Mensageiros da Esperança
por Indalício Mendes
Reformador (FEB) Setembro 1954
Digno
de todas as bênçãos é o serviço de beneficiência realizado pelos espíritas, em
favor dos deserdados da fortuna e dos enfermos da alma e do corpo. Obra
santificada, essa, que muitas vezes exige grande e enobrecedor espírito de
renúncia dos que a praticam. Aqueles que se entregam à faina de ir visitar a
miséria em sua intimidade, tomando contato direto com a dor alheia, sem se
preocupar com a posição religiosa dos necessitados, levam aos infelizes o pão
que acalma a revolta das vísceras famintas, a coberta que atenua os rigores do
frio, a veste que retarda a nudez enxovalhante, o medicamento que contribui
para restabelecer o equilíbrio orgânico, dando ensanchas(oportunidades) a que se estabilize a
saúde indispensável ao cumprimento das obrigações inerentes à vida terrena. A
par disso, leva ainda palavra amiga, o esclarecimento que pode transferir aos
corações sofredores o conforto espiritual imprescindível à integral
recomposição da criatura necessitada. São numerosos os serviços de caridade instituídos pelo Espiritismo para atender as
dores do mundo, sem qualquer retribuição, assim como sem distinção de raças e
de credos, tal como Jesus exemplificou e consta do Evangelho. Sem vacilarem
ante obstáculos quase insuperáveis, desdenhando das imposições da fadiga, sacrificando
mesmo interesses e conveniências particulares, mas compenetrados da nobilitante
missão que lhes cabe cumprir, os espíritas percorrem longas distâncias, sobem
morros íngremes, de difícil acesso, enfrentam circunstâncias muitas vezes desagradáveis, sob o sol, sob a
chuva, pisando a lama ou respirando o pó das estradas, sem outro fim que não
seja o de servir, de fazer o bem, consoante o rumo evangélico. Assim, iluminam
sua rota com a luz imperecível do Evangelho de Jesus e executam seus programas
de assistência.
*
Quantas
vezes, no esforço seletivo da sindicância, acolhem conceitos inadequados e
imerecidos! No entanto, fiéis às normas de trabalho prefixadas, procuram,
escudados na fé e fortalecidos pela tolerância, apanágio da religião espírita,
dissolver pacientemente as incompreensões, com a elucidação ponderada;
responder, com o silêncio ungido de vigilância, às imprecações(maldições) geradas pela
cólera de indivíduos perturbados espiritualmente; transformar conceitos
pejorativos em bênçãos sobre os que, coitados, ainda não se encontram em
condições de avaliar os esplendores da luz nem os perigos da escuridão. Nessa
luta gigantesca, que não repercute em outros ambientes porque é guardada no âmago do coração, os espíritas acabam por firmar pé e triunfar, porquanto são
acompanhados, nessas peregrinações cristãs, pela advertência de Jesus a Paulo: “Tem bom ânimo; pois assim com deste
testemunho de mim em Jerusalém, assim Importa também que o dês em Roma.”
*
É
possível que, entre tantos dedicados obreiros do Espiritismo, algum se detenha,
às vezes, para considerar o peso do fardo que carrega e, em tais momentos, que
Espíritos inferiores acoroçoam, faz-se mister a reflexão serena, pois é
preferível ceder à tarefa a quem a possa executar de boa-vontade, do que
insistir que alguém a realize sem entusiasmo. A atitude mental que adotamos
pode facilitar o ato que pretendemos consumar. Há sempre uma efusão fluídica
quando pensamos ou agimos. Muitas vezes um ato não chega a concretizar-se mas
fica marcado em nossa subconsciência. Todo trabalho feito com desânimo dá
resultados deficientes. Pelo menos, disse o Mestre: “fazei o bem e emprestai, sem nada esperardes, e será grande a vossa
recompensa, e sereis filho do Altíssimo; porque Ele é benigno até para com os
ingratos e maus.” Eis porque o serviço de caridade tem de ser feito com
alegria no coração, com sentimento amoroso, para que seus efeitos sejam
realmente benéficos. A esmola dada friamente, sem vibração amorosa, não
encontra eco na senda espiritual, é semente desperdiçada em terreno sáfaro(árido).
