Reencarnação
- estudo sobre as vidas sucessivas."
Capítulo IV – 'O Esquecimento do Passado’
por Aurélio A. Valente
Editora:
Moderna - Ano: 1946
Biblioteca
Espírita Brasileira
“Há três anos quis o Destino implacável de
Marina, abandonando o invólucro terreno, remontasse à pátria espiritual, para
reunir-se àqueles de quem fora filha carinhosa e boa, deixando-nos mergulhado
em funda saudade.
Eu, que nesse tempo não era ainda
espírita, vi naquela separação o eterno afastamento de um ente que me era muito
caro.
Um ano depois, porém, aprouve à
Providência Divina que a Luz da Verdade se fizesse nas trevas do meu cérebro, e
comecei a frequentar as sessões espíritas da casa do Sr. Pedro Bastos. Uma
noite em que ali me encontrei, fui prevenido, pela médium vidente Dª Altemira
Medeiros Branco, da presença do espírito de minha nora, pousando ao meu lado; e
assim continuou semanalmente, até que em um dos dias do fim de Novembro de
1921, minha filha A. disse-me pelo telefone que a Senhora M. (muito nossa
amiga), vira em sonho a minha nora Marina, pedindo-lhe para me avisar que tinha
uma comunicação a fazer-me; pelo que não deixasse de ir à sessão espírita do
Sr. Pedro Bastos.
Fui, como de costume, à dita sessão;
o espírito de Marina foi visto ao meu lado, mas não se manifestou por
intermédio nessa note.
No dia 27 estive presente à sessão
da casa do Maestro Bosio e o médium vidente D. Carmen Beset, que se achava
presente, viu o espírito de uma moça acompanhado pelo de um homem alto, vestido
de roupa clara, colocado ao meu lado, e ouviu-a dizer-me: “Vim e voltarei”. D.
Carmen, não tendo conhecido minha nora em vida, não soube dizer-me se ra ela
que ali se achava.
Na sessão da noite de 8 de Dezembro,
na casa do Sr. Pedro Bastos, a médium vidente Dª Altemira, tornou a ver o
espírito de Maria ao meu lado, com semblante alegre, mostrando-me um papel onde
havia palavras escritas; e ao mesmo tempo apontando para o médium Dª Antônia
Bastos.
Passando aos trabalhos de escrita,
Dª Antônia bastos recebeu uma comunicação que não quis ler para todos os
presentes ouvirem, como de costume; dizendo que se tratava de uma comunicação
particular; e ao terminarem os trabalhos, veio ao meu encontro com um riso nos
lábios e disse-me estas palavras textuais: “Sua
nora que voltar a pertencer a sua família. Amanhã copiarei a manifestação que recebi
dela e lh’a remeterei.”
No dia seguinte recebi no meu
gabinete e li comovido o que se segue:
“Boa
noite,
A si, meu pai, que tão ansiosamente deseja que eu dê uma prova da minha
presença, venho gostosamente falar. Eu disse: “Vim e voltarei”. Queria dizer
com isso que estando na pátria espiritual, já pressinto uma próxima encarnação.
E... meu Deus! Parece-me...
- Talvez seja feliz em sentar ainda sobre os seus joelhos; de sentir
velar sobre mim o afeto paternal daquele para quem fui objeto de outro amor...
compreende?
- Peça a Deus que assim seja, que muito desejo.
- De longe em longe experimento vaga perturbação; e o meu guia diz-me
que são os prenúncios da reencarnação.
- Deus seja consigo, Dª Marina.”
No dia 18 de Dezembro, em casa do
Maestro Bosio, Dª Carmen Beset viu novamente o espírito sentado em uma
barquinha, rio abaixo, num ribeiro de águas límpidas.
Na noite e 22 do mesmo mês, em casa
do Sr. Pedro Bastos o médium Dª Altemira Medeiros viu o espírito de Marina
mostrando sofrimento, vir ofegante da sala de visitas e entrar na sala onde
assisto às sessões; aí chegando, penetrar m um ambiente de luz espiritual, e
mostrar-se bem calma.
Terminada, porém, a sessão, a
vidente viu-se voltar à sala e começar novamente a dar provas de sofrimento, e
ofegante, como si viesse de uma longa viagem.
29 de Dezembro, na casa do Sr.
Bastos.
O médium vidente notou novamente a
presença de Marina, na sala de visitas, dando sinais de muito sofrer e aí
permanecer durante toda a sessão, desprendendo de si uma espécie de fumaça, que
penetrava no corpo da minha atual nora, que se achava a certa distância dela;
não se aproximando de mim durante a sessão.
