O
Evangelho Redivivo
por Francisco Thiesen
Reformador (FEB) Março 1971
Pergunta: Apresentando o Espiritismo,
na sua feição de Consolador prometido pelo Cristo,
três aspectos diferentes: cientifico, filosófico e religioso, qual desses
aspectos é
o maior?
Resposta:
Podemos tomar o Espiritismo, simbolizado
desse modo, como um triângulo de forças espirituais. A Ciência e a Filosofia
vinculam à Terra essa figura simbólica, porém, a Religião é o ângulo divino que
a liga ao Céu. No seu aspecto cientifico e filosófico a doutrina será sempre um
campo nobre de investigações humanas, como outros movimentos coletivos, de
natureza intelectual, que visam ao aperfeiçoamento da Humanidade. No aspecto
religioso, todavia, repousa a sua grandeza divina, por constituir a
restauração do Evangelho de Jesus-Cristo,
estabelecendo a renovação definitiva do homem para a grandeza do seu imenso
futuro espiritual. (Emmanuel – “O Consolador”, Francisco Cândido Xavier, 5ª
ed., 1970, FEB, pág. 15).
Dissertando sobre a historicidade
das letras evangélicas com a tranquila serenidade dos espíritos que conhecem os
fatos, Emmanuel, na obra "A Caminho
da Luz", de Francisco Cândido Xavier, págs. 112-3, diz-nos que "os mensageiros do Cristo presidem à redação
dos textos definitivos, com vistas ao futuro, não somente junto aos Apóstolos e
seus discípulos, mas igualmente junto aos núcleos das tradições".
"A grandeza da doutrina (cristã) não reside na
circunstância de o Evangelho ser de Marcos ou de Mateus, de Lucas ou de João; está na beleza
imortal que se irradia de suas lições divinas, atravessando as idades e os
corações".
Depois de aduzir outras considerações, assim conclui o seu pensamento: "Portas a dentro do coração, só a essência deve prevalecer para as
almas e, em se tratando das conquistas sublimadas da fé, a intuição tem de marchar à frente da razão, preludiando generosos
e definitivos conhecimentos".
Em trabalho anterior ("As Minhas Palavras não Passarão",
"Reformador" de fevereiro de 1971) (já divulgado neste blog) evidenciáramos a
enérgica determinação de Paulo de Tarso quanto à redação do maior número
possível de anotações sobre a
Doutrina e a Obra de Jesus por quantos conhecessem situações e fatos não
registrados por Levi (Mateus), convicto de nisso insistir por inspiração do
Alto. O seu esforço alcançou a superior finalidade programada, já que os textos
definitivos, grafados sob as vistas dos Enviados do Senhor,
relatando os ensinos e os fatos identificados em núcleos de tradições
orientados de igual
modo pelos Arautos do Céu, chegaram até nós para ficarem como eterna e serena
Luz, clareando e suavizando os destinos humanos.
Sabendo que os homens não podiam
assimilar-lhe os ensinamentos numa só reencarnação, o Divino Mestre dosou-os de
sorte a que o Consolador, no século propício do seu evolver, viesse tornar
claras as palavras recolhidas pelos evangelistas. E o Consolador veio, no
século XIX, quando o admirável apóstolo Allan Kardec, guiado pelo Espírito da Verdade, lançou na Terra a Codificação do Espiritismo -
a Doutrina dos Espíritos, de que as obras "O Livro dos Espíritos",
"O Livro dos Médiuns", "O Evangelho segundo o Espiritismo",
"O Céu e o Inferno", "A Gênese", afora outras, constituem lhe
a base e a estrutura, numa afirmação de perenidade da maior e mais firme
edificação de todos os tempos.
A Doutrina do Espírito da Verdade,
restaurando e desenvolvendo o Cristianismo do Cristo, por ordem sua e sob sua
misericordiosa direção, na conformidade de esquema vinculado à evolução dos
espíritos, desencarnados ou reencarnados, é por excelência aberta e vai-se
ampliando, completando ao longo dos séculos, na busca incessante dos corações,
onde quer que se encontrem. Como prolongamento ideal das linhas da cruz, no
alto do Calvário, dirige-se horizontal e verticalmente ao Infinito, em demanda
das muitas moradas do espírito na casa do Pai.
E, em sendo ela de tal grandeza e excelsitude,
jamais esteve ou estará na arbitrária dependência de um homem ou grupamento
humano, consoante claro e oportuno ensinamento do próprio missionário de Lyon.
O Espírito Humberto de Campos, no
livro "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", à pág, 137
(médium Francisco Cândido Xavier, 8ª edição da FEB) nos informa que
"segundo os planos de trabalho do mundo invisível, o grande missionário
(Allan Kardec), no seu maravilhoso esforço de síntese, contaria com a cooperação de uma plêiade de auxiliares da
sua obra, designados particularmente para coadjuvá-lo, nas individualidades de
João Batista Roustaing, que organizaria
o trabalho da fé".
