quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Um líder no conceito de Emmanuel

Um líder no conceito
de Emmanuel
por Kleber Halfeld
Reformador (FEB) ...... 1997

            Eles tiveram lugar de destaque nas coletividades.

            Foram respeitados pelo que disseram ou realizaram.

            Os que alcançaram patamares elevados de espiritualidade, dentro de um sistema evolutivo, buscaram nortear aqueles que os cercavam, para cometimentos nobres tendo por divisa: Verdade e Perfeição.

            Os que permaneceram presos em angustiantes labirintos criados pela própria incúria não hesitaram levar o próximo a tortuosos caminhos.

            Eram líderes.

            O mundo os tem conhecido em todos os tempos.

            Impressionaram gerações e entraram para as páginas da História.

            Receberam nomes como Catarina a Grande, Chu-En-Lai, Napoleão Bonaparte, Golda Meir, De Gaule, Adolpho Hitler, Simon Bolivar, Washington, Gandhi.

            E outros.

*

            Quando a Nova Cultural lançou a série "Os Grandes Líderes", no tomo que enfoca a figura de Gandhi, o leitor teve ensejo de ler estas pressões, impressas na capa de fundo:

            "Mohandas Karamchand Gandhi, arquiteto da independência da índia, foi a combinação única de um político extremamente hábil e de um humanista cuja dedicação estava próxima da santidade. Depois de sentir na própria pele o racismo e as injustiças do colonialismo britânico na África do Sul, Gandhi retomou à índia determinado a ajudar na luta de seus compatriotas pela independência do país. Perseguiu esse objetivo sem jamais se desviar daquilo que constituía o princípio fundamental de suas concepções éticas, políticas e filosóficas: o princípio da não-violência. Amado e admirado por milhões de pessoas, o Mahatma foi para seus contemporâneos e para todos aqueles que viram nele uma fonte de inspiração a consciência do seu país e do mundo."

            A responsabilidade do volume sobre a vida e a obra de um dos maiores vultos que a Índia conheceu foi entregue pela Editora a Catherine Bush, bacharel em Literatura Comparada pela Universidade de Yale, Estados Unidos, e autora de textos de ficção e de estudos críticos de literatura que através de expressões de apreciada simplicidade, mas concomitantemente de bem redigidos textos, soube transmitir ao leitor os conflitos e sofrimentos pelos quais passou Gandhi, objetivando libertar o povo indiano do domínio inglês.

            Há que considerar de início uma expressão desse respeitável vulto. Constituirá ele uma legenda em torno da qual serão desenvolvidas algumas apreciações, ao mesmo tempo que, claramente, sintetizará o pensamento do grande líder diante da tarefa de que estava investido. Missão, aliás, quem sabe, contraída mesmo antes de reencarnar no grande país asiático do Ganges, do Sutley e do Jumma; da terra que acolheu Viasa, Krishna e Buda; da pátria dos marajás e dos párias.

            É de Gandhi o texto a seguir:

            "Minha convicção pessoal é absolutamente clara. Não tenho o direito de magoar nenhum ser vivo, muito menos seres humanos como eu, ainda que eles possam causar grandes males a mim e aos meus. Por isso ao mesmo tempo que considerando o domínio britânico uma calamidade, não pretendo causar danos a um único cidadão inglês, ou a qualquer interesse legítimo que ele possa ter na índia. Sei que, empenhando-me pela não-violência, estarei correndo o que poderia ser chamado de um grande risco, mas as vitórias da verdade jamais foram alcançadas sem riscos! E transformar uma nação que, consciente ou inconscientemente, foi opressora de outra, mais numerosa, mais antiga e não menos civilizada que ela própria, merece correr qualquer risco."

            Lendo semelhante trecho, ficamos a meditar quão diferente daqueles divulgados, por exemplo, por algumas figuras políticas da Alemanha das décadas de 30 e 40, cujo sonho de conquista custou a vida de milhares de soldados ingleses, franceses e americanos, de 20 milhões de soviéticos e de mais de 6 milhões de judeus, a maioria morta nos campos de concentração de Bergen-Belsen, Auschwitz, Treblinka, Buchenwald e outros.

            Quando em 1939, ano do início da Segunda Grande Guerra Mundial, foi lançada pela Federação Espírita Brasileira a obra "A Caminho da Luz", de autoria do Espírito Emmanuel, através de Francisco Cândido Xavier, estava Gandhi com 70 anos e ainda com vigor entregava-se na Índia à luta pela independência do País através daquilo que chamou de "não-violência". Uma luta que teria sua recompensa anos mais tarde, ou seja, em 15 de agosto de 1947, quando a índia se tomou uma República Federal dentro da Comunidade Britânica, oportunidade em que proclamou Jawaharlal Nehru seu primeiro-ministro.

            O livro de Emmanuel - "uma história da civilização à luz do Espiritismo" - em seu capítulo V (A Índia) contém gravada curiosa afirmativa do autor. Depois de referir-se às disparidades sociais existentes no país do Ganges, escreve ele:

            "Ainda hoje, o Espírito iluminado de Gandhi; que é obrigado a agir na esfera da mais atenciosa psicologia dos seus irmãos de raça, não conseguiu eliminar esses absurdos do seio do grande povo de iniciados e profetas." (Grifei.)

