segunda-feira, 19 de julho de 2021

A Reencarnação - Capítulo 4 - "O Esquecimento do Passado"

Reencarnação

- estudo sobre as vidas sucessivas."

Capítulo IV – 'O Esquecimento do Passado’

 por Aurélio A. Valente 

Editora: Moderna - Ano: 1946

Biblioteca Espírita Brasileira

           “Há três anos quis o Destino implacável de Marina, abandonando o invólucro terreno, remontasse à pátria espiritual, para reunir-se àqueles de quem fora filha carinhosa e boa, deixando-nos mergulhado em funda saudade.

           Eu, que nesse tempo não era ainda espírita, vi naquela separação o eterno afastamento de um ente que me era muito caro.

           Um ano depois, porém, aprouve à Providência Divina que a Luz da Verdade se fizesse nas trevas do meu cérebro, e comecei a frequentar as sessões espíritas da casa do Sr. Pedro Bastos. Uma noite em que ali me encontrei, fui prevenido, pela médium vidente Dª Altemira Medeiros Branco, da presença do espírito de minha nora, pousando ao meu lado; e assim continuou semanalmente, até que em um dos dias do fim de Novembro de 1921, minha filha A. disse-me pelo telefone que a Senhora M. (muito nossa amiga), vira em sonho a minha nora Marina, pedindo-lhe para me avisar que tinha uma comunicação a fazer-me; pelo que não deixasse de ir à sessão espírita do Sr. Pedro Bastos.

           Fui, como de costume, à dita sessão; o espírito de Marina foi visto ao meu lado, mas não se manifestou por intermédio nessa note.

           No dia 27 estive presente à sessão da casa do Maestro Bosio e o médium vidente D. Carmen Beset, que se achava presente, viu o espírito de uma moça acompanhado pelo de um homem alto, vestido de roupa clara, colocado ao meu lado, e ouviu-a dizer-me: “Vim e voltarei”. D. Carmen, não tendo conhecido minha nora em vida, não soube dizer-me se ra ela que ali se achava.

           Na sessão da noite de 8 de Dezembro, na casa do Sr. Pedro Bastos, a médium vidente Dª Altemira, tornou a ver o espírito de Maria ao meu lado, com semblante alegre, mostrando-me um papel onde havia palavras escritas; e ao mesmo tempo apontando para o médium Dª Antônia Bastos.

           Passando aos trabalhos de escrita, Dª Antônia bastos recebeu uma comunicação que não quis ler para todos os presentes ouvirem, como de costume; dizendo que se tratava de uma comunicação particular; e ao terminarem os trabalhos, veio ao meu encontro com um riso nos lábios e disse-me estas palavras textuais: “Sua nora que voltar a pertencer a sua família. Amanhã copiarei a manifestação que recebi dela e lh’a remeterei.”

           No dia seguinte recebi no meu gabinete e li comovido o que se segue:

           Boa noite,

           A si, meu pai, que tão ansiosamente deseja que eu dê uma prova da minha presença, venho gostosamente falar. Eu disse: “Vim e voltarei”. Queria dizer com isso que estando na pátria espiritual, já pressinto uma próxima encarnação. E... meu Deus! Parece-me...

           - Talvez seja feliz em sentar ainda sobre os seus joelhos; de sentir velar sobre mim o afeto paternal daquele para quem fui objeto de outro amor... compreende?

           - Peça a Deus que assim seja, que muito desejo.

           - De longe em longe experimento vaga perturbação; e o meu guia diz-me que são os prenúncios da reencarnação.

           - Deus seja consigo, Dª Marina.”

           No dia 18 de Dezembro, em casa do Maestro Bosio, Dª Carmen Beset viu novamente o espírito sentado em uma barquinha, rio abaixo, num ribeiro de águas límpidas.

           Na noite e 22 do mesmo mês, em casa do Sr. Pedro Bastos o médium Dª Altemira Medeiros viu o espírito de Marina mostrando sofrimento, vir ofegante da sala de visitas e entrar na sala onde assisto às sessões; aí chegando, penetrar m um ambiente de luz espiritual, e mostrar-se bem calma.

           Terminada, porém, a sessão, a vidente viu-se voltar à sala e começar novamente a dar provas de sofrimento, e ofegante, como si viesse de uma longa viagem.

           29 de Dezembro, na casa do Sr. Bastos.

