segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Scheilla


Fonte: Reformador (FEB) Fevereiro 1978 

XVII. 'Apreciando a Paulo'



XVII
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958


“Segui a caridade e procurai com zelo os dons espirituais,
 mas principalmente o de profetizar.
Porque o que fala língua estranha não fala aos homens,
senão a Deus; porque ninguém o entende,
e em espírito fala de mistérios.
Mas, o que profetiza fala aos homens
para edificação, exortação e consolação.
O que fala língua estranha edifica a si mesmo,
mas o que profetiza edifica a igreja.
E eu quero que todos vós faleis línguas estranhas,
 mas, muito mais, que profetizeis, porque o que profetiza
 é maior do que o que fala línguas estranhas,
a não ser que também interprete para que
a igreja receba edificação.”
(1ª Epístola aos Coríntios, 14:1 a 5)

            Paulo de Tarso, o apóstolo dos gentios, o divulgador do Cristianismo, o mais douto e operoso dos discípulos de Jesus, em várias passagens de suas epístolas refere-se aos dons espirituais, a respeito dos quais não deseja que sejamos ignorantes, como frisa no capítulo doze dessa 1ª Epístola aos Coríntios, voltando aqui, neste capítulo catorze, a referir-se a esses mesmos dons, notadamente ao de falar línguas estranhas, ao de profetizar e ao de interpretar, sendo que este ele também o destaca, pois que serve “para a edificação da Igreja”.

            Portanto, lendo as epístolas de Paulo, temos de convencer-nos de que, entre os primeiros cristãos, os dons espirituais eram cultivados, e que só por motivos supervenientes deixaram de o ser, descurando-se depois os seguidores do Evangelho, durante séculos, do amanho desses dons ou dessas virtudes, que os espíritas agora procuram fazer ressurgir no seio da cristandade. Restauramos assim os fenômenos que eram comuns entre “a gente do caminho”, renovamos a prática das profecias, o dom “de discernir os espíritos” (I Cor., 12:10), a faculdade de interpretar os textos evangélicos, e exercitamos ainda outras mediunidades ou outros dons espirituais, que de certo eram também praticados pelos primeiros cristãos, que bem os conheciam, como se conclui, logicamente, dessa lição de Paulo.

            É por isto que o Espiritismo, além de ser o Consolador prometido por Jesus (João, 14:26 e 16:12 a 14), é ainda o restaurador do verdadeiro Cristianismo, pois que o praticamos tal
como os primitivos cristãos, dando assinalado valor aos dons espirituais, que procuramos cultivar, confiados no Cristo e “para a edificação de sua Igreja”.

            Compreendemos que a Igreja do Senhor Jesus é composta de todos os cristãos, de qualquer seita ou de qualquer plano da vida, e sabemos também que não monopolizamos o Cordeiro de Deus, o qual pertence a toda a cristandade, ou melhor, é de todos aqueles que se amam e que cumprem os seus mandamentos:

            “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.” (João, 13:34 e 35)

            “Se me amardes, guardareis os meus mandamentos.” (João, 14:15)

            Portanto, não temos a ideia estreita de jungir Jesus a qualquer seita, porque ele a todas transcende, mas procuramos respeitar os seus ensinamentos, adorando a Deus “em espírito e verdade” (João, 4:23) e objetivando um Cristianismo puro, onde há o cultivo do amor e dos dons espirituais, como era praticado pelos primeiros cristãos, de conformidade com as recomendações de Paulo, seu apóstolo e nosso apóstolo, seu servidor e nosso guia.

            “Segui a caridade, diz o orientador dos gentios, e procurai com zelo os dons espirituais, mas principalmente o de profetizar.”

            Tenhamos em vista que a caridade é virtude excelsa e que, como dizem os Espíritos, “fora da caridade não há salvação”. Porém, outrossim, procuremos com zelo os dons espirituais, porque eles são capazes de elevar nossa alma, pondo-a em sintonia com os planos celestiais, de onde defluem as mais puras emanações da divindade!

            Busquemos fazer o bem, mas exercitemos nossas faculdades superiores em busca do Pai Celestial, cumprindo e praticando os ensinamentos de nosso Divino Mestre e as recomendações de seus apóstolos, que são o legítimo roteiro de nosso procedimento cristão e os guias seguros de nossa mais pura religiosidade.

            Cristianismo sem cultivo de caridade ou de nossos dons espirituais é flor sem perfume, é quadro deslumbrante, mas de beleza morta, porque não palpita, porque não se exterioriza, porque não manifesta as coisas de Deus, limitando-se ao culto externo, maquinal e vazio dos rituais estratificados na forma, ou no mero respeito aos dogmas forjados nos concílios, porém sem a essência purificadora do amor, sem a sublimidade desse sentimento que eleva o crente às regiões superiores da espiritualidade, onde ele comunga, verdadeiramente, com o Espírito de Deus!

            O Pai Celestial une seus filhos pela força universal e eterna do amor e manifesta-se aos homens por intermédio dos dons espirituais destes, que são verdadeiras antenas erguidas aos céus, prontas a entrarem em sintonia com os eflúvios carinhosos da divindade, cujo reino “vem a nós”, conforme o Senhor Jesus assegurou, através da oração dominical.

            Destarte, como poderemos ser legítimos cristãos, se negarmos os dons espirituais, cujo cultivo o apóstolo Paulo tanto recomenda? Como poderemos ser bons cristãos desprezando as coisas da espiritualidade, negando o Espiritismo?

            Não chegamos a ponto de afirmar, intolerantemente, que fora do Espiritismo não haja salvação. Mas dentro dele, cultivando a caridade e os dons espirituais, acharemos o caminho reto que nos conduzirá a Deus, de maneira segura e genuína, sem tergiversações, sem obliquidades, sem indecisões, mas com firmeza, confiança e fé, porque nele está o Cristianismo redivivo em toda a sua pureza primitiva, de vez que é o próprio Consolador que o Cristo Jesus prometeu à Humanidade e que viria dos céus, nos tempos prescritos, para complemento das revelações de Deus.

            E as vozes dos Mensageiros do Senhor persistem em entrar em sintonia com os novos cristãos, através de seus dons espirituais, estabelecendo a legítima comunhão com o Divino Mestre, “em espírito e verdade”, na prática do Cristianismo puro, como era feita nos tempos apostólicos e como hoje se cumpre, através do Espiritismo-cristão, pelo exercício das diversas mediunidades.

            Consoante disse o apóstolo Paulo, nesta 1ª Epístola aos Coríntios, “o que profetiza fala aos homens para edificação, exortação e consolação”.

