Ismael Gomes Braga
A Mediunidade
Ismael Gomes Braga
Reformador (FEB)
Novembro 1947
Acontecerá depois que derramarei o
meu espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os
vossos anciãos sonharão, terão visões os vossos mancebos; também sobre os
servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu espírito. Joel, II. 28 e 29.
São chegados os tempos preditos pelo
profeta. Por toda a parte surgem médiuns: homens e mulheres, jovens e anciãos,
gente iletrada e professores de Universidade. América Delgado, Zilda Gama,
Francisco Cândido Xavier, Porto Carreiro Neto já representam uma longa escala!
Dos três primeiros não precisamos
falar, porque todos os leitores de Reformador os conhecem em livros que
circulam há decênios. Vamos tratar somente do quarto, cujo primeiro livro
apareceu neste momento.
Por alguns poemetos em português e
Esperanto recebidos mediunicamente e publicados nestas colunas, já os leitores
sabem que Porto Carreiro Neto é médium de sublime inspiração poética, mas ainda
ninguém sabia que esse ilustre professor da Universidade do Brasil receberia
igualmente mensagens de impressionante expressão científica, como agora vemos
no primoroso livro Ciência Divina, de
Jayme Braga.
É um livro desconcertante para os
professores da ciência oficial, entre os quais se acha o médium, cujo lápis
escreveu essas páginas que em muitos pontos lhe contestam as convicções
científicas. Talvez seja audácia nossa escrever sobre essas lições, mas
pareceu-nos necessário que um membro do povo simples, um estudioso da Doutrina,
dissesse algo, suas impressões do livro que se destina a todo o público
espírita, não somente aos sábios das Universidades.
Num prefácio de 15 páginas, em
excelente português, composição elegante, revisão perfeita, o médium nos
esclarece sobre a sua mediunidade, faculdade pela qual revela muito respeito.
Diz-nos: “...as ideias me assaltam aos
turbilhões, tendo eu, pois, necessidade de acompanha-las com o lápis o mais
depressa possível. Não tenho a menor ideia nem do que vou escrever de início,
quando sinto a aproximação de algum manifestante nem, outrossim, do que
escreverei ao fazer ponto nalgum período”.
Só trata nesse prefácio da
mediunidade psicográfica, mas quem escreve estas linhas o conhece igualmente
como médium de incorporação. Já o temos visto por muitas vezes incorporado, ora
com o Guia, dirigindo trabalhos durante mais de uma hora, ora com Espíritos
perturbados a serem doutrinados. Convém ficar aqui registrado, portanto, que
Porto Carreiro não é somente médium psicógrafo, como se deduziria da leitura do
livro: sua missão mediúnica é muito mais complexa. Ainda outra forma de
mediunidade muito original de Porto Carreiro é a artística, tão diferente da
que se nota em Francisco Cândido Xavier. Este último recebe um poema com a
mesma desenvoltura com que recebe prosa, ao correr do lápis; Porto Carreiro recebe
um soneto lentamente, por inspiração, verso e verso, sem ação mecânica do
braço. Por vezes o poeta invisível o visita em momento inesperado,
durante uma viagem, ou o interrompe quando escrevendo ou lendo. Num ônibus, por
exemplo, sente a presença de um Espírito e toma de um cartão e lápis e vai
escrevendo, em letra muito miúda, os versos que lhe são inspirados. Ao fim da
viagem tem o trabalho pronto ou quase pronto. Assim tem recebido lindos sonetos
de Camões, de Bocage, de Abel Gomes e outros. Não raro recebe belos versos em
Esperanto, alguns dos quais já se acham impressos em Reformador e outros e muitos em sua pasta, sem publicidade.
Passa a declarar no mesmo longo
preâmbulo que gostaria muito de poder apresentar o livro como seu, porque o
acha interessante, mas não o faz, porque tem certeza de que a obra não é sua e
sim de Jayme Braga. Refuta a teoria do subconsciente, porque muitas ideias do
livro são inteiramente novas e desconhecidas do mundo.
A seguir dá explicações de termos
científicos, para que os leigos em ciência possam compreender o pensamento do
Autor, tornando assim o prefácio uma breve iniciação em Física e Química.
Apesar do esforço do prefaciador, o
livro requer muita reflexão e certa instrução e não está ao alcance de todas as
inteligências, como os romances mediúnicos ou as mensagens morais. A obra
parece destinada às rodas intelectuais e não ao povo em geral. Nesse sentido,
surpreende-nos a coragem da Editora, dando a primeira edição de cinco mil
exemplares que é demasiado grande para livro de compreensão difícil. Bastariam
dois mil exemplares para muitos anos.
Nalguns
lugares mais difíceis, interfere Bezerra de Menezes, dando esclarecimentos,
ajudando o leitor a penetrar no pensamento do Autor.
Em outros artiguetes prosseguiremos
dando nossas impressões do livro e desde já expressamos nossa imensa
curiosidade por saber como será recebida no mundo espírita brasileiro uma obra
dessa natureza, por enquanto quase única, pois que a única de natureza
semelhante, “A Grande Síntese”, de Pedro Ubaldi, em tradução de Guillon
Ribeiro, só teve uma edição e ficou em pequenas rodas de eruditos.
Não se suponha, no entanto, de
nossas palavras acima, que se trate de um livro friamente científico, sem Deus
nem fé, como costumam ser as obras de mera ciência. Nada disso! O livro é um
hino de louvores ao Criador e ao Universo. Os seus esforços mais ingentes são
para entendermos o poema de Deus na Criação, para aprendermos a ler o Livro
Divino da Natureza. Neste sentido pode ele figurar como páginas de ouro da
literatura religiosa.
Findo o preâmbulo do médium, vem uma
“Apresentação” do Autor, apenas de uma página, na qual define ele sua missão sobre
a Terra. Essa missão resume-se a isto: “...esclarecer todas essas questões que
se debatem em livros, sem que se entendam". “Desejo que tudo se esclareça
de modo elevado e consentâneo com a grandeza do Criador... , diz-nos o Autor
invisível.
Não deve ficar olvidado neste
primeiro artiguete o aspecto literário do livro. Português de lei, excelente
pontuação, boa revisão, dá-nos a impressão de obra clássica de nossa literatura
vernácula.
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