sábado, 30 de abril de 2011

01 Escravidão e Espiritismo




Em 13 de Maio de 1988 comemorou-se o 1º Centenário da Libertação dos Escravos no Brasil. A fim de ressaltar esse evento de grande significado social e espiritual para a Pátria do Evangelho, Alberto de Souza Rocha escreveu uma série de artigos sobre o magno assunto, cuja publicação ‘Reformador’ iniciou em Dezembro de 1987.

A Escravidão 
na História da Humanidade

por Alberto de Souza Rocha

Reformador (FEB) Dezembro 1987

            Ao desabrochar da razão, e por isso mesmo, o homem cedo percebeu que poderia economizar as próprias forças e intuitivamente utilizou os primeiros insti’ntos, ainda rústicos, dando um passo decisivo no caminho do progresso a que se destinava no volver dos milênios. De suas mãos ainda grosseiras nascia o protótipo da máquina. Num segundo tempo, poderemos dizer, uitilizou-se, para isso, dos animais, domesticando-os, pondo-os a seu serviço. Com a instituição do Estado, mais tarde, ampliando-se o nicho em tribo e estas em áreas de dominação, a conquista e a pilhagem assumiram proporções de poder; o poder de grupamentos humanos sobre outros. As disputas já poderiam chamar-se guerras. Os derrotados não apenas pagariam com muitas vidas a sua eventual inferioridade bélica, mas com a sua dependência. Cobravam-se altos tributos e até meso as suas terras estariam sob o domínio dos conquistadores. Surgiram os primeiros impérios. Era uma forma essa que, embora dolorosa, serviu para a miscigenação dos costumes e disseminação das culturas primitivas. Não satisfeitos, porém, os dominadores teriam ainda  seu serviço o braço do vencido, a quem não reconheciam habitualmente os mais comezinhos direitos humanos. Eram estes os escravos. Mulheres jovens e belas submetiam-se a vexames, servindo à concupiscência dos conquistadores. A Bíblia reporta-se a esses fatos e também os romances de época o fazem. Vendiam-se pessoas dominadas pela força bruta e até em emboscadas, para trabalhos forçados em minas, para a lavoura, para a guerra ou para serviços domésticos. Em Roma, escravos vigorosos eram gladiadores e expunham suas vidas para gáudio dos patrícios. Escravos cultos, como eram ao gregos, serviam de preceptores aos filhos de nobres romanos. Mesmo os que obtivessem a graça da libertação não alcançavam direitos iguais: eram ‘os libertos’.
            Escravos notáveis: Terêncio, Fedro, Esopo, Platão, Espártaco. Esopo foi libertado pelo seu último dono, mas depois cndenado a morrer lançado de um rochedo, em Delfos. Platão, prisioneiro de guerra vendido aos flibusteiros em Egina, readquiriu a liberdade, comprado que fora por um discípulo, José, filho de Jacob, vendido por 20 moedas de prata, decifrou o sonho do Faraó e foi feito primeiro ministro do Egito. Jesiel é feito prisioneiro das galés romanas. Por que adoecera, ia se atirado ao mar; deixado, porém, em terra, torna-se cristão e vem a ser o primeiro mártir do Cristianismo, com o nome de Estevão. Mouros escravizam cristãos na sua invasão da Europa. E os ditos cristãos não fazem por menos. Assim foi o mundo por muitos milênios. Eis que, com os tempos novos, movimentos revolucionários questionam direitos de pessoa humana. E na velha Europa o regime de exploração do homem pelo homem como força de trabalho escravo cede à pressões e às revoluções. Tivemos mesmo em Roma, em tempos idos (73-71 a.C.) a chamada ‘revolta dos escravos’ (e eram 70000!) com Espártaco à frente. Em passado recente, a Revolução Francesa e, nos EUA, a Guerra da Secessão. Mesmo assim as Metrópoles por muito tempo conservaram colônias distantes, especialmente na África, exploradas de forma desapiedada.
            Antes de entrar diretamente nesse problema em relação ao nosso país, assinalando o centenário da epopéia libertária, faremos outras considerações, dentro, especialmente, do enfoque espírita.