            Entretanto, há cristãos hoje em dia que, infelizmente, apegados ao seu sectarismo intolerante, negam os dons espirituais e o seu cultivo, esquecidos dessa e de outras lições de Paulo de Tarso, que tanto recomenda a prática desses dons, “para a edificação da Igreja”.
Mas, para esses, ainda presos ao dogma, recordemos tais palavras do apóstolo dos gentios, que são fonte de ensinamento perene e de água viva, capaz de dessedentar aquele que queira beber, sem prevenções, o néctar puro que o apóstolo-mártir nos legou em suas epístolas, e que jorra perenemente, para nossa salvação e para nossa felicidade.

            Procuremos sentir a sublimidade e a singeleza dessas lições; não as neguemos, jamais; sigamo-las com firmeza e fé. E compreendamos que o Espiritismo é baseado na Bíblia, na palavra divina que deflui do maior dos livros, “para edificação, exortação e consolação” da Humanidade, tão necessitada desse caminho de luz!


Lei e Consciência


Lei e Consciência

Martins Peralva

A Lei de Deus está escrita na consciência do homem. - (De "O Livro dos Espíritos".)

            A ideia geral, mesmo nos tempos em curso, é de que, à maneira dos códigos terrestres, a Lei está fora de nós e, de fora para dentro, nos influencia os destinos. Os Espíritos, contudo, corrigem-na, esclarecendo que a Lei está escrita na consciência do ser encarnado.

            Dessa maneira, é impossível ao que desrespeitou a Lei escapar às sanções naturalmente impostas por essa mesma Lei, no que se positiva o princípio da “justiça imanente”, aceito, postulado e difundido pelo Espiritismo.

            Não adiantará ao homem apresentar-se como justo, ou como justo ser considerado, se a consciência desse homem lhe fala de reiteradas infrações.

            Deus é AMOR e PAZ imensuráveis.

            Se temos paz e o nosso coração vibra de amor para com o próximo, é óbvio que a nossa consciência, como um espelho divino, reflete, sem nuvens ou nódoas de qualquer natureza, a face do Pai Celestial.

            Quando interpelamos a consciência e ela não nos condena, o nosso ser inunda-se de maravilhosa e sublime paz; no entanto, quando ela nos acusa, o nosso ser se inquieta, se agita, sofre.

            Afirma Humberto de Campos, alhures: mais vale ao homem ter o mundo contra si e a consciência a seu favor, do que ter o mundo ao seu lado e a consciência contra ele.

            Evidentemente - todos bem o sentimos - a Lei não está fora de nós.

            A Lei instalou o seu “tribunal” no santuário da consciência.

            Isentos de culpas, isolamo-nos, preservamo-nos, defendemo-nos contra as forças negativas exteriores, por mais tenebrosas, terríveis, medonhas, sejam essas forças.

            Consciência tranquila, consciência em paz, é sinônimo de resistência, de equilíbrio, de vitória, de felicidade.

            A prática do bem dá ao homem esse estado de venturosa euforia, capaz de fazê-lo enfrentar, superar, vencer o turbilhão de lutas provacionais que assinalam, de forma dolorosa, os atuais experimentos evolutivos do ser encarnado.

            Identificar-nos, pois, com o bem, na sua lídima, genuína expressão evangélica, afeiçoando-nos ao seu clima, é garantirmos, agora e sempre, a Presença de Deus no santuário de nossa alma eterna, porque, consoante esclarece a Doutrina Espírita, a Lei está escrita na consciência do homem.
Reformador (FEB) Nov 1958


Recado aos companheiros




O abraço amigo do querido Presidente...

Recado aos Companheiros
Wantuil (Espírito)
por  Hernani T. de Sant’Anna.
Reformador (FEB) Julho 1978

            Recomendam-me as Inteligências Superiores que, em nome do Anjo Ismael, venha eu esta noite, repetir-lhes velhas verdades, já de nosso comum conhecimento desde muito, mas verdades que, mais do que nunca, devem ser consideradas, rememoradas e vividas, nesta hora decisiva para os destinos humanos. Trata-se, basicamente, da função daqueles que exercem, nesta Casa, um mandato, outorgado pelo Alto, com vistas à preparação do Terceiro Milênio da Era Cristã.

            Ninguém, todos sabemos, ninguém recebe responsabilidades marcantes, em momento tão crucial da História, sem a devida preparação e sem que esteja assinalado previamente para certos tipos de tarefa, com aproveitamento pleno de capacidades longamente exercitadas no pretérito, quase sempre em sentido contrário aos legítimos interesses do Céu. Isto significa que o trabalho a ser realizado pelos mandatários humanos, nesta Casa, deve ser levado a cabo com o cabedal de possibilidades de que cada qual dispõe, sob a supervisão e com a inspiração de Ismael e dos seus Mensageiros. Há, por isso mesmo, o perigo constante do cometimento de erros e a ameaça permanente de interferências negativas, não só vindas de fora, mas também as originadas portas a dentro da alma de cada obreiro, portador de fixações bastante fortes, de ideias vividas no passado e de vezos que só o trabalho do bem pode corrigir. Não fora assim, onde estaria o mérito dos que são convocados à construção da Nova Era?

            Jamais houve, porém, nem haverá, qualquer omissão dos Guias Tutelares, responsáveis e amadurecidos, que seguem os passos de cada operário do Cristo, auxiliando-o na realização de seus misteres, principalmente no que diz respeito aos superiores interesses da Doutrina Espírita e do Evangelho de Jesus, nesta hora de específica significação no plano da evolução de nosso orbe. Resta, pois, aos que, como vocês, permanecem na linha de combate, em posição de magna responsabilidade, manter-se em permanente contato mental com o Pensamento Sublime do Mestre, a fim de que seja sempre prevalecente a Sua Augusta Vontade.

            Fôssemos, vocês e nós, da mesma faixa evolutiva, “espíritos de escol", outras seriam as nossas tarefas, provavelmente no setor maior das grandes mensagens e dos grandes testemunhos, que exigem integração superior com as Forças Celestes, sem tão rígidos compromissos com as pequenezas do dia-a-dia administrativo das coisas humanas. A Lei Perfeita, no entanto, que une Justiça e Amor, quer que os grandes demolidores se transformem nos grandes construtores, de modo que a remissão de velhas e enormes dívidas seja, ao mesmo tempo, semeadura magnânima de celestes edificações, que engrandecem os Espíritos para sempre, ligando-os à coletividade em termos de nobreza moral e sublime solidariedade. O Senhor sabe usar a química do tempo para a todos fazer-nos crescer, juntamente com a Sua Obra, porquanto a Obra Divina é sobretudo a da transformação dos Espíritos, no rumo da Angelitude e da Perfeição.