           O médium vidente notou novamente a presença de Marina, na sala de visitas, dando sinais de muito sofrer e aí permanecer durante toda a sessão, desprendendo de si uma espécie de fumaça, que penetrava no corpo da minha atual nora, que se achava a certa distância dela; não se aproximando de mim durante a sessão.

           1º de Janeiro do corrente ano, em casa do Maestro Bosio, sendo o médium Dª Carmen.

           Viu, disse ela como uma nuvem de fluidos brancos, que lentamente caminhava par onde nós estávamos. Ao chegar perto de mim a nuvem abriu-se, ou propriamente afastou-se apara os lados, e viu claramente o espírito do costume.

           Vinha como opressa por um pesar profundo; os membros lassos, caídos; tendo a cabeça inclinada sobre o peito. Ergueu a fronte, abriu os olhos, e deles viu correrem duas lágrimas brancas, grossas, que foram descendo pelas faces muito pálidas e emagrecidas. Os lábios abriram-se, e, num esforço bastante visível para ela médium, balbuciaram:  “- Meu pai!...”

           Ficou até quase o fim dos trabalhos, quando a forma branca começo a envolve-la lentamente, e o espírito foi quando até desaparecer, dirigindo-me uma palavra, como despedindo-se: “Adeus!”

           5 de Janeiro. Sessão na casa do Sr. Bastos. O médium Dª Altemira viu, pela última vez o espírito de Marina ao longe, ente dois espíritos de branco, que a sustinham com a cabeça apoiada sobre o ombro de um deles, revelando profundo abatimento.

           Ao terminar a sensacional narração deste caso de reencarnação semelhante em certos pontos ao referido pelo Dr. Lucien Groux no seu interessante livro “Reincarné”, sou obrigado, por motivos respeitáveis, a não declinar o meu nome, muito conhecido nesta cidade de Belém; esperando todavia em Deus que, para bem da verdade e benefício dos que negam a reencarnação, chegará esse dia em que eu, ou meus filhos, possamos provar com os fatos a veracidade do que deixo dito; pois Marina já regressou à Terra, cândida e bela, como uma pequena estrela a cintilar solitária num céu de anil. J. T.”

           Esta minuciosa e admirável narrativa foi publicada na Revista Espírita, nº 17, de 25 de Dezembro de 1922, em Belém do Pará, e com exceção de J. T., que não quis se dará conhecer, todas as outras pessoas foram citadas com os seus nomes completos, o que lhe enriquece o valor, especialmente por serem todas muito conhecidas e dignas de respeito pelas suas convicções e excelente reputação no meio social.

           Em nossa memória tinha se obscurecido por completo o fato que acabamos de transcrever, quando, certo dia, meditando sobre a elaboração deste capítulo, sentimos incontida vontade de reler a Revista Espírita, cujos números guardamos carinhosamente por ter sido esse órgão o que recebeu a nossa primeira colaboração de propaganda do Espiritismo – a mais consoladora de todas as Doutrinas.

           Uma agradável surpresa nos estava reservada: esta narrativa se adequava perfeitamente para início deste estudo, pela riqueza de pormenores e por comprovar o que vem sendo ensinado pelos espíritos a respeito dos prelúdios da reencarnação.

           A alma desencarnada, depois de permanecer no espaço ou nos outros mundos o tempo necessário para resgatar parte de suas dívidas, receber ensinamentos e orientação dos seus mentores, particularmente do seu anjo de guarda. E haurir energias bastantes para avida de expiação, provação, reparação ou missão, aproxima-se daquela que vai ser sua futura mãe, por escolha dos espíritos superiores ou sua própria, se já adquiriu discernimento e liberdade para tal.

           Algum tempo antes da concepção o espírito candidato à nova vida, começa a vagar em torno do lar que vai recebe-lo. Aguarda ansioso, satisfeito ou revoltado, o momento abençoado em que os laços do amor aproximam com carícias os futuros pais, e, quando a natureza principia a sua obra com o encontro dos germens da fecundação, ele inicia o seu trabalho árduo de ligação do seu períspirito com o feto, que se transformará no corpo que lhe vai servir de instrumento na Terra. 

           Pouco a pouco, consciente ou inconscientemente, o espírito vai transmitindo ao corpo as suas características próprias – o sexo – o seu tipo pessoal. As deformidades, manchas, os estigmas, atribuídos pela ciência a defeitos orgânicos e moléstias acidentais ou crônicas da mãe, são determinantes do espírito que vai renascer e tanto isso nos parece verdadeiro que, até hoje, nenhuma hipótese aventurada conseguiu firmar-se em lei.

