde esperará a redenção
final... o término do caminho.
É
sobre o poder bendito de tua força, que as gazelas transviadas, perdida na escuridão
soturna das florestas, onde feras as espreitam a as desejam, encontram enfim a
gruta salvadora que as esconde do temeroso faro, e dormem tranquilas e seguras
contra o mal que as perderia...
É por influência tua que
o ceguinho trôpego encontra o guia que o ajuda a palmilhar as estradas, sob a
clara luz do sol amigo, mas mergulhado na treva em que vive...
És tu quem ensina a
matar a fome ao mendigo desgraçado que rola pelo mundo, como pedregulho perdido
na torrente, sofrendo todas as torturas, todas as desgraças, sem ânimo para reagir
contra a dura sorte, até morrer como cão sem dono, desamparado de Tudo, de todos
esquecido...
Foi
armado com a tua força que Jesus, o suavíssimo Rabi da Galileia, nos veio redimir
do erro, abrir os olhos à luz clara da verdade. E porque subsistiu a doutrina santa
de Jesus? Porque Ele não possuía uma partícula da Virtude Sagrada; não trazia em
si apenas uma dessas partículas que só reunidas a outras consegue formar um diminuto
todo. Nele refulgia todo um raio aquecedor de sua virtude e com esse raio redimiu
Ele o mundo!
Se não fosse a sublime bondade
que impregnava todos os atos e palavras do Divino Mestre, seus ensinamentos não
criariam as raízes que depois floriram em coroas luminosas de crenças puras, em
frutos doces de obras boas!
É que Jesus, sendo o
filho dileto do Senhor, recebeu d'Este, o Supremo Criador de todas as coisas, como
dádiva preciosa de sua emanação, a celeste Bondade nele personificada. A seus
discípulos transmitiu algumas centelhas divinas que o Iluminara, e nunca mais a
Bondade deixou a terra. Para cada dor, criou ela um conforto; para cada crime
um perdão; para cada erro, um suave corretivo; para cada infortúnio; uma consolação
balsâmica. Espalhou-a o Santo dos Santos pela face do mundo como poeira
luminosa; tenue, que vagueia, rodopia no ar e cai de manso sobre todas as
coisas, redoirando negruras, rebrilhando em cima de monturos, escondendo chagas
vivas... dores linindo (?),
estancando lágrimas...
Passa de quando em
quando vendaval infrene, num ponto onde o Pólen da Bondade pousara, e desvairado
tenta varre-lo. Passa furioso, desnudando antros, descobrindo charcos! Mas vem de
novo o sol de Deus e a poeira dourada volta a tremeluzir no ar claro, a pairar no espaço e vai novamente cair onde há
uma chaga a sangrar ou uma podridão a rescender. E volta tudo a parecer diferente,
sob manto tênue das partículas luminosas da mais pura emanação de Deus!
Nas coisas, como nas almas, as
partículas da Bondade aderem mais a umas do que a outras, porque umas as desejam
e outras as repelem. Nas almas que as desejam, elas encontram campo pronto a ser
fertilizado; plantam ali a divina semente do Bem e vêm brotar as flores puras
da verdadeira caridade. Nas que as repudiam, o Mal se implanta, deixando sáfaro
o terreno que não aceitou a luminosa semente.
***
Nos primitivos tempos,
quando a Bondade começou a ser ensinada e exemplificada pelo Divino Mestre,
poucas, bem poucas, eram as almas que a podiam compreender e desejar, pois a
maldade e a desumanidade reinavam soltas pelo mundo afora, alimentadas pela ignorância
em que vivia a humanidade, da existência de um Deus todo Amor e Misericórdia.
Deuses havia muitos, mas criações de imaginações bárbaras que, para cultua-los,
praticavam verdadeiras monstruosidades. Deuses materiais, feitos de bronze,
como o terrível Moloch, em cujas entranhas acendiam fornalhas para onde atiravam
inocentes crianças vivas como oferenda de crença e respeito. Deuses, representados
por grosseiras imagens, sobre as quais se espargia o sangue das virgens
imoladas em sua honra; deuses que exigiam, por intermédio dos seus fanáticos sacerdotes,
o sacrifício dei seres vivos em troca das graças que lhes imploravam seus fieis!
No
tempo dessas atrozes crenças selvagens e bárbaras, a Bondade não podia descer à
terra. Trouxe-a Jesus consigo, quando do azul, da luz eterna, baixou a negrura
triste deste mundo de trevas.
