A Verdade Libertadora
Marcílio Gonzaga
Reformador
(FEB) Maio 1944
Conhecereis a verdade e a verdade vos fará livres.
- João, VIII:32.
O homem era escravo do pecado. Iludido pela
aparência de vida material, confundindo o efeito com a causa, supunha que a vida
era esse agregado de matéria em vibração no seu corpo e que, uma vez
desagregada essa matéria, viria o não-ser, o eterno nada.
Essa ilusão dava-lhe o anseio de viver, de conservar
a vida por todos os meios e a qualquer preço, mesmo em sacrifício de outras vidas,
da vida de outros seres. A morte era o supremo pavor, a mais temível de todas
as calamidades.
Afim de conservar a vida, a qualquer custo, o
homem desenvolveu em si o mais violento egoísmo. A propriedade, a liberdade, a
vida de seus semelhantes, passaram a ser por ele sacrificadas, desde que isso
lhe proporcionasse possibilidade de viver mais e viver melhor.
A guerra de conquista, para adquirir terras e
rebanhos e fazer escravos com os vencidos, tomou-se instituição legítima,
porque a lei era ditada pelo vencedor, pelo mais forte.
Depois de despojado de todos os seus bens, o
vencido era vendido no mercado pelo vencedor, como sua propriedade legítima e indiscutível.
O pecado era o grande escravizador: escravizava
imediatamente o vencido e mais remotamente o vencedor, pela lei inexorável de
causa e efeito que o forçava a viver as mesmas dores que impusera a outros
filhos de Deus.
Assim correram milênios. O progresso se fazia
penosamente por entre terríveis lutas e dores; porque, na verdade, todos eram
escravos: uns pertenciam aos seus senhores e outros às suas paixões e temores.
Era assim pela inferioridade moral dos habitantes da Terra.
Quando o homem alcançou um grau de progresso
suficiente para compreender melhor seu destino e iniciar esforços conscientes
no sentido de sua libertação, Jesus desceu à Terra e ensinou-lhe o mistério da
vida eterna e do eterno crescimento. Disse-lhe pela primeira vez: "Conhecereis a verdade e a verdade vos fará
livres".
E
esclareceu mais ainda: "Quem comete
pecado é escravo do pecado", isto é, ensinou-lhe a lei de causa e
efeito que os Espíritos hoje comentam em todos os seus pormenores, apresentando
exemplos vivos e palpitantes de sofrimentos ou gozos, de angústias ou júbilos,
de esperança ou desespero, de paz ou fúria, em consequência de seus atos
anteriores, bons ou maus.
Ficou reservado ao Espiritismo, 19 séculos mais
tarde, explicar minuciosamente a todos os homens o sentido completo daquelas
duas frases do Messias.
Cada crime prepara para o culpado a correspondente
cadeia que o virá maniatar na mesma ou em futura encarnação. Pela sucessão dos crimes,
o homem toma-se um prisioneiro das consequências de seus atos. Seus sofrimentos
são infernais, pelo desconhecimento do futuro e o terror do não-ser. Apega-se
desesperadamente ao corpo, supondo-o a própria vida. É escravo do mais tirano
dos senhores, ao qual se acha algemado. Esse tirano é o pavor que o acompanha
com sua própria sombra, por toda parte, noite e dia.
Porém conhecerá a verdade, saberá que a vida é
eterna e o mal tem fim; que está em suas próprias mãos conquistar um futuro
feliz e livre, pela prática do altruísmo abnegado; verá suas cadeias
dissolverem como neve ao Sol, a medida que rompe ele o círculo de aço do egoísmo
e se projeta amorosamente para o exterior de seu cárcere de trevas, em busca de
seus irmãos. As trevas se desfazem sob a luz do amor universal, e os gemidos se
transformam em hinos de gratidão ao Criador do Universo, cuja paternal bondade
se manifesta ao coração aberto ao amor a todas as suas criaturas.
Os fantasmas obsidiantes do orgulho, da vaidade,
do amor-próprio ferido, do temor, da sede de vida e de gozos, da angústia de
justificar-se e ser compreendido, de impor suas ideias e convicções, de
apresentar-se como padrão; o medo do futuro, dos juízos alheios, da desonra, da
condenação, da dor, da morte, toda essa tenebrosa multidão de fantasmas, que o
escravo do pecado criou para seu tormento, tornam-se
infantis
razões que desaparecem a luz da verdade, como as sombras da noite se desfazem
ao sol da manhã.
"Conhecereis
a verdade e a verdade vos fará livres". De possa da verdade, com a
certeza de que a morte não existe e a vida é eterna, o homem adquire a fé
onipotente que transporta montanhas, porque ele se incorpora 'à caudal infinita
da vida que é Deus. Desfaz-se seu infantil personalismo que era isolamento e
fraqueza, e, sentindo-se uno com todos e com Deus, sente palpitar em si a onipotência
de Deus que tudo conduzirá a bom termo dentro da eternidade e do infinito. A
verdade o fará livre!
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