            Sirvam, portanto, estas palavras, que nada encerram de novo, para renovar-lhes o estímulo e a segurança, na certeza de que permanecemos juntos, no cumprimento de elevadas obrigações livremente aceitas. Cônscios, todos nós, de que a Seara é do Senhor, mas o trabalho nos pertence, façamos, cada dia, o que pudermos de melhor.

            Recebam o abraço amigo do velho companheiro.


As Mesas Girantes



As Mesas Girantes

Ismael Gomes Braga
Reformador (FEB) Nov 1958

            Em 1853 corria mundo a febre das mesas girantes, sobre as quais surgiam as mais insensatas teorias de "sábios" e ignorantes. As mesas falavam e ensinavam coisas maravilhosas que excediam de muito os conhecimentos dos homens. Interrogadas sobre a inteligência que as movimentava, explicaram com toda a clareza que eram Espíritos de pessoas que já viveram sobre a Terra e agora se achavam livres do corpo físico.

            Era uma tremenda revelação que deveria transformar rapidamente a vida na superfície do Planeta, porque provava a sobrevivência e a real responsabilidade de cada um. Certo número de pessoas, como Allan Kardec, compreenderam a importância dos fatos e deles extraíram as conclusões lógicas. A imensa maioria, porém, continuou por algum tempo divertindo-se levianamente com as mesas e depois abandonou, como desinteressante, o assunto.

Ismael Gomes Braga


            Já são decorridos mais de cem anos e essa massa imensa de "sábios" e ignorantes continua materialista como sempre, irresponsável como sempre, fazendo guerras, lutas de classes, revoluções políticas e econômicas, sofrendo todos os tormentos da dúvida, sem refletir um momento sobre os fenômenos espíritas iniciados com as mesas girantes.

            Um estudioso profundo, o nosso confrade Zêus Wantuil, deu-se ao trabalho paciente de pesquisar em diversos lugares, em muitas bibliotecas, em velhas coleções de jornais, reunindo em um volume a documentação dos fatos de 1853 e de poucos anos antes e depois, a fim de demonstrar a todos os estudiosos que, quatro anos antes de aparecer a primeira obra de Allan Kardec, já os fenômenos, em que o Mestre se baseou, estavam perfeitamente conhecidos em escala mundial.

            Esse período pré-kardequiano do Espiritismo ia ficando esquecido nos arquivos e bibliotecas, com toda a sua documentação preciosa e também com todas as disparatadas teorias improvisadas, hipóteses absurdas que bem caracterizam a pobre criatura humana. Prestou, pois, o nosso jovem amigo um relevante serviço aos estudiosos, fazendo ressurgir esse ano já esquecido de 1853 em seu belo volume “As Mesas Girantes e o Espiritismo".

            Ele mesmo e outros estudiosos continuem a História até os nossos dias e ponham-lhe um título geral: "História da Irresponsabilidade Humana".


            Essa série de volumes demonstrará que até este século vinte da Era Cristã o planeta Terra era habitado por crianças espirituais, levianas, irresponsáveis, que brincavam com as coisas mais sérias e se comprometiam com atividades diametralmente opostas aos seus interesses reais.

domingo, 29 de setembro de 2013

'Celeste Reconforto'



Celeste
 Reconforto
Redação
Reformador (FEB) Junho 1978

            Todos sabemos que é nos postos avançados de serviço que mais intensos se tornam os combates que o Bem e o Mal travam no mundo. Aqui, na Federação Espírita Brasileira, nenhum trabalhador, desde os primórdios da Instituição, até os dias atuais, foi jamais poupado de duras provações e difíceis testemunhos. Entretanto, é forçoso reconhecer que, de todas as formas de aflição que angustiaram e angustiam os operários de Ismael, a mais dolorosa sempre foi e continua sendo a incompreensão de valorosos confrades, de irmãos de ideal, de estimados companheiros de lutas redentoras.

            Quantos sofrimentos, nesse sentido, experimentou o próprio Bezerra de Menezes, na presidência da FEB! O testemunho de Allan Kardec, a esse respeito, é, por sua vez, impressionante: "Andei em luta com o ódio de inimigos encarniçados, com a injúria, a calúnia, a inveja e o ciúme - escreveu ele, ainda encarnado -; libelos infames se publicaram contra mim; as minhas melhores instruções foram falseadas; traíram-me aqueles em quem eu mais confiança depositava, pagaram-me com a ingratidão aqueles a quem prestei serviços.  A Sociedade de Paris se constituiu foco de contínuas intrigas urdidas contra mim por aqueles mesmos que se declaravam a meu favor e que, de boa fisionomia na minha presença, pelas costas me golpeavam. ( ... ) Nunca mais me foi dado saber o que é o repouso; mais de uma vez sucumbi ao excesso de trabalho, tive abalada a saúde e comprometida a existência." ("Obras Póstumas", FEB, 16ª ed., pp. 283/4.)

            De nossa parte, cumpre reconheçamos quão difícil é "sacudir o pó das sandálias" e superar, no silêncio da prece e do trabalho, aleivosias imerecidas e gratuitas incriminações.

            Por isso que, de tempos em tempos, os próprios Mentores da Espiritualidade, condoídos das chagas que as nossas almas ostentam, ofertam-nos, espontaneamente, verdadeiras cachoeiras de sacrossantos estímulos, através de mensagens extremamente confortadoras, para reanimar-nos o bom ânimo. Foi o que aconteceu no dia 20 de outubro de 1977, quando, em reunião do Grupo Ismael, os três médiuns em serviço receberam, simultaneamente, através da psicografia, páginas que não somente se afinam pelo mesmo diapasão de sentimentos, mas que representaram, para as nossas almas, uma chuva de bênçãos renovadoras.

            Certos de que inúmeros outros servidores de Jesus se beneficiarão igualmente com aqueles ditados sublimes, decidimos reproduzi-los aqui, esclarecendo, desde  logo, que não nos julgamos deles merecedores, e sim, apenas, com eles beneficiados.

            Uma das mensagens nos veio do grande Bittencourt Sampaio e foi recebida pelo médium Giffoni:

            "Meus amigos, a advertência que invariavelmente ouvis, para que vigieis e oreis, não são simples palavras de retórica para facilitar a compreensão das lutas e vicissitudes a que a vida vos condiciona e que são instrumentos do vosso aperfeiçoamento moral.

            Não, elas não são simples literatura dos vossos mentores espirituais; são, sim, uma advertência mais do que necessária, um imperativo da hora presente.