Todos os atos que praticou
durante a sua estada entre os humanos foram lições de Bondade. Suas palavras tinham
aquela doçura profunda que penetrava no âmago das almas, porque as ungia a verdadeira
bondade indo refrescar as chagas ocultas das consciências. Seu meigo olhar era
tão enluarado e puro, que aclarava as trevas que ensombravam os corações. É que
iluminava o fulgor da Bondade que trouxera do infinito reino de seu Pai!
Que
mais sublimado gesto de Bondade do que o seu, acudindo ao chamamento do pequenino
enfermo de Genesaré, quando dizia à pobre mãe chorosa: “Mãe, quero ver Jesus!”
E tinham ido servos procurar o milagroso Rabi, o mando de um poderoso senhor,
que o solicitava para curar a filha! E tinham sido enviados destacamentos de soldados
para levar Jesus a curar um outro poderoso senhor... Bastou, porém, a vozinha débil
do desgraçadinho enfermo e a Bondade suprema do Messias o levou até junto da enxerga
onde sofria o inocente!
Assim, desde essa luminosa
época, a Bondade começou a florir na face do mundo, a penetrar nas almas, corrigir
os sentimentos maus. Escondeu-se sob diversos nomes... Chamou-se Piedade, Civilização,
Progresso, Caridade.
A Divina Sementeira reverdeceu
na aridez do solo escuro. E cresceu..., cresceu... Deu as primeiras flores, os primeiros frutos,
mas não atingiu ainda ao seu pleno desenvolvimento. Por poucos ainda contam os
frutos, porque os lavradores da grande seara não são ainda em número suficiente
para que eles se produzam em maior abundância, melhores e mais sazonados.
Já nos nossos dias vemos
a grande obra que a Bondade tem construído pela mão da Caridade que Jesus ensinou.
Tem vindo num crescendo constante essa harmonia divina de vontade e onde irá parar
o mesmo Jesus no-lo deixou entrever´. É assombroso esse crescendo pela
multiplicação de gestos e obras que, raros em passadas eras, são hoje quase
vulgares.
Quando Vicente de Paulo andou
pelo mundo a socorrer por suas mãos os desgraçados, poucos eram os que se animavam
lhe imitar o sagrado mister e só muito mais tarde seu divino ensinamento fio compreendido,
multiplicando-se então os que consagravam a vida a socorrer as misérias
alheias.
Mais tarde, quando a
rainha Isabel de Portugal, a doce criatura que, às ocultas, trocava os prazeres
suntuosos da Corte opulenta pelos suaves encantos de acudir aos pobres, correndo
o risco de despertar a ira de seu régio esposo autoritário, já a bondade tinha
maior influência sobre os humanos. Que força não infundia ela no coração piedoso
da que foi depois chamada Rainha Santa, para que operasse o lindo milagre das
moedas que se transformaram em flores!
Foi, decerto, a bondade sublime, que morava em sua alma, quem operou,
aos olhos pasmados, do esposo, esse maravilhoso fenômeno!
As páginas da história do
mundo estilo salpicadas dessas gotas de luz: atos de bondade, que, isoladamente
praticados, criavam em torno de quem os praticava uma auréola de santidade, por
tão raros se contarem. Nas épocas mais negras, em que a humanidade cometia as maiores
atrocidades, havia sempre alguém extraordinário que se destacava pela bondade do
seu proceder, em desacordo com os tempos em que vivia. Muitos passaram à posterioridade,
incluídos que foram seus nomes no rol dos santos e dos mártires. Estão nesse
número como os de grandes santos, os do venerando Vicente de Paulo, o do místico
e suave Francisco de Assis, o de Francisco de Paula de tantos outros astros de
Bondade, que iluminaram a terra com a divina palavra do Justo ensinada pela
bondade imensa que o santificava todos os seus atos.
A pouco e pouco se foi
modificando a generalidade da alma humana, sob o domínio dos sublimes exemplos
dados pelos pioneiros da Bondade. Edificaram-se as primeiras casas destinadas a
acolher os desgraçados. Construíram-se os primeiros hospitais para os pobres;
primeiros asilos para os órfãos, os primeiros albergues para os inválidos. A Bondade,
sob a forma bendita da Caridade, ia ensinando lentamente os homens a se amarem
uns aos outros. Eles, coitados, ainda muito rudes, misturavam os atos de
humanitário amor às nefandas ações com que torturavam seus semelhantes. Em
frente de um asilo de crianças abandonadas, não trepidavam em erguer uma
fogueira, para queimar um ser humano ou uma forca para estrangular uma criatura
de Deus! A par dos hospitais, construíam cárceres tenebrosos, onde se supliciava
atrozmente, selvaticamente, desgraçados prisioneiros l Era a eterna luta das
trevas contra a luz; o eterno combate do mal contra os surtos do Bem. Lentamente,
muito lentamente, porém, a Bondade foi cultivando no coração do homem o sentimento
da misericórdia e da piedade. Não podia deixar de ser vagarosa a sua obra,
porque muitos eram os espinhos a arrancar, muitos os rochedos a destruir,
muitos os obstáculos a -vencer. Mas os alicerces dessa obra eram lançadas profundamente,
para terem a capacidade necessária de suportar mais tarde o peso formidável do grande
edifício que seria construído para a glória suprema de Deus!
