O Conquistador diferente
Irmão
X
por Chico
Xavier
in “Reformador
(FEB) Nov 1945
Os
conquistadores aparecem no mundo desde as recuadas eras da selvajaria
primitiva. E, há muitos séculos, postados em soberbos carros de triunfo, exibem
troféus sangrentos e abafam, com aplausos ruidosos, o cortejo de misérias e
lágrimas que deixam à distância. Sorridentes e felizes, aceitam as ovações do
povo e distribuem graças e honrarias, cobertos de insígnias e incensados pelas
frases lisonjeiras da multidão. Vasta fileira de escritores congrega-se-lhes em
torno, exaltando lhes as vitórias no campo de batalha. Poemas épicos e
biografias romanceadas surgem no caminho, glorificando lhes a personalidade que
se eleva, perante os homens falíveis; à dourada galeria dos semideuses...
Todavia,
mais longe, na paisagem escura, onde choram os vencidos, permanecem as
sementeiras de dor que aguardarão os improvisados heróis na passagem implacável
do tempo. Muitas vezes, contudo, não chegam a conduzir para o túmulo as
medalhas que lhes brilham no peito dominador, porque a própria vida humana se
incumbe de esclarecê-los, através das sombras da derrota, dos espinhos da
enfermidade e das amargas lições da morte.
Dario,
filho de Histaspe, rei dos persas, após fixar o poderio dos seus exércitos,
impôs terríveis sofrimentos a Índia, a Trácia e a Macedônia, conhecendo, em
seguida, a amargura e a derrota, a frente dos gregos.
Alexandre
Magno, por tantos motivos admirado na história do mundo, titulou-se
generalíssimo dos helenos, em plena mocidade, e, numa série de movimentos
militares que o celebrizaram para sempre, infligiu inomináveis padecimentos aos
lares gregos, egípcios e persas; todavia, apesar das glórias bélicas com que
desafiava cidades e guerreiros, fazendo-se acompanhar de incêndios e
morticínios, rendeu-se à doença que lhe imobilizou os ossos em Babilônia.
Aníbal,
o grande chefe cartaginês, espalhou o terror e a humilhação entre os romanos,
em sucessivas ações heroicas que lhe imortalizaram o nome na crônica militar do
Planeta; contudo, em seguida à bajulação dos aduladores e à falsa concepção de
poder, foi vencido por Cipião, transformando-se num foragido sem esperança,
suicidando-se, por fim, num terrível complexo de vaidade e loucura.
Júlio
César, o famoso general que pretendia descender de Vênus e de Anquises,
constituiu um dos maiores expoentes do engenho humano; submeteu a Gália e
desbaratou os adversários em combates brilhantes, governando Roma, na qualidade
de magnífico triunfador; no entanto, quando mais se lhe dilatava a ambição, o
punhal de Bruto, seu protegido e comensal, assassinou-o, sem comiseração em
pleno Senado.
Napoleão
Bonaparte, o imperador dos franceses, depois de exercer no mundo uma influência
de que raros homens puderam dispor na Terra, morre, melancolicamente, numa ilha
apagada, ao longo da vastidão do mar.
Ainda
hoje, os conquistadores modernos, depois dos aplausos de milhões de vozes, após
a dominação em que se fazem sentir, magnânimos para os amigos e cruéis
para os adversários, espalhando condecorações e sentenças condenatórias, caem
ruidosamente dos pedestais de barro, convertendo-se em malfeitores comuns a
serem julgados pelas mesmas vozes que lhes cantavam louvores na véspera.
Todos
Eles, dominadores e tiranos, passam no mundo, entre as púrpuras do poder, a
caminho dos mistérios do sofrimento e dos desencantos da morte. Em verdade,
sempre deixam algum bem no campo das relações humanas, pelas novas estradas
abertas e pelas utilidades de civilização, cujo aparecimento aceleram; todavia,
o progresso amaldiçoa lhes a personalidade, porque as lágrimas das mães, os
soluços dos lares desertos, as aflições da orfandade a destruição dos campos e
o horror da Natureza ultrajada, os acompanham por toda parte, destacando-os com
execráveis sinais.
Um
só conquistador houve no mundo, diferente de todos pela singularidade de sua
missão entre as criaturas. Não possuía legiões armadas, nem poderes políticos,
nem mantos de gala. Nunca expediu ordens a soldados, nem traçou programas de
dominação. Jamais humilhou e feriu. Cercou-se de cooperadores aos quais chamou
"amigos". Dignificou a vida familiar, recolheu crianças ao desamparo,
libertou os oprimidos, consolou os tristes e sofredores, curou cegos e
paralíticos... E, por fim, em compensação aos seus trabalhos, levados a efeito
com humildade e amor, aceitou acusações para que ninguém as sofresse,
submeteu-se à prisão para que outros não experimentassem a angústia do cárcere,
conheceu o abandono dos que amava, separou-se dos seus, recebeu, sem revolta,
ironias e bofetadas, carregou a cruz em que foi imolado e sua morte passou por
ser a de um ladrão.
Mas,
desde a última vitória no madeiro tecida em perdão e misericórdia, consolidou o
seu infinito poder sobre as almas e, desde esse dia, Jesus-Cristo, o
conquistador diferente, começou a estender o seu divino império no mundo, prosseguindo
no serviço sublime da edificação espiritual, no Oriente e no Ocidente, no Norte
e no Sul, nas mais variadas regiões do Planeta, erguendo uma Terra aperfeiçoada
e feliz, que continua a ser construída, em bases de amor e concórdia,
fraternidade e justiça, acima da sombria animalidade do egoísmo e das ruínas
geladas da morte.
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