domingo, 16 de setembro de 2018

O Itinerário de Felicidade



O Itinerário da Felicidade
por Indalício Mendes
Reformador (FEB) Setembro 1944

"Em todo homem repousa a partícula da divindade do Criador, com a qual pode a criatura terrestre participar dos poderes sagrados da Criação. O Espírito encarnado ainda não ponderou devidamente o conjunto de possibilidades divinas guardadas em suas mãos, dons sagrados tantas vezes convertidos em elementos de ruína e destruição. Entretanto, os poucos que sabem crescer na sua divindade pela exemplificação e pelo ensinamento, são cognominados na Terra santos e heróis, por afirmarem a sua condição espiritual, sendo justo que todas as criaturas procurem alcançar esses valores, desenvolvendo para o bem e para a luz a sua natureza divina”. (Emmanuel).

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Qual Prometeu, encadeado às suas inferioridades, o homem materializado sente o abutre do sofrimento devorar-lhe as entranhas. Pode, contudo, realizar o milagre de uma metamorfose moral que dilua as espessas trevas da miséria espiritual que o envolve. E, renovados os seus anseios de liberdade, acumula forças, concentra energias, aflito por despedaçar as cadeias que o jungem ao pelourinho da dor. Liberto, reinicia o afadigante jornadear para o Infinito, de encarnação em encarnação, em busca da felicidade, que é o prêmio dos Espíritos redimidos. Ganha o árduo aclive da montanha alcantilada e imensa, retemperado pela fé, que lhe nutre de esperança o coração, e segue corajosamente, demandando o colimado cume. Pode então encher, a largos haustos, os pulmões cansados de tamanho esforço, banhando-os no ar puro das emoções santificadas. Alonga a vista pela distância que ficou lá embaixo, que veio, depois, subindo a trilha da montanha, como que receosa de se mostrar em toda a sua grandeza. É quando, então, mede a enormidade do
cometimento. Esquece depressa as fadigas do passado e procura no horizonte fugidio, com o coração, enflorecido por alegrias imaculadas, a    futuro ainda longínquo; e parte de novo, experimentando uma sensação de festa íntima, tal como sucedeu a Moisés ao vislumbrar a Terra Prometida, do alto do monte Nebo.

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Em todas as coletividades, há sempre um Deucalion preservado de um "dilúvio" universal. E a Humanidade vai avançando paulatinamente para a perfeição, que é o seu destino. Séculos e séculos serão consumidos nesse vagaroso e seguro processo evolutivo, porque a Natureza não dá saltos. Dia virá, porém, em que a Terra ficará plena de Deucalions, porquanto, de "dilúvio" em "dilúvio" - de geração em geração - êles se multiplicarão, numa eloquente afirmativa da força incoercível das leis a que estamos sujeitos no concerto cósmico. Cada indivíduo tem de realizar sua renovação íntima, evitando fazer a outrem o que não desejar lhe seja feito, guiado pela frase milenária do famoso templo de Delfos: Conhece-te a ti mesmo, primeiro passo para a compreensão das verdades evangélicas disseminadas pelo Cristo, sintetizadas no preceito máximo de Sua doutrina: Amai-vos uns aos outros. Nessas duas frases está traçado o itinerário da felicidade humana.

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O homem sofre na razão correspondente de sua fraqueza moral. À medida que se robustece moralmente, reintegra-se na ambiência divina de onde se afastou por infringir as leis do Criador. Estudando-se a si mesmo, conhecendo-se melhor, tomar-se-á tolerante e amigo dos outros homens. Suas próprias deficiências serão as sentinelas de sua conduta. O homem que se desconhece, julga mal seus semelhantes. Atribui-se virtudes que não possui. Por isso foi que Diógenes percorreu as ruas de Corinto, empunhando uma lanterna, à cata de quem se lhe mostrasse homem, não somente pelos atributos físicos, mas pelos predicados morais. O homem materializado é o mais feroz inimigo de si mesmo. Ignora que o verme de hoje será a águia altaneira que, amanhã, cortará os ares, acima, muito acima de altíssimos píncaros, inacessíveis àqueles que mantêm os pés chumbados aos pauis (áreas pantanosas) da materialidade.

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Entretanto, subordinado a leis que tudo impelem ao progresso incessante, o homem precisa aprender que é o construtor do seu próprio destino, entregue que está à relatividade do livre-arbítrio. Tem de aprender por si mesmo que seu sofrimento é obra sua, causado pela resistência que, por seus pensamentos e atos, opõe àquelas leis. "A atividade moral equivale à aptidão que o homem tem de impor a si próprio uma regra de conduta, de escolher, entre vários atos possíveis, o que considera bom, de se libertar do seu egoísmo e da sua maldade. A atividade moral cria no individuo o sentimento de uma obrigação, de um dever. - Só num pequeno número de indivíduos a podemos observar: na maior parte, conserva-se em estado virtual. Contudo, é impossível duvidar da sua realidade; se o senso moral não existisse, Sócrates não teria bebido a cicuta." (A. Carrel).

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O negativismo materialista embota os sentimentos humanos e brutaliza o homem, tirando-lhe a socrática serenidade de encarar as vicissitudes, corajosa e resignadamente. Impede-lhe a visão das claridades excelsas da vida espiritual. Esta a razão de se ridicularizar a sentimentalidade sadia, quando ela mostra a distância que separa o homem do irracional. O egoísmo, causa precípua da infelicidade terrena, torna-o insensível às dores e misérias alheias, mas hipertrofia-lhe os cuidados e as angústias, quando é presa do sofrimento alguém que lhe está vinculado pelo sangue ou pelo amor-feiticismo. Ainda que mesclado com o egoísmo, a sentimentalidade se manifesta nesses casos. O sentimental-altruísta é um espírito delicado, que já sabe sentir como suas as amarguras de outrem.  

O papel do Espiritismo cristão é, pois, destruir as muralhas do egoísmo, erigidas pelo materialismo, câncer da Humanidade. Quanto mais difícil a luta, mais bela a vitória. Todo homem encontra, um dia, irretorquivelmente, a sua "estrada de Damasco"...

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O espetáculo confrangedor do mundo contemporâneo dá-nos o testemunho irrefragável dos erros acumulados por sucessivas gerações de homens despreocupados dos problemas do espírito. E assim continuará sendo, até que a dor
grave na alma de cada um, indelevelmente, o rumo necessário e certo de sua redenção. Depois que a caminhada para a frente e para o alto se inicia, o Espírito se enfloreia gloriosamente, e, a cada avanço para o futuro, parece ouvir o suave murmurejo de vozes estimuladoras:

Sursum corda!... Sursum corda!..  (corações ao alto!)

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E os corações se elevam, extasiados de felicidade, na recepção amorosa do Espírito que se achou a si mesmo, através dos calvários da vida terrena, após os gólgotas vencidos em encarnações redentoras:

- Glória a Deus nas alturas! ...

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