terça-feira, 26 de março de 2013

26. 'Fenômenos de Materialização'



26
Fenômenos de Materialização
por   Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942


            "Deve haver alguma razão para essa tão profusa irrigação, essa fertilidade de solo, essa salubridade de clima.

            "Nenhum pais tropical é tão elevado como o Brasil. Essa grande elevação, combinada com os ventos alísios, produz um clima mais fresco e mais salubre do que o das latitudes correspondentes da África e da Ásia Meridional."

            R.R. TANNES, C. FLETCHER E KmER - Narrativas de viagens ao Brasil, 1857 e 1862.

            Este conceito nós o extraímos da apologética de William Stead, nosso confrade, ao papel de Ruy Barbosa no Congresso da Haia, versão portuguesa de Artur Bomilcar, sob o título de - O Brasil em Haia.

            Ainda na mesma obra se nos depara, do célebre geógrafo Eliseu Reclus, um paralelo interessante entre os Estados Unidos do Norte e os do Sul, quer em sua potamografia (estudo, descrição dos rios) , quer na sua orografia (estudo ou tratado a respeito do relevo terrestre), quer no seu desenvolvimento histórico.

            Esse confronto vem de molde a corroborar nossa tese, que abrange de cimo o desdobramento dos povos na laboração do planeta e a elaboração, nele, de tarefas progressivamente ampliativas do alvo imanente e providencial - o amor universal.

            Porque, de resto, o que se verifica é o seguinte: se lá, como aqui, os elementos originários foram idênticos - o branco, o índio, o negro - lá esses elementos cedo se extremaram, com predominância do anglo-saxão e outros ádvenas (pessoa que chega a um lugar. O que não é nascido no país. Estranho, forasteiro; adventício), sem dar os pródromos (primeiros indícios de alguma coisa)  de uma alma coletiva.

            O índio, hoje escassíssimo em seus remanescentes, se ainda existe porventura, é como valor negativo; e o preto, não só psicológica como socialmente considerado, é qual corpo exótico enquistado no organismo nacional.

            Por isso, lá, o problema racial é um espantalho, uma incógnita a desafiar desde já os estadistas providentes e previdentes. Aqui, esse problema está, de há muito, praticamente resolvido e já agora as correntes migratórias, por volumosas, não absorverão a índole psíquica, caldeada em quatro séculos de ininterrupta aproximação e transfusão.

            Expliquemo-nos: o crioulo, seja ele oriundo de sangue europeu, ou asiático (não esquecer a numerosa colônia árabe aqui derramada), seja produto outro mestiço, de qualquer raça adventícia, para logo se revela mais brasileiro, na mentalidade e na cordialidade, do que sírio, italiano ou alemão.

            Nem já as influências da educação doméstica, o extremismo dos costumes têm a força de lhes reter o caráter atávico, o ascendente original.

            No passado, o Visconde de Montezuma e o Barão de Cotegipe, para só falar destes, deram- nos o expoente exato da nacionalidade em floração; hoje, Rodrigues Alves, de origem portuguesa, Lauro Muller, de origem alemã, e Pandiá Calógeras, de origem grega, são figuras que se confundem no mesmo padrão nacional, psiquicamente sintonizadas na compreensão dos nossos destinos políticos e internacionais.

            E os que mais resistem à absorção como, ao que dizem, os alemães, não ultrapassam a resistência da segunda geração.

            Mas, como se dá, afinal, essa identificação psíquica? 

            Pela hereditariedade biogenética, pela influência mesológica, pela comunhão social, civil, política? Absolutamente ...

            O fenômeno aqui evidente assume proporções infirmativas de todas as teorias clássicas da hereditariedade e só a realidade das reencarnações, dentro da nossa tese, pode explicá-lo e mais - justificá-lo.

            Figuradamente, retrocedendo aos primórdios de nossa história, o colono, o conquistador, o guerreiro, ou simplesmente o flibusteiro, aqui aportou ávido de fortuna, de aventura, ou apenas de paz e liberdade.

            O seu primeiro contato com a terra úbere e opulenta, florida e luminosa, foi um deslumbramento!

