Em defesa do Velho Testamento
por Alfredo C. de Farias
Reformador (FEB) 16 Maio 1937
Parece que
há o propósito irrefletido de relegar-se a dita obra ao esquecimento, senão o
de afastá-la das lides e fundamentos doutrináros trazidos pela Terceira Revelação.
Assim, porém, não quer o preclaríssimo Diretor de nosso planeta e assim não querem
os altos Espíritos que sob a sua orientação trabalham em prol do nosso
progresso.
O Velho
Testamento não é obra de ficção, nem foi coordenado impensadamente. O homem é,
bom ou malgrado seu, um instrumento do Criador. Dentro das suas deficiências e
incorreções, segue sempre a diretriz que Ele, Pai amantíssimo, a tudo assinou
no princípio das coisas.
Do
Velho Testamento, além de fluir a lei moral, acorde com as capacidades das
sucessivas gerações, por uma exegese comum, seguida da interpretação em espírito,
dimana a sabedoria dos fatos religiosos soberbamente produzidos e dos
acontecimentos prodigiosos que nesse campo nos reserva o futuro.
Como obra
profética para dilatados tempos, outra mais perfeita não existe no mundo, capaz
de lhe empanar o brilho.
Foi, assim
no sentido da lei moral, como também no de reservatório de edificantes
premissas, consideradas igualmente leis, por traduzirem a vontade e os desígnios
de Deus, que o querido Mestre sentenciou, quando em missão, na Palestina: “Não penseis
que eu tenha vindo destruir a lei e os profetas; não os vim destruir, mas
cumprir.” Com efeito, ele assim o fez durante toda a sua incomparável missão. Além
do ensino moral, sabiamente ministrado, o Divino Mestre, para cumprimento dos anteriormente
traçados na grande obra que hoje conhecemos sob o nome de “Velho Testamento”,
surgiu entre os homens como israelita, tendo, por isso, que se sujeitar a um
nascimento aparente, do seio de uma virgem da estirpe de Israel; teve que se
sujeitar à consagração do Templo, no oitavo dia desse nascimento; teve que se
referir, inúmeras vezes, às Escrituras, mostrando que a sua alta missão
correspondia ao que se achava nelas escrito; teve que se transfigurar no Tabor
para, apresentando-se ao lado de Moisés e Elias, comprovar a ligação da revelação
que viera trazer ao mundo à primeira, de que foram instrumentos aqueles dois
patriarcas: teve que se submeter à morte aparente na cruz e aparecer depois
como ressurgido – tudo sempre no propósito de confirmar a lei, que define, em seus
pontos essenciais, o papel que lhe coube desempenhar.
Jesus jamais
surgiria no planeta para confirmar mistificações, ou desmpenhar um papel que não
tivesse alcance grandioso e sumamente meritório. A sua revelação se liga
estreitamente à revelação mosaica, com um cunho de unidade perene a completar-se
através do Espiritismo: “Porque três são os que testificam no céu: O Pai, a
Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. (I Epístola de João, 5:7)
Jesus,
confirmando a lei e os profetas, demonstrou, ainda, ser, para todos os tempos,
a figura mais proeminente na sequência dos fatos e prescrições condicionadas
naturalmente por ele próprio e gravadas nos anais dos povos, como imponente
realização.
Para
a humanidade do futuro, o Velho Testamento será um relicário de verdades e
sabedoria, existentes nos seus inúmeros simbolismos e alegorias, a envolverem
conceitos e acontecimentos.
Referindo-se à sabedoria divina ali contida e encoberta pelo véu da letra, assim se expressou o elevado Espírito de Imperator pelo médium Stainton Moses: “Antes que possais atingir essas distãncias, contentai-vos com aprender que uma significação espiritual está oculta sob cada coisa, de que Bíblia está repleta. As interpretações, definições e glosas humanas, são a crosta material que envolve a divina semente da Verdade. Se retirássemos a crosta, o tenro grão murcharia e feneceria. Contentemo-nos, pois, com indicar-vos até onde podeis compreender a Verdade palpitante, que não vedes sob a face exterior que vos é familiar." (“Ensinos Espiritualistas”, de Stainton Moses, Sessão XVIII)
A fim de demonstrar que nem tudo a Bíblia é de origem divina e que, portanto, há ali muita coisa refletindo o pensamento do homem, sendo por isso necessária uma intuição poderosa para uma inteligente separação, foi que também disse o mesmo Imperator: “Não temos necessidade de repetir que a Bíblia contém páginas que não concordam com o nosso ensinamento, sendo uma mistura de erro humano transmitido pelo espírito dos médiuns escolhidos; somente podereis conseguir isolar a verdade, julgando a tendência geral" (Seção X). “Toda verdade está mesclada de erro; as fezes serão rejeitadas.” (Seção XXVII).
Convém, do
mesmo modo, dispensarmos atenção a estes dizeres de Allan Kardec:
“Muitos
pontos dos Evangelhos, da Bíblia e dos autores sacros em geral só são
inteligíveis, parecendo alguns, até, irracionais, por falta da chave que faculte-se-lhes apreenda o verdadeiro sentido. Essa chave está completa no Espiritismo,
como já o puderam reconhecer os que a têm estudado seriamente e como todos,
mais tarde, ainda melhor o reconhecendo.”
Já é
tempo, portanto, de reconhecermos que no Espiritismo está a chave para a
compreensão exata desses muitos pontos do Velho Testamento. Neles naturalmente
sobrepujam os símbolos e as alegorias, cujo meneio interpretativo parece que
não agrada a alguns confrades, donde,
talvez, a ogeriza que votam ao Antigo Testamento.
Embora se
sustente e reconheça que a clareza é a característica dos ensinos da Terceira
Revelação, julgamos que tal somente ocorre às lições morais, para melhoria de
nossa conduta, pois, há muitas coisas sobre a vida ultra-terrestre que nos vem
sob forma emblemática. Note-se ainda isto que diz Imperator: “É loucura
sustentar-se a exatidão literal de qualquer ensinamento espírita.” (Seção IX).
Eis
agora uma visão simbólica muito interessante. À entidade espiritual que a
produziu certamente a apresentou para ser interpretada.
Conhecemos
uma senhora católica, mas sem fanatismo, humilde, boa e ignorante, que tem tido
vários sonhos simbólicos. Há pouco tempo sonhou com uma barca, mas escura,
navegando em céu borrascoso, no qual se viam alguns homens com vestes
sacerdotais, trazendo nas cabeças “chapéus altos” (segundo ficou esclarecidos,
tratava-se de mitras), a fazerem os maiores esforços para romper as nuvens
escuras que circundavam a barca e lhes obstavam a marcha. Essa senhora narrava
habitualmente os seus sonhos em casa de certa família, que os interpretava para
o jogo do bicho. De uma feita urpreendemo-la a fazer a narrativa deste último.
Não têm
conta fatos análogos a estes, verificados por toda parte, especialmente no
Brasil.
Se os Espíritos
ainda se valem do mistério dos símbolos e das alegorias para nos darem certos
avisos, como impugnar uma obra constituída de modo análogo, cuja finalidade
séria ficou provada com a confirmação do Messias?
O futuro
revelará o valor do Velho Testamento, assim como na atualidade está sendo
revelado todo o valor do Evangelho. Demos tempo ao tempo.
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