            A afirmativa conduz minha lembrança ao sempre querido e lembrado irmão de Doutrina, Newton Boechat.

            Há alguns anos, após uma palestra em um Centro Espírita de Juiz de Fora, tive ensejo de, no recesso de meu lar, dele ouvir este esclarecimento:

            - Em meus diálogos com nosso amoroso Chico, afirmou-me ele que Emmanuel é uma Entidade Espiritual que nunca fez referência elogiosa, de público, a uma pessoa encarnada, exceção feita a Gandhi!

            E ante minha surpresa, informou:

            - Leia no capítulo V de "A Caminho da Luz".

            Ainda complementou:

            - O Chico afirma que André Luiz, que todos julgam um Espírito muito severo, circunspecto, é muito aberto e ameno nos diálogos; o Emmanuel, sim, é muito rígido no raciocínio. Entretanto, não pode furtar-se em dar elogioso adjetivo a Gandhi.

            Após tais considerações passa-se a refletir:

            - Um elogio solto a esmo por Emmanuel?

            De forma alguma. Era, a afirmativa, o resultado de longa observação do Plano Espiritual à figura simples de quem fizera da existência na Índia uma luta contínua em benefício de sua população. Do homem que, através de suas palavras e conduta,
identificava-se com os conceitos apregoados pelo Espiritismo, há um século!

            Buscando demonstrar o que acaba de ser dito, vejamos algumas de suas expressões:

            1. "Não sou um santo que se tomou político. Sou um político que está tentando ser santo."

            Observa-se no enunciado o esforço de um líder para melhorar suas tendências. O que nos recorda a expressão de Kardec, contida na obra "O Evangelho segundo o Espiritismo", no capítulo XVII:

            "Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más".

            Observação - Sem nos ligar a esta ou àquela ideia particularizada, poderíamos dizer que semelhante expressão do líder indiano deveria ser o escopo de qualquer Espírito, encarnado ou não, fosse qual fosse o campo religioso em que estivesse militando.

            2. Os dois princípios seguintes Gandhi os absorveu de John Ruskin, filósofo e ensaísta britânico do século XIX, cujas ideias sobre o trabalho exerceram marcada e decidida influência no pensamento do líder indiano, os quais estão em perfeita consonância com o que apregoam em todos os tempos os Mentores Espirituais:

            a) "Que o bem do indivíduo está contido no bem comum."

            b) "Que o trabalho do advogado tem o mesmo valor que o do barbeiro, na medida em que todos têm o mesmo direito de ganhar sua sobrevivência graças ao trabalho."

            3. "Para atingir a autonomia, os indivíduos devem cultivar o servir, a renúncia, a verdade, a não-violência, o autodomínio e a paciência."

            Raciocinamos: Não é o que vamos ler nas obras espíritas de autores encarnados ou desencarnados?

            4. "Meu esforço nunca deve ser o de diminuir a fé do outro, mas tomá-lo um melhor seguidor de sua própria fé."

            É sempre oportuno repetir que a Doutrina Espírita não tem como escopo fazer proselitismo, o que obviamente deixa entendido que respeita o livre-arbítrio de cada um que moureja em outros campos religiosos. Aliás, em "Conduta Espírita", de André Luiz, capítulo 23, lemos:

            "Estimar e reverenciar os irmãos de outros credos religiosos.
            O sarcasmo não edifica.
            Sistematicamente, não impor ou forçar a transformação religiosa dos irmãos alheios à fé que lhe consola o coração.
            Toda imposição, em matéria religiosa, revela fanatismo. "

            5. "Acredito ser possível introduzir a verdade e a honestidade descompromissada na vida política do país... Tentarei tudo para tornar a Verdade e a Não-Violência aceitas em todas as nossas atividades nacionais."

            Se abrirmos a obra "Fonte Viva", de Emmanuel, no capítulo 173, leremos:

            "Só existe verdadeira liberdade na submissão ao dever fielmente cumprido.
            Conhecer, portanto, a verdade é perceber o sentido da vida.
            E perceber o sentido da vida é crescer em serviço e burilamento constantes."

            6. "O controle dos sentidos permite ficar absolutamente livre da paixão e colocar-se acima dos fluxos do amor e do ódio, do afeto e da aversão."

            Daí a advertência registrada na obra "Falando à Terra", que a Federação Espírita Brasileira editou em 1951. No capítulo Saúde, trabalho assinado pelo Espírito Joaquim Murtinho, elucida ele:

            "O homem comumente apenas registra efeitos, sem consignar as causas profundas.
            E que dizer das paixões insopitadas, das enormes crises de ódio e de ciúme, dos martírios ocultos do remorso, que rasgam feridas e semeiam padecimentos inomináveis na delicada constituição da alma?"

            Esses mesmos enunciados procurou o líder indiano colocar em evidência em todo e qualquer lugar em que estivesse presente: na intimidade do lar ou diante de altos dignitários estrangeiros, na tribuna modesta de uma sala na Índia ou perante as multidões das praças públicas.