            A transparência das aguas, o matiz das selvas adustas, a suavidade azul do céu, a policromia dos horizontes, o canto das aves, o perfume das flores, a orquestração dos insetos, a alma dos seres e a alma das coisas, enfim, eis o primeiro abalo de sua alma.

            Ele o sentiu e ficou. Se não ficou, também não se esqueceu jamais.

            Digamos, porém, na generalidade, que ficou e triunfou, ou sofreu, foi vencido e aqui morreu.  Morreu? Não! ninguém morre... Enquanto o arcabouço vigoroso tombava em plena refrega, ou arrefecia naturalmente entre comparsas indiferentes, o Espírito liberto, já afeiçoado ao meio, iluso ainda dos sonhos que o derrancaram do lar e da pátria, erra, circunvaga, paira entre e sobre aquelas grandezas fascinadoras, até que refeito para sondar o passado e balancear o próprio destino.

            E a consciência lhe diz que já não é o cidadão de uma pátria confinada no planeta, mas o cidadão do Universo, o itinerante do Infinito, o filho de Deus!

            Ou ainda: a consciência não lhe diz coisa alguma, nada, e ele apenas sente que pode e deve continuar ali, viver e lutar ali.

            Consciente ou inconsciente, pois, ei-lo a buscar uma lapa, uma furna, uma choupana, uma feitoria, um berço enfim.

            Se era, lá na pátria de antanho, um sonhador, nada lhe impede continue a sonhar aqui: simplesmente, o que sonhou e não realizou lá, pode sonhar e realizar aqui.

            O potencial do Espírito como que se subtiliza na luta e já elementos novos do ambiente novo lhe tonalizam a vontade, lhe apuram, lhe virilizam as faculdades.

            Guerreiro de ontem, arcabuzando, monteando impiedoso o selvícola, que defende galhardo, a peito nu, a taba dos seus maiores, pode ele tornar-se amanhã o defensor heroico dessa mesma taba, para que nele se cumpra a irrefragável, a iniludível quão benéfica lei da reparação.    

            E viverá escravo ou viverá senhor; e virá humilde ou grande, sucessivamente, mas a ficar aqui, a gravitar aqui, a realizar aqui, na esfera de sua capacidade, na gradatividade do seu esforço e do seu mérito, a cooperação de mais altos desígnios morais, sociais, políticos, históricos, cada vez mais identificado com essa aura espiritual que afina, burila, estratifica a alma das nacionalidades, o espírito das raças, até que, finalizada a sua missão, essa alma se dispersa, ou se desloca, na consecução de novas conquistas planetárias, ou para novos planos siderais...

            Assim é que, um povo insignificante mas psiquicamente sintonizado - o hebreu, nos legou o Monoteísmo prático (1).

            (1) Sobre a destinação do povo hebreu em perfeita identidade com este nosso ponto de vista, decorridos que são 15 ans da fatura deste nosso trabalho, vale recomendar o que a respeito aduz Emmanuel em – A Caminho da Luz.

            Assim é que a Grécia unida nos deu o patrimônio da Ciência, da Filosofia, da Arte.

            Assim é que Roma nos deu, na unidade da sua força, o Direito e a Política.

            Assim é que a França elaborou a consciência da Liberdade humana.

            Assim é que a Inglaterra nos deu, e ainda mantém, um grande império colonial.

            Assim é que os Estados Unidos da América esboçam a construção - uma nova construção político-industrial, um progresso material tendente a suavizar as agruras da vida física planetária.

            E assim é que o Brasil - a terra de Santa Cruz, nos vaticina uma civilização original, uma pátria de comunhão espiritual, na qual todos os patrimônios e conquistas se confundem e se amolgam à improvisação de um Novo Estado, que assinale à Humanidade enferma o início de uma Nova-Era, de uma Égira-Nova.

            Sim! nós o cremos e pressentimos: daqui, ao influxo de Espíritos elevados, partirá o exemplo de que essa entressonhada e tão violentamente requestada Democracia só deixará de ser aspiração teórica, quando os homens assimilarem e praticarem, em espírito e verdade, os Evangelhos de N. S. Jesus Cristo.



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