terça-feira, 6 de agosto de 2013

32. 'Rimas do Além Túmulo'

32
‘Rimas do Além Túmulo’
Versos Mediúnicos de
 Guerra Junqueiro

Grupo Espírita Roustaing
Belém do Pará 1929

Casa Editora Guajarina

Clama Ne Cesses (Fala, não te cales)

Ao irmão Theodoro Palmeira, prezado amigo

Palmeira: a Igreja teve outrora a petulância
de dar, como alimento às almas juvenis,
a lama - Estupidez - e o fel - Ignorância,
dizendo eram essências divinas, sutis.
E o mundo analfabeto, e o mundo ignorante,
coitado, não possuía da análise o clarão;
só teve de curvar-se ao jugo escravisante,
na submissão covarde de piedoso cão.
Quando um sábio, esmagando as falsas teorias
com o facho da Ciência entrevia a Verdade,
era alvo de vinganças, crítica, ironias,
e, por fim, desprezado pela sociedade.
E, para rematar, a fúria dos “ministros”
contra os que combatiam toda escravidão
era tal,- que os seus ódios ficaram sinistros,
e a Igreja instituiu a Santa Inquisição.
Os tentáculos fatais desse polvo esfaimado,
infundindo pavor à Humanidade inteira,
fizeram deste orbe um campo devastado
pela Igreja: uma hedionda e medonha fogueira.
 E quando, por acaso, algum batalhador
desejava implantar no mundo a Liberdade,
tombava fulminado ao intenso furor
das feras congregadas na torpe crueldade.
Sob véu de hipocrisia, em nome de Jesus,
os padres penetravam dentro até dos lares,
e, olvidando as lições do que morreu na Cruz,
atiravam donzelas a atroz lupanares.
Quem reagir tentasse contra a hedionda harpia
e negasse fazer a profissão de fé,
ia para a fogueira ou para a enxovia,
por desobedecer à lei da Santa Sé.
O tempo decorreu, e novos lutadores
surgiram pelo mundo, à luz de outra alvorada,
e a benção divinal de Gênios Protetores
como orvalho caiu sobre a terra abrasada.
O Clero, semelhante a um monstro já decrépito,
lutou para abafar a trágica explosão,
da Justiça fatal o grandioso estrépito,
que mostrava o negror da Santa Inquisição.
Quantos crimes terríveis, maldosas loucuras
bonzos cobriram com o véu da santidade,
cumprindo, “piamente”, aos olhos das criaturas,
os votos de pobreza e os votos de humildade!
Mas, quando, grandiosa, a lança da Verdade
rasgou a negra máscara, a atroz tirania,
o mundo pode ver a torpe iniquidade,
como um abutre imenso à plena luz do dia.
Depois, quando, altaneira, a luz da Liberdade
brilhou, para alegria aos livre pensadores,
a Igreja foi perdendo a antiga autoridade
que exercia por sobre os pobres servidores.
E, já por esse tempo, uma paz relativa
parecia alentar a Humanidade inteira,
que fora, em outras eras, uma vil cativa,
e que já não tremia ao medo da fogueira.
Um dia, certo poeta, em plena mocidade,
“herege e salteador”, bradou pela amplidão:
Abaixo o monstro que acorrenta a Humanidade!
Derrubemos a Igreja, à foice da Razão!
De tal modo espalhou-se pelo orbe agitado
o brado do “precito” (condenado, maldito), o “réprobo”, o “ateu”,
- que, em meio do furor do mar encapelado,
o Trono vacilou e a Igreja estremeceu.
Esses dogmas de bronze e os erros colossais
que servem de alicerces à Igreja Romana,
recebendo em açoite as “rimas infernais”,
não puderam reagir à análise soberana.
Que “heresia”, tremenda! Horror! Maquiavelismo!
O papa resolveu lançar a excomunhão
sobre esse “Imundo verme”, que, à lama do ateísmo,
queria despenhar o rebanho cristão.
Mas tudo foi em vão. A guerra encarniçada,
que formaram contra esse “inseto perigoso”,
foi mesmo que atirar uma tocha apagada
sobre um devastador incêndio tenebroso.
No vulcão do seu cérebro contínuo ardia
o desejo de ver os míseros terrenos,
livres das opressões da Tirania,
escutarem do Bem os acordes serenos,
Acredita, Palmeira, até na Eternidade,
o pobre sente ainda esse desejo ideal
de trabalhar em prol da louca Humanidade,
a fim de liberta-la às correntes do Mal.
Não julgues, meu amigo, eu tenha algum rancor
aos príncipes da Igreja. Isso, absolutamente.
Para eles também meu pequenino amor;
mas preciso é que expliquem claramente
a Verdade que foi por Jesus propagada
e que o Clero pretende ocultar sob o véu,
como uma linda estrela que fosse rodeada
de névoas que a impedissem cintilar no Céu.
E como tu sabes, Palmeira, a doutrina
do Cristo já se espalha em todos os países,
e a Árvore que dá sombra à Alma peregrina
já vai robustecendo as sólidas raízes.
E embora o Clero esteja mais fino e polido,
nem haja, atualmente a Santa Inquisição,
- o Erro é o mesmo e deve ser bem combatido,
até que a Igreja tenha outra orientação,
pois deves compreender que É CRIME A TOLERÂNCIA
QUE DÁ GUARIDA AO ERRO E APLAUDE A IGNORÂNCIA!


21 de Fevereiro de 1929.

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