sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

12 'Doutrina e Prática do Espiritismo'




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            A existência desse corpo etéreo, afirmada nos lampejos de seu descortino clarividente por S. Paulo, sob a denominação de "corpo espiritual", e pressentida pelo grande filósofo inglês Cudworth, que reconhecia a necessidade de um mediador plástico, no homem, que fosse o laço de união entre a matéria e o espírito teve a sua consagração definitiva nas observações da psicologia experimental, particularmente nas experiências do coronel de Rochas, a que no capítulo anterior nos referimos, em virtude das quais a exteriorização do ser humano, revestido de uma certa substancialidade que reproduz o fantasma ou a forma vaporosa do indivíduo adormecido, pode ser, sem exagero considerada uma verdade cientificamente comprovada.

            Estabelecida assim a realidade objetiva do perispírito, no homem, devemos por nossa parte confessar que o seu valor ou, mais propriamente, o papel que desempenha na dupla economia, do organismo e das faculdades e aquisições do espírito, não nos parece definitiva e perfeitamente fixado, não obstante os ensaios teóricos a tal respeito formulados, o que não admira, atendendo-se de um lado, à exiguidade dos meios de que, se tem podido dispor para essa pesquisa, de resto só recentemente empreendida com um certo cunho de sistematização, e de outro à obscuridade do domínio em que se exercem e irradiam as operações daquele agente imponderável.

            A ciência contemporânea só se havia, até a pouco, limitado a estudar a matéria em seus aspectos mais grosseiros e perceptíveis daí a desdenhosa sobranceria com que repudiava - sem todavia examina-la - a afirmação do Espiritismo acerca do corpo sutil, ou perispírito. Com as recentes descobertas, porém, de modalidades da substância, ou melhor, da energia universal, até então desconhecidas para ela, desde o "estado radiante", verificado por William Crookes, e as experiências do casal Curie, de Becquerel, Ramsay, etc., sobre o radio e a radioatividade dos corpos, até às observações de Gustave Le Bon relativamente à dissociação dos átomos, atestando a "desmaterialização da matéria ", em vésperas assim de ser surpreendida em sua identificação com a energia, em cuja imponderabilidade vem afinal a resolver-se, é de esperar que já lhe não cause tanta estranheza a existência, que afirmamos, daquele corpo etéreo, constituído de matéria quintessenciada. Porque, se a matéria pode existir em estados extremamente rarefeitos no imenso reservatório do universo, nada impede que, sob a ação de leis naturais, mal definidas ou ignoradas da ciência, dIa se organize em corpos de linhas determinadas, posto que invisíveis. E, se se pode apresentar, sob a forma de vibrações ultra sensíveis (radioatividade) , em corpos brutos, como o rádio, o urânio, o tório, o mesotório[1] e tantos outros, porque não admitir que possa, com uma forma definida, coexistir no homem, que é certamente o mais radioativo, não já de todos os corpos, senão de todos os seres vivos? E que são os eflúvios ódicos, reconhecidos e até fotografados, nas experiências de Reichenbach, senão o testemunho de que o corpo humano, envolto numa atmosfera fluídica, imperceptível aos sentidos ordinários, emite vibrações da mesma natureza, que têm ali a sua sede?

            Se, pois, a realidade objetiva do perispírito já não estivesse demonstrada, as modernas investigações da físico-química, a que aludimos, patenteando aspetos extremamente rarefeitos da substancia e da energia, seriam de molde. a fazer, pelo menos, admitir a sua possibilidade. Mas essa demonstração - insistiremos - não está, felizmente, por fazer.

            O que resta é pesquisar mais acuradamente as particularidades da sua natureza e determinar com precisão, tão rigorosa quão possível, o seu funcionamento, o seu papel e - porque não? - também o seu destino subordinado indubitavelmente à grande lei de evolução, que tudo rege.

            Será essa - não o duvidamos - a magna tarefa da ciência de amanhã, desembaraçada de escravizadores preconceitos de escola e de sistema, em trânsito para as supremas cogitações da espiritualidade, em que hão de forçosamente culminar as suas investigações.

            Até lá, que nos seja permitido, a todos os pesquisadores independentes da Verdade, antecede-la, como de resto, há meio século, o tem feito o Espiritismo - na sondagem desses domínios da hiper-física e do ignoto, valendo-nos para isso dos testemunhos, da observação direta, até onde a possamos conduzir, mas não desprezando por igual os subsídios da analogia e as leis do raciocínio, a cujos ditames têm os próprios ensinamentos da Revelação que ser submetidos.

            No que se refere particularmente ao períspirito, o seu papel, como o dissemos, ainda não parece positiva e satisfatoriamente definido, assim no ponto de vista fisiológico, de que teremos ocasião de nos ocupar no capítulo a seguir, como em suas funções de natureza psíquica.