Sendo ininterrupto o fluxo da
Revelação, a codificação da Doutrina Espírita receberia, como recebeu, a valiosa
contribuição de outros espíritos reencarnados, capacitados e inspirados, na
desincumbência de desenvolver com abundância de detalhes, analiticamente, cada um dos aspectos do Espiritismo, todos eles
apreciados com sabedoria por Allan Kardec que, no entanto, não os detalhou,
face à natureza específica de sua gigantesca
missão.
Coube a J. B. Roustaing a penetração analítica no aspecto religioso do
Espiritismo e, para bem desempenhar-se de tão sublime quão honrosa tarefa,
buscou o conhecimento necessário ao intercâmbio com o Invisível nas obras de
Allan Kardec.
O Codificador, que legou ao mundo
"O Evangelho segundo o Espiritismo", sob a orientação e com a
colaboração dos Espíritos Superiores, não se pronunciou a respeito da
totalidade dos textos evangélicos, detendo-se, como ele próprio o advertira,
tão-só nos ensinos morais, incontroversos, fundamentais para a vivência do
Cristianismo e a transformação moral dos homens. E através dos séculos será
essa obra um bendito farol deitando claridades celestes no mar tempestuoso dos
testemunhos humanos.
O Cristo, todavia, cujas palavras
não passariam, não nos legou a sua Doutrina para que grande parte dela ficasse
indefinidamente encoberta sob o véu da
letra, impermeável às incursões do pensamento sequioso da linfa pura da
eterna Fonte da Vida. "Batei e abrir-se-vos-á", disse-nos Ele.'
A "Revelação da
Revelação", ou "Os Quatro Evangelhos", é a obra monumental que
aborda, na sua inteireza, o aspecto
religioso do Espiritismo, a organização do trabalho da fé iniciada por
vontade soberana do Alto e que teve em Roustaing o instrumento humano
qualificado, como a Codificação teve em Allan Kardec o instrumento preciso ao
trabalho de síntese.
Os textos integrais, definitivos,
insuscetíveis de alterações, preservados e disponíveis na atualidade, segundo
ordenação sábia e amorosa de eterna unidade
e infinita universalidade, foram em
minúcia explicados, interpretados, conciliados por aqueles mesmos Espíritos que
na Terra acompanharam o Divino Mestre, participando das pregações evangélicas -
os apóstolos; ou recolhendo em pergaminhos e peles os seus ensinos - os
evangelistas; além de Moisés, que no Sinai obteve do Senhor as Tábuas da Lei, e
que em reencarnações sucessivas foi Elias e João Batista, este último
contemporâneo e precursor do Messias.
Com a "Revelação da
Revelação", o Evangelho segundo Mateus, Evangelho segundo Lucas e
Evangelho segundo Marcos - denominados sinóticos ou concordantes - e o
Evangelho segundo, João, passam a integrar, efetivamente, em espírito e
verdade, o Evangelho Redivivo, que é um
e único, o Evangelho de Nosso Senhor Jesus-Cristo, no qual não há
substancialmente contradições, incorreções ou impropriedades mas somente Luz intensíssima
irradiando sem cessar em todas as direções conscienciais do evolutir dos
espíritos, por veicular o Cristianismo do Cristo, restaurado em sua majestosa
simplicidade e pureza pela Doutrina dos Espíritos.
Ainda assim, porém, a obra
empreendida por Roustaing - e é ele quem no-lo diz - "é apenas um introito
destinado a preparar a unidade de crença entre os homens", donde se
infere que a "organização do trabalho da fé" referida pelo Espírito
Humberto de Campos: foi iniciada mas não concluída, sendo lícito admitir-se a ideia
de que o aspecto religioso do Espiritismo é suscetível de novas, contínuas e mais avançadas revelações, na
exata medida em que os espíritos forem evoluindo. Desencarnados ou reencarnados,
todos têm, no nível do progresso espiritual alcançado pela coletividade. Inclusive,
por certo, no seio da coletividade espírita,
como indivíduos, a sua própria "zona de compreensão , como diz Emmanuel,
ou "zona lúcida" como a denominou Paul Gibier.
A Federação Espírita Brasileira,
desde o início de suas atividades, em 1884, empreendeu o estudo e a divulgação
da obra "Os Quatro Evangelhos", estudo que leva a efeito em razão do
programa consubstanciado em seus próprios estatutos. Em 1938, com a publicação
do livro “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", o Mundo
Invisível referendou o seu programa inclusive e explicitamente nesse ponto. Mas
não ficou aí. Revelou a responsabilidade
do nosso País em relação à cristianização da Humanidade ao proclamá-lo Pátria
do Evangelho. E mais: ao longo dos últimos quarenta anos confiou-nos
valiosíssimas obras doutrinárias em número que ascende a mais de uma centena versando
sobre todos os aspectos da Codificação do Espiritismo e mui especialmente com
pertinência ao Evangelho, ao trabalho da
fé cuja organização, com Roustaing, se iniciara, e com outros
obreiros, pelo profetismo ou via medianímica, prosseguirá sem
solução de continuidade, realizando a lenta e progressiva unidade de crença
entre os homens, oferecendo a cada um deles uma mensagem compatível com a
"zona de compreensão" individualmente alcançada.