           Vemos algumas mulheres doentes ou defeituosas darem nascimento a crianças perfeitas e belas, enquanto outras sadias e bem conformadas terem aleijões. Umas vezes é o primogênito que nasce imperfeito, outras o segundo, o terceiro ou o último, sem que se possa perceber a causa.

           A sua memória vai lentamente se turvando. Nuvens, tênues a princípio e densas depois, vão envolvendo-o até produzirem o esquecimento de tudo, como um doente a operar sob a ação do clorofórmio, para poder entrar no mundo com o manto da inocência a cobrir-lhe o corpinho débil, a fim de que a recepção de todos seja alegre e ruidosa.

           A influência do espírito se faz sentir de modo evidente na mulher. Conforme a repulsa ou simpatia que lhe inspira esta, as perturbações denominadas antojos (desejos) variam de intensidade. Quando os fluidos se harmonizam facilmente, em virtude da afinidade de sentimentos, a gestante sente-se feliz, cheia de saúde e tudo corre às maravilhas. Os médicos assistentes exultam com os resultados obtidos com os seus métodos. Mas... se ao contrário os fluidos combinam-se com dificuldade, os distúrbios de saúde da futura mãe se acentuam fortemente, a ponto de causar-lhe grandes abalos. Por vezes assumem proporções tais que levam os ginecologistas a vacilar entre o aborto e a espera do termo da gestação. Contam-se muitos casos graves que conduziram as gestantes à sepultura.

           Qual a razão que a ciência apresenta? Haverá porventura uma hipótese aceitável que resolva todos os casos?

           O espírito que vai reencarnar, sendo inimigo da mãe grávida ou de qualquer membro da família, não provoca na mulher grávida só os horríveis antojos, mas também as antipatias moderadas ou fortes por certas pessoas. Há muitas mulheres que, no período de gestação, mostram-se hostis aos próprios maridos, a ponto de não os suportarem e, se estes não têm a educação necessária para compreender e tolerar, concorrem para cenas tristes e lamentáveis.

           Depois, quando a criança nasce e se liberta das irradiações do espírito, o antigo amor volta e ela carinhosamente chama pelo esposo, lamenta-se, chora e pede desculpas, alegando não saber a razão da birra que sentia por ele!!!

           Conhecemos um caso bem curioso, em que a ação produziu-se no homem e não na mulher. R. R., nosso amigo e estimado colega, homem probo e exemplar pai de família, contou-nos o seguinte:

           “Ao tornar-se grávida sua esposa, de um dos seus adorados filhos, ele começou a sentir por ela uma aversão tão intensa que fazia tudo para permanecer o mais tempo possível fora do lar.  Sofria horrivelmente com isso, porque estimava muito sua mulher, e não podia compreender a razão daquilo, uma vez que nenhuma afeição o prendia fora, pois toda a sua vida tinha sido dedicada aos seus. Nunca deixou que sua mulher percebesse o seu sofrimento e antipatia que lhe inspirava.

           Ao nascer a criança, desfez-se como por encanto a sua triste situação e voltou imediatamente a ter pela esposa o mesmo amor que lhe votava antes, mas... a aversão passou para a criança!!! Durante peto de dois meses, sob vários pretextos, recusou pegar o filhinho no colo, até que conseguiu dominar-se. Com o decorrer do tempo, tudo desapareceu. Este amigo não é espírita.

           Segundo sua declaração, até hoje esse estranho fato é ignorado por todos em seu lar.

           Esses casos são mais frequentes talvez do que possamos imaginar, porém, são conhecidos e comentados apenas nos meios íntimos, pela vergonha natural e desgostos que causam.

           Se o espírito que vai reencarnar trás consigo uma pesada bagagem de um passado de culpas graves e crimes, é possível que até as suas vítimas também atuem sobre a gestante, daí a causa de agitações inexplicáveis dela e do feto, um indefinido pavor de perseguições, uma ideia vaga de ter ofendido alguém.

           Na época da gravidez, a mulher, sob a ação do espírito candidato a uma nova vida, sente desejos de comer determinadas coisas que vão influir poderosamente na constituição física do feto, cujo objetivo é prepara-lo em condições materiais de servir convenientemente para o encargo ou a vida que vai ter na Terra.

