Pai João! Tão velhinho
Que já perdeu a conta
Dos anos que viveu...
Os seus cabelos encarapinhados,
Que ainda fazem mais preta
A pele que Deus lhe deu,
Lembram um carneirinho
Muito branco
Na orla de um monte quando desce a noite...
Artrítico, pés tortos, passo lento,
Anda apoiado à rústica muleta
E quando o inverno brande o seu açoite,
E o capim, de pendões arroxeados,
Cobre as montanhas ondulando o vento,
Pai João sente um frio!
Flor da pobreza,
Impregnado de mato,
Como um ninho de pássaro, arredio,
O seu casebre pequenino esponta
Em plena natureza,
A se espelhar na água tranquila
De um regato...
Um fogão de tijolo, um catre, um banco
E algumas coisas mais ali se encontram.
A riqueza, porém, de Pai João
É o seu cachimbo e umas imagens gastas
De Jesus e Nossa Senhora
Que ele adora
Com ternura infinita
E em suas preces fita,
As mãos trêmulas sobre o coração...
Buscam lhe ainda as benzeduras,
Feitas com fé imensa
Que lhe acende a pupila,
Doentes de alma e corpo
Confiantes no êxito das curas...
Doce velhinho
Abençoado mineiro
Que ajudaste a extrair, assíduo e nobre,
Um dos tesouros colossais
Desse estupendo solo brasileiro,
Hás de morrer no esquecimento e pobre
Sem o carinho
E a recompensa
Que mereces!
Tu, cujos braços trabalharam tanto
Nos opulentos cafezais
E hoje são como galhos ressequidos
De uma árvore cansada de dar frutos...
Vemos-te por teu singelo encanto,
Pelos teus sentimentos impolutos,
Porque esqueces
As tuas cicatrizes
O martírio da tua mocidade
De castigos atrozes,
Falar aos brancos afetuosamente
Humildemente,
E nunca te revoltas, nem maldizes
A injustiça dos homens
Que em tempos idos
Foram teus algozes!
Todos te sabem preto, Pai João!
Mas ninguém soube definir ainda
Qual a cor da tua alma pura e linda,
E de Perdão...
Herói Obscuro
Carmen Cinira
por Chico Xavier
Reformador
(FEB) 01.04.1949 ?
Nenhum comentário:
Postar um comentário