Entre
Dois Mundos
Estendera o Eterno, de um a outro
extremo, a sua potência criadora - desde os puros espíritos até à matéria
bruta.
Desde a mais alta vida intelectual -
até à mais profunda negação do intelecto.
Entretanto, não atingira ainda o
Eterno o extremo limite da sua divina audácia ...
Restava-lhe ainda o mais temerário e
paradoxal de todos os atos - a união do espirito e da matéria.
Seria possível fundir em um único ser
a luz dos puros espíritos - e a noite da matéria inerte? ...
Reduzir a uma síntese essas duas
antíteses?. ..
''E disse o Senhor: Façamos o homem
- e fez Deus, da substância da terra, um corpo e inspirou-lhe na face o
espírito vivente" ...
E ergueu-se, no meio da natureza
virgem, esse paradoxo ambulante, esse enigma anônimo, essa indefinível esfinge,
semianimal e semi anjo - o homem ...
Quando os espíritos celestes viram o
homem, exultaram sobre a sua grandeza - e choraram sobre a sua miséria ...
Cristalizaram-se, na alma humana,
essas centelhas de júbilo e essas lágrimas de dor - e formaram um mar imenso
de doce amargura e inextinguível nostalgia ...
Principiou, então, neste mundo
visível, a luta entre a luz e as trevas - entre o bem e o mal ...
A história da humanidade ...
Têm os puros espíritos sua pátria -
lá em cima ...
Tem
a matéria bruta sua sede - cá embaixo ...
Mas onde está a pátria do
espírito-matéria?. ..
Na terra? - protesta o espírito!
No céu? - protesta a matéria!
Entre o céu e a terra? - mas lá se
erguem os braços duma cruz!
É por isto mesmo que o mais humano e
mais divino dos homens expirou entre o céu e a terra - na sua pátria
cruciforme ...
"Não havia lugar para ele"
- em outra parte ...
E é por isto mesmo que os melhores
dentre os homens são sempre crucificados ...
Não os compreende a terra - nem os
acolheu ainda o céu ...
E assim, entre o céu e a terra, vive
o homem esta vida dilacerada de angústias e paradoxos.
Sem pátria certa...
Em perene exílio...
Oscilando entre a matéria e o
espírito ...
Lutando...
Sofrendo...
Amando...
Até que a matéria volte à matéria
...
E o espírito ao Espírito ...
Solvendo o enigma ...
Sintetizando dois mundos ...
Em Deus ...
Huberto
Rohden
in “De Alma para
Alma”
(Ed. União
Cultural Editora 1956)
Nenhum comentário:
Postar um comentário