"Espíritas! amai-vos, este o
primeiro ensinamento; Instruí-vos, este o segundo. No
Cristianismo se encontram todas as verdades; são de origem humana os erros que nele
se enraizaram". (O Espírito da Verdade, Paris, 1860, pág. 124, de "O Evangelho segundo o Espiritismo",
Allan Kardec, 57ª edição da FEB, 1970).
A FEB, preparando para o 1º
quadrimestre de 1971 a 5ª edição da obra de Roustaing (útil inclusive a
consultas, por conter diversos e riquíssimos índices elaborados por seu erudito
tradutor, o Dr. Guillon Ribeiro), satisfaz a justa expectativa dos espíritas
estudiosos do Brasil e prossegue no cumprimento do seu programa, o programa da
Casa de Ismael no coração do mundo.
Tornando possível aos estudiosos e
aos espíritas responsáveis por trabalhos de direção nas casas e centros da
Doutrina o acesso a esse verdadeiro "curso superior de Espiritismo" a
FEB não ignora os riscos editoriais face ao investimento numa edição de obra
contendo 2.200 páginas em 4 volumes, e os assume na certeza de ser o sacrifício
material altamente compensador em termos de semeadura espiritual.
Coerentes com as lições do
Evangelho, somos de opinião que a obra de Roustaing ainda não pode ser
endereçada a todos os espíritas, pois o seu estudo requer o prévio conhecimento
das obras básicas da Codificação e de outras subsidiárias, ainda não
suficientemente estudadas por muitos dos nossos companheiros (todas as de Allan
Kardec, de Léon Denis, de Gabriel Delanne, de Camille Flammarion e outros). De
outro lado, cumpre-nos reconhecer que razões econômicas são muita vez
impeditivas de sua aquisição, pois apesar de calculado pela editora com base no
mínimo possível, o seu preço não é baixo.
Mas, nem por isso ficarão os
espíritas privados do conhecimento da obra. Os residentes na Guanabara ou adjacências
poderão acompanhar-lhe os estudos semanais, às terças-feiras, na FEB. E todos
encontrarão a "Revelação da Revelação" resumida num único volume na
obra magistral de Antônio Luiz Sayão, "Elucidações Evangélicas",
prestes a esgotar-se, mas com a 5ª edição já em preparo. É livro de grande
mérito, por apresentar em linguagem concisa a interpretação dos Evangelhos
sinóticos. Igualmente em um só tomo, breve todos poderão edificar-se com a
leitura da "Divina Epopeia" de Bittencourt Sampaio. "Trasladando
para versos heroicos o Evangelho segundo João, não tive outro fim senão o de
elevar a Deus o meu espírito, pedindo ao Vidente do Apocalipse as asas de sua águia
de Patmos para remontar num voo aos pés da Divindade" (palavras do autor
na Advertência, à pág. 15, cuja 3ª
edição está em estudo. É livro baseado em Roustaing, o qual, com “Elucidacões
Evangélicas" constitui satisfatório resumo de "Os Quatro
Evangelhos".
Finalizando, queremos informar que
não discutiremos aqueles pontos em razão dos quais alguns espíritas discordam
da obra em exame, mormente o do corpo
fluídico, pois, estribados na erudição e clarividência que nos faltam,
muitos já o fizeram, inclusive Emmanuel ("Os homens devem saber que o
Missionário Divino não viveu a mesma lama de suas existências". "Fora
ridículo proibir-se a elucidação. O que será de evitar-se, zelosamente, é a
azedia da polêmica". "Os homens ainda não atingiram o estado de renúncia
pessoal para lucrarem, espiritualmente, com as discussões acaloradas".
"Infenso, pois, a qualquer dissensão, nesse sentido, venho falar dele, no
limiar deste livro, como os astrônomos que vão estudar no livro imenso da
natureza celeste". "Tentando aprofundar a questão da personalidade do
Divino Mestre, sinto meus pobres olhos confundidos numa vaga imensa de
relâmpagos ofuscadores" - do prefácio à "Vida de Jesus", de
Antônio Lima, edição FEB). Confiamos no Senhor, porém, em que os espíritas que
aceitam o "amai-vos", como o primeiro ensinamento do Espírito da
Verdade, não contestarão a legitimidade do estudo e da divulgação da obra de
Roustaing: e os que obedecem também ao segundo, "instruí-vos", não
lhe recusarão o mérito.
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