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“O Cristianismo do Cristo
e o dos seus Vigários...”
Autor: Padre Alta (Doutor pela Sorbonne)
Tradução de Guillon Ribeiro
1921
Ed. Federação Espírita Brasileira
Direitos cedidos pela Editores Vigot Frères, Paris
"Que é o Terceiro Estado? Nada!
Que deve ele ser? Tudo!" bradava Síéyès nos Estados Gerais, em 1789,
Evidentemente, Siéyès não era matemático, pois o terço não é o todo e, para
fazer o todo, são precisos os dois outros terços. Mas, Siéyès era padre e fora
educado pelos Jesuítas. Tinha, a cerca da Igreja, a noção que definitivamente
seus mestres lhe incutiram e se propunha a aplicá-la ao Estado.
Na
primeira hora da história da Igreja, diziam os apóstolos: "Somos delegados
para pregar a palavra de Deus. Quanto às coisas administrativas, escolhei
dentre vós sete homens inteligentes e cheios do Espírito de Deus, aos quais
confiaremos esse encargo" (27).
(27) Atos
dos Apóstolos, VI
Como
já tive ocasião de dizer, foram as reclamações dos cristãos helênicos que
ocasionaram essa criação eclesiástica. Um pouco mais tarde, ainda por causa dos
Gregos, foram precisos doutores capazes de apresentar o Cristianismo como uma
filosofia e não apenas como moral religiosa. Achavam-se assim
constituídos, quando S. Paulo escreveu aos Coríntios, por volta dos anos 53 e
54, as três ordens incumbidas de dirigir os fiéis:
1º Os inspirados: apóstolos, profetas,
evangelistas.
2º Os intelectuais: doutores e instrutores.
3º Os administradores: diáconos, presbíteros,
bispos.
Assim
o título, como as funções de bispo, muito menos honorÍficas do que hoje, eram
atribuídas, não a um só; mas a muitos, em cada comunidade cristã um pouco
numerosa .
Esses
administradores eram, então, na Igreja - abaixo dos profetas e dos doutores - o
que eram na França, quando da Revolução, os a quem se chamava "o Terceiro
Estado", denominado hoje "a Burguesia".
Assim,
quando a Igreja realizava o sentido de seu nome - Igreja é uma palavra grega
que significa Escol - havia, acima dos bispos, não um papa - São Paulo, em sua
Epístola aos Gálatas, mostra, muito claramente, que ele se reconhecia no
direito e, algumas vezes, no dever de resistir S. Pedro - mas os inspirados de
Deus e os doutores. Inspiração, ciência,
administração eram as três forças diretoras da Igreja e todos limitavam
suas ambições, segundo o mandato conferido por Jesus Cristo, a ser "o sal da
terra".
Porém,
como já eu vos disse, como já vos demonstrei positivamente, quando, mais tarde,
foram trazidos ao Cristianismo, não por inspiração do Espírito Santo, sim por
agradar ao imperador Constantino, multidões cuja quantidade fatalmente excluía
a qualidade, os administradores também fatalmente assumiram maior importância e
logo, modelando a organização da Igreja pela do Império, fizeram no Catolicismo
uma revolução precisamente às avessas da que em 1789 foi feita na França,
porquanto, em vez de destruir a realeza, que não existia na Igreja, arranjaram
as coisas de modo que ela constituísse uma realeza. Unicamente a luta entre
Roma e Constantinopla retardou a realização da empresa. Desde, porém, a
primeira reunião, sob a presidência de Constantino, daqueles Estados Gerais
chamados Concílios Ecumênicos, os 318 bispos que compuseram o de Niceia, isto
é, os administradores
eclesiásticos, fortes pela proteção do imperador,
para nitidamente significarem que, dali em diante, tudo na Igreja lhes
pertencia, cortaram oficialmente as questões filosóficas, que o espírito de
potência dos Gregos suscitara, a propósito da unidade de Deus. Mais tarde, continuaram a fazer o mesmo em Constantinopla, em
Êfeso, na Calcedônia, etc., a propósito de todos os mistérios: Trindade,
Encarnação, Redenção, etc., até que, em 1870, o último dos Estados Gerais
eclesiásticos, abdicando todos os direitos, os enfeixou oficialmente nas mãos do Soberano Pontífice.
Como
foi que, dos 318 autoritários do ano 313, o poder eclesiástico passou ao único
administrador de 1870 e de agora? Eis de que modo as coisas se deram.
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