Mais e mais frequente se
foi formando no mundo o advento dos prosélitos da Bondade, surgindo neles em
cada canto da terra a espalhar os mais belos, mais comovedores exemplos, os
mais profundos e o mais luminoso ensinamento da sagrada doutrina do Amor.
Nos fastos da história
desta terra que Deus nos deu por pátria, nas páginas gloriosas que a nossa raça
tem escrito com os seus feitos, uma havia, tão negra e tão triste que empanava
o brilho das demais. Nessa pá nefanda se gravara o mais grave dos erros de uma
nação que se formava; um erro que impedia o seu prestígio em face do mundo, Era
a em que escreveram as leis que permitiam houvesse escravos neste recanto augusto
da terra, sob a luz radiosa do sol de Deus.
Nas que a essa página se
seguem, horríveis tragédias se grafaram, atestando a que ponto ali se desconhecia
a existência de um Deus todo misericórdia e piedade. Veio, entretanto, um dia em que a Bondade dominou
o coração de uma mulher, aqueceu-o com o calor divino, iluminou- com a
claridade doce do seu brilho e nesse coração de mulher nasceu uma aspiração
que, a tornaria sagrada aos olhos pasmos do mundo. Era uma princesa gentil que
um dia deveria ser imperatriz, Quis o destino que chegasse a ser apenas, por breve
tempo, uma imperatriz provisória, uma regente, a substituir o monarca ausente.
Essa princesa iluminada não se aproveitou de sua autoridade de governante, nem
para deslumbrar o povo com o esplendor de sua corte nem para criar em torno do
trono esse ambiente de adulação e terror que costuma cercar os tronos de todos
os coroados. Pensou apenas em praticar um ato de tamanha grandeza moral, que jamais
ninguém houvera cometido, em realizar o sonho ardentemente acariciado pelo seu coração
abençoado. E a sua regia mão, obedecendo tão somente ditames da Bondade da que lhe
morava n'alma, assinou a promulgação da mais sábia lei que ainda ilustrou um reinado
terreno! Essa princesa bondosa, essa santa mulher que, tendo nas mãos o poder que
o cetro dá, fez dele apenas o instrumento de um sublime ato de caridade,
chama-se Isabel e ficou sagrada como a Redentora.
Isabel a Redentora! Que alma!
Pela Bondade, se igualou sob o céu da nossa terá? Isabel, a Redentora! A santa
que estancou rios de lágrimas, vertidas dos olhos dos cativos, era a perfeita encarnação
de um desses Espíritos que aspiram à perfeição, envolvendo-se nos raios luminosos
da Bondade salvadora! Foi tão boa e morreu tão triste e esquecida daqueles a
quem tudo dera, dando a alegria da liberdade; mas o seu ato magnânimo foi o
mais belo exemplo que um mortal podia dar na face da terra. Muito, de certo,
subiu para Deus aquela alma impregnada de bondade aquela doce alma caridosa que
conquistou a sua coroa de glória, outorgando a paz e a felicidade de milhares
de sofredores.
O
poder da Bondade –
parte 2 de 2
por Sra. Iveta Ribeiro
Reformador (FEB) Julho 1925
Assim, em cada canto da
terra foram surgindo vultos, cuja estrutura moral era um foco de ensinamentos
proveitosos. Esses Espíritos evoluídos divulgaram cada vez mais as belezas
sublimes de que a Bondade se reveste e os frutos de seus exemplos foram
aparecendo em maior cópia. A bondade sugeriu um dia a piedosa ideia de
socorrerem -se os desgraçados que nos campos de batalha regam com o próprio sangue o duro solo; ensinou o homem
a socorrer o seu semelhante, não o deixando mais morrer abandonado como mísero
animal estropiado, e desse ensino abençoado nasceu a organização da humanitária
instituição que rapidamente se espalhou pelo mundo. A Bondade foi ensinada por
Jesus e a todas as suas grandes obras se liga o nome sagrado do Divino Mestre;
por isso, essa instituição mundial tomou o sugestivo
nome de Cruz Vermelha e é hoje tão útil na paz, como na guerra. A Cruz
Vermelha... a Cruz de sangue... Cruz que ampara... Cruz que salva!