            7. "A tendência da civilização indiana é elevar o ser moral."

            Gandhi acreditava na evolução contínua do ser humano.

            Por sua vez a Doutrina Espírita esclarece que a criatura não reencarna predestinada para o mal. As distorções são responsabilidade de cada um. O líder indiano guardava dentro de si a certeza do progresso de seus irmãos. Era otimista quanto ao futuro de seu país.

            Pensava o melhor para a Índia, cujos habitantes no passado seriam "um dos ramos da massa de proscritos da Capela, exilados no planeta"; "o país dos Vedas e dos Upanishads, as primeiras vozes da filosofia e da religião no mundo terrestre".

*



            Do Plano Espiritual extravasou Emmanuel sua simpatia à figura ímpar de Gandhi, conceituando-o " espírito iluminado".

              Na índia, como em diversificados países, não têm faltado, da mesma forma, expressões de apoio a esse respeitado vulto.

            Anotemos algumas dessas expressões:

            - Mahatma - título que se agregou ao seu nome, traduz "Grande Alma".

            - Os ashramitas chamavam-lhe de "Bapu ", que significa "pai".

            - O General George C. Marshall, Secretário de Estado norte-americano, afirmou que o "Mahatma Gandhi foi o porta-voz da consciência de toda a Humanidade" .

            - Entre parênteses, é bom lembrar que o piso do edifício que serviu de quartel-general em Bombaim entre 1919 e 1934 tem estampado o retrato de Gandhi, juntamente com as figuras de Buda e ainda a cruz cristã. Naturalmente para demonstrar à posteridade o quanto o líder indiano estava identificado em seu trabalho com a figura do meigo Jesus e com o célebre filósofo indiano conhecido também pela denominação de Sakyamuni - o sábio sáquia.

*

            Baseado na obra de Catherine Bush, transcrevo agora alguns trechos que da mesma forma justificarão a afirmativa de Emmanuel quanto à figura missionária que a Índia conheceu durante quase oito décadas, eis que nasceu Gandhi em Porbandar (1869), desencarnando em Delhi (1948).

            Algumas expressões estarão sublinhadas para maior realce!

            1. "É o dia 6 de abril de 1930. Um velho magro e baixo, de aspecto frágil, vestido com uma espécie de tanga camponesa de tecido rústico, caminha em direção ao mar. ( ... ) Usa pequenos óculos metálicos de armação arredondada, um relógio de algibeira e se apoia em um cajado. É a pouca riqueza que possui. "

            2. "Venerado como santo, Gandhi lutou até o fim pela independência por meios não-violentos."

            3. "Finalmente, conseguiu localizar um restaurante vegetariano na capital britânica ( ... ) o vegetarianismo agora se tornava para ele uma escolha consciente, não mais uma obrigação."

            4. Gandhi leu a obra "Bhagavad-Gítã" - "canto do Bem-aventurado" - considerada a expressão máxima da literatura da Índia antiga. Baseado nela apontou para o leitor os três caminhos da libertação do ciclo das reencarnações: o caminho da devoção pessoal, o caminho do conhecimento e o caminho das obras. Neste livro o líder indiano iria encontrar também "o princípio que abrange ao mesmo tempo a renúncia, a doçura, a generosidade e a ausência da mentira".

            Preceitos que ele colocou em prática durante toda a sua vida.

            5. Leu os Evangelhos, ficando deveras impressionado com os trechos referentes ao "Sermão da Montanha".

            6. "Tomava-se cada vez mais radical em suas posições e um homem cada vez mais dedicado ao seu semelhante. Uma vida totalmente dedicada à abnegação, julgava ele, exigia uma total renúncia aos bens materiais. "

            7. ''Tagore, detentor do Prêmio Nobel de Literatura em 1913, descreveu-o como a grande alma vestida de camponês".

            8. "Na verdade, Gandhi queria a eliminação total do sistema de castas. "

            9. "Em 20 de janeiro de 1948, uma bomba explodiu no local em que Gandhi mantinha os grupos de orações ( ... ) 'Se eu for a vítima de uma bala assassina', disse, 'não deverá haver ódio dentro de mim. Deus deverá estar em meu coração e em meus lábios'."

            10. “Poucas horas após a morte de Gandhi, Nehru falou pela rádio: ‘E a luz se apagou.. não mais veremos como o vimos todos esses anos.’”

*
            Catherine Bush, que biografou Gandhi para a Nova Cultural, encerra seu trabalho com estas expressões:

            “Passados os anos, tudo indica que Gandhi jamais será esquecido. Na época que vivemos, com a raça humana tendo a capacidade de destruir a vida neste planeta, o exemplo de confiança, tolerância e protesto por meios ‘não violentos’ dado por Gandhi pode ser decisivo para nossa sobrevivência. Enquanto houver esperança para a Humanidade, a luz do Mahatma não se apagará.”

            O que mais podemos acrescentar a essas palavras tão comoventes quanto sensatas? Somente aspirar a que a vida e obra do líder que recebeu do Plano Maio elogiosa expressão tenha-se tornado um roteiro não apenas para o país em que nasceu, mas, afinal, para todas as nações de nosso Planeta!




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