           Da sua alimentação, mais do que dos medicamentos, por vezes nocivos, é que depende a robustez ou debilidade do entezinho em formação. Os depurativos, tão em uso, podem produzir maus resultados. Entre pessoas do nosso conhecimento, temos um caso digno de estudo. Uma senhora, mãe de quatro filhos, durante a gravidez de um deles, a conselho médico, submeteu-se a um tratamento antiluético e reconstituinte. A criança nasceu forte, com aparência sadia, porém, é quase um anormal, pois apresenta sintomas evidentes de idiotice. A tendência moderna é de interessarmo-nos mais pela alimentação que pelos remédios.

           O autor observou que todos os seus filhos, em número de seis, sentem o mesmo prazer pelas coisas que eram objeto de desejo incontido da esposa querida.

           O segundo filho, Carlos Aurélio, que aprecia com imensa satisfação qualquer espécie de frutas, contribuiu para sua mãe comer, sem se fartar, frutas em grande quantidade, mesmo as que não gosta e nem suporta no seu estado normal.

           Durante a gestação do terceiro filho, Carlos Alberto, ela sentiu tentação de beber aguardente, muito embora seja uma bebida que até o cheiro repugna-lhe. Em pequeno ele manifestava tentação por bebidas. Certo dia, tendo tomado vinho em demasia, clandestinamente, em uma festividade, ficou doente, vindo-lhe daí uma aversão pela bebida. Desde muito pequeno, esse menino apresentou, em épocas não determinadas, dores hepáticas que o faziam chorar muito. Ligando os acontecimentos, formulamos a seguinte hipótese: Será essa moléstia o estigma em seu períspirito de um mal contraído noutra existência, em consequência de uma vida desregrada? É uma hipótese, apenas, mas é a hipótese que marca o ponto de partida de toda investigação.

           Com o objetivo de colher uma contribuição rica para o nosso trabalho, indagamos de várias senhoras de nosso conhecimento, se haviam feito observações idênticas às nossas. Isto é, se os seus filhos tinham prazer em comer aquilo que eles desejavam quando em estado de gravidez, mas pouco colhemos de positivo e digno de citação, pois, como já dissemos em várias oportunidades, poucos sabem observar, para isso é também necessário educarmo-nos.  

           Apenas uma senhora residente em Niterói, esposas de um amigo que muito prezamos, P.S.A., altamente colocado no comércio desta metrópole, disse-nos que, ao ficar grávida da sua primeira filhinha, “era louca por queijo”, e que a menina cedo demonstrou prazer por queijo, a tal ponto que, certa vez, ludibriando os pais, comera em demasia, tendo ficado gravemente enferma em consequência disso.

           Não é somente o prazer pelos alimentos que se manifesta como demonstração d atuação do espírito sobre a gestante, o gosto por certos divertimentos, pela arte, pelo estudo, também.

           Conversando a respeito das nossas observações com uma senhora que se encontrava em estado interessante, esposa de um destacado elemento da alta administração pública, ela achou interessante e interpelou-nos prontamente: “Acha o senhor que eu vou dar a luz uma criança apreciadora de música? Talvez um maestro? Completou a rir. O senhor não sabe como eu sinto agora imensa satisfação pela música. Quero tocar, ouvir boa música e isso parece-se estranho, porque eu passava longo tempo sem me aperceber do piano.

           Dois anos depois, voltando à sua casa, ela lembrou-se da nossa conversa e disse-nos logo: “Sabe que a minha filhinha gosta imensamente de música? Quando alguém vai tocar, ela aproxima-se do piano com muita satisfação e não se afasta senão quando termina.”

           Cremos que, sob o ponto de vista espiritual, estes fatos têm sido pouco observados e por isso fazemos um apelo aos nossos confrades a fim de contribuírem para esclarecer este ponto deveras interessante.

           Havendo um fundo de verdade no que vimos expondo, é o caso de, em vez de se tratarem as perturbações próprias da gravidez, por meio de remédios e panaceias, experimentarmos os efeitos dos passes magnéticos ou espirituais e preces. Estamos quase certos de que este processo seria eficaz.

           O fato, narrado circunstanciadamente no início deste capítulo, deve ser bem analisado pelo leitor.

           A princípio, o espírito foi visto satisfeito, cheio de alegrias e a sua comunicação foi fácil. O mesmo já não aconteceu posteriormente, quando começo a operar-se a perturbação para perder a consciência de si mesmo. O vidente viu o espírito triste, com o aspecto ofegante, d quem estava sumamente fatigado e dos seus olhos correram lágrimas. Observou também o médium uma espécie de fumaça desprendendo-se do espírito e penetrar naquela que ia ser sua futura mãe.

