Novos tempos, novas táticas
por Roberto Coimbra
Reformador
(FEB) Julho 1947
A um fluente e culto pregador ouvimos certa
feita a afirmação de que a quase ninguém hoje amedrontam mais os pintados e
celebrados horrores do inferno. Para salvar almas não vale o esforço de traçar,
a cores vivas e a golpes largos, em sermões e artigos maçudos, os quadros
dantescos reservados aos bodes no dia do juízo final. O povo já não liga para
essas assombrações. É preciso mudar de tática - concluía o orador.
Posto o ilustre reverendo quisesse, com
isso, reforçar argumentos outros com os quais não concordamos, absolutamente,
por amor da lógica e da verdade, o certo é que ele tem carradas de razão e,
honra se lhe faça, aceitou um fato indiscutível que muita gente boa inda não
aceita, ou faz que não aceita.
De feito, o inferno descrito em certo palratório
(= parlatório), que chega às vezes
a parecer inflamado pelo próprio fogo daquelas bandas, só mesmo por um milagre
da ignorância mantém nesta época o seu prestígio neste mundo de Deus, - neste
mundo de Deus que alguns ministros, com a sua poderosa homilética (arte de pregar
sermões religiosos),
buscam à viva força convencer-nos de que é do diabo.
Essa história de céu e inferno vem sendo muito
mal contada. E não pode ser doutro modo. Mas, depois que as vozes de
além-túmulo repontaram aqui, ali e acolá, nas línguas mais díspares, entre os
povos mais diversos, nos meios até mais adversos, depois que o Espiritismo, assentado
em bases graníticas, entrou a espalhar luz sobre os ensinos do Cristo, uma
nova, e mais justa, e mais segura concepção de Deus e do Universo veio
transformar a vida de inestimável multidão de gente.
O preconceito, de mãos dadas a interesses e
convenções sociais, ainda faz pé atrás e empenha-se, infelizmente, em conservar
as consciências nas trevas, asfixiando-as, Mas dia virá em que desaparecerão os
carneiros de Panúrgio (personagem
de Rabelais; seguir alguém sem limites ou restrições) e todo o mundo
aprenderá, por si mesmo, o rumo a seguir.
Até lá, muita luta, muito obstáculo, muita incompreensão
terão de ser enfrentados, transpostos e vencidos pelos cristãos-novos, por aqueles
que fazem por viver o Cristianismo em sua primitiva pureza e simplicidade. Ao
presente, apesar de tudo que por aí vai, já temos fortes razões para considerar
animador o progresso alcançado. Boa parte da humanidade pensa com a própria
cabeça e sente com o próprio coração, o que não é pouco. Daí o crescente
fracasso da verborragia dos que advogam a causa do inferno eterno, ou do céu
ganho à custa alheia, do céu dependente até de salvo-condutos de homens como
nós mesmos.
A verdade triunfa sempre. É das leis de Deus.
Só ela libertará o homem do pecado, através das vidas sucessivas. Não obstante
isso, certos religiosos multiplicarão seu zelo e sua energia no triste e
inglório intuito de incutir falsidades na mente dos seus semelhantes. Poderão
ir mudando de tática esses sectaristas, mas, dominados por dogmas, procurarão
impô-las às criaturas, assim como quem está certíssimo de que o reino dos céus
seja, exclusivamente, o reino dos seus.
Não esmoreçamos, pois, no combate aos erros,
venham donde vierem. Orando e vigiando, assiste-nos, a nós, os espíritas, o
dever de esclarecer os homens no verdadeiro caminho do Espírito de Verdade.
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