Mediunidade e Trabalho
Indalício Mendes
Reformador (FEB) Julho 1954
Nunca é demasiado insistir sobre a necessidade de incrementar
o trabalho de desenvolvimento mediúnico. Ele pode ter influência marcante na
vida individual, porquanto, desde que o médium se apresente em condições de
exercer atividade diante dele se abrirá vasto campo de realizações fecundas. A
retenção de mediunidades, isto é, a falta de exercício do dom mediúnico, pode
trazer perturbações diversas, inclusive de natureza nervosa. Via de regra o
médium é indivíduo de grande sensibilidade psíquica. Se adquire o domínio
relativo da força que possui, pode orientá-la de modo a alcançar os resultados
mais produtivos e benéficos. Se se desinteressa desse poder, ele acaba por lhe
prejudicar o equilíbrio nervoso e pode trazer consequências danosas a todo o
organismo.
A situação de médium independe de crenças e opiniões, bem como
da condição social. Naturalmente, o médium que se vota a uma vida sadia,
moralmente elevada, inclinado à prática de ações louváveis, estará naturalmente
protegido de surpresas desagradáveis. A mediunidade é um fluido, admitamos,
como a eletricidade: conhecido, mas de difícil definição. O médium atua como um
instrumento, como uma antena, capaz de captar todas as manifestações psíquicas
que lhe sejam afins. Nestas condições, precisa de estar sempre preparado para
realizar espontaneamente a seleção das influências que o acometem. Desde que se
desenvolva suficientemente temente e se oriente de modo superior, dará mais facilmente
passagem às manifestações de Espíritos
de boa moral do que a Espíritos ainda em grau evolutivo inferior. Ninguém
desconhece, entre os espiritistas, que os Espíritos exercem sobre o mundo moral
e mesmo sobre o mundo físico uma ação incessante. Atuam sobre a matéria e sobre
o pensamento e constituem uma das potências da Natureza, causa eficiente de uma
multidão de fenômenos até então inexplicados ou mal explicados e que não encontram
solução racional senão no Espiritismo.” (“O Livro dos Espíritos” - Introdução.)
Ao contrário do que muitos opinam, devem ser cultivados
todos os aspectos da mediunidade. Não há razão para se desprezar o
desenvolvimento da mediunidade relacionada com os fenômenos físicos. Ela é de
enorme utilidade e importância. O que se deve evitar é a preferência pelos
fenômenos, com o abandono da parte moral, indispensável à melhoria espiritual
dos indivíduos. Qualquer setor da mediunidade é digno
de estudo e de cultivo: a mediunidade curadora, a mediunidade psicográfica, a
mediunidade intuitiva, a mediunidade auditiva, a mediunidade mecânica, a
mediunidade de efeitos físicos (incluindo-se neste ramo os trabalhos de materialização
e desmaterialização, de desintegração e reintegração da matéria, de transportes,
de voz direta, de escrita direta, etc., etc.).
Evidentemente, qualquer trabalho de natureza mediúnica deve
ser realizado com o maior escrúpulo, com todos os cuidados possíveis, além de
um serviço de controle efetivo, que não dê margem a dúvidas e contribua para a
obtenção de elementos progressivamente mais amplos de verificação. Julgar-se
que tudo já esteja feito ou descoberto no setor do Espiritismo é parar no meio
do caminho. O Espiritismo é, por excelência, uma doutrina evolutiva. Não se
prende a dogmas estreitos, não tem a presunção de haver já conquistado a
plenitude dos conhecimentos, não presume haver dominado a verdade inteira.
Precisamos convir que a vida não cessa, assim como não se detém o impulso investigador
da Humanidade. O muito que já se conseguiu até hoje talvez nada seja diante do que
ainda aguarda os homens do futuro.
O dom mediunico é de excepcional importância no porvir da
Humanidade. Impõe-se, todavia, que se desenvolva metodicamente, que possa ir,
ainda que lentamente, ampliando sem interrupção seu campo de ação. Nada se
perde, pelo contrário, tudo se terá a ganhar, com a persistência e a boa
vontade no progresso do trabalho espiritual.
As sessões mediúnicas familiares são úteis, desde que à sua
testa se encontre alguém com real capacidade moral e suficiente experiência para
controlar e orientar os trabalhos. Sem se afastar da ambiência evangélica;
podem ser efetuados todos os serviços relacionados com as experiências mediúnicas,
sejam estas de que natureza for. O trabalho de caráter cientifico não é
incompatível com o ambiente religioso, porque, na realidade,
os dois se completam. Para muitos, o caráter religioso de uma reunião espírita (ou
de qualquer outro credo) prescinde de experimentações científicas, porque
religião subentende revelação. Não devemos, nós, os espíritas, adotar semelhante
atitude. As experimentações científicas estão perfeitamente acordes com o espírito
religioso, porque os homens jamais poderiam entregar-se a investigações no ramo
da Ciência
sem o beneplácito das forças espirituais superiores. E cada conquista científica
não deixa de ser uma revelação e essa revelação, a História no-la mostra, muito
embora inicialmente combatida, acaba por ser aceita no mundo e passa a
constituir um dos elementos da vida humana, caindo na rotina.