1º de Janeiro do corrente ano, em
casa do Maestro Bosio, sendo o médium Dª Carmen.
Viu, disse ela como uma nuvem de
fluidos brancos, que lentamente caminhava par onde nós estávamos. Ao chegar
perto de mim a nuvem abriu-se, ou propriamente afastou-se apara os lados, e viu
claramente o espírito do costume.
Vinha como opressa por um pesar
profundo; os membros lassos, caídos; tendo a cabeça inclinada sobre o peito.
Ergueu a fronte, abriu os olhos, e deles viu correrem duas lágrimas brancas,
grossas, que foram descendo pelas faces muito pálidas e emagrecidas. Os lábios
abriram-se, e, num esforço bastante visível para ela médium, balbuciaram: “- Meu pai!...”
Ficou até quase o fim dos trabalhos,
quando a forma branca começo a envolve-la lentamente, e o espírito foi quando
até desaparecer, dirigindo-me uma palavra, como despedindo-se: “Adeus!”
5 de Janeiro. Sessão na casa do Sr.
Bastos. O médium Dª Altemira viu, pela última vez o espírito de Marina ao longe,
ente dois espíritos de branco, que a sustinham com a cabeça apoiada sobre o
ombro de um deles, revelando profundo abatimento.
Ao terminar a sensacional narração
deste caso de reencarnação semelhante em certos pontos ao referido pelo Dr. Lucien
Groux no seu interessante livro “Reincarné”,
sou obrigado, por motivos respeitáveis, a não declinar o meu nome, muito
conhecido nesta cidade de Belém; esperando todavia em Deus que, para bem da
verdade e benefício dos que negam a reencarnação, chegará esse dia em que eu,
ou meus filhos, possamos provar com os fatos a veracidade do que deixo dito;
pois Marina já regressou à Terra, cândida e bela, como uma pequena estrela a
cintilar solitária num céu de anil. J. T.”
Esta minuciosa e admirável narrativa
foi publicada na Revista Espírita, nº
17, de 25 de Dezembro de 1922, em Belém do Pará, e com exceção de J. T., que
não quis se dará conhecer, todas as outras pessoas foram citadas com os seus
nomes completos, o que lhe enriquece o valor, especialmente por serem todas
muito conhecidas e dignas de respeito pelas suas convicções e excelente
reputação no meio social.
Em nossa memória tinha se
obscurecido por completo o fato que acabamos de transcrever, quando, certo dia,
meditando sobre a elaboração deste capítulo, sentimos incontida vontade de
reler a Revista Espírita, cujos
números guardamos carinhosamente por ter sido esse órgão o que recebeu a nossa
primeira colaboração de propaganda do Espiritismo – a mais consoladora de todas
as Doutrinas.
Uma agradável surpresa nos estava
reservada: esta narrativa se adequava perfeitamente para início deste estudo,
pela riqueza de pormenores e por comprovar o que vem sendo ensinado pelos
espíritos a respeito dos prelúdios da reencarnação.
A alma desencarnada, depois de permanecer no espaço ou nos outros mundos
o tempo necessário para resgatar parte de suas dívidas, receber ensinamentos e
orientação dos seus mentores, particularmente do seu anjo de guarda. E haurir energias
bastantes para avida de expiação, provação, reparação ou missão, aproxima-se
daquela que vai ser sua futura mãe, por escolha dos espíritos superiores ou sua
própria, se já adquiriu discernimento e liberdade para tal.
Algum tempo antes da concepção o espírito
candidato à nova vida, começa a vagar em torno do lar que vai recebe-lo.
Aguarda ansioso, satisfeito ou revoltado, o momento abençoado em que os laços
do amor aproximam com carícias os futuros pais, e, quando a natureza principia
a sua obra com o encontro dos germens da fecundação, ele inicia o seu trabalho
árduo de ligação do seu períspirito com o feto, que se transformará no corpo
que lhe vai servir de instrumento na Terra.
Pouco a pouco, consciente ou
inconscientemente, o espírito vai transmitindo ao corpo as suas características
próprias – o sexo – o seu tipo pessoal. As deformidades, manchas, os estigmas,
atribuídos pela ciência a defeitos orgânicos e moléstias acidentais ou crônicas
da mãe, são determinantes do espírito que vai renascer e tanto isso nos parece
verdadeiro que, até hoje, nenhuma hipótese aventurada conseguiu firmar-se em
lei.
