No dia 9 de março corrente (1984), às 22 horas,
aproximadamente, no Hospital da Lagoa, onde havia sido internada poucas horas
antes, desencarnou a irmã e conhecida médium cujo nome dá titulo a esta página.
Ao
sepultamento, ocorrido no dia seguinte, 10 de março de 1984, às 16 horas, no
Cemitério de Inhaúma, compareceram numerosos confrades e amigos, entre os quais
se achava o representante da Federação Espírita Brasileira, na pessoa do seu
Vice-Presidente Juvanir Borges de Souza, que representava também pessoalmente o
Presidente Francisco Thlesen, a pedido deste.
Momentos
antes, os confrades presentes reuniram-se em torno do esquife mortuário para
elevar a Deus uma prece. Usaram, então, da palavra o seu sobrinho, confrade
Cesar Augusto Lourenço Filho, e o representante da FEB. O primeiro leu
expressiva página deixada por D. Yvonne, escrita por ela para registrar as
horas mais felizes da sua vida, dizendo aos seus irmãos que elas foram
exatamente aquelas que pode dedicar ao trabalho na Doutrina Espírita. Juvanir Borges de
Souza expressou admiração e reconhecimento à irmã cuja existência se extinguia
após longo tempo de atividades benfazejas e, com sinceridade, acrescentou que
todos, superando naturais sentimentos de pesar, como espíritas convictos,
podíamos louvar a Deus pela libertação de um Espírito que, seguramente,
reingressava na Pátria Espiritual redimido e merecendo a felicidade reservada
aos que cumpriram na Terra os seus sagrados deveres e foram caridosos com os
seus irmãos em sofrimento. Após essas palavras, o confrade Lauro de Oliveira S.
Thiago fez a prece.
Encerrou-se,
assim, a existência terrena de D. Yvonne Amaral Pereira, médium dotada de
valiosas faculdades, sempre postas a serviço do bem aos seus semelhantes e da
Doutrina Espírita, à qual se consagrou com verdadeira devoção e plena
consciência do seu imenso alcance.
"Reformador",
em seus números de janeiro e fevereiro de 1982, publicou os "Dados
biográficos de Yvonne A. Pereira para a Federação Espírita Brasileira, em
revisão feita em 1981, pela própria Autora, de escrito de 1973. Enviamos os
nossos leitores, para maiores detalhes, a esse trabalho. Aqui desejamos apenas
salientar, como homenagem de sincero afeto e admiração a esse Espírito de
escol, os traços fundamentais da sua personalidade e a obra excelente que
realizou como médium. Espírito de escol - dizemos - e o justificamos, pois duas
coisas que caracterizam a distinção espiritual ela, inegavelmente, tinha: Inteligência e bondade. Não possuía senão a
Instrução primária; no entanto, através de grande amor ao estudo e férrea
vontade, que a levaram sempre a estudar "sozinha, até duas horas da
madrugada", conseguiu adquirir Invejável cultura, conhecimentos
literários, filosóficos, históricos, doutrinários, que lhe permitiram produzir
obras em que, ao dom descritivo, se unem beleza e correção da linguagem.
Escritora espírita de tão apreciáveis recursos, foi D. Yvonne Pereira a autora
de dois livros sobre os aspectos da vida no Plano Espiritual, tal como os revelaram os próprios
Espíritos, e sobre a mediunidade em si mesma e como, particularmente, ela a
experimentou: "Devassando o Invisível" e "Recordações da Mediunidade".
São duas obras interessantíssimas, em que o leitor, ao mesmo tempo que se
deleita, instrui-se. Escreveu também muitos artigos para jornais do Interior e
foi colaboradora de "Reformador", onde muitas vezes apareceu sob o
pseudônimo de Frederico Francisco.
Mas
foi, sobretudo, como médium que Yvonne Pereira produziu obras realmente
notáveis, entre todas destacando-se "Memórias de um Suicida", devida
ao Espírito Camilo Castelo Branco. É obra de inegável valor doutrinário e de
apoio e fortalecimento moral a todos que passam por dolorosas provações e
expiações nesta vida, ante as quais poderiam ser levados a fraquejar. Além dessa,
porém, podem citar-se: "Nas Telas do Infinito", devida aos Espíritos
Bezerra de Menezes (Primeira parte) e Camilo Castelo Branco (Segunda parte);
"A Tragédia de Santa Maria", devida também ao Espírito Bezerra de
Menezes; "Amor e Ódio", ditada pelo Espírito Charles;
"Nas Voragens do Pecado", romance mediúnico, como o anterior, mas
fazendo parte de uma série de três e ao qual se seguiram "O Drama da
Bretanha" e "O Cavaleiro de Numiers", devidos todos ao Espírito
Charles; "Dramas da Obsessão", ainda de autoria espiritual de Bezerra
de Menezes; "Ressurreição e Vida", belíssima obra devida ao Espírito
Léon Tolstoi; e, finalmente, "Sublimação", contos devidos também a
Léon Tolstoi (Espírito), com dois capítulos finais do Espírito Charles.
Sua
mediunidade despontou espontaneamente desde a Infância. Aos cinco anos já via
os Espíritos e com eles falava, estando a isso de tal modo habituada que lhe
era como, coisa natural. Caracterizou-se pela facilidade com que se desdobrava,
passando, então, a médium, em estado de emancipação, a ver e a ouvir
os Espíritos que, segundo o seu próprio testemunho, lhe apresentavam em quadros
vivos as cenas que ela depois teria de descrever nos livros que ía psicografar.
Multas vezes caiu em estado cataléptico, letárgico, pela profundidade do desprendimento que a sua
modalidade mediúnica lhe proporcionava. Isso ocorreu, Inclusive, na mais tenra
Idade, com apenas vinte e nove dias de nascida, escapando de ser sepultada
viva, sendo salva pela intuição e a fé maternas, o que constitui fato singularíssimo,
ao mesmo tempo que importante e de grande Interesse Instrutivo, mas que não
pode ser aqui narrado com a extensão que merece, pelo que enviamos os leitores
que ainda não o conheçam ao livro em que a própria médium faz a narrativa:
"Recordações da Mediunidade", capítulo 2, pp. 23 e seguintes.
Nascida
em lar espírita, a 24 de dezembro de 1906, num sitio nos arredores da Vila de
Santa Tereza, no Município de Valença, Estado do Rio de Janeiro - hoje cidade
de Rio das Flores -, desde menina não teve "outra crença senão a espírita".
Com
seus pais, generosos de coração, que abrigavam em seu lar, para os assistir,
enfermos e ate mendigos, apesar de não serem ricos, aprendeu a levar vida
modesta e conformada com a sua humilde condição social, mas, mesmo assim, a
servir com verdadeira caridade os ainda mais necessitados. Recebeu de seu pai,
que já no seu tempo fazia reuniões doutrinárias com os filhos semanalmente,
"as primeiras lições de Espiritismo e de Evangelho". "Aos doze
anos - diz ela - meu pai pôs em minhas mãos "O Evangelho segundo o
Espiritismo" e "O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec, os quais
me acompanharam na travessia da vida e que estudo até agora, sem nunca me
cansar da sua leitura. Aos 13 anos, comecei a assistir às sessões práticas de
Espiritismo, as quais muito me encantavam, pois eu via os Espíritos se
comunicarem, inclusive Bezerra de Menezes e demais assistentes espirituais. Fiz,
assim, um grande aprendizado de prática espírita desde a adolescência, o qual
muito tem valido aos meus variados desempenhos na seara espírita".
Como
médium psicógrafo trabalhou durante cinquenta anos, desde 1926 até 1980, quase
a vida inteira.
Foi
médium receitista durante todo esse tempo e praticou muitas curas espíritas com
auxílio de receituário homeopático, bem como através de passes e de preces.