            Nossos irmãos encarnados e desencarnados que ainda necessitam da dor, como instrumento para renunciarem à condição humana, que os escraviza sem que disso se apercebam, cercam todos aqueles que levantam a bandeira do Evangelho como o caminho da redenção.

            Viveis as mesmas tentações que impuseram a Jesus, a fim de que Ele renunciasse à pregação que fazia, anunciando o Reino de Deus, e o levariam ao Gólgota, na tentativa de impedir a divulgação da Verdade.

            Sereis, a cada dia que passar, mais assediados pelos que não querem ver a Luz; e, para levar avante vossas tarefas, tereis que manter permanente comunhão com os enviados do Céu, mas esta comunhão só se obtém através da oração e da vigilância.

            Sereis, meus irmãos, tentados por todas as formas, mas tende confiança.

            Jesus é o nosso Pastor: Ele fala aos nossos corações, se lhe abrirmos as portas. Ele dará, se ainda isto lhe exigirem, a vida, para salvar-nos. Ele sofrerá junto com quantos estão no mundo lutando por fazer com que o seu Reino seja permanente nos nossos corações."



            Outra página, psicografada naquela noite, é uma formosa prece do Espírito Letícia:

            "Divino Jesus, Senhor Augusto e Soberano Mestre!

            Aqui estamos, em lágrimas de ternura e gratidão, ao lado de teus e nossos filhos! Eles enfrentam, Senhor, no grande oceano da vida terrena, os primeiros sopros fortes do vendaval que avança sobre a Tua Barca, e sentem no coração o frio da vigília que precede a manhã das batalhas decisivas.

            Percebem claramente, ó Mestre, que chega, veloz e silenciosa, a hora do testemunho, e sabem que não há como afrontar a realidade maior senão de alma aberta e confiada em Ti.

            Dá, porém, Augusto Condutor de nossas vidas, que eles percebam, mais clara e permanentemente que nem só cardos e pedras atapetam o chão áspero da senda a que a Tua Bondade os conduziu.

            Que eles recolham, no escrínio íntimo, as flores perfumosas e sinceras que o nosso afeto lhes oferece todos os dias e todas as noites.

            Que vejam, Mestre Amado, as nossas mães carinhosas a afagar lhes as frontes cansadas e a encorajá-los à batalha redentora!

            Ó Pastor Sublime, dá que eles se apercebam de que o nosso coração acompanha cada um dos seus passos, nossos braços secundam os seus braços, nossos olhos choram as mesmas gotas de pranto e contemplam, no longínquo Céu, as mesmas estrelas!

            São nossos irmãos muito amados - e mais - são nossos filhos, a quem acalentamos durante muitos séculos, no desdobrar-se incessante dos tempos, e a quem nem sempre soubemos encaminhar e defender.

            Agora, Glorioso Governador de nossas almas, somos compelidos a acompanha-los no silêncio do anonimato e na constância do amor, deixando-os, porém, livres e aparentemente sós, à frente dos vagalhões que vem vindo ao seu encontro.

            Confiamos neles, mas sobretudo confiamos em Ti, que a todos nos amparas e nos guias, para que, ó Redentor Excelso, o nosso sublime amanhã alvoreça maravilhoso, sobre nós, no firmamento sagrado que cobre esta Pátria bendita, em que replantaste, para o Novo Milênio, a Árvore Divina da Tua Boa Nova!"



            A terceira mensagem, de sublimal conteúdo, foi recebida pela médium Maria Cecília Paiva e veio do amorável Bezerra de Menezes:

            "POR MEU AMOR, ASSIM FARÁS!

            Hoje certamente já não existem os circos, onde os cristãos, martirizados, testemunhavam a fé e o amor.

            Não mais existem as fogueiras da "santa" Inquisição, que consumiam as vítimas indefesas, arrebanhadas no apostolado da mediunidade ou da fé exaltada em espírito e verdade.

            Desapareceram as cruzes, os cravos, as coroas de espinhos...

            Entretanto, o ódio acirrado das trevas prossegue sua faina destruidora, atingindo povos e nações, mas é no reduto daqueles que se consagram à bênção do estudo renovador, à sustentação da luz, no planeta, à intensificação do Bem e à propagação da Verdade, que esse ódio atinge a sua escalada maior, culminando muitas vezes no arrastamento, às sombras, das almas invigilantes.

            Todavia, por amor ao Mestre Divino, farás a tua parte.

            Perdoarás quanto for preciso.

            Olvidarás o nome dos portadores da sombra, esquecendo a calúnia.

            Orarás por teus inimigos.

            Vigiarás, de luz acesa, a tua noite e o teu dia, não por medo destruidor, mas para que não dês guarida a nenhum rastro vil da miséria oculta, ou do veneno tenebroso.

            Por amor do Senhor, participarás, confiante, de seu banquete celestial.

            Convidarás os coxos e os estropiados.

            Escreverás mensagens de fé.

            Erguerás, com júbilo dalma, o estandarte do Anjo Imaculado e, hasteando-o bem alto, proclamarás a tua fé.

            Não te deixes abater, mas confia.

            Sê forte e sereno n’Aquele que é a tua força e o teu vigor.

            Alimenta a chama sagrada do Amor no núcleo cristão e estende os olhos para a Terra da Promissão.

            Um dia, verás cintilar, no céu azul, mais intensamente, a formosa Estrela da Paz.

            Ouvirás o murmúrio das vozes, em preces de gratidão, e entoarás, com a alma festiva, o cântico dos anjos: Paz a todos os homens!..

            Por amor ao Senhor Divino, caminharás. E com Ele vencerás! 

            Deus seja louvado, hoje e sempre.”

            Bem sabemos que essas joias do Céu não nos foram entregues por merecimento especial, mas não podemos deixar de admitir, com o Divino Mestre, (Mateus, 10:10) que "digno é o trabalhador do seu alimento".


XVI b. 'Apreciando a Paulo'


XVI b
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958

            O Nazareno, ainda aí, proclamou a superioridade de seu Pai Celestial. Com efeito, o Criador, que é único, como disse Paulo de Tarso é “sobre todos, e por todos e em todos”. (Efésios, 4:6)

            Os teólogos católicos, porém, procuram fazer uma distinção entre Jesus homem e Jesus Deus, distinção sutilíssima, que a Bíblia não faz. Dizem que, como homem, Jesus era inferior a Deus, mas que, em Espírito, é igual a Deus, como integrante da Santíssima Trindade. Mas as declarações do Cristo, feitas a Madalena, depois da ressurreição, como se vê em João, 20:17, e que acima transcrevemos, desmentem essa interpretação sofística, porque aí Jesus era, como todos estão de acordo, somente Espírito, e ainda chamava aos apóstolos “irmãos” e a Deus, “Pai” e “meu Deus”, frisando bem: “eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus”.