Vemos algumas mulheres doentes ou
defeituosas darem nascimento a crianças perfeitas e belas, enquanto outras
sadias e bem conformadas terem aleijões. Umas vezes é o primogênito que nasce
imperfeito, outras o segundo, o terceiro ou o último, sem que se possa perceber
a causa.
A sua memória vai lentamente se
turvando. Nuvens, tênues a princípio e densas depois, vão envolvendo-o até
produzirem o esquecimento de tudo, como um doente a operar sob a ação do clorofórmio,
para poder entrar no mundo com o manto da inocência a cobrir-lhe o corpinho
débil, a fim de que a recepção de todos seja alegre e ruidosa.
A influência do espírito se faz
sentir de modo evidente na mulher. Conforme a repulsa ou simpatia que lhe
inspira esta, as perturbações denominadas antojos (desejos) variam de
intensidade. Quando os fluidos se harmonizam facilmente, em virtude da
afinidade de sentimentos, a gestante sente-se feliz, cheia de saúde e tudo
corre às maravilhas. Os médicos assistentes exultam com os resultados obtidos
com os seus métodos. Mas... se ao contrário os fluidos combinam-se com
dificuldade, os distúrbios de saúde da futura mãe se acentuam fortemente, a
ponto de causar-lhe grandes abalos. Por vezes assumem proporções tais que levam
os ginecologistas a vacilar entre o aborto e a espera do termo da gestação.
Contam-se muitos casos graves que conduziram as gestantes à sepultura.
Qual a razão que a ciência apresenta? Haverá
porventura uma hipótese aceitável que resolva todos os casos?
O espírito que vai reencarnar, sendo
inimigo da mãe grávida ou de qualquer membro da família, não provoca na mulher
grávida só os horríveis antojos, mas também as antipatias moderadas ou fortes
por certas pessoas. Há muitas mulheres que, no período de gestação, mostram-se
hostis aos próprios maridos, a ponto de não os suportarem e, se estes não têm a
educação necessária para compreender e tolerar, concorrem para cenas tristes e
lamentáveis.
Depois, quando a criança nasce e se
liberta das irradiações do espírito, o antigo amor volta e ela carinhosamente
chama pelo esposo, lamenta-se, chora e pede desculpas, alegando não saber a razão
da birra que sentia por ele!!!
Conhecemos um caso bem curioso, em
que a ação produziu-se no homem e não na mulher. R. R., nosso amigo e estimado
colega, homem probo e exemplar pai de família, contou-nos o seguinte:
“Ao tornar-se grávida sua esposa, de
um dos seus adorados filhos, ele começou a sentir por ela uma aversão tão
intensa que fazia tudo para permanecer o mais tempo possível fora do lar. Sofria horrivelmente com isso, porque
estimava muito sua mulher, e não podia compreender a razão daquilo, uma vez que
nenhuma afeição o prendia fora, pois toda a sua vida tinha sido dedicada aos
seus. Nunca deixou que sua mulher percebesse o seu sofrimento e antipatia que
lhe inspirava.
Ao nascer a criança, desfez-se como
por encanto a sua triste situação e voltou imediatamente a ter pela esposa o
mesmo amor que lhe votava antes, mas... a aversão passou para a criança!!!
Durante peto de dois meses, sob vários pretextos, recusou pegar o filhinho no
colo, até que conseguiu dominar-se. Com o decorrer do tempo, tudo desapareceu.
Este amigo não é espírita.
Segundo sua declaração, até hoje
esse estranho fato é ignorado por todos em seu lar.
Esses casos são mais frequentes
talvez do que possamos imaginar, porém, são conhecidos e comentados apenas nos
meios íntimos, pela vergonha natural e desgostos que causam.
Se o espírito que vai reencarnar
trás consigo uma pesada bagagem de um passado de culpas graves e crimes, é
possível que até as suas vítimas também atuem sobre a gestante, daí a causa de
agitações inexplicáveis dela e do feto, um indefinido pavor de perseguições,
uma ideia vaga de ter ofendido alguém.
Na época da gravidez, a mulher, sob
a ação do espírito candidato a uma nova vida, sente desejos de comer
determinadas coisas que vão influir poderosamente na constituição física do
feto, cujo objetivo é prepara-lo em condições materiais de servir
convenientemente para o encargo ou a vida que vai ter na Terra.