           Na última sessão era notável a perturbação do espírito, que veio amparado por dois outros mais adiantados e provavelmente os próprios guias.

           Numerosos são os casos, embora nem todas manifestem, de mulheres grávidas, que se enchem de apreensões; umas receiam a morte, outras sentem temores vários e indefinidos e algumas tem pavor que o filho nasça deformado ou mesmo um monstro.

           Logo após a “délivrance”, a parturiente manifesta o desejo de ver o filho, e o seu olhar perscrutador examina o corpinho do recém-nascido, a fim de certificar-se da sua perfeição. A pergunta ao médico ou à parteira: “O meu filho não tem defeitos ?”, é tão comum que passa como coisa sem importância, mas é a última prova da preocupação angustiosa que a dominava.

           Para explicar esses casos estranhos, nenhuma hipótese conseguiu ainda as primícias da verdadeira lei. Se de um lado os maus pressentimentos justificam-se na horado parto; de outro, e isso na maioria dos casos, eles não se realizam. 

           Qual então a origem desses fatos? Nada se sabe de positivo.

           Em torno desses acontecimentos peculiares à gravidez, a ignorância criou lendas e superstições, algumas das quais verdadeiramente absurdas, como essa de atribuir a causa dos lábios rachados a uma chave colocada no seio ou no ventre. Hoje em dia, esse defeito é apresentado como sinal de tara sifilítica. Contudo, não é recomendável considerar destituídas de fundamento as observações do povo, pois, vez por outra, verificamos algo de verdade.

           Elizabeth Valente, esposa do autor, estando em estado interessante, visitou Dona Maria do Carmo, esposa do nosso estimado confrade e amigo Desembargador Nogueira de Faria, e vendo uma das meninas, ficou deveras encantada por um sinal escuro, quase preto, de bonita aparência, que dava certa graça no bracinho da criança. Indagando da origem, Dona Maria do Carmo atribuiu à influência de um besouro preto que lhe caiu sobre o seio quando estava grávida, muito embora não se tivesse impressionado com o caso, lembrava-se apenas de ter tido um grande susto.

           Elisabeth, desejosa que o fenômeno se repetisse consigo, procurou um besouro iual ao indicado, porém, quando o encontrou, temendo ser ferrada pelo inseto, matou-o., e só então teve a coragem de colocá-lo sobre o seio. Ao nascer nossa filhinha Lecy-Elisabeth verificamos ter no ventre um sinal semelhante a um bichinho, de cor esmaecida e também outro no braço, que lembrava perfeitamente um colar de pérolas, um tanto longo, que Elisabeth vinha usando desde antes da concepção. Deram-se assim, na mesma ocasião, dois fatos distintos: o aparecimento de um sinal desejado e de outro para o qual não havia concorrido nem o pensamento nem a vontade.

           Este acontecimento deu-se com o quarto filho, não se tendo repetido nas gestações posteriores, nem antes observamos algo nesse sentido.

           Houve apenas uma ocasião em que Elisabeth, tendo por descuido posto uma chave algum tempo sobre o ventre, alarmou-se pensando no futuro do filho que ia nascer, tendo-lhe, porém, sido explicado a origem científica dos lábios de lebre, esqueceu rapidamente o fato e nada de anormal sucedeu.

          A aspiração vigorosa e constante de que uma criança seja desta ou daquela forma, nem sempre se transforma em realidade.

           W. G. relatou-nos o seguinte: F.T., nosso colega, recém-casado, desejava, juntamente com a esposa, ter um filho lindíssimo. Com o intuito de impressionar a sua esposa, adquiriu algumas estampas de crianças muito belas e essa senhora passava horas contemplando-as. O nascimento do filho deu-lhes uma grande decepção, era muito feio.

          Enquanto esse casal passou por semelhante dissabor, uma senhora de nossas relações, que procedia da mesma forma, obteve o seu desejo, pois teve um filhinho lindo, que se assemelhava a uma das figuras que mais a tinham interessado.

          Vemos, portanto, com dois casos apenas, para não fatigar o leitor, pois eles contam-se ás dezenas, que se comprova a hipótese outro a destrói na mesma ocasião.