Foi
grande sua atividade com Espíritos obsessores, aos quais dedicava caridosa
simpatia e, por isso, captando lhes a confiança, conseguiu muitas curas dos
que, por eles, eram obsidiados. Assistiam-na Espíritos da envergadura moral de
Bezerra de Menezes, Bittencourt Sampaio, Augusto Silva, Charles e muitos
outros. Nesses trabalhos exercia também a mediunidade de incorporação, em sua
modalidade psicofônica ou falante. Possuía ainda mediunidade de efeitos físicos
e materialização, mas a ela não se dedicou, a conselho mesmo dos seus guias.
Embora
Yvonne Pereira tivesse exercido grande parte de suas atividades mediúnicas e
espíritas independentemente e por estímulos próprios, exerceu-as também junto a
vários Centros e Instituições espíritas aos quais prestou relevantes serviços,
entre os quais podem citar-se: "Centro Espírita de Lavras" (mais
tarde "Centro Espírita Augusto Silva" - um dos Espíritos que a
assistiam), na cidade de Lavras, em Minas Gerais, o primeiro onde exerceu suas
atividades, ainda muito jovem, como Secretária e como médium, responsável pelo
"Posto Mediúnico", onde eram tiradas receitas homeopáticas e se
processavam os trabalhos de passes e curas espíritas, em geral, dentro de um
critério de modéstia e austeridade, sem alarde, e visando apenas à prática da
mais pura caridade; "Casa Espírita", de Juiz de Fora, Estado de Minas
Gerais, onde foi Secretária, Bibliotecária e Vice-Presidente; "Grêmio
Espírita de Beneficência", de Barra do Piraí, no Estado do Rio de Janeiro,
em que trabalhou como médium receitista, evangelizadora da infância e expositora
da Doutrina; "Centro Espírita Luiz Gonzaga", em
Pedro Leopoldo, Minas Gerais, durante dois anos, em serviço de passes;
"União Espírita Suburbana", no Rio de Janeiro, então Guanabara, em
serviço de assistência a enfermos obsidiados.
Não
ficam nisso os trabalhos realizados por nossa Irmã, mas o que aí fica dá ideia
de quão devotada trabalhadora foi ela da seara espírita, em cujas tarefas
encontrava verdadeiro motivo de felicidade. Quem escreve estas linhas teve
numerosas oportunidades de sentir isso nas conversas que com ela entretinha, na
qualidade de seu médico, ao lado de outros colegas que também a assistiram.
Praticando a Medicina de Hahnemann, administrava-lhe medicamentos homeopáticos,
conforme seu desejo.
Sempre
a visitávamos em casa de sua Irmã Amália, onde residia, na Piedade. Íamos
levar-lhe assistência médica, mas muito também recebíamos, em doação
espiritual. Muito nos edificávamos ao constatar o verdadeiro enlevo que ela
tinha, quando falava das coisas da nossa Doutrina. Por isso é com emoção que
traçamos este registro; ele nos traz ao espírito uma grata lembrança da irmã
que encerrou sua existência terrena após vivo testemunho de fidelidade a Jesus,
o Mestre Divino.
Grande
foi a prova de D. Yvonne, em suas renúncias e sofrimentos; dolorosa, mas levada
com firme decisão e grandeza de alma. Maior ainda foi a sua missão, consolando
aflitos, elevando ânimos abatidos, tratando obsidiados e obsessores e, com
especialidade, abrindo horizontes de redenção a suicidas, cujos
testemunhos alentadores trazia também aos encarnados, ajudando estes a suportar
com ânimo os seus fardos, sem desertar jamais dos caminhos da existência,
sempre concedida por Deus para o progresso das suas criaturas.
Paz
e felicidade ao Espírito agora liberto é o voto que elevamos a nosso Pai Eterno.
Yvonne A. Pereira - sua desencarnação
A Redação - Reformador (FEB) Abril
1984
Do Blog: Yvonne Pereira escreveu inúmeros artigos em ‘Reformador (FEB)’ sob o pseudônimo ‘Frederico Francisco’. Alguns desses artigos estão presentes
neste blog.
Nenhum comentário:
Postar um comentário