A par dessa pujante frutificação
da Bondade, outras viu o mundo e agora mesmo, nos dias que correm, os nossos
olhos pasmados comtemplam a grandiosidade surpreendente da obra que ele tem
construído através dos séculos, em nome de Jesus, mesmo quando esse nome não é
sinceramente pronunciado. Por toda parte a criações da Bondade esplendem ao sol, sorriem, florescem, embalsamando a terra com o suave perfume que
inebria as almas e embriaga os corações bem formados. Multiplicaram-se
prodigiosamente os asilos e os hospitais; as obras de humanitário amor
proliferam por todos os cantos, amparando os desgraçados, protegendo os fracos,
ensinando os ignorantes, alimentando os famintos e curando os enfermos!
Cada dia a Bondade infiltra
no cérebro humano novas ideias de caridade, muito embora não tenham francamente
a forma de atos de tal natureza. Assim é que, todos os dias, leis novas se
promulgam, que enriquecem as nações pela elevação do bem a que visam. Umas vem
amparar fracas mulheres que labutam em trabalhos pesados, nas oficinas
terríveis, onde, esgotadas as forças, gasta, a saúde, a vida, numa ignorada e
inglória luta; outras criam orfanatos e asilos de caráter oficial, mantidos
pelas coletividades, para socorrer crianças abandonadas; outra regulamentam as
horas de trabalho dos pobres que os ricos exploram sem piedade. Já todas as
nações porfiam em procurar a dianteira na decretação dessas leis humanitárias
e, se entre as nações há essa preocupação, entre as criaturas ela se apresenta
ainda mais sensível. Já é rara a que não sinta em si o desejo mais ou menos
sincero de ser boa. Cada um aspira, ou parece aspirar, a poder praticar a
caridade, que é a mais perfeita manifestação da Bondade. Raro é o rico de hoje
que não liga seu nome a um empreendimento humanitário e nobre. Muitos ainda são impelidos por vão sentimento
de vaidade, fazendo da prática do bem ostensivo uma auréola de prestígio e de
grandeza humanos, em torno de suas personalidades. São os bons incipientes, os
que não compreenderam ainda os verdadeiros ditames da Bondade e os confundem
com as insinuações perdidas da vaidade; mas, em todo caso, não deixam de ter
algum mérito, pois sempre concorrem para abrandar desgraças e amparar
infortúnios.
Que importa que muita gente
pareça boa, quando apenas tem amor ao seu renome e tudo fazem por merecer
louvores, se assim mesmo vão ao encontro das necessidades dos infelizes? Se o
ouro, que espalham com o intuito de chamar a atenção do mundo sobre as suas
ações, também serve para enxugar lágrimas e suavizar dores, abençoados sejam os
seus gestos, apesar de impróprios de verdadeiros cristãos.
Movidos embora, mais por
um sentimento de ostentação, do que de verdadeira bondade, esses ricos
vaidosos, que dão esmolas para aparecer e se destacar dos demais, estão bem
mais perto da lei de Deus do que os outros, egoístas, que se cercam de pompas e
exagerados confortos, sem se lembrarem nunca dos que nada tem, nem pão, nem
teto. Esses são os refratários às parcelas luminosas da Bondade, que em vão
procuram amenizar a dureza de seus corações marmorizados. Esses são como os
terrenos pedregosos, onde as sementes não germinam, ficando sempre áridos,
desertos, sem a tenue coloração de um brotinho novo a manchar de verde macio e
fresco a secura que revelam, sem poder gozar nunca o frescor balsâmico de uma
flor, ainda agreste, pura.
Felizmente, nos tempos
que correm, vai diminuindo o número dessas almas esquivas que fogem aos
influxos da Bondade já tão disseminada pelo mundo. Vão escasseando os corações
endurecidos, que não consentem lhes penetre no âmago a doçura infinita de um
sentimento ungido de Bondade... Bendito seja Deus por essa escassez abençoada!
Tanto o império da
Bondade se vai consolidando sobre a humanidade, que nunca um gesto de malvadez,
partido de um rebelde às leis sagradas de Deus, deixa de ser combatido, ou,
pelo menos, minorado nos seus efeitos, por uma manifestação contrária, uma
manifestação de caridade.
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