“Milagres” Espíritas
Vinélius DI MARCO (Indalício
Mendes)
Reformador
(FEB) Agosto 1964
Professando a religião anglicana,
Dorothy Kerin, ao narrar fatos puramente espíritas, preferiu considera-los
milagrosos, pois que obteve cura “diretamente de Deus, de Deus somente”, como
se as curas propiciadas pelo Espiritismo tivessem outra origem. Depois de haver
peregrinado penosamente pela vasta seara da Medicina, sendo desenganada, pois
seu caso era considerado desesperador, diz ela, recorreu ao hipnotismo, a
Espíritos benfeitores, à sugestão etc., sem alcançar a cura procurada, vítima
que era da tuberculose consequente duma pleurisia.
Dorothy assinala haver sua saúde
começado a declinar a partir da morte de seu pai. Quatro anos andou às voltas
com os médicos e no quinto adoeceu de difteria. Mais tarde, uma pneumonia a encaminhou à pleurisia,
que, então marcou a parte mais acidentada e dolorosa da sua existência. Tuberculosa,
sofrendo crises agudas de hemoptise, perdeu as esperanças de sobreviver, quando
o último dos vinte e oito médicos lhe disse que era humanamente impossível salvá-la.
Uma peritonite tuberculosa lhe apontava o fim próximo.
Foi quando começou a ter visões
estranhas. Pareceu-lhe ver Jesus e formas vestidas de branco, tendo cada uma um
lírio na mão. Acreditou ouvir de Jesus: “Dorothy, não poderás vir agora”, isto
é, não desencarnarás agora. Sentiu que deslizava no espaço e ouviu uma voz
gritar-lhe: “Dorothy! Dorothy! Dorothy! Estou escutando. Quem é?” Neste
momento, viu-se envolvida em grande luz. Um anjo segurou-lhe a mão, dizendo: “Dorothy,
teu sofrimento terminou. Levanta-te e anda! “Ele passou suas mãos sobre os meus
olhos – narra a autora – e eu me encontrei sentada no leito.”
Confessa não ter tido nenhuma
explicação a dar a sua cura instantânea. O Dr. Norman, que a tivera sob os seus
cuidados, declarou a um repórter do “Evening News” que já tinha perdido as
esperanças de salva-la. “Suas enfermidades eram suficientes para matar meia
dúzia de pessoas.”, ajuntou. Ela apresentava os mais graves sintomas de
tuberculose avançada, de diabete e outras complicações. A curva térmica acusava
os resultados mais inquietantes, subindo algumas vezes a 105 graus Fahrenheit.
Tudo isso foi publicado no citado jornal inglês, em sua edição de 20 de
Fevereiro de 1902.
Em face da cura prodigiosa, o
referido médico convidou várias sumidades da Medicina e realizarem rigorosos
exames na ex-enferma e todos eles concluíram que ela estava curada, mas não
podiam explicar como fora possível acontecer isso. “Quinze dia depois –
acrescenta Dorothy Kerin – dois especialistas me fizeram passar pelos Raios X e
reconheceram o meu estado de perfeita saúde. O Dr. Murray Leslie recorreu às
reações de Von Parquet e de Calmette, mas ambas foram negativas. A partir desse
momento, gozei de uma boa saúde, até o acidente que sofri em Paigton, em setembro
de 1913”.
Como nós sabemos, os fenômenos espíritas
podem verificar-se em qualquer ambiente, seja ele católico, protestante, ateu,
muçulmano, espírita, etc. O fato de haver a autora consultado “Espíritos
benfeitores”, sem resultado, nada significa, porque talvez esses Espíritos não
estivessem à altura da situação que a eles se apresentava. O fato de serem
Espíritos não lhes confere onisciência e onipotência. Mas que ela foi curada
através da intervenção espiritual, não há a mais mínima dúvida.
Tanto se tratava de manifestação espírita,
que Dorothy Kerin narra, à partir da página 29 da edição francesa de seu livro:
“No domingo, 11 de Março, fui despertada do meu sono por uma voz que me chamava
“Dorothy!” Sentei-me na cama e percebi ao pé do meu leito uma claridade
maravilhosa, da qual emanava o mais belo rosto de mulher que se possa imaginar.
Ela tinha um lírio na mão e veio colocar-se a meu lado, esclarecendo:
“- Dorothy, agora irás fazer o bem. Deus te
salvou a vida para te atribuir uma missão importante e privilegiada. Graças às
tuas preces e à tua fé, muitas doenças serão curadas. Consola os aflitos e
incute a fé nos incrédulos. Conhecerás contratempos, mas supera-lo às, pois és três
vezes abençoada. A graça de Deus te será suficiente, pois Ele não te abandonará
jamais.”
E concluiu: “Depois de fazer, com o
seu lírio, três vezes, o Sinal da Cruz sobre mim, ela desapareceu. No dia
seguinte, quando despertei, o quarto estava impregnado do perfume de lírio.”
Compreende-se sem esforço que
Dorothy Kerin era médium, dotada de muita fé em Deus e habituada ao recurso
consolador da prece.
“A essa visão sucedeu um período de
espera, durante o qual a minha alma aprendeu a se refugiar na paciência. Oh! Como
foi difícil permanecer inativa e esperar, enquanto outros seres estavam
mergulhando nas trevas espirituais eu ardia do desejo de participar com eles da
alegria dessa saúde e dessa felicidade que recentemente eu obtivera! Enfim, a
hora soou e fui convidada a participar de diferentes reuniões e a relatar as
minhas experiências.”
Em outubro de 1912, Dorothy sofreu
sério desastre de ônibus, sendo lançada á estrada. Atingida na coluna dorsal,
sentia-se desfalecer quando, nesse mesmo momento, foi envolvida por magnífica
luz azul e ouviu distintamente uma voz gritar-lhe; “Deus é Amor”. Acrescenta; “Em
menos tempo do que estou gastando para dizer estas palavras, fui erguida do
chão por mãos invisíveis até a plataforma do auto-ônibus e, toda alegre,
escalei depressa os degraus do veículo. Em seguida, o motorista procurou-me
para saber se eu me encontrava gravemente ferida. Pude responder-lhe, com toda
a verdade: “Não, e lhe agradeço sinceramente a atenção.” E continuei a viagem
sem sentir coisa alguma.”
Muitas provas teve ainda a autora, todas
intrinsicamente espíritas. Duma delas, conta: “Pouco tempo depois do acidente
no local referido, passava eu de bonde pela ponte Vauxhall, onde o tráfego é
intenso, quando, de repente, justamente atrás de mim, pesado caminhão veio
atingir em cheio o veículo em que eu me encontrava, pegando-o de lado. Os
vidros voaram em estilhaços e eu fui alvo de fragmentos. Mas saí ilesa, sem a menor contusão ou mesmo o
menor arranhão.”
Cita o ataque sofrido de um ladrão, do que
lhe resultou fratura na base do crânio e rutura do tímpano do ouvido esquerdo.
Teve uma visão de Jesus e salvou-se. Todavia, continuou a sentir dorida a
cabeça e a surdez persistia. Pouco depois, era acometida duma crise de
apendicite. Ia ser operada quando recebeu de novo a visita do Grande Médico e se
sentiu feliz por não precisar mais da operação. Horas antes, a dor que sentia
na cabeça se tornara mais intensa e durante toda a noite seu ouvido esquerdo
sangrava abundantemente, tornando-se necessária a aplicação constante de
tampões de algodão. Tornara-se totalmente surda e não ouvia som algum.
Nova visão começara. Ela se sentia como que
transportada para fora do quarto, no espaço, cercada de legiões de Anjos,
segundo sua expressão.
“Um deles se dirigiu a mim, dizendo:
“Ainda tens confiança em Jesus? Respondi afirmativamente e, elevando os olhos,
vi um grande círculo formado por Anjos e ao centro dele apareceu Jesus, que me
disse: “Fiz muitas obras notáveis, mas eles não creram. Disse-lhes que os
tempos chegavam. Então, retornei `Glória a fim de reunir os meus eleitos. E
colocarei em meu seio, como cordeiros, aqueles que se mantiverem fiéis. Que a
minha vontade seja o teu repouso, e eu te conduzirei.”
“Muitas coisas – continua a autora –
que não estou autorizada a divulgar me foram reveladas durante essa visão. Quando
ela terminou reencontrei-me sentada em meu leito. Todas as dores haviam
desaparecido e o meu ouvido estava completamente curado. Os meus amigos não
haviam saído do quarto e disseram: “Estás curada, não estás? Nós também sentimos
Sua presença”.
“Retirei os tampões do ouvido e, desde esse instante, a hemorragia cessou inteiramente.
“O Dr. George não podia crer em seus próprios olhos, tanto me achou mudada, e me declarou em perfeita saúde.”
Evidentemente, se os fatos espíritas
ocorrem em ambientes não espíritas, as impressões, interpretações e conclusões
não podem deixar de trazer consigo os aspectos peculiares aos ambientes em que
se verificam. Os católicos, protestantes e talvez outros falem em milagres. Se
entendem por milagres os fatos que transcendem às leis naturais, discordamos,
dentro da nossa posição simplesmente espírita, pois que tudo quanto sucede é
perfeitamente normal e natural. Apenas não são tão comuns quanto ocorrências a
que já nos habituamos a conhecer, analisar e qualificar. São tantas as leis
naturais que permanecem desconhecidas da Ciência, que mais fácil se torna simplificar
as coisas com a denominação de “milagres”.
Os casos citados por Dorothy Kerin,
realmente interessantes, mas perfeitamente banais no conhecimento espírita, não
foram milagrosos, apesar de ela ter afirmado a presença de Jesus em suas
visões. Não negaremos a possibilidade de essa presença se dar, em casos excepcionais,
se grande for o merecimento moral daqueles que a afirmam. A familiaridade com a
sua igreja, sem dúvida pode ter propiciado à autora a impressão de que estava
cercada de anjos e que Jesus a visitava com a frequência citada no livro. Mas
pode também acontecer que ela, em virtude de sua fé e do seu alto espírito de
religiosidade, tivesse sido contemplada com a presença real do Mestre. Tudo
isso, porém, é secundário, porque, agora, o que interessa à finalidade deste
artigo é deixar claro que todas as visões assinaladas em “Une main me toucha”
não foram milagres, mas, simplesmente, manifestações espíritas. Sob este
aspecto, o livro é realmente interessante, ainda que, em tese, não ofereça nada
diferente do que já consta de milhares de obras e testemunhos espíritas.
Na visão a que nos referimos em
último lugar, achavam-se no quarto outras pessoas, mas nenhuma viu Jesus nem os
Anjos. Apenas sentiram, segundo disseram, a presença dele. Isto
evidencia que Dorothy Kerin teve esse “privilégio” por ser médium e achar-se
espiritualmente em condições de devassar o Invisível, tanto mais que a autora,
segundo os documentos anexos em apêndice, teve uma vida verdadeiramente cristã
e era dotada de grande fé. O testemunho dos médicos e enfermeiras que a
assistiram, assim como de outras pessoas idôneas, demonstram de maneira
irrefutável, uma vez mais, a espantosa realidade do Espiritismo.
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