Da sua alimentação, mais do que dos
medicamentos, por vezes nocivos, é que depende a robustez ou debilidade do entezinho
em formação. Os depurativos, tão em uso, podem produzir maus resultados. Entre
pessoas do nosso conhecimento, temos um caso digno de estudo. Uma senhora, mãe
de quatro filhos, durante a gravidez de um deles, a conselho médico,
submeteu-se a um tratamento antiluético e reconstituinte. A criança nasceu
forte, com aparência sadia, porém, é quase um anormal, pois apresenta sintomas
evidentes de idiotice. A tendência moderna é de interessarmo-nos mais pela
alimentação que pelos remédios.
O autor observou que todos os seus
filhos, em número de seis, sentem o mesmo prazer pelas coisas que eram objeto
de desejo incontido da esposa querida.
O segundo filho, Carlos Aurélio, que
aprecia com imensa satisfação qualquer espécie de frutas, contribuiu para sua
mãe comer, sem se fartar, frutas em grande quantidade, mesmo as que não gosta e
nem suporta no seu estado normal.
Durante a gestação do terceiro
filho, Carlos Alberto, ela sentiu tentação de beber aguardente, muito embora
seja uma bebida que até o cheiro repugna-lhe. Em pequeno ele manifestava
tentação por bebidas. Certo dia, tendo tomado vinho em demasia,
clandestinamente, em uma festividade, ficou doente, vindo-lhe daí uma aversão
pela bebida. Desde muito pequeno, esse menino apresentou, em épocas não
determinadas, dores hepáticas que o faziam chorar muito. Ligando os
acontecimentos, formulamos a seguinte hipótese: Será essa moléstia o estigma em
seu períspirito de um mal contraído noutra existência, em consequência de uma
vida desregrada? É uma hipótese, apenas, mas é a hipótese que marca o ponto de
partida de toda investigação.
Com o objetivo de colher uma
contribuição rica para o nosso trabalho, indagamos de várias senhoras de nosso
conhecimento, se haviam feito observações idênticas às nossas. Isto é, se os
seus filhos tinham prazer em comer aquilo que eles desejavam quando em estado
de gravidez, mas pouco colhemos de positivo e digno de citação, pois, como já
dissemos em várias oportunidades, poucos sabem observar, para isso é também
necessário educarmo-nos.
Apenas uma senhora residente em
Niterói, esposas de um amigo que muito prezamos, P.S.A., altamente colocado no
comércio desta metrópole, disse-nos que, ao ficar grávida da sua primeira
filhinha, “era louca por queijo”, e
que a menina cedo demonstrou prazer por queijo, a tal ponto que, certa vez,
ludibriando os pais, comera em demasia, tendo ficado gravemente enferma em
consequência disso.
Não é somente o prazer pelos
alimentos que se manifesta como demonstração d atuação do espírito sobre a
gestante, o gosto por certos divertimentos, pela arte, pelo estudo, também.
Conversando a respeito das nossas
observações com uma senhora que se encontrava em estado interessante, esposa de
um destacado elemento da alta administração pública, ela achou interessante e
interpelou-nos prontamente: “Acha o senhor que eu vou dar a luz uma criança
apreciadora de música? Talvez um maestro? Completou a rir. O senhor não sabe
como eu sinto agora imensa satisfação pela música. Quero tocar, ouvir boa
música e isso parece-se estranho, porque eu passava longo tempo sem me
aperceber do piano.
Dois anos depois, voltando à sua
casa, ela lembrou-se da nossa conversa e disse-nos logo: “Sabe que a minha
filhinha gosta imensamente de música? Quando alguém vai tocar, ela aproxima-se
do piano com muita satisfação e não se afasta senão quando termina.”
Cremos que, sob o ponto de vista
espiritual, estes fatos têm sido pouco observados e por isso fazemos um apelo
aos nossos confrades a fim de contribuírem para esclarecer este ponto deveras
interessante.
Havendo um fundo de verdade no que
vimos expondo, é o caso de, em vez de se tratarem as perturbações próprias da
gravidez, por meio de remédios e panaceias, experimentarmos os efeitos dos
passes magnéticos ou espirituais e preces. Estamos quase certos de que este
processo seria eficaz.
O fato, narrado circunstanciadamente
no início deste capítulo, deve ser bem analisado pelo leitor.
A princípio, o espírito foi visto
satisfeito, cheio de alegrias e a sua comunicação foi fácil. O mesmo já não
aconteceu posteriormente, quando começo a operar-se a perturbação para perder a
consciência de si mesmo. O vidente viu o espírito triste, com o aspecto
ofegante, d quem estava sumamente fatigado e dos seus olhos correram lágrimas.
