domingo, 5 de agosto de 2012

4. 'Amor à Verdade'


4
“Amor à Verdade”
por Alpheu Gomes O. Campos
Marques Araújo & C. – R. S. Pedro, 216
1927


            Passados dias, pensamos: se não houve logro e as almas se serviram da mesa para respostas inteligentes, isso não constitui privilégio de ninguém e, tomadas as necessárias cautelas, também a nós nos atenderão. De fato, logo no primeiro ensaio, obtivemos, com surpresa, fenômenos de levitação e satisfatórias respostas a quanto desejamos saber.

            Com regularidade nos entregamos às observações, até que um dia, perguntando á entidade que movimentava a mesa o que pretendia, recebemos o seguinte: “Instruir-vos talvez ... “ Ao que respondemos: o processo é moroso e fatalmente despenderíamos um tempo demasiado longo para alcançar o objetivo. A esta objeção, a mesa, movendo-se, por meio das pancadas convencionais, forma a palavra – “Escrevei”.

            Emocionado e ao mesmo tempo receoso, neófito que éramos, vacilamos.

            À vacilação sobreveio uma vontade grande de perscrutar o desconhecido e, resoluto, convidamos um amigo, que sabíamos versado em coisas do espiritismo, para assistir á experiência.

            Tomando um lápis e um bloco de papel, sem perdermos a noção do que se passava em derredor de nós, calmo, em pleno gozo das faculdades, sentimos deslizar a mão sobre o papel, imprimir com o lápis um longo traço e, voltando sempre à origem das linhas, iniciar, lauda abaixo, uma série de exercícios caligráficos, logo substituídos por um ditado que ocupou 12 paginas do bloco.

            Importa acrescentar que, enquanto isto se dava, a trechos conversávamos, o amigo e nós, sem que a mão estacasse nem a mensagem sofresse.

            Satisfeito com o resultado, procuramos adquirir as obras de Allan Kardec, segundo foram aconselhadas para nossa educação.

            Dividido o tempo entre os afazeres e o curso do sexto ano médico, líamos, contudo, sempre que se oferecia ensejo, o Evangelho com a sua interpretação espirita.

            Poucas semanas corridas, começamos a ouvir vozes, distintas extremamente umas das outras, e não estranhas algumas a nosso ouvido.

            Sobressaltámo-nos (não era para menos), e muito sofremos.

            Não acabávamos de compreender como aquilo era, se nenhum ser material, conforme dizemos, nos falava. Supusemo-nos vítima de uma alucinação, pelo que não raro nos sondávamos com resolver problemas de matemática elementar.

            Redobramos os estudos sobre a doutrina e os fenômenos intensificando igualmente as lucubrações no ramal da psiquiatria.

            Frequentando assiduamente as aulas da faculdade e dos hospitais, atento a qualquer observação da parte dos colegas, era continua e torturante a expectativa de uma desilusão, que sentíamos sobre a cabeça como a espada de Dâmocles.

            As falações continuavam: a princípio frívolas; depois, grosseiras; mais tarde, conselhos e insistentes convites para deixarmos a terra, pois na morte encontraríamos a paz e o bem estar.

            Tal estado de coisas durou semanas, até que, certa noite, se fez entender uma voz toda carinho, inconfundivelmente diversa das outras, anteriormente ouvidas.

            Disse-nos: “Pediste, em uma prece, provas da nossa imortalidade. Não foi em pura perda a rogativa. Aí tens a chave do problema da vida. É saber tirar dela todo o proveito necessário à tua real felicidade. Passaste por uma provação, que neste momento chega ao termo. Não ouvirás doravante.

            Crê em Deus e ama a teu próximo. O Pai te abençoe. Adeus”.

            Satisfeito nosso pedido a Deus! nossa prece ganhara os céus! deferida afinal!

            Daí por diante refulgimos comunicações e perseveramos na leitura de Kardec; em 17 de Março de 1910, sentindo impulso para a escrita, recebemos o ditado seguinte:

            “Em bem da verdade tudo deve ser explicado, tudo deve ser devassado.
             Não tenhas receio do teu modo de pensar. Deus tudo vê. Deus tudo prevê e evita os males quando desnecessários.
            Na tua peregrinação sobre a Terra, que já também me serviu de escola, terás que julgar muitas vezes o caráter dos homens e por isso não ficarás valendo menos, nem odiado, porque só Deus e os Espíritos superiores podem, com justiça, julgar.
            Não tenhas excessivo medo de errar; porque o homem é falível, como falível é o planeta, que constantemente muda na sua textura e estrutura.
            Olha as convulsões intestinas do orbe, dando em resultado mortes em massa, a destruição de cidades inteiras.
            Não vês as revoluções sobre a superfície das águas, das terras, das cidades, dos povos?!
            Tudo é ordenado por Deus, porque nada disto é real, puro, definitivo.
            Não prejudiques a marcha do mundo, não contribuas para o desrespeito às leis divinas, ama não o ouro e o bem estar individual, mas a Deus, aos homens, aos Espíritos, principalmente aos infelizes, que são também nossos irmãos, filhos da mesma fonte de Bondade.
            Eu sou um desconhecido teu nesta vida, sou um amigo da família humana e da verdade, e por isso venho comunicar-me contigo, a quem de há muito sigo, animado pelo firme proposito de guiar-te, não como um anjo, um pai, mas um colega, um feliz que encontra em ti elementos para receber a semente que, por vontade divina, está em tempo de ser lançada.
            Agora, pelo que fica dito, adoptarei sempre, em toda comunicação, o pseudônimo de

                                                                                              Amor à verdade


            Estava dado o primeiro passo na estrada nova.

            Iam-se desenrolar aos nossos olhos coisas assombrosas, com força de varrer, para sempre, da nossa imaginação, o chamado mistério.




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