            Portanto, em face de tão peremptórias assertivas de Jesus, a Igreja não teve razão em criar o dogma do Mistério da Santíssima Trindade, simples repetição da crença dos povos antigos a que ela mesma chama pagãos, e que também admitiam, embora sob outros aspectos e com outra aparência, essa Trindade Divina. Ela não podia desprezar o Velho Testamento e nem se chocar com esses versículos do Novo, para basear-se só em outros, pois que todos devem ser interpretados em harmonia.

            É verdade que São João chamou Deus ao Messias, mas isto, como veremos, não implica de forma alguma com a clara e justa afirmação de Paulo, ao escrever este que Jesus “não teve por usurpação ser igual a Deus”. E o que São Tiago disse, e que somente João registrou, foi naturalmente num arroubo místico, ao ver o Cristo materializado (João, 20:28), mas tal afirmativa, que não se encontra nos outros Evangelhos, chamados sinóticos, não pode desfazer as palavras que brotaram dos próprios lábios de Jesus e que acima transcrevemos. O Cordeiro de Deus jamais discordaria do Velho Testamento, em ponto tão substancial, qual seja o que manifesta a primeira Revelação, que é o Monoteísmo. E, realmente, Jesus confirmou o Pentateuco nesta parte essencial, conforme provamos com suas próprias palavras, secundadas ainda pelas de Paulo, o vulgarizador do Cristianismo e seu vaso escolhido para levá-las “aos gentios, aos reis e aos filhos de Israel”. (Atos, 9:15.)

            Um ilustre padre romano já disse, confirmando, aliás, o pensamento de sua Igreja: “O Judaísmo era um ponto luminoso na esfera negra do Paganismo. O tesouro nacional mais rico, guardado por séculos, era o Monoteísmo.” Logo, por que a Igreja de Roma criou a Trindade, contrariando o Velho Testamento e as palavras de Jesus?

            Quanto àquela assertiva de João, dizendo que “o Verbo era Deus” (João, 1:1), ninguém pode afirmar, em sã consciência, como em seguida provaremos, que essa palavra “Deus”, usada por São João, tenha sido escrita no texto original com letra maiúscula ou minúscula.

            O Evangelho de João foi escrito em Éfeso, cidade das mais cosmopolitas e cultas da Ásia Menor, onde aquele apóstolo querido fora residir com Maria, a pedido do Rabi, que do alto da cruz lha entregara a seus cuidados (João, 19:27). Foi grafado originariamente em grego, língua internacional de seu tempo, lá pelo ano setenta da nossa era. Foi o último dos quatro Evangelhos ditos “canônicos”, pois que os três sinóticos lhe são anteriores. Alguns autores entendem mesmo que ele foi escrito no último decênio do primeiro século.

            Ora, a escrita antiga, usada pelos copistas dos Evangelhos, era cursiva, 0].1 uncial, composta só de maiúsculas. A partir do século IV, quando se generalizou o uso dos pergaminhos, passaram a usar a escrita minúscula. E desde o século IX só se encontram manuscritos com minúsculas. Quando usavam, antigamente, a escrita maiúscula, o manuscrito era composto só de letras maiúsculas; e quando usavam a minúscula, só se utilizavam de letras pequenas. Os escritos eram feitos seguidamente, pois os escribas não separavam as palavras entre si e nem se utilizavam da pontuação, mas grafavam os vocábulos como eram falados. Vale ainda, como curiosidade, o seguinte: a divisão da Bíblia em capítulos foi feita, pela primeira vez, por Estevão Langton, em 1214. E a divisão do Novo Testamento, em versículos, data de 1555, quando Roberto Estêvão assim editou sua Bíblia, corrigindo a de Sanctos Pagnini, de 1528, “cuja numeração versicular ficou para o Antigo Testamento”. Todas estas particularidades estão na obra do erudito jesuíta espanhol João Leal - Os Evangelhos e a Critica Moderna (Porto, 1945).

            Portanto, em face de os escribas só usarem a letra maiúscula ou somente a minúscula, não se pode garantir que no texto primitivo esteja “e o Verbo era Deus”, como hoje consta da Vulgata, ou se estava escrito “e o verbo era deus”, o que é mais provável e lógico, pois acreditamos que o apóstolo João, por mais entusiasmado que fosse por Jesus, não o havia de querer igualar ao Pai Celestial, contrariando as lições de seu Mestre, reiteradamente dadas. Mas vem a propósito lembrar que nós também somos deuses (Salmos, 82:6; Isaías, 41 :23 e João, 10 :34) em formação e em evolução, pois gozamos de imortalidade e, como Jesus, somos filhos de Deus (Deut., 14:1; João, 1:12 e 11:52; Romanos, 8:16; I João, 3:1 e 2) Algum dia, quando atingirmos a perfeição sideral, seremos consumados na unidade (João, 17:23) e, embora sem perdermos a individualidade, seremos “um com o Pai”.

            É neste sentido que podemos admitir que Jesus é deus, pois Ele mesmo repetiu o que está escrito em Salmos, 82:6 e Isaías, 41 :23, como se vê em João, 10 :33 a 36, o que pedimos ao leitor conferir.

            O Divino Mestre é o Espírito mais puro que já baixou à Terra. É mesmo o protetor e o governador de nosso planeta, tanto que “ninguém irá ao Pai senão por seu intermédio”. Dele estamos distanciados, possivelmente, por milhões de anos; é para nós, por assim dizer, como que um Deus, pois que foi e é a expressão de Deus para a Terra; mas, apesar de tudo, é nosso Irmão maior (como ele mesmo se confessou, referindo-se aos seus apóstolos), porque o Pai Celestial, o Deus dos deuses, é só um. Ele está na congregação dos poderosos e julga no meio dos deuses (Salmo, 82 :1).

            As passagens que levaram os “doutores em Teologia” a cometer aquele erro de interpretação, por tomá-las ao pé da letra, extraindo do Novo Testamento uma Trindade Divina, semelhante a dos povos antigos (a que eles mesmos chamam hereges), são além daquela com que João inicia seu Evangelho, as seguintes:

            “Eu e o Pai somos um.” (João, 10:30.)
            “Quem me vê a mim, vê o Pai.” (João, 14:9.)

            Mas não se devem entender tais versículos isoladamente, porém em conjunto com os demais, para que não contrariem aquelas outras afirmativas, que também brotaram dos lábios de Jesus.