Observou também o médium uma espécie de fumaça desprendendo-se do espírito e
penetrar naquela que ia ser sua futura mãe.
Na última sessão era notável a
perturbação do espírito, que veio amparado por dois outros mais adiantados e
provavelmente os próprios guias.
Numerosos são os casos, embora nem todas
manifestem, de mulheres grávidas, que se enchem de apreensões; umas receiam a
morte, outras sentem temores vários e indefinidos e algumas tem pavor que o
filho nasça deformado ou mesmo um monstro.
Logo após a “délivrance”, a
parturiente manifesta o desejo de ver o filho, e o seu olhar perscrutador
examina o corpinho do recém-nascido, a fim de certificar-se da sua perfeição. A
pergunta ao médico ou à parteira: “O meu filho não tem defeitos ?”, é tão comum
que passa como coisa sem importância, mas é a última prova da preocupação
angustiosa que a dominava.
Para explicar esses casos estranhos,
nenhuma hipótese conseguiu ainda as primícias da verdadeira lei. Se de um lado
os maus pressentimentos justificam-se na horado parto; de outro, e isso na
maioria dos casos, eles não se realizam.
Qual então a origem desses fatos?
Nada se sabe de positivo.
Em torno desses acontecimentos
peculiares à gravidez, a ignorância criou lendas e superstições, algumas das
quais verdadeiramente absurdas, como essa de atribuir a causa dos lábios
rachados a uma chave colocada no seio ou no ventre. Hoje em dia, esse defeito é
apresentado como sinal de tara sifilítica. Contudo, não é recomendável
considerar destituídas de fundamento as observações do povo, pois, vez por
outra, verificamos algo de verdade.
Elizabeth Valente, esposa do autor,
estando em estado interessante, visitou Dona Maria do Carmo, esposa do nosso
estimado confrade e amigo Desembargador Nogueira de Faria, e vendo uma das
meninas, ficou deveras encantada por um sinal escuro, quase preto, de bonita
aparência, que dava certa graça no bracinho da criança. Indagando da origem,
Dona Maria do Carmo atribuiu à influência de um besouro preto que lhe caiu
sobre o seio quando estava grávida, muito embora não se tivesse impressionado
com o caso, lembrava-se apenas de ter tido um grande susto.
Elisabeth, desejosa que o fenômeno
se repetisse consigo, procurou um besouro iual ao indicado, porém, quando o
encontrou, temendo ser ferrada pelo inseto, matou-o., e só então teve a coragem
de colocá-lo sobre o seio. Ao nascer nossa filhinha Lecy-Elisabeth verificamos
ter no ventre um sinal semelhante a um bichinho, de cor esmaecida e também
outro no braço, que lembrava perfeitamente um colar de pérolas, um tanto longo,
que Elisabeth vinha usando desde antes da concepção. Deram-se assim, na mesma
ocasião, dois fatos distintos: o aparecimento de um sinal desejado e de outro
para o qual não havia concorrido nem o pensamento nem a vontade.
Este acontecimento deu-se com o
quarto filho, não se tendo repetido nas gestações posteriores, nem antes
observamos algo nesse sentido.
Houve apenas uma ocasião em que
Elisabeth, tendo por descuido posto uma chave algum tempo sobre o ventre,
alarmou-se pensando no futuro do filho que ia nascer, tendo-lhe, porém, sido
explicado a origem científica dos lábios de lebre, esqueceu rapidamente o fato
e nada de anormal sucedeu.
A aspiração vigorosa e constante de
que uma criança seja desta ou daquela forma, nem sempre se transforma em
realidade.
W. G. relatou-nos o seguinte: F.T.,
nosso colega, recém-casado, desejava, juntamente com a esposa, ter um filho
lindíssimo. Com o intuito de impressionar a sua esposa, adquiriu algumas
estampas de crianças muito belas e essa senhora passava horas contemplando-as.
O nascimento do filho deu-lhes uma grande decepção, era muito feio.
Enquanto esse casal passou por
semelhante dissabor, uma senhora de nossas relações, que procedia da mesma
forma, obteve o seu desejo, pois teve um filhinho lindo, que se assemelhava a
uma das figuras que mais a tinham interessado.
Vemos, portanto, com dois casos
apenas, para não fatigar o leitor, pois eles contam-se ás dezenas, que se
comprova a hipótese outro a destrói na mesma ocasião.
Várias causas podem determinar esses
fatos. Castigo para a vaidade dos pais. Fealdade própria da imperfeição do
espírito que volta a Terra, o qual, consciente da sua aparência antipática,
sugere aos pais a proceder daquela forma para ajudarem-no a modificar o seu
aspecto.
