segunda-feira, 10 de junho de 2013

'Norma de Conduta'



Norma de conduta
Ernani Cabral
Reformador (FEB) Jan 1959

            Os filósofos e os sociólogos, os economistas e os jurisconsultos - todos os homens de pensamento, enfim - se preocupam com o regime político necessário ao seu país e se interessam, patrioticamente, para que melhorem as condições da vida social.

            Os que têm sentimentos bons compreendem que a pessoa não deve pensar só em si mesma, mas esforçar-se para que os demais sejam felizes. Porém todos reconhecem que a solução do problema consiste em evitar-se a exploração do homem pelo homem, contribuindo cada um, na medida de suas possibilidades, para que tal se verifique.

            Ótimo será o regime que não escravize as consciências, que dê liberdade de ação ao indivíduo, mas que, ao mesmo tempo, lhe proporcione meios de viver com decência e com honestidade, numa sociedade onde haja trabalho bem remunerado, assistência aos desvalidos e onde a pessoa possa sentir-se amparada e feliz.

            Todavia, a diversidade das situações econômicas e a complexidade dos problemas angustiantes que afligem a Humanidade criaram um estado de inquietude e de insatisfação, que tem gerado a luta de classes e o desequilíbrio na prática ou na realização de qualquer regime.

            Nós, espíritas-cristãos, reconhecemos que o problema social ou político só se resolverá com o aperfeiçoamento moral do homem. Destarte, louvando aqueles que pretendem melhorar as condições de vida material do indivíduo, afastamo-nos das competições facciosas, a fim de contribuirmos imparcialmente para a cristianização da Humanidade.

            Achamos que o aperfeiçoamento maior é interno; vem de dentro para fora. Assim, as condições sociais melhorarão quando todos sentirem que são irmãos e compreenderem que se devem ajudar, em vez de se combaterem. Consequentemente, que as raças, as doutrinas políticas ou filosóficas e as religiões não sirvam para separar, mas para unir os filhos de Deus, que andam dispersos, como disse o apóstolo (João, 11 :52) .

            O lema enunciado por Hobbes é de que "o homem é o lobo do homem". Mas já o Cristo recomendara, séculos antes: "AMAI-VOS UNS AOS OUTROS." Tal é a norma da redenção e da paz entre os homens.

            Esforçando-nos para difundir as lições de Jesus no seio da sociedade, estamos contribuindo, indireta mas seguramente, para o aprimoramento de nossos costumes sociais e políticos.

            Realmente, como disse o Rabi da Galileia, não se pode servir a dois senhores. Ou o espírita da vanguarda se dedica à difusão do Evangelho ou se preocupa com as riquezas ou com a carreira política.

            É difícil, quase impossível, fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Insistindo, é quase certo que prejudique a ambas as atividades, sem dar o melhor de seus esforços a qualquer delas.

            É certo que temos nossos problemas materiais e não podemos mesmo abandoná-los.  Ao contrário, é necessário que a criatura se esforce em dar um bom padrão de vida à sua família. Cuidar somente de religião, negligenciando os deveres materiais, é fanatismo condenável. A virtude está no equilíbrio, na evolução material e espiritual. Mas, por outro lado, pensamos que, espiritistas ou não, devemos pôr um teto em nossas ambições.

            Há pessoas que, quanto mais dinheiro têm, mais se esforçam por ganhá-lo. Há outras que vivem constantemente endividadas, por causa da multiplicação de seus negócios. Assim, quando descansarão, quando lhes sobrará tempo para as coisas espirituais?

            Outros são vereadores, depois querem ser deputados. Mais tarde viverão angustiados para não se privarem do mandato. Nessas ilusões do mundo, há os que querem ser úteis ao Espiritismo, porém vão gastando energias e perdendo grandes oportunidades de melhor servirem à causa de Deus.

            Não estamos condenando certas atividades lícitas, mas apenas alertando alguns de nossos irmãos sobre a riqueza e a política, que são fontes de desenganos e até de sofrimentos.

            Alguns entendem que nós, espíritas, como cidadãos brasileiros, não nos podemos desinteressar da política. Há que distinguir; como cidadãos brasileiros, podemos interessar-nos pela política; mas, como espíritas, convém evitarmos a política e, sobretudo, não trazê-la para os nossos Centros, pois isto será motivo de desuniões ou de lutas internas, pelas competições partidárias que acarretará.

            Espiritismo é política dos Céus, que não deve ser confundida, nem misturada, com a política da Terra, sempre cheia de segundas intenções, de desejos personalistas e até de ambições desmedidas.

            A melhor política é pregar a transformação moral dos homens, pela palavra e pelo exemplo. Eles melhorarão lentamente e seus processos políticos irão evoluindo, à medida que se forem tornando mais compreensivos e mais fraternos.

            Perceberão então que a intolerância tem causado muitos males à Humanidade e que o adversário, seja qual for, político ou religioso, deve merecer nosso respeito, pois nem todos podemos pensar do mesmo modo e há o direito de divergir, que é característico das democracias. Deus mesmo respeita nosso livre arbítrio e em nada nos força; portanto, temos a obrigação de respeitar a liberdade de pensamento de nosso semelhante.

            Compreenderão ainda os homens, futuramente, que todos somos irmãos, angustiados pelos mesmos problemas, torturados por imperfeições semelhantes, razão por que somos dignos de piedade e não de ódio, que gera sempre o sofrimento e o mal. Sentirão enfim, algum dia, a sublimidade dos ensinamentos do Senhor Jesus e terão a certeza de que, com efeito, só há um remédio; o amor. Ele cobrirá a multidão de pecados e trará a felicidade ao mundo, ainda tão sofredor.

            Assim, enquanto a Humanidade persistir em seus erros, preguemos o Evangelho pela palavra escrita, pela palavra falada e também pelo exemplo de nossa conduta pessoal. Mas falemos aos homens no Evangelho do Cristo "em espírito e verdade", que ensina, não a dominação política, religiosa ou econômica, mas o perdão, a tolerância, a humildade e a compreensão mútua entre os seres humanos. Recordemos a palavra redentora daquele que é "o caminho, a verdade e a vida", como está em Mateus, 16; 24; "Aquele que quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me."



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