A escolha de uma cruz
Reformador (FEB) 15.12.1919
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Ao longo de um caminho pedregoso que tornava mais intenso o calor do sol, um peregrino que caminhava, levando à custo a cruz de sua vida, sentindo-se sem forças, arquejante, murmurou consigo:
“- É bem pesada a cruz que Deus me dá... Oh! eu bem sei que todos nós precisamos de uma cruz para nos assemelharmos a Jesus Cristo; mas, a que carrego, me esmaga! Meu Deus! Meu Deus! Não me podereis aliviar o fardo?!”
E um profundo sono apoderou-se dele, e ele viu, então, rodeado de uma luz brilhante, Jesus Cristo que lhe sorria, dizendo-lhe com voz suave:
“-Querias uma outra cruz que não fosse a tua?”
“-Oh! Sim, Senhor! Sou um pobre velho e não posso mais! Vede, há 60 anos que eu caminho, carregando a cruz que Vós me destes e que, por isso, eu amo, não obstante o seu peso, mas Senhor...”
“-Vem comigo, meu filho...”
E, de súbito, ele achou-se diante de uma vasta gruta; e então o Senhor lhe disse:
“-Aí se acham, reunidas, todas as cruzes que, por misericórdia do Pai, devem abrir aos homens as portas do paraíso, põe a tua cruz ao chão, entra, e escolhe aquela que mais te convier.”
O peregrino entrou e, admirado, estacou diante duma multidão de cruzes carregadas desde o princípio do mundo e que deveriam ser levadas até o fim dos séculos.
Durante muito tempo ele as examinou: pesava umas, experimentava outras, carregava e tornava a deixar, sem se decidir por nenhuma.
Eram a cruz do remorso, a cruz da inveja, a cruz da ingratidão - as cruzes das famílias desunidas - da doença, da calúnia, da discórdia, da traição, etc.
E a cada uma dessas cruzes ele dizia: “-Não, esta não; será preciso, meu Deus, que eu a escolha?!...”
“-Sem cruz na Terra, não terás coroa no céu!” Disse-lhe Jesus.
O peregrino voltou, examinou de novo todas as cruzes e procurou ainda uma que lhe pudesse convir; mas, desanimado, curvou a cabeça.
“-Olha”, disse-lhe a doce voz de Jesus; e ele distinguiu, perto da entrada da gruta, no solo, uma cruz que o atraiu; ergueu-se e um suspiro de paz se lhe escapou dos lábios.
“-Parece que esta eu poderei carregar: ela é bem menos pesada que as outras. Poderei tomá-la, Senhor?”
“-Tome-a”, respondeu Jesus.
Ele estendeu os braços para erguê-la e soltou um grito; era a sua, a cruz que Deus lhe havia dado em sua misericórdia, a cruz que ele tinha deixado como pesada demais!
Oh! Vós a quem o sofrimento longo, penoso, humilhante, arranca uma queixa amarga, uma murmuração, talvez, ò pobre alma, sob o diáfano véu da alegria, vede Jesus, não somente indicando-vos a cruz que deveis levar, mas Ele próprio depositando-a fraternalmente sobre os vossos ombros e ajudando-vos a sustentá-la para que ela não descarregue sobre vós todo seu peso.
Tomai, pois, a vossa cruz e não a chameis simplesmente minha cruz, mas ‘minha boa cruz’. Ela foi criada para vós, somente para vós.
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