Espiritismo
e Espiritualismo
Redação
Reformador
(FEB) Fevereiro 1958
É comum aos homens usar e abusar das
palavras, ora agrilhoando-as a definições e conceitos rígidos e dogmáticos, ora
dando-lhes asas para se librarem (fundamentarem) em altos voos, em remígios (as penas mais compridas das asas) mirabolantes, até que aos nossos olhos elas
perdem sua significação original.
Procuraremos, aqui, não nos
inclinarmos para esses extremos, prudentemente permanecendo no meio: in
medio virtus.
Kardec, em "O Livro dos
Espíritos" (22ª ed. brasileira), pág. 11, declarou: “A Doutrina Espírita ou o Espiritismo tem por
princípio as relações do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo
invisível. Seus adeptos serão os espíritas, ou, se quiserem, espiritistas."
Portanto, por inelutável corolário,
segundo o mesmo Autor, “Espírita é aquele
que crê nas manifestações espíritas”. ("O Livro dos Médiuns" (49ª
ed. brasileira, pág. 411). Em consequência mesmo dessa definição, Kardec chegou
a escrever que o Espiritismo conta entre os seus aderentes homens de todas as crenças,
católicos fervorosos, protestantes de todas as seitas, israelitas, muçulmanos,
budistas e bramanistas, os quais não renunciaram às suas convicções (?). ("O
que é o Espiritismo" (10ª ed. brasileira), pág. 85).
A palavra “Espiritualismo”, que tinha e tem um sentido oposto ao de Materialismo, após os fenômenos de
Hydesville, com as irmãs Fox, ganhou mais um sentido que os norte-americanos lhe
deram; Acrescido do adjetivo "moderno" ou prefixado de
"neo" (Espiritualismo moderno, ou Neo-espiritualismo), passou a
designar as manifestações dos Espíritos com os vivos da Terra, e os crentes se
denominaram, muito naturalmente, espiritualistas. Aceitaram tudo isto os ingleses,
e até mesmo os franceses, antes de Kardec. Este, somente criou os termos Espiritismo
e espírita para maior clareza de linguagem, para evitar confusão com o sentido
originalmente aplicado a Espiritualismo e espiritualista. Todas estas coisas
ele esclareceu na "Introdução" de "O Livro dos Espíritos" e
em “O que é o Espiritismo".
A doutrina dos Espíritos batizou-a, então,
com o nome de Espiritismo. Nunca jamais lhe passou
pela mente utilizar-se deste último termo para nomear uma "doutrina de
Kardec".
“Se
adotei os termos espírita, espiritismo, é porque eles exprimem, sem equívoco, as
ideias relativas aos Espíritos” - reafirmou Kardec para, de uma vez por
todas, deixar bem claro a razão por que ele procedeu daquela maneira.
Aos espiritualistas, principalmente
ingleses e norte-americanos, desde o princípio, por motivos de todos
conhecidos, repugnaram as ideias reencarnacionistas. 0s elevados guias espirituais,
diante desse estado de coisas e para que as novas revelações não sofressem
interrupções em sua disseminação, resolveram velar aos homens daqueles países o
problema da reencarnação, certos de que no futuro apareceria ocasião mais
propícia. Como não poderia deixar de acontecer, Kardec tratou também dessa
questão em sua
"Revue Spiríte", estudou-a com tino e clareza, explicando aos
espíritas franceses o fato, que no fundo
é natural e compreensível. Cheio de tolerância e fé, prenunciou para épocas vindouras
a aceitação da reencarnação pelos espíritas de língua inglesa. Não nos consta
que o mestre de Lyon apresentou, alguma vez, os espiritualistas das terras de
Tio Sam e John Bull como não espíritas. Vejamos o que escreveu o Codificador em
"Revue Spirite", 1862, pág. 109: “A reencarnação, diremos, não é
necessária para que se creia nos Espíritos e suas manifestações, e a prova
disto é que há crentes que não na admitem. Eis aí um fato confirmado. Também não
diremos que não se possa ser um bom Espírita sem o conhecimento dela; não somos
daqueles que atiram pedras contra os que divergem do nosso modo de pensar.”