Sabemos que muitas conquistas da Ciência foram impugnadas
por credos mal esclarecidos. O clero se insurgia, acusando-as de obras do demônio,
mas o tempo acabou por destruir inteiramente os argumentos cavilosos de pretensos
donatários da verdade absoluta... Olhemos para o passado. Se hoje a Humanidade
se debate no ceticismo e no materialismo, devemo-lo à diretriz defeituosa
daqueles que, em nome de Deus
e de Jesus, pretenderam, a ferro, fogo e sangue, cortar cerce os voos da
inteligência humana, esquecidos de que, em muitos dos heróis da Ciência,
vicejava a mediunidade mais bela e fecunda. Sacrificaram corpos, mas não puderam
destruir as almas. O pior é que se falava em nome de Deus para consumar
tragédias que hoje atestam a falta de substância moral daqueles que tentaram
infrutiferamente jugular o avanço da Ciência.
O Espiritismo não está nesse molde. É Ciência-Religião-Filosofia.
Cresce em todos os sentidos porque sua doutrina, evolucionista por excelência,
ampara o homem, esclarece-o, encaminha-o e lhe dá a força moral de que
necessita na vida humana, para a compreensão de seu importante papel na Terra e
na vida espiritual. Mesmo em seu seio, o Espiritismo tem de progredir sempre,
porque esta é a sua lei, esta é a determinação de sua própria origem. Allan Kardec,
o grande mestre, codificou os ensinamentos transmitidos pelos Espíritos. Em
seguida, Jean-Baptiste Roustaing, também assistido por forças espirituais
respeitáveis, trouxe novos e preciosos esclarecimentos que reuniu em notável
obra denominada “OS Quatro Evangelhos”. Temos,
pois, como pedestal do Espiritismo, os livros notáveis de Kardec: “O Livro dos
Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, “O Evangelho segundo o Espiritismo” , “A
Gênese”, “o Céu e o Inferno” além do seu ingente trabalho como desbravador,
numa época em que ainda era forte e perigoso o poder do clero católico no mundo.
Depois, surge Roustaing, como discípulo de Kardec, digno também do maior
respeito, com os ensinamentos vindos do Alto pela médium Collignon. Então,
passaram “Os Quatro Evangelhos” a constituir uma obra também indispensável ao
estudo do Espiritismo, da qual testemunhou Allan Kardec (“Revue Spirite” Junho de
1867): Esta obra compreende a explicação e a interpretação dos Evangelhos,
artigo por artigo, com o auxílio de comunicações ditadas pelos Espíritos. É um
trabalho considerável e que tem, para os espíritas, o mérito de não estar em
contradição, por qualquer dos seus pontos, com a doutrina ensinada n’O Livro
dos Espíritos e no dos Médiuns. As partes correspondentes às de que tratamos
n'O Evangelho segundo o Espiritismo o são num sentido análogo.
Aí está a palavra de Kardec, que dispensa, por sua
autoridade, maiores comentários, Assim como as obras do Codificador foram
devidas a excelente e idôneo trabalho mediúnico, também “Os Quatro Evangelhos”,
recebidos por via idêntica, mediante um médium autorizado, como Mme. Collignon,
tiveram em Roustaing o apoio de que necessitavam no ambiente terreno em que
apareceram, já que essa grande figura do movimento espírita era pessoa de
absoluta inteireza moral, possuidora de sólida cultura e perfeitamente
identificada com a essência e os objetivos da doutrina que professamos.
Quaisquer que sejam as modalidades do mediunismo, todas
revelam a ação formidável dos Espíritos, que, se mais não fazem, é porque nem sempre
podem contar com médiuns perfeitamente à altura dos trabalhos, médiuns que se
encontrem realmente integrados em sua importante missão terrena. Isto põe em
relevo a necessidade primordial de serem dispensadas atenções cada vez maiores
aos médiuns, para que eles possam, com segurança e orientação superior,
adquirir as condições imprescindíveis ao trabalho traçado no plano invisível.
Para que o esforço mediúnico ofereça resultados excelentes, devem
os médiuns encará-la com a máxima seriedade possível, escorados no exemplo
evangélico e nos princípios da doutrina espírita. Se, em qualquer atividade, a
persistência, o esclarecimento e a boa vontade obram prodígios, no campo da
mediunidade, então, os efeitos são insofismavelmente magníficos. Portanto,
desenvolver- o trabalho mediúnico, seguindo os métodos prescritos pelo
Espiritismo, consoante Kardec, é estabelecer bases sólidas para farta e valiosa
colheita futura. Os médiuns, pelo fato de serem dotados dessa valiosa
faculdade, devem aceitar com coragem e fé a missão que lhes for destinada, buscando
cumpri-la com devotamento, santificando-a pelo exemplo e pela resignação em
face dos obstáculos comuns ao itinerário humano. Não há dúvida de que mediunismo
não necessita de estudos para desabrochar no espírito doa seres humanos.
Todavia, o ideal será que o médium estude, enriqueça os seus conhecimentos e
leve uma vida simples e pura, fugindo o mais possível do que possa contribuir
para o enfraquecimento de suas reservas morais.
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