A família de Jesus
Vinícius
(Pedro de Camargo)
Reformador
(FEB) Abril 1925
Discursando Jesus à multidão eis que se aproximam
sua mãe e seus irmãos, pretendendo falar-lhe, E disse-lhe alguém: Estão aí
fora, tua mãe e teus irmãos querendo falar-te. E o mestre respondeu: Quem é
minha mãe e quem são meus irmãos? Em seguida, estendendo a mão para seus discípulos,
acrescentou: “Eis aqui minha mãe e meus irmãos; porque qualquer que fizer a
vontade de meu Pai que está no céu, esse é meu irmão, irmã e mãe.” (Evangelho)
Eloquentíssima lição. Os laços que verdadeiramente
ligam os seres entre si, na constituição
da família, não são os da carne, nem do sangue, mas sim os do Espírito.
Os laços da carne e do sangue são contingências
da vida terrena: afrouxam com o atrito das paixões, rompem-se no momento da
morte. Não podem, por sua natureza, irmanar e confundir os corações, fazendo da
coletividade uma unidade. Só os laços do Espírito logram tal resultado.
A prova desse fato está nas desinteligências
que se verificam comumente no seio das famílias cujos membros se acham ligados somente
pelos frágeis e tênues vínculos da carne e do sangue.
Há irmãos - filhos do mesmo pai e da mesma mãe
- que mutuamente se repelem e até se hostilizam. Há cônjuges que se acham
radicalmente divorciados, aparentando vida conjugal apenas para salvar as exterioridades.
Na organização da família, como na organização
da pátria, só s de ordem moral podem estabelecer aquela coesão indispensável
que dá a tais organizações solidez, vitalidade e permanência.
É no equilíbrio de aspirações comuns que se
funda a base da família. Onde as almas não vibram no mesmo diapasão, onde os
ideais não conjugam, obedecendo a afinidade que se atraem, poderá haver conúbios
híbridos, mais ou menos duradouros, jamais haverá família, nem pátria.
Escusado é dizer que os ideais que deveras congraçam
são os puros e nobres, escoimados de rasteiros interesses. O egoísmo é dispersivo.
Só o amor, perfeitamente compreendido, gera vínculos indissolúveis.
Daí o dizer de Jesus: “Aqueles que fazem a
vontade de meu Pai, esses são os meus irmãos, irmãs e mãe.”
Fazer a vontade de Deus é agir segundo a suprema
lei do AMOR, fora da qual tudo é efêmero, fugaz e insustentável.
Há leis que regem o bem, mas não existe
nenhuma para reger o mal. Este, como efeito da ignorância humana, vai se
dissipando a medida que a luz se vai fazendo nos cérebros e nos corações.
Nada pode ser estável no mal. Quanto mais fora
da lei mais perto da dissolução. Quanto
mais dentro da lei, mais perto da consolidação.
Entre Jesus e Deus há íntima e perfeita
comunhão.
“Eu e o Pai somos um." Semelhante
ideal que visa tão completa identificação, confundindo as individualidades numa
unidade, representa o alvo supremo do Cristianismo, como se infere desta sentença
da oração sacerdotal do divino Mestre: “Pai, quero que todos (seus discípulos
de então e de todos os tempos) sejam um em mim comigo como eu já sou um contigo.
Eu nele e Tu em mim para que, desse modo, todos se aperfeiçoem na unidade.”
A verdade unifica. O erro dispersa. Se os
homens conhecessem e procurassem obedecer à lei da organização da família, evitariam
inúmeros dissabores e dolorosos sofrimentos. Infelizmente, porém, quando tratam
de o fazer, cuidam de tudo, menos dos fatores de natureza espiritual.
Casam-se corpos, não se casam almas.
Previnam-se os interesses temporais, menosprezando-se por completo os interesses
espirituais.
Consequência: o lar, em vez de ser o doce remanso
da paz, onde se retemperam as forças, é pandemônio, onde se querela, noite e
dia, ou, então, é masmorra, onde todos vegetam e ninguém vive com alegria, de
viver.
O lar, organizado sob a égide sagrada da
lei, há de ser a verdadeira igreja do
Cristo,
conforme a promessa: “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estarei
Eu no meio deles.
Cada chefe de família, assim constituída,
será o sacerdote desse templo augusto. A esposa e mãe - cônscia dos seus
deveres - será o anjo que protege esse ninho abençoado, abrindo sobre ele suas
brancas asas, a fim de abriga-lo das intempéries do mal. Os filhos serão discípulos
que, em tal meio, se exercitarão na aprendizagem da virtude, no cumprimento do
dever, na disciplina e santa do trabalho e da mútua dedicação.
Tal é a família, como a quer Jesus, e da
qual ele se considera membro.
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