Desde há muito Espíritos Superiores
e Espíritos familiares se têm manifestado em meios reencarnacionistas daqueles
dois países, declarando que mais cedo ou mais tarde as vidas sucessivas, processadas
aqui neste Planeta, não mais serão ponto duvidoso entre aqueles irmãos. Tudo
tem o seu tempo, acrescentam, e, através dos noticiários internacionais que nos
chegam às mãos, já temos a grata oportunidade de comprovar o que aqueles
Espíritos vêm dizendo: lentamente as ideias reencarnacionistas vão penetrando
ali e acolá.
É natural que tudo isso se concretize
lentamente, pois que o próprio Kardec, missionário chefe do Espiritismo,
relutou em aceitar a teoria da reencarnação, segundo vemos no seguinte trecho
por ele publicado em sua 'Revue Spiríte", de 1862, pág. 51: “Quando o dogma da reencarnação nos foi revelado,
ficamos surpresos e o acolhemos com hesitação, com desconfiança, combatemo-lo mesmo,
durante algum tempo, até que a sua evidência nos foi demonstrada. Assim, nós não
inventamos este dogma mas o aceitamos, o que é bem diferente."
Assim, incoerente é falar que os
neo-espiritistas não são espíritas, só porque ainda não creem, em sua
generalidade, na reencarnação, como incoerente será dizer, por exemplo, que os espíritas
que admitem a revelação rustenista não são espíritas realmente dignos desse
nome!
Devemos convir que entre os próprios
espiritistas há diferenças de compreensão e aceitação de diversos pontos
doutrinários, e diferenças outras que para certos grupos são até mesmo capitais.
A vista disso, poderiam surgir denominações várias que caracterizassem cada
grupo, mas, no final das contas, todos não deixariam de ser espíritas, segundo
a definição de Kardec.
O 2º Congresso Espírita e
Espiritualista Internacional, realizado na capital francesa, em 1889, aceitou,
em suas conclusões, a reencarnação, ressalvando, entretanto, que "um grande
número de espiritistas e espiritualistas constituem uma escola,
que tem direito a todas as considerações dos irmãos, a qual nega a reencarnação,
sem que Isto mude em coisa alguma a doutrina geral admitida pelos espiritistas.
“É útil para todos - confirmou a
comissão - adquirir conhecimento dos argumentos recíprocos
apresentados pelas duas escolas."
Espíritas respeitáveis foram os espiritualistas
Russel Wallace, Edmonds, Olíver Lodge,Crookes,
Arthur Findlay', William Barrett, Hyslop, Dale Owen, Sexton, William Stead,
Conan Doyle, Haraldur
Niellson, Bradley, Chambers, Stainton Moses, etc., etc.
Todos eles são chamados
constantemente na defesa do Espiritismo, e não há espírita propriamente dito
(digamos assim) que numa simples conversa não traga à boca um nome daqueles ilustres
homens, para apoio e afirmação da Doutrina. Espírita. Se a eles, e a muitos
outros, nos arrimamos, porque negar-lhes a. condição de espíritas, unicamente
por faltar-lhes o conhecimento da reencarnação?!
Nos anos de 1898 e 1948, espiritualistas
e espíritas do mundo inteiro, unidos pelo mesmo ideal, comemoram festivamente o
cinquentenário de Hydesville, manifestações que originaram o Modern Spiritualism. Houve entre uns e outros fraternal intercâmbio de
sentimentos e de ideias, demonstrando terem todos o mesmo objetivo: cristianização
da. Humanidade.
Não criemos, pois, barreiras de antagonismo
motivado pelo uso ostentoso, privativo e separatista de tal ou tal vocábulo.
As divergências que existem entre
espíritas podem ser aplanadas pela tolerância recíproca. O tempo e os fatos
desvelarão a Verdade, e todos terão um só entendimento quanto ao problema do
Ser, do Destino e da Dor.
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