           Várias causas podem determinar esses fatos. Castigo para a vaidade dos pais. Fealdade própria da imperfeição do espírito que volta a Terra, o qual, consciente da sua aparência antipática, sugere aos pais a proceder daquela forma para ajudarem-no a modificar o seu aspecto.

           Quanto ao segundo caso, é possível que o espírito de lindo tipo tenha também induzido sua mãe a agir daquela maneira para auxiliá-lo a dar ao corpo a beleza desejada e que naturalmente era necessária para o seu modo de vida no mundo terráqueo.

          A doutrina firmada e aceita até hoje, é que o receio, o assombro, a sugestão, impressão violenta da gestante, são as causas determinantes dos casos teratológicos.

          Baseados no Espiritismo, lançamos outra hipótese. É a alma do nascituro que atua mais sobre a futura mãe do que a desta sobre a daquele.

          A leitura impressionante, o terror, o pavor, a sugestão e todos os acontecimentos extraordinários, entram apenas como elementos de ordem secundária, e servem para consolida a estrutura de um corpo, que, desde o início da gestação, vinha se formando com defeitos. Esses fatos são consequência e não causa.

           Parece-nos anticientífico que um fato surpreendente e horrível contribua para transformar, num espaço de tempo assaz reduzido, em um monstro, uma criança que vinha se formando com perfeita normalidade desde o primeiro instante da concepção.

           Quando éramos ainda criança, ficamos espantado com a notícia de um jornal, sobre o nascimento de um monstro.

          Um homem casado foi como de costume caçar, sem que isso causasse o menor receio em sua esposa. Ao regressar à casa, trouxe ele um macaco morto. Ao ver o animal, a mulher, que estava no último mês de gravidez, teve um tão forte abalo que adoeceu e daí a dias deu nascimento a uma criança em tudo semelhante a um macaco. Não apresentamos pormenores por não termos guardado senão a lembrança do fato.

           É científico aceitar-se que o horror tenha transformado uma criança normal, perfeita, num monstro? Que mãos mimosas, delicadas, cabelos curtos, crânio bem conformado, sejam repentinamente substituídos por mãos animalescas, pelos longos e cabeça simiesca?

           Essa hipótese é menos provável do que a de crer que é o espírito que vai reencarnar que provoca na gestante o pressentimento do que vai acontecer. As crianças deformadas representam expiações penosas para pais e filhos.        

           Que um fato sinistro, emocionante presenciado por uma mulher grávida produza abalo, traumatismo ou possível parada de desenvolvimento do feto, é mais aceitável.

           Eis dois casos notáveis, que corroboram o nosso ponto de vista, transcritos do livro do Dr. Albert Coste ‘Fenômenos Psíquicos Ocultos’, prefaciado por Medeiros e Albuquerque:

           “O Dr. Swift refere a observação de uma mulher grávida e quase a termo que, tendo ficado muito comovida, deu à luz outra criança, cuja unha do mesmo dedo estava preta; três semanas depois, com vinte e quatro horas de diferença, as unhas dos polegares das duas crianças caíam ambas.

           “O Dr. Erico Coelho, professor de clínica obstétrica e ginecológica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, levou ao conhecimento da Academia de Medicina um fato curioso por ele e uma colega Mme. Hoxe Cardoso.

           “Um rapaz católico tinha casado com uma judia. Quando se tratou de obter o consentimento dos pais desta, houve grande relutância. Afinal, decidiu-se o casamento com uma condição expressa: que do casal os filhos seguiriam a religião judaica e as filhas a católica. Celebrado o enlace, a mulher se declarou que não se submeteria à imposição da família dela e, se lhe nascesse um filho, não permitiria a circuncisão. Desde então, entre os cônjuges, esse foi um motivo de intenso desgosto. A mãe, prevendo que, depois das dificuldades que tivera a recusa da circuncisão, ia, logo após o nascimento da criança, ocasionar a desavença com toda a sua família, não tinha outra preocupação.

           Resultado: a criança, que era um menino, nasceu perfeitamente circuncidada.

           O fenômeno é tanto mais interessante, quanto a falta da hereditariedade da modificação produzida nos circuncidados é alegada, frequentemente, como um argumento contra o darwinismo.    

           Assim, o que ainda não pode, na descendência dos judeus, a obra de muitos séculos, foi conseguido pela imaginação materna.”

           No primeiro caso, é interessante observar que o dedo portador de uma prova de traumatismo ficou são dentro de pouco tempo e, assim, desapareceu o vestígio e o caso permaneceu na lembrança apenas como um caso triste.