            Quando Moisés,, segundo a tradição, recebeu as Tábuas da Lei, seria curioso indagar por que razão não houve um quesito mais ou menos assim: ‘Não escravizareis vosso semelhante, nem branco, nem negro, nem amarelo’... Pelo contrário, a servidão, de certa forma, é admitida no 10º Mandamento: ‘Não cobiçareis o servo nem a serva, nem o boi nem o jumento (...)’. Nesse mandamento, o homem (escravizado|) e o jumento nivelam-se como alimárias que se não devem cobiçar ao vizinho... Embora Moisés houvesse lutado contra a escravidão do seu povo em terras do Egito – e os hebreus vieram a ser escravos dos babilônios também – havia lá no velho Egito outros tantos escravos que não os israelitas, inclusive negros. Escravos negros no continente da negritude... Alguma semelhança com o que ainda hoje se passa nas terras do sul.
            Teria Jeová dito a Abraão: ‘-Cortareis a carne como sinal de minha aliança. Toda criança masculina será circuncidada, mesmo aquela nascida de escravos comprados de estrangeiro e que não pertençam à vossa raça.’ (‘Da Bíblia aos nossos dias’, Mário Cavalcanti de Melo, pág 184). Ora, a lei mosaica reflete, embora bem inspirada, não há dúvida, condições de uma época. E trás algo em si que recorda os conhecimentos bramânicos, por seu turno introduzidos nos egípcios e considerados secretos. E Brama conserva a divisão em castas...
            Contudo, o Mandamento maior, do Cristo – AMAI-VOS UNS AOS OUTROS – por abrangente, superior, definitivo, é suficientemente forte, claro, consistente para dirimir dúvidas quanto à verdadeira posição do que chamamos o Cristianismo do Cristo, autêntico, dentro da questão.
            E não se discutiria aqui, consideremos, tão só o aspecto de uma liberdade ou de uma sevidão em termos de propriedade física. Há que se reconhecerem todas as formas de libertação: liberdade de consciência, de pensamento, de direcionamento de suas vidas.
            Mas o homem sequer consegue muita vez libertar-se da escravidão dos preconceitos, dos vícios, da própria ignorância, do fanatismo... Questão de faixa vibratória.
            Voltemos a Jesus: ‘-Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso pra vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve’ (Mateus 11: 28 a 30). Seu jugo é a observação da Lei, para que a Justiça nos alivie o fardo dos sofrimentos, tornando-os suportáveis e úteis ao nosso progresso.
            Dir-se-ia que, por estarem as criaturas (no caso, aquelas conduzidas ao cativeiro) resgatando – praticamente todas elas – um passado delituoso, poder-se-ia supor que o regime escravagista tivesse pleno aval dentro da lei dos destinos. Engano.  
            Lembramo-nos de que Jesus dissera que ‘o escândalo é necessário; porém ai daquele por cujo intermédio o escândalo venha’. Léon Denis (‘O Problema do Ser, do Destino e da Dor’, pág 290, 14ª Edição FEB) expõe:
            ‘A doutrina das reencarnações aproxima os homens mais que qualquer outra crença, ensinando-lhes a comunidade de origens e fins, mostrando-lhes a solidariedade que os liga a todos no passado, no presente, no futuro. Diz-lhes que não há, entre eles, deserdados nem favorecidos, que cada um é filho de suas obras, senhor de seu destino. Nossos sofrimentos, ocultos ou aparentes, são conseqüências do passado ou também a escola austera onde se aprendem as altas virtudes e os grandes deveres.’
            E diz mais (pág. 296):
            ‘Com a lei dos destinos, a questão muda logo de face; não somente o mal que tivermos feito recairá sobre nós e teremos de pagar as nossas dívidas até o último centil, como o estado social que tivermos contribuído para perpetuar com seus vícios, com as suas iniqüidades, apanhar-nos-á na férrea engrenagem, quando voltarmos à Terra, e sofreremos por todas as suas imperfeições.’
            As obras espíritas, que proximamente comentaremos, são todas elas, de modo geral, um manancial de convicções e um repositório de confirmações nesse mesmo sentido.

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