Calamidades
Salvadoras
Malgrado toda a cultura que já
amontoaram, os homens ainda não conseguem nem entender nem enfrentar as coisas
comezinhas que fazem parte integrante de sua estada na crosta terrena. Bem o
demonstra o estupor que lhes causam as ocorrências que aparentam decorrer da
atuação de forças cegas e caprichosas, rotuladas de fatalidade. A dificuldade,
para os encarnados, reside no fato de não possuírem uma concepção firme e
racional de suas próprias condições de vida neste «vale de lágrimas», a
despeito de todos os protestos que fazem de suas convicções espiritualistas e
de sua crença na imortalidade. De fato, para aqueles que reduzem a uma vida
única, no plano terráqueo, o mecanismo de ação duma justiça, perfeita e
Iniludível - toma-se totalmente incompreensível um acontecimento como o
pavoroso incêndio ocorrido no Edifício Joelma, na cidade de São Paulo, onde
perto de 200 pessoas foram arrebatadas da vida pelos processos mais dolorosos,
sendo a grande maioria constituída de jovens que despontavam para o porvir.
Diante de quadros como esse é que se
pode averiguar a solidez e a justeza da Doutrina Espírita, cujas virtudes
consoladoras se realçam exatamente nessas contingências, pois só mesmo a ideia
das vidas sucessivas pode asserenar o pensamento atordoado dos homens,
fazendo-os entrever a justiça imanente na trama dos fatos cuja brutalidade
inesperada os faz descambar, muita vez, para o desespero, a dúvida, e até a
descrença. A reencarnação põe à mostra a dinâmica da justiça perfeita e infalível,
a desenrolar-se através da lei de ação e reação, que, em suas determinantes,
sujeita, sempre e inapelavelmente, a colher segundo o que se planta. E a
exatidão desse mecanismo alcança tanto os atos cometidos individualmente quanto
aqueles praticados coletivamente. Por isso mesmo, aquilo que aos olhos dos
homens são terríveis coincidências, a reunirem num dado local e no mesmo
momento criaturas as mais diversas, provenientes das mais distanciadas
procedências, conhecidas ou desconhecidas, e impelidas pelas mais fortuitas
razões, são, na verdade, dispositivos providenciais
que agrupam Espíritos com débitos contraídos em comum e chamados, portanto, no
momento oportuno, a resgatarem conjuntamente as responsabilidades assumidas em
parceria.
Se meditarmos bem, é de se agradecer
a Deus a irrupção dessas calamidades imprevisíveis, cujas causas imediatas não
possam ser imputadas à ação deliberada dos homens, Porque mil vezes mais
sinistras são aquelas ocasionadas pela cegueira e pela inópia moral dos homens,
como as guerras desencadeadas pelo egoísmo e pelas paixões coletivas, pelo
patriotismo inumano que conduz nações inteiras a se digladiarem e exterminarem,
e que ainda faz que os patriotas estufem o peito de orgulho, por dizimarem o
inimigo, arrasando suas cidades, ou por morrerem heroicamente ...
Deplorável, nesse particular, o
espetáculo que ainda oferece o mundo nos dias presentes. Ignorante ou alienada
das coisas do espírito, da realidade de si mesma, a humanidade continua a
movimentar o carrossel do círculo vicioso e carreando, para si mesma, os ônus
das dores repetitivas, inteiramente desatenta, para sua própria infelicidade, à
profunda advertência do Mestre Divino, quando disse: «O escândalo é necessário,
mas ai daquele por quem vier o escândalo! ... » Há, contudo, que se refazer dos
golpes dolorosos.
Os
desígnios do Pai Celestial são sempre magnânimos e impregnados de misericórdia,
que começa por balsamizar as angústias daqueles que são atingidos pela
severidade da lei. Misericórdia que impele a todos, igualmente, nas linhas da
evolução infinita, à conquista das galas da intelectualidade iluminada e do
sentimento sublimado, quando então, sabendo senhorear todas as forças da
Natureza e sendo os manobreiros dos próprios destinos, estarão livres das inferioridades
e liberados, em definitivo, de suas funestas consequências.
Editorial de ‘Reformador’ (FEB) (Março 1974)
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