           No segundo, de acordo coma a teoria espírita, p ode admitir-se que o espírito que vinha reencarnando há muito tempo entre os judeus, fortemente dominado pelos preconceitos religiosos, não e conformado com a ameaça que pairava sobre o seu destino, e por isso incitou sua futura mãe a impressionar-se fortemente com o caso. O observador não relata se a judia desejou que o filho nascesse circuncidado, o que era de grande valia saber-se; segundo deduzimos, ela não tinha pensado em tal, dado o fato dos hebreus ligarem grande importância às cerimônias religiosas.

           Vejamos ainda mais um caso citado no mesmo livro:

           “O marido de uma senhora, que estava grávida, recebia frequentemente a visita de um colega de profissão, aleijado de uma das mãos. Antes da gravidez, nunca o fato impressionara a senhora, que aliás é uma grande histérica de tipo taciturno. Depois, porém, que isso aconteceu, a quem ela era obrigada a fazer sala, acolhendo-o amavelmente, começou a angustia-la. Deixou-se tomar por um receio obsedante de vir a ter um filho com o mesmo aleijão.

           Ao dar à luz, sob a ação do clorofórmio, nada percebeu. Mas, assim que recuperou os sentidos, reclamou que lhe mostrassem o filho para ver se estava perfeito. O filho tinha, de fato, os dedinhos cotos (amputados ou abortivos) na primeira falange e só o polegar conservado, com um estrangulamento anular aquém da falangeta, parecendo indicar que aí também se ia dar uma verdadeira amputação espontânea e não uma simples parada de desenvolvimento.”

           Este caso é de observação do Dr. Luiz Antônio da Silva Santos, também lente da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.”

           Entre os casos citados, o último parece-nos ser o que mais corrobora o nosso ponto de vista, pois, segundo a narrativa do próprio assistente, ela não se havia impressionado antes com o aleijão do amigo do seu esposo. É lógico, pois, que admitamos que o nascituro já estava condenado a reencarnar aleijado e foi o seu espírito que despertou, na gestante, o pressentimento de uma coisa que se ia realizar. Não havendo efeito sem causa, para nós espíritas, cada deformação não passa de um castigo por uma determinada falta, Jesus, o nosso Amado Mestre, disse: “Se a vossa mão ou o vosso pé são para vós causa de escândalo, cortai-os e lançai-os longe de vós; vale mais para vós entrar na vida tendo um só pé ou uma só mão, do que ter duas e ser lançado ao fogo eterno. E se o vosso olho é causa de escândalo, arrancai-o e lançai-o longe de vós, vale mais para vós entrar na vida com um só olho de que ter dois e ser precipitado no fogo do inferno.” (S. Mateus, Cap. XVIII, vv. 8-9; S. Marcos, Cap. IX, vv. 41-47).

           Se os temores, emoções fortes, sugestões são os fatores preponderantes dos casos teratológicos, como explicar àqueles em que nada sucede digno de atenção como presságio dos mesmos?

           E eles tornam-se mais inexplicáveis para a ciência materialista, quando, acontecendo do modo que acabamos de referir, o fato é único entre vários irmãos perfeitos e sadios.

           O delicado estudo da maternidade em todas as suas fases, faz nos deparar com inúmeros e transcendentes problemas.

           Por vezes, tudo parece correr bem quando se aproxima o momento supremo. Um imprevisto acontece e um grande perigo se apresenta pondo em risco a vida de parturiente. Depois de investigarmos as causas puramente materiais, não seria lógico admitir tratar-se de um espírito inimigo da família que, coagido a reencarnar num meio estranho e antipático, tivesse num derradeiro arranco procurado fugir às leis divinas? É possível. A objeção é imediata, não dizem que o espírito perde a consciência antes de reencarnar? Sim, mas não de todo. Os casos citados de crianças se recordarem de acontecimentos de outras vidas é o testemunho real de que o esquecimento completo só se concretiza entre os seis e sete anos.

           Eis mais alguns casos interessantes, que se ajustam ao que vimos afirmando.

           Há muitos anos, já o nosso confrade Rafael Ferreira Gomes, de Belém do Pará, contou-nos que uma senhora voltava aflita do Instituto de Proteção e Assistência à Infância, por causa de um filho de meses que vinha sofrendo de umas convulsões inexplicáveis. Os médicos não sabiam determinar a causa. Todos os remédios haviam falhado. Habilmente aconselhada a recorrer ao Espiritismo e tendo aceito, o médium vidente e curador tudo esclareceu.

           “- A senhora ainda não notou que a criança só tem tido esses acessos quando está no seu colo?

           “ – Realmente, meu senhor, os acessos costumam a dar quando ele está mamando. Começa primeiro por fitar-me com insistência e depois aparecem as convulsões.

           “ – O remédio dele, minha senhora, são os passes e as preces. Este menino foi seu inimigo em outra existência. Ao fitar o seu rosto, a lembrança não apagada de todo reavivava-se e ele manifesta o seu desagrado, mas, tenha paciência, resignação e Fé, que isso vai passar.”

           E, realmente, dentro de uma semana, com passes diários, a criança ficou completamente curada.

           Uma advertência dessas, longe de despertar ódio da mãe, servirá de modo imperioso para que ela tenha pelo filho um desvelo maio do que o habitual, para fazer de um inimigo um amigo, pois todos nós temos o dever de trabalhar para reinar a verdadeira fraternidade no mundo, e esta tem a sua base fundamental no lar, sob a santificada orientação da mulher.

           Um outro caso digno de citação nos foi relatado pelo conhecido e incansável propagandista do Espiritismo, Professor Leopoldo Machado.

           Visitávamos o “Lar de Jesus” e falávamos sobre aquelas criancinhas cujos destinos lhe estavam confiados. Abordamos a reencarnação, quando ele disse: “Vê aquela menina branca, de olhos verdes, de semblante tristonho? Foi uma princesa segundo uma revelação espontânea no nosso Centro. Muitos dias antes, essa menina vinha choramingando continuamente, aborrecida, enjoada, mas sem estar doente, não queria brincar. Uma noite aparece um espírito dizendo-se de alta nobreza e não se conformar com a sua situação de asilada, principalmente entre crianças desamparadas. Era preciso tirá-la de lá, porque não era desta forma que se tratava de uma princesa. Doutrinada, mostrou-se mais calma e deixou o médium. A criança, depois disso, sem tomar medicamentos, nem receber afagos mais privilegiados que os outros, mostrou-se mais alegre. Quantas vezes, dizemos nós, as choradeiras extemporâneas das crianças não têm a sua causa de fundo puramente espiritual? Conhecendo-se a Doutrina Espírita, encontra-se remédio para todos esses casos extraordinários pois os passes e as preces são recursos incalculáveis de podemos lançar mão em benefício dos nossos irmãos sofredores.

           E quando pensamos que em pleno século XX ainda aparecem homens que se opõem ao emprego de bens que o céu nos concedeu para amenizar a situação do nosso semelhante, ficamos perplexos, sem saber em que pensar mais, se no futuro de sofrimentos angustiosos dos mesmos, se no sentimento de tristeza de não poder praticar o bem como ensinou o nosso Amado Mestre Jesus.

           Confiemos na misericórdia divina. A evolução não está sujeita aos caprichos dos homens, quando a sua marcha tive de ser feita de modo mais rápido, bons e maus serão arrastados, como tudo é levado pelas águas turvas da inesperada enchente de um rio, e nesses momentos de dor e desespero, uns auxiliam os outros, mas será tarde porque os cabritos serão apartados das ovelhas. E então muitos dirão: Senhor, nós também te seguíamos, nós também te rendíamos culto, nós também praticamos prodígios em teu nome.” E o Senhor perguntar-lhes-á: Quando fizestes isso, porque não me lembro? Nós ajudamos a construção do templo de S... na cidade de... não auxiliamos a edificação do asilo? ... não demos sempre avultadas esmolas? E o Senhor replicará: Já recebeste a vossa recompensa, pois estes atos foram impulsionados pela vossa vaidade. Outros dirão ainda: Senhor, nós fizemos talvez mais do que isso. Como ocupávamos lugares importantes, preservamos a humanidade da exploração dos maus. Não consentíamos que as leis sociais fossem desrespeitadas. Lembra-te de nós.  E o Senhor também lhes dirá: Já recebeste a vossa recompensa. Todos esses atos foram produto do vosso orgulho e falso saber, e ainda do vosso desmedido egoísmo. Na defesa do interesse da humanidade estava oculto o vosso.

           Envidemos, pois, todos os nossos esforços na difusão dos princípios luminosos da Doutrina Espírita, que a humanidade terá melhores dias no porvir.

 


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