            O Divino Mestre esclarece que sua unidade com Deus é através da palavra ou da doutrina, e termina assegurando que os cristãos serão também consumados nessa unidade, que afinal consiste no amor.

            “Não crês tu que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que vos digo, não as digo de mim mesmo, mas o Pai que está em mim, é que faz as obras. “Crede-me que estou no Pai e o Pai em mim; crede-me, ao menos, por causa das mesmas obras.”(João, 14:10 e 11)

            Quem está com Deus tem o Pai no coração, como Jesus, e manifestará em obras sua elevação espiritual, através do amor.

            “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viveremos para ele e faremos nele morada.” (João, 14:23.)

            Assim, o Pai e Jesus são um, porque este já está consumado na Unidade Divina, pois é perfeito. Outros já estão ou serão integrados nessa mesma unidade, quando atingirem essa perfeição sideral, mas sem perderem a individualidade, porque estarão com Deus, sendo embora distintos de Deus, que é um só. A integração na divindade não implica em desmembramento da pessoa de Deus, que é sempre diversa e superior à sua obra ou aos deuses que cria.

            “E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela sua palavra hão de crer em mim; Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu lhes dei a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um. Eu neles e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade.” (João, 17:20 a 23).

            Muitos outros tradutores da Bíblia, como ainda recentemente monsenhor Vicente Zione, reitor do Seminário Central de São Paulo (edição do Novo Testamento da “Pia Sociedade de São Paulo” - 1950), usam as palavras “para que sejam CONSUMADOS NA UNIDADE”, in verbis: “Eu estou neles e tu em mim, para que sejam consumados na unidade.” (João, 17:23)

            A Unidade Divina, portanto, não é fruto de uma Trindade, mas de todos os cristãos sinceros que nela serão consumados, sem que o Pai deixe de ser UM, em essência criadora e em personalidade, distinto de sua obra.

            É a explicação desse ponto da verdade, que distingue, substancialmente, o Cristianismo do Budismo. Este afirma que cairemos afinal, como gotas de água, no grande oceano do Nirvana, onde está a divindade, e ali nos confundiremos com ela. O Cristianismo, ora bem esclarecido “em espírito e verdade” pelos Mensageiros do Senhor, diz que algum dia atingiremos a unidade, porém sem perdermos a individualidade.

            E essa Unidade Divina sintetiza-se no amor e, destarte, “quem vê a Jesus vê o Pai” e é nisto que ele é “um com o Pai”, num amor eterno e infinito a todas as criaturas e a toda a Criação! Mesmo porque “Deus é amor” (I João, 4:8). Mas o Criador é Espírito único, embora seu amor se manifeste por toda a parte, pois toda a sua obra também é amor. E este sentimento sublime nos deve unir e purificar, evolutivamente, através dos séculos, até sermos consumados na Unidade Divina, na grandeza desse amor universal, que é eterno, fecundo, perfeito, infinito e auto suficiente. 

XVI a. 'Apreciando a Paulo'


XVI a
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958


“Para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo,
 o Pai da glória, vos dê em conhecimento
o espírito de sabedoria e de revelação.”
(Epístola aos Efésios, 1:17)

            As lições do apóstolo dos gentios prestam-se a comentários que poderão servir para melhor conhecimento das coisas celestiais. Mas como o entendimento humano é variável, as apreciações que se seguem, embora calcadas na Doutrina dos Espíritos superiores, a muitos não agradará, máxime àqueles que ainda se encontram presos aos dogmas da Igreja de Roma, alguns dos quais foram herdados e aceitos por nossos prezados irmãos Protestantes. Assim o do “Mistério da Santíssima Trindade”, que nos fala em três deuses em um só, ou “três pessoas distintas num só Deus verdadeiro”, erro multissecular, oriundo das religiões anteriores ao Cristianismo.

            “Aquele que sem cessar cria os mundos, diz Brama (Upanishas), é tríplice. É Brama, o Pai; é Maia, a Mãe; é Vishnu, o Filho: Essência, Substância e Vida. Cada um encerra em si os dois restantes e todos os três são um no Inefável.”

            A religião védica pura, anterior ao Bramanismo, “cuja antiguidade se perde na noite dos tempos”, fala-nos em Agni, o Espírito puro, o Eterno Masculino, e em Soma, o Eterno Feminino, fonte de tudo o que é visível e invisível. Da união de ambos surge uma “terceira pessoa”: a Essência Divina.

            Ensinava-se também no templo de Osíris, no antigo Egito, o mistério da Trindade Divina: “Deus era o Pai; o Verbo, o Filho; e, da união destas duas potências divinas, surgia uma terceira, que era a Vida. Isis une-se a Osíris, e pelo desmembramento deste, e por sua própria ressurreição, surgiu o seu filho Hórus, o divino mediador.”

            Lao-Tseu, cuja religião conta hoje na China com milhões de adeptos, é considerado pelos seus discípulos como o próprio Deus, cujo ser seria ainda composto por mais duas individualidades: Chaos-Yu-Huang e Sang-Ti.

            Babilônia também cultuava a Trindade Divina, concretizada nos deuses Sin, Shamash e Ishtar, respectivamente: a Lua, o Sol e Vênus.

            Contra o politeísmo dos povos mais bárbaros, que era a expressão primitiva de adoração às coisas celestiais, surgiu assim, entre os povos antigos, o sincretismo da Trindade, que a Igreja Católica romana entendeu de copiar ou de fazer ressurgir. Jesus porém nos ensinou que “a salvação vem dos judeus” (João, 4:22), e isto porque os hebreus, rompendo com as crenças dominantes, afirmavam a existência de “um Deus único e verdadeiro”, axioma que define a primeira revelação que nos veio dos céus: o Monoteísmo.

            “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor.” (Deuter., 6:4; Marcos, 12 :29)

            Realmente, examinando-se o Velho Testamento, fonte legítima do Novo, não se lê uma só referência à Santíssima Trindade, que a Igreja Católica romana depois criou, baseada na interpretação bíblica de seus doutores e logo aceita por concílios que hereticamente afirmam, sem a menor prova, ter contado com a assistência do Espírito Santo, eleito também, não se sabe porque, em pessoa dessa Trindade Divina.