            Pretendam estudiosos e, mesmo, eruditos expositores da doutrina espirita que é nesse involucro etéreo que se fixam in perpetuum, não somente as imagens, impressões e sensações. Percebidas pelo indivíduo, como todas as suas aquisições intelectuais, constituindo um arquivo permanente e indelével, suficiente para explicar os fenômenos e o mecanismo da memória, mesmo relacionada com um passado remoto, anterior a esta vida.

            Por sua intima conexão com o corpo físico, de que pode ser considerado um substrato, sem dúvida o perispírito, graças à tonalidade vibratória com que, no homem, funciona em relação ao cérebro; registra todas as imagens, percepções e sensações que a este se transmitem, as quais, não se limitando a gravar-se nas células cerebrais, em perpetua instabilidade, como ficou indicado, se propagam aquele invólucro sutil, em que se vão sucessiva e fielmente fixando. E vimos, a propósito da clarividência psicométrica, por exemplo, que é no aura que envolve o individuo, constituindo a sua efluviação ódica[2] ou - o que preferimos - a sua irradiação perispirital, que o psicômetra lê, de par com as tendências e qualidades morais que se lhe revelam, a história ou pelo menos sucessos coordenados da existência do indivíduo.

            Mas, se é unicamente nesse invólucro fluídico que, depois de transitar pelo cérebro, se insere definitivamente a complexa trama de todos os movimentos sensoriais e psíquicos do homem, e se é esse involucro a condição sine qua non da memória, subsiste à mesma impugnação, que formulamos acerca da gradação das reminiscências, em relação ao cérebro, considerado como único registrador da atividade psíquica isto é : se as impressões se fixam em camadas sucessivas, embora de variada intensidade, ou o sejam unicamente no cérebro, como pretendem os materialistas , ou, através dele, no perispírito, como o afirmamos os espíritas, de todo modo as mais recentes deveriam ser também as mais vivazes. E - repetimos - não é isso positivamente o que se dá.

            A memória não pode ser, conseguintemente, o resultado de uma ação puramente mecânica de fixação de imagens ou impressões numa tela mais grosseira (cérebro, no corpo físico) ou mais sutil (perispírito), senão um fato de consciência e de atenção.

            Importa, ao demais, considerar que, se o perispírito é constituído de matéria, embora quintessenciada, aglomerado, portanto, de átomos, ou ainda de íons e elétrons (denominações adotadas pelos modernos investigadores da físico química, para indicar as subdivisões ultramicroscópicas resultantes da fragmentação dos átomos), forçoso é admitir a dissociação dos seus elementos, posto que num prazo excessivamente longo, tal como se dá com os corpos radioativos de que falamos, cuja dispersão – digamo-lo assim - segundo os cálculos daqueles investigadores, reclamará muitos milhares, senão milhões de anos para se efetuar, considerada a extrema lentidão por eles reconhecida em tal processo,

            Quer isso dizer que o perispírito, como toda forma particular da energia-substância, também se modifica e evolui,  desassimilando partículas de sua composição e – quem sabe? – assimilando outras. Que essas modificações se operem com tão grande lentidão que sejam imperceptíveis no prazo de uma vida, não temos duvida em admitir, em afirmar até. Convém, todavia, não perder de vista esta consideração, quando se tratar de apreciar o papel do perispírito através as épocas milenárias a que é possível fazer recuar a sua evolução, em trânsito pelas quais o temos visto, nos trabalhos dos aludidos expositores da doutrina espírita, assinalado como a uma coisa de permanente e inalterável, ou pelo menos como um registro indelével das aquisições do ser, em toda as ordens da criação.

            Mas não é ainda aqui o lugar de abordarmos esses transcendentes aspectos do problema.        

            Dizíamos que a memoria só pode ser um fato de consciência e de atenção. De atenção, porque do grau desta, mais ou menos intenso, é que resulta, por sua vez, a maior ou menor intensidade das imagens, percepções e impressões na retentiva da memória, o que explica que na infância e na primeira mocidade, fixando-se a atenção com interesse em todas as coisas, sob os estímulos da curiosidade, se conserve nítida a lembrança, pelo menos das que mais particularmente a impressionaram, ao passo que na velhice, crescendo a indiferença, agravada com os desgostos, pelas solicitações do mundo, a atenção se retrai, concentrando-se de preferência no mundo subjetivo da saudade ou no substrato das experiências penosamente adquiridas. Daí o tornar-se a memória indecisa e muitas vezes falha em relação às coisas e às perspectivas ambientes.

            E é um facto de consciência, porque, transitando embora pelo duplo veículo, sensorial (no cérebro) e psíquico (no perispírito) , a imagem, percepção ou impressão só adquire realidade ao atingir o Ego, em que se fixa. Ora esse Ego, inconfundível com qualquer dos envoltórios que o revestem, é que constitui propriamente o espirito.



[1] Do Blog: intermediário radioativo.
[2] Do Blog: Corpo bioplasmático.



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