Quanto ao segundo caso, é possível
que o espírito de lindo tipo tenha também induzido sua mãe a agir daquela
maneira para auxiliá-lo a dar ao corpo a beleza desejada e que naturalmente era
necessária para o seu modo de vida no mundo terráqueo.
A doutrina firmada e aceita até hoje,
é que o receio, o assombro, a sugestão, impressão violenta da gestante, são as
causas determinantes dos casos teratológicos.
Baseados no Espiritismo, lançamos
outra hipótese. É a alma do nascituro que atua mais sobre a futura mãe do que a
desta sobre a daquele.
A leitura impressionante, o terror, o
pavor, a sugestão e todos os acontecimentos extraordinários, entram apenas como
elementos de ordem secundária, e servem para consolida a estrutura de um corpo,
que, desde o início da gestação, vinha se formando com defeitos. Esses fatos
são consequência e não causa.
Parece-nos anticientífico que um fato
surpreendente e horrível contribua para transformar, num espaço de tempo assaz
reduzido, em um monstro, uma criança que vinha se formando com perfeita
normalidade desde o primeiro instante da concepção.
Quando éramos ainda criança, ficamos
espantado com a notícia de um jornal, sobre o nascimento de um monstro.
Um homem casado foi como de costume
caçar, sem que isso causasse o menor receio em sua esposa. Ao regressar à casa,
trouxe ele um macaco morto. Ao ver o animal, a mulher, que estava no último mês
de gravidez, teve um tão forte abalo que adoeceu e daí a dias deu nascimento a
uma criança em tudo semelhante a um macaco. Não apresentamos pormenores por não
termos guardado senão a lembrança do fato.
É científico aceitar-se que o horror
tenha transformado uma criança normal, perfeita, num monstro? Que mãos mimosas,
delicadas, cabelos curtos, crânio bem conformado, sejam repentinamente
substituídos por mãos animalescas, pelos longos e cabeça simiesca?
Essa hipótese é menos provável do
que a de crer que é o espírito que vai reencarnar que provoca na gestante o
pressentimento do que vai acontecer. As crianças deformadas representam
expiações penosas para pais e filhos.
Que um fato sinistro, emocionante
presenciado por uma mulher grávida produza abalo, traumatismo ou possível
parada de desenvolvimento do feto, é mais aceitável.
Eis dois casos notáveis, que
corroboram o nosso ponto de vista, transcritos do livro do Dr. Albert Coste ‘Fenômenos Psíquicos Ocultos’, prefaciado
por Medeiros e Albuquerque:
“O Dr. Swift refere a observação de
uma mulher grávida e quase a termo que, tendo ficado muito comovida, deu à luz
outra criança, cuja unha do mesmo dedo estava preta; três semanas depois, com
vinte e quatro horas de diferença, as unhas dos polegares das duas crianças
caíam ambas.
“O Dr. Erico Coelho, professor de
clínica obstétrica e ginecológica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro,
levou ao conhecimento da Academia de Medicina um fato curioso por ele e uma
colega Mme. Hoxe Cardoso.
“Um rapaz católico tinha casado com
uma judia. Quando se tratou de obter o consentimento dos pais desta, houve
grande relutância. Afinal, decidiu-se o casamento com uma condição expressa: que
do casal os filhos seguiriam a religião judaica e as filhas a católica.
Celebrado o enlace, a mulher se declarou que não se submeteria à imposição da
família dela e, se lhe nascesse um filho, não permitiria a circuncisão. Desde
então, entre os cônjuges, esse foi um motivo de intenso desgosto. A mãe,
prevendo que, depois das dificuldades que tivera a recusa da circuncisão, ia,
logo após o nascimento da criança, ocasionar a desavença com toda a sua
família, não tinha outra preocupação.
Resultado: a criança, que era um menino,
nasceu perfeitamente circuncidada.
O fenômeno é tanto mais
interessante, quanto a falta da hereditariedade da modificação produzida nos
circuncidados é alegada, frequentemente, como um argumento contra o
darwinismo.
Assim, o que ainda não pode, na
descendência dos judeus, a obra de muitos séculos, foi conseguido pela
imaginação materna.”
No primeiro caso, é interessante
observar que o dedo portador de uma prova de traumatismo ficou são dentro de
pouco tempo e, assim, desapareceu o vestígio e o caso permaneceu na lembrança
apenas como um caso triste.