            Mas os exegetas da Igreja de Roma fundamentaram-se apenas, ao estabelecerem aquele dogma, em alguns versículos do Novo Testamento, que tomaram ao pé da letra, como depois demonstraremos, mas que não podiam contrariar o Antigo Testamento, em ponto tão fundamental, visto que este nunca, jamais, em versículo algum se referiu à Santíssima Trindade, mas, pelo contrário, proclamou a existência do Deus único, como igualmente o fez Jesus:

            “Vós, porém, não queirais ser chamados Rabi, porque um só é o vosso Mestre, a saber, o Cristo, e todos vós sois irmãos. “E a ninguém na Terra chameis vosso pai, porque um só é o vosso Pai; o qual está no Céus!” (Mateus, 23:8 e 9)

            Assim, o Mistério da Santíssima Trindade é a ressurreição ideológica da Trindade Divina dos povos antigos (bem anteriores a Moisés), heresia que se choca com a afirmativa principal do Velho Testamento, o qual reconhece que Deus é o único Senhor (Deuter., 6:4), crença que Jesus proclamou, como se lê ainda em Marcos, 12 :29, que é a reprodução daquele versículo do Deuteronômio.

            O apóstolo Paulo, na epístola aos Efésios, diz que “o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo é o Pai da glória”.

            O Deus de Jesus é o Criador, seu Pai e nosso Pai, seu Deus e nosso Deus, conforme o Divino Mestre confessou quando apareceu a Maria Madalena, depois de sua ressurreição:

            “E, disse-lhe Jesus: Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus.” (João, 20:17)

            Aliás, São Paulo também frisou: “Há um só Deus, o qual é Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos.” (Efésios, 4 :6.)

            E a Ele chamou “Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”. (lI Cor., 11 :31)

            Mas, referindo-se diretamente ao Cordeiro de Deus, disse: “Que sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus.” (Fil., 2 :6.)

            Sim, o Cristo nunca se declarou Deus, mas sempre disse que era Filho de Deus, irmão de seus apóstolos, como frisou a Madalena, depois da ressurreição (João, 20: 17), e jamais quis usurpar as qualidades de seu Pai Celestial, tendo mesmo confessado que é menor do que Ele, para evitar qualquer dúvida que, no futuro, surgisse a esse respeito:

            “Se me amais, certamente exultareis por ter dito: Vou para o Pai: porque o Pai é maior do que eu.” (João, 14 :28)

            Se Jesus fosse Deus ou mesmo parte da Trindade Divina, seria igual ao Pai, porque, sendo Deus, seria igual a Deus e não menor do que este. Mas ele, fazendo tal afirmativa, de que o Pai é maior do que ele, confessou-se inferior a Deus, como o fez ainda em Mateus, 19 :17; Marcos, 10 :18 e Lucas, 18 :19, quando declarou:

            “Por que me chamas bom? Não há bom senão só um, que é Deus.” 

XV. 'Apreciando a Paulo'


XV 

‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958

“E Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra,
 e os céus são obra de tuas mãos.
Eles perecerão, mas Tu permanecerás;
 e todos eles, como roupa, envelhecerão.
E como um manto os enrolarás,
e como um vestido se mudarão,
mas Tu és o mesmo, e os teus anos não acabarão.
E a qual dos anjos disse jamais:
Assenta-te à minha destra até
que ponha teus inimigos como escabelo de teus pés?
Não são porventura todos eles espíritos ministradores,
enviados para servir a favor daqueles
que hão de herdar a salvação?
(Epístola aos Hebreus, 1:10 a 14)

           
            O fenômeno da gêneses ou da origem da Terra, dos seres que nela habitam e das coisas que nela existem, vem preocupando os homens, desde a mais remota antiguidade. Filósofos, cientistas e religiosos têm procurado resolvê-lo, mas é claro que toda explicação religiosa ou filosófica, que contradiga a ciência, não pode ser aceita, porque a ciência provém de Deus, e é fruto do estudo, da experiência e da observação de fatos positivos, tudo sujeito a leis determinadas, contra as quais a religião, que também deflui de Deus, não se deve chocar, mas harmonizar-se, numa concepção una e indestrutível.

            Foi-se o tempo em que se dizia, erroneamente, que ciência é uma coisa e religião outra, que se não devem misturar, nem confundir. Se a ciência provém do Senhor e a religião a este conduz, tem que haver reencontro ou união de ambas; assim, como é possível achar que esta pode contradizer aquela, em suas afirmativas lógicas ou racionais, se elas têm a mesma origem, o mesmo fluxo criador?

            Nem somente a religião é abstrata, nem só a ciência é correta. Esta também possui suas leis, seu campo especulativo ou ideológico, e a verdadeira religião, por outro lado, não palpita apenas na fé, mas concretiza-se em atos ou em obras que a manifestam, e até em fenômenos positivos que a comprovam.

             A vida de Jesus, fundamento do Cristianismo, é real e palpitante, assim como a ciência espírita, baseada em fenômenos positivos, serve de base ao Espiritismo-cristão. A vida do Espiritismo são os fenômenos, assim como a do Cristianismo é a de Jesus. Portanto, a ciência funda-se no positivo e a religião também; ambas têm seu terreno especulativo, mas possuem igualmente seu campo de ação prático, concreto, positivo, aplicável à Humanidade. Esta se beneficia da ciência, assim como da religião, e ambas têm de ser racionais, para serem exatas.

            Assim, o Espiritismo, como síntese das religiões e como legítima expressão de unificação da verdade, ensina que devemos ter uma fé racional, filtrada pelo crivo de nosso entendimento, a fim de que possa inundar de paz e de luz o nosso coração, e não uma fé cega ou baseada em dogmas de mistérios impenetráveis, criados pelos teólogos para dominar e aterrorizar as consciências, pois todo e qualquer mistério é mero fruto de nossa ignorância, que irá desaparecendo, à medida que formos evoluindo, tornando-nos capazes de repelir as imposturas, frutos de “tradições que afogam” a inteligência e a verdade.

            Se todo homem tem sua “zona lúcida”, sua capacidade máxima de percepção, tudo o que passar daí será mistério para ele. O grau de entendimento, assim como o livre arbítrio, são limitados, porém, à medida que o Espírito evolve, à medida que se instrui, mais dilatada se vai tornando sua inteligência, maiores serão seus conhecimentos, menor o número de mistérios relativos à obra divina.

            Por consequência, afirmar que o dogma existe, na concepção católica romana ou protestante, falar, por exemplo, numa Santíssima Trindade, como mistério impenetrável, é, além de tudo, contrariar as próprias palavras do Divino Mestre, que assegurou:

            “Nada há de encoberto que não haja de revelar-se, nem de oculto que não haja de saber-se.” (Mateus, 10:26.)

            O próprio esoterismo, que era constituído da ciência hermética ou oculta, dada, antigamente, só aos iniciados que se tornavam dignos de possuí-la, perdeu sua razão de ser como esoterismo, pois que se tornou exotérico, isto é, descoberto, acessível a qualquer pessoa que, hoje em dia, queira estudá-lo. O “mistério”, só conhecido pelos hierofantes, já se vulgarizou, embora constitua ainda objeto de estudos especiais e muito interessantes à cultura do homem. Assim, o nome de esoterismo ficou; mas aqueles ensinamentos não são mais ocultos, porém abertos e livres ao estudo de quem neles se queira aprofundar.

            Os livros que tratam do esoterismo, repetimos, são muito instrutivos e úteis para a cultura intelectual, mesmo os rosacrucianos, mas, se as revelações são progressivas, é claro que o Cristianismo, sendo posterior, já superou o esoterismo, na explicação das coisas 
celestiais. Se a lei é da evolução, através do tempo e do espaço, não podemos negar que o que vem depois, em matéria de revelação, amplia ou retifica o que lhe antecedeu.

            Elifas Levi, um dos mais autorizados mestres do esoterismo, afirmou em “O Grande Arcano”, pág. 86: “Os antigos ritos perderam sua eficácia desde que o Cristianismo apareceu no mundo.

            Portanto, sendo o Espiritismo-cristão a última das revelações dada à Humanidade, ele completa e supera todas as outras, expressando uma parcela maior de verdade (a verdade absoluta não está na Terra, mas pertence a Deus), a qual, se está fragmentada em todas as religiões, o Espírito Santo a condensou melhor em sua obra de luz, que é o Espiritismo. As religiões ou as doutrinas filosóficas que o antecederam, representam degraus da escada evolutiva, que Jacó viu em sonhos, ascendendo aos céus, no cimo da qual se encontram os Mensageiros do Senhor, fazendo derramar sobre a Terra o Espírito de Verdade, iluminando e consolando os corações dos homens de boa vontade, que possuam olhos para ver e entendimento para sentir.

            Cumpre-se, assim, a promessa do Cristo de Deus, contida no Evangelho de João, 16:12 a 14:

            “Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora.
            “Mas, quando vier aquele Espírito de Verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará o que há de vir.
            “Ele me glorificará, porque há de receber o que é meu e vo-lo há de anunciar.”

            É inegável que os apóstolos e os primeiros cristãos receberam o Espírito Santo no dia de Pentecostes, pouco depois da ressurreição de Jesus Cristo, nosso Senhor e nosso Mestre, conforme está descrito em Atos, 2:1 a 12.

            Mas o fenômeno estancou e não se expandiu com a intensidade de hoje, porque a Humanidade não estava preparada para receber uma parcela ainda maior da verdade, que apenas foi vislumbrada naquela época, por alguns eleitos. Mas agora “os tempos estão chegados” e cumprem-se as profecias de Joel, um dos grandes médiuns proféticos do Velho Testamento:

            “E há de ser que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos mancebos terão visões.” (Joel, 2 :28).

            E a mediunidade hoje surge por toda a parte! Lares de católicos e de protestantes, lares de indiferentes, veem-se às voltas com fenômenos estranhos. Pode-se dizer, sem exagero, que talvez não haja no Brasil uma família que não tenha um “caso de Espiritismo” para contar, passado entre o aconchego honesto de quatro paredes ou mesmo guardado com certo segredo, como se a verdade merecesse encoberta. São Espíritos de todas as categorias que se manifestam, sobretudo os familiares, desejosos de demonstrar que ainda continuam a viver, na verdadeira vida, que é a espiritual, e na qual, mais cedo ou mais tarde, ingressaremos. Há
fenômenos provocados também pelos “falsos profetas” ou por Espíritos atrasados, o que também foi previsto (Mateus, 7:15).

            O mérito está em saber sentir e conhecer o que vem do Alto, em separar o joio do trigo. Isto foi indicado por Allan Kardec, para que a Humanidade não ficasse sem rumo, indecisa e perplexa, ante a multiplicidade de tais fenômenos. Era necessário que tivéssemos um roteiro exato, o que nos foi dado por ele, que se tornou o Codificador do Espiritismo. Destarte, para conhecê-lo, convém estudar as obras fundamentais da doutrina, “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns” o “Evangelho segundo o Espiritismo” - e medir também as comunicações recebidas pela luz da palavra de Nosso Senhor, como está escrito no capítulo sétimo de Mateus:

            “Pelos seus frutos o conhecereis. Toda árvore boa produz bons frutos e toda árvore má produz frutos maus.”

            Assim, as comunicações que se fundarem nos Evangelhos, harmonizando-se às que foram dadas pelos Espíritos Superiores a Allan Kardec, são frutos saborosos, que merecem nossa reflexão e nosso acatamento. Defluem, como diz Paulo, nesta Epístola aos Hebreus, “de espírito ministradores, enviados a favor daqueles que hão de herdar a salvação”.

            Portanto, de um lado temos certas interpretações dos textos bíblicos, a teologia feita na Terra, e, de outro lado, as interpretações dos Espíritos do Senhor. Mas os homens, por mais cultos e eruditos que sejam, mesmo reunidos em concílios, estão sujeitos ao erro, que é característico de nosso plano. Dizer que os concílios têm o apoio do Espírito Santo, é ainda faltar à verdade, porque ali são homens que se manifestam e não Espírito ou Espíritos.

            Mas as comunicações dos Mensageiros do Senhor, estas nos devem merecer fé. Não se denunciam por conclusões momentâneas, como frutos de discussão entre seres falíveis, mas vêm dos céus e se caracterizam por sua uniformidade, manifestada em tempos, lugares e médiuns diferentes. Até hoje, em matéria doutrinária, eles repetem em nossas sessões aquilo que foi dito no tempo de Kardec! Se algum falso profeta da erraticidade interfere, é facilmente descoberto, porque milhares de pessoas poderão passar o ensinamento pelo crivo da razão, já que nossa fé não é cega, mas raciocinada. Somente o que é lógico e uniforme constitui o corpo da Doutrina dos Espíritos, que também é evolutiva. À medida que os homens vão desenvolvendo seu grau de entendimento, novos esclarecimentos lhes são prestados, baseados sempre na mesma estrutura, sem discrepar dos Evangelhos, nem das linhas mestras traça das pelo Codificador. É a obra do Paracleto, o Consolador prometido por Jesus, que ficará eternamente conosco, ensinando-nos “toda a verdade”.

            O céu e a terra perecerão, como ensina Paulo, na lição acima, mas o Pai Celestial permanecerá ad eternum, como eternamente ficará conosco a palavra do Espírito Santo, sempre repetida, sempre renovada, guiando-nos com Jesus em nossa vida imortal!