Caridade não se faz com o coração vazio de amor, porque, então, não será
caridade, uma vez que lhe falta o complemento valioso. Por isso, o serviço de
assistência a enfermos do corpo e da alma, aos que são atingidos também pela
provação econômica, é de extraordinário alcance social e altruístico. Não se
trata de amparar e estimular a ociosidade nem a mendicância profissional, mas
de prover aos que são realmente necessitados e não têm meios de tirar do trabalho
o suficiente para a sua subsistência ou o seu amparo. Daí a imensa
responsabilidade moral do serviço de sindicância, destinado a separar o joio do
trigo, a resguardar os que são verdadeiramente necessitados. Avulta de
importância a tarefa dos trabalhadores espíritas nesse setor, e eles a realizam
com o mais puro sentimento de paz, compreensão e amor. Caridade seca,
orgulhosa, indiferente, humilhante ou espalhafatosa, não é rigorosamente
caridade. Herdeiros do Cristianismo primitivo, os espíritos continuam hoje a
cumprir sua abençoada missão, que ainda mais se desenvolverá no futuro. Seu benemérito
trabalho se expande dia a dia por não lhe faltar a ajuda preciosa do plano invisível. Criaturas bem intencionadas
colaboram com essa obra grandiosa, fazendo donativos de toda sorte, sem
resvalarem para a propaganda das boas ações que praticam. O espírita consciencioso,
de que nos fala Kardec, trabalha sem alarde, anonimamente, se possível. O que
vale para Deus não é a caridade insincera, que objetiva laurear quem a faz, mas
a caridade simples e modesta, na qual não sabe a mão esquerda o que a direita
faz. A não ser assim, a caridade se torna conspurcada pela vaidade e envilecida
pela hipocrisia, humilhando, não raro, quem a recebe. Os que assim procedem,
não são caridosos, mas egoístas, porquanto beneficiam seu orgulho, em
detrimento da infelicidade de seus semelhantes. “Praticam, porém, todas as
obras para serem vistos pelos homens.”
*
É
mais frequente e bem mais fácil, decorar e repetir os versículos do Evangelho,
do que seguir-lhes o escarpado curso da exemplificação. O melhor crente não é o
que sabe recitar preces e provar a memória na citação calorosa das passagens da
Boa Nova, mas aquele que, humilde, afina os sentimentos na prática das boas ações,
que sabe transformar o mal em benesses e adubar o coração para produzir frutos
santificados. Qualquer ato de caridade deve ser iniciado com o pensamento puro,
para que se envolva em fluidos positivos e revigorantes, capazes de transmitir
aos que sofrem o desejado alivio. Na medida do amor posto no ato de
caridade, o que o pratica será igualmente beneficiado, consoante a Lei da
Retribuição ou Lei da Causa e do Efeito. Todos somos necessitados de caridade,
muitas vezes ainda mais do que aqueles que presumimos em piores condições do
que nós, tanto assim que nos cumpre servir e a eles, serem servidos. A riqueza
material jamais poderá suplantar em valia a riqueza espiritual. No entanto,
quando a riqueza material é também utilizada em obras de benemerência, deve ser
abençoada. Nem sempre o egoísmo humano se liberta facilmente de preconceitos
desenvolvidos e mantidos pela ausência ou pelos defeitos de educação. Para
sermos realmente caridosos com os nossos semelhantes, devemos enriquecer-nos de
humildade, tolerância e amor. Perante o mundo, a felicidade é geralmente condicionada a maior ou menor posse de haveres. Perante o Altíssimo, a felicidade somente
pode ser encontrada através da exemplificação do bem, no exercício da caridade
sincera, no testemunho permanente do amor elevado. “Quando, pois, deres esmola, não faças tocar a trombeta diante de ti,
como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem honrados pelos homens;
em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando deres
esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua
esmola fique em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te retribuirá.”
*
Os
abnegados obreiros espíritas, que se entregam, cheios de ânimo e zelo
evangélicos, aos trabalhos de assistência aos necessitados, são legítimos
Mensageiros da Esperança. Dão aos abandonados a certeza de que não se encontram
sós; mostram aos aflitos que poderão fazer jus ao bálsamo da tranquilidade,
desde que não percam a fé ou se esforcem para recuperá-la; transmitem, àqueles
que se debatem na dor física, a confiança em dias menos angustiosos, assim como
levam, aos que são acicatados pelo sofrimento moral, o sedativo da paz, através
da palavra oportuna e da caridade que, a mancheias, derramam sobre a Terra os
trabalhadores invisíveis, que nunca faltam, que jamais deixam de lutar pela
libertação dos que ainda se achem enclausurados em pensamentos negros e
obsidientes.
*
“Fora
da caridade não há salvação” - sentenciou Allan Kardec. O Espiritismo é
fundamentalmente caridoso e os espíritas, integrados na Doutrina que nos legou
o Codificador, devem palmilhar atentamente o rumo evangélico. Podemos todos
cumprir nossos deveres de espíritas cristãos, ainda que tenhamos as mãos
vazias, desde que nos apresentemos com o coração cheio de bondade, o pensamento
inundado de perfeita compreensão evangélica. A boa-vontade opera prodígios. O
Espiritismo dá o pão do Espírito e também dá o pão da carne. Sua obra
humanitária cresce a todo instante, agiganta-se e há de abarcar toda a Terra. É
a Religião que está triunfando sem violência, por força mesma da sua expressão
divina. Todos os trabalhadores da Seara de Jesus, no plano da caridade objetiva e subjetiva,
os obreiros visíveis e os obreiros invisíveis são amparados pelas bênçãos do
Mestre, Paradigma de Caridade, que é expressão pura do Amor.
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