No segundo, de acordo coma a teoria
espírita, p ode admitir-se que o espírito que vinha reencarnando há muito tempo
entre os judeus, fortemente dominado pelos preconceitos religiosos, não e
conformado com a ameaça que pairava sobre o seu destino, e por isso incitou sua
futura mãe a impressionar-se fortemente com o caso. O observador não relata se
a judia desejou que o filho nascesse circuncidado, o que era de grande valia
saber-se; segundo deduzimos, ela não tinha pensado em tal, dado o fato dos
hebreus ligarem grande importância às cerimônias religiosas.
Vejamos ainda mais um caso citado no
mesmo livro:
“O marido de uma senhora, que estava
grávida, recebia frequentemente a visita de um colega de profissão, aleijado de
uma das mãos. Antes da gravidez, nunca o fato impressionara a senhora, que
aliás é uma grande histérica de tipo taciturno. Depois, porém, que isso
aconteceu, a quem ela era obrigada a fazer sala, acolhendo-o amavelmente,
começou a angustia-la. Deixou-se tomar por um receio obsedante de vir a ter um
filho com o mesmo aleijão.
Ao dar à luz, sob a ação do
clorofórmio, nada percebeu. Mas, assim que recuperou os sentidos, reclamou que
lhe mostrassem o filho para ver se estava perfeito. O filho tinha, de fato, os
dedinhos cotos (amputados ou abortivos) na primeira falange e só o polegar
conservado, com um estrangulamento anular aquém da falangeta, parecendo indicar
que aí também se ia dar uma verdadeira amputação espontânea e não uma simples
parada de desenvolvimento.”
Este caso é de observação do Dr.
Luiz Antônio da Silva Santos, também lente da Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro.”
Entre os casos citados, o último
parece-nos ser o que mais corrobora o nosso ponto de vista, pois, segundo a
narrativa do próprio assistente, ela não se havia impressionado antes com o
aleijão do amigo do seu esposo. É lógico, pois, que admitamos que o nascituro
já estava condenado a reencarnar aleijado e foi o seu espírito que despertou,
na gestante, o pressentimento de uma coisa que se ia realizar. Não havendo
efeito sem causa, para nós espíritas, cada deformação não passa de um castigo
por uma determinada falta, Jesus, o nosso Amado Mestre, disse: “Se a vossa mão
ou o vosso pé são para vós causa de escândalo, cortai-os e lançai-os longe de
vós; vale mais para vós entrar na vida tendo um só pé ou uma só mão, do que ter
duas e ser lançado ao fogo eterno. E se o vosso olho é causa de escândalo,
arrancai-o e lançai-o longe de vós, vale mais para vós entrar na vida com um só
olho de que ter dois e ser precipitado no fogo do inferno.” (S. Mateus, Cap.
XVIII, vv. 8-9; S. Marcos, Cap. IX, vv. 41-47).
Se os temores, emoções fortes,
sugestões são os fatores preponderantes dos casos teratológicos, como explicar
àqueles em que nada sucede digno de atenção como presságio dos mesmos?
E eles tornam-se mais inexplicáveis
para a ciência materialista, quando, acontecendo do modo que acabamos de
referir, o fato é único entre vários irmãos perfeitos e sadios.
O delicado estudo da maternidade em
todas as suas fases, faz nos deparar com inúmeros e transcendentes problemas.
Por vezes, tudo parece correr bem
quando se aproxima o momento supremo. Um imprevisto acontece e um grande perigo
se apresenta pondo em risco a vida de parturiente. Depois de investigarmos as
causas puramente materiais, não seria lógico admitir tratar-se de um espírito
inimigo da família que, coagido a reencarnar num meio estranho e antipático,
tivesse num derradeiro arranco procurado fugir às leis divinas? É possível. A
objeção é imediata, não dizem que o espírito perde a consciência antes de reencarnar?
Sim, mas não de todo. Os casos citados de crianças se recordarem de
acontecimentos de outras vidas é o testemunho real de que o esquecimento
completo só se concretiza entre os seis e sete anos.
Eis mais alguns casos interessantes,
que se ajustam ao que vimos afirmando.
Há muitos anos, já o nosso confrade
Rafael Ferreira Gomes, de Belém do Pará, contou-nos que uma senhora voltava
aflita do Instituto de Proteção e Assistência à Infância, por causa de um filho
de meses que vinha sofrendo de umas convulsões inexplicáveis. Os médicos não
sabiam determinar a causa. Todos os remédios haviam falhado. Habilmente
aconselhada a recorrer ao Espiritismo e tendo aceito, o médium vidente e
curador tudo esclareceu.
