segunda-feira, 23 de abril de 2012

Calamidades Salvadoras


Calamidades
Salvadoras


            Malgrado toda a cultura que já amontoaram, os homens ainda não conseguem nem entender nem enfrentar as coisas comezinhas que fazem parte integrante de sua estada na crosta terrena. Bem o demonstra o estupor que lhes causam as ocorrências que aparentam decorrer da atuação de forças cegas e caprichosas, rotuladas de fatalidade. A dificuldade, para os encarnados, reside no fato de não possuírem uma concepção firme e racional de suas próprias condições de vida neste «vale de lágrimas», a despeito de todos os protestos que fazem de suas convicções espiritualistas e de sua crença na imortalidade. De fato, para aqueles que reduzem a uma vida única, no plano terráqueo, o mecanismo de ação duma justiça, perfeita e Iniludível - toma-se totalmente incompreensível um acontecimento como o pavoroso incêndio ocorrido no Edifício Joelma, na cidade de São Paulo, onde perto de 200 pessoas foram arrebatadas da vida pelos processos mais dolorosos, sendo a grande maioria constituída de jovens que despontavam para o porvir.

            Diante de quadros como esse é que se pode averiguar a solidez e a justeza da Doutrina Espírita, cujas virtudes consoladoras se realçam exatamente nessas contingências, pois só mesmo a ideia das vidas sucessivas pode asserenar o pensamento atordoado dos homens, fazendo-os entrever a justiça imanente na trama dos fatos cuja brutalidade inesperada os faz descambar, muita vez, para o desespero, a dúvida, e até a descrença. A reencarnação põe à mostra a dinâmica da justiça perfeita e infalível, a desenrolar-se através da lei de ação e reação, que, em suas determinantes, sujeita, sempre e inapelavelmente, a colher segundo o que se planta. E a exatidão desse mecanismo alcança tanto os atos cometidos individualmente quanto aqueles praticados coletivamente. Por isso mesmo, aquilo que aos olhos dos homens são terríveis coincidências, a reunirem num dado local e no mesmo momento criaturas as mais diversas, provenientes das mais distanciadas procedências, conhecidas ou desconhecidas, e impelidas pelas mais fortuitas razões, são, na verdade, dispositivos providenciais que agrupam Espíritos com débitos contraídos em comum e chamados, portanto, no momento oportuno, a resgatarem conjuntamente as responsabilidades assumidas em parceria.

            Se meditarmos bem, é de se agradecer a Deus a irrupção dessas calamidades imprevisíveis, cujas causas imediatas não possam ser imputadas à ação deliberada dos homens, Porque mil vezes mais sinistras são aquelas ocasionadas pela cegueira e pela inópia moral dos homens, como as guerras desencadeadas pelo egoísmo e pelas paixões coletivas, pelo patriotismo inumano que conduz nações inteiras a se digladiarem e exterminarem, e que ainda faz que os patriotas estufem o peito de orgulho, por dizimarem o inimigo, arrasando suas cidades, ou por morrerem heroicamente ...

            Deplorável, nesse particular, o espetáculo que ainda oferece o mundo nos dias presentes. Ignorante ou alienada das coisas do espírito, da realidade de si mesma, a humanidade continua a movimentar o carrossel do círculo vicioso e carreando, para si mesma, os ônus das dores repetitivas, inteiramente desatenta, para sua própria infelicidade, à profunda advertência do Mestre Divino, quando disse: «O escândalo é necessário, mas ai daquele por quem vier o escândalo! ... » Há, contudo, que se refazer dos golpes dolorosos.

             Os desígnios do Pai Celestial são sempre magnânimos e impregnados de misericórdia, que começa por balsamizar as angústias daqueles que são atingidos pela severidade da lei. Misericórdia que impele a todos, igualmente, nas linhas da evolução infinita, à conquista das galas da intelectualidade iluminada e do sentimento sublimado, quando então, sabendo senhorear todas as forças da Natureza e sendo os manobreiros dos próprios destinos, estarão livres das inferioridades e liberados, em definitivo, de suas funestas consequências.



Editorial deReformador’ (FEB) (Março 1974)





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