“- A senhora ainda não notou que a
criança só tem tido esses acessos quando está no seu colo?
“ – Realmente, meu senhor, os
acessos costumam a dar quando ele está mamando. Começa primeiro por fitar-me
com insistência e depois aparecem as convulsões.
“ – O remédio dele, minha senhora, são os
passes e as preces. Este menino foi seu inimigo em outra existência. Ao fitar o
seu rosto, a lembrança não apagada de todo reavivava-se e ele manifesta o seu
desagrado, mas, tenha paciência, resignação e Fé, que isso vai passar.”
E, realmente, dentro de uma semana,
com passes diários, a criança ficou completamente curada.
Uma advertência dessas, longe de
despertar ódio da mãe, servirá de modo imperioso para que ela tenha pelo filho
um desvelo maio do que o habitual, para fazer de um inimigo um amigo, pois
todos nós temos o dever de trabalhar para reinar a verdadeira fraternidade no
mundo, e esta tem a sua base fundamental no lar, sob a santificada orientação
da mulher.
Um outro caso digno de citação nos
foi relatado pelo conhecido e incansável propagandista do Espiritismo,
Professor Leopoldo Machado.
Visitávamos o “Lar de Jesus” e
falávamos sobre aquelas criancinhas cujos destinos lhe estavam confiados.
Abordamos a reencarnação, quando ele disse: “Vê aquela menina branca, de olhos
verdes, de semblante tristonho? Foi uma princesa segundo uma revelação
espontânea no nosso Centro. Muitos dias antes, essa menina vinha choramingando
continuamente, aborrecida, enjoada, mas sem estar doente, não queria brincar.
Uma noite aparece um espírito dizendo-se de alta nobreza e não se conformar com
a sua situação de asilada, principalmente entre crianças desamparadas. Era
preciso tirá-la de lá, porque não era desta forma que se tratava de uma
princesa. Doutrinada, mostrou-se mais calma e deixou o médium. A criança,
depois disso, sem tomar medicamentos, nem receber afagos mais privilegiados que
os outros, mostrou-se mais alegre. Quantas vezes, dizemos nós, as choradeiras
extemporâneas das crianças não têm a sua causa de fundo puramente espiritual?
Conhecendo-se a Doutrina Espírita, encontra-se remédio para todos esses casos extraordinários
pois os passes e as preces são recursos incalculáveis de podemos lançar mão em
benefício dos nossos irmãos sofredores.
E quando pensamos que em pleno
século XX ainda aparecem homens que se opõem ao emprego de bens que o céu nos
concedeu para amenizar a situação do nosso semelhante, ficamos perplexos, sem
saber em que pensar mais, se no futuro de sofrimentos angustiosos dos mesmos,
se no sentimento de tristeza de não poder praticar o bem como ensinou o nosso
Amado Mestre Jesus.
Confiemos na misericórdia
divina. A evolução não está sujeita aos caprichos dos homens, quando a sua
marcha tive de ser feita de modo mais rápido, bons e maus serão arrastados,
como tudo é levado pelas águas turvas da inesperada enchente de um rio, e
nesses momentos de dor e desespero, uns auxiliam os outros, mas será tarde
porque os cabritos serão apartados das ovelhas. E então muitos dirão: Senhor,
nós também te seguíamos, nós também te rendíamos culto, nós também praticamos
prodígios em teu nome.” E o Senhor perguntar-lhes-á: Quando fizestes isso,
porque não me lembro? Nós ajudamos a construção do templo de S... na cidade
de... não auxiliamos a edificação do asilo? ... não demos sempre avultadas
esmolas? E o Senhor replicará: Já recebeste a vossa recompensa, pois estes atos
foram impulsionados pela vossa vaidade. Outros dirão ainda: Senhor, nós fizemos
talvez mais do que isso. Como ocupávamos lugares importantes, preservamos a
humanidade da exploração dos maus. Não consentíamos que as leis sociais fossem
desrespeitadas. Lembra-te de nós. E o
Senhor também lhes dirá: Já recebeste a vossa recompensa. Todos esses atos
foram produto do vosso orgulho e falso saber, e ainda do vosso desmedido
egoísmo. Na defesa do interesse da humanidade estava oculto o vosso.
Envidemos, pois, todos os nossos
esforços na difusão dos princípios luminosos da Doutrina Espírita, que a
humanidade terá melhores dias no porvir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário