"Desaparecerá
algum dia, da legislação humana, a pena
de morte?”
- “Incontestavelmente desaparecerá e
sua supressão assinalará um progresso da humanidade. Quando os homens estiverem
mais esclarecidos, a pena de morte será completamente abolida da Terra. Não
mais precisarão os homens de ser julgados pelos homens. Refiro-me a uma época
ainda muito distante de vós.” (“O Livro dos Espíritos”, nº 760, 3ª ed. FEB)
“Estando os filhos de Israel no
deserto, acharam um homem apanhando lenha no dia de
sábado, o qual foi metido em prisão, porque ainda não se sabia o que deviam
fazer com ele. Disse, então, o Senhor a Moisés: “Este homem morra de morte,
todo o povo o apedreje fora do arraial.” Toda a congregação o lapidou, e o tal
homem morreu como o Senhor ordenara a Moisés.” (Números XV: 32-36.)
*
Contradição real entre “O Livro dos
Espíritos” e o Antigo Testamento? Será a Doutrina Espírita uma distorção da
realidade, mero produto da imaginação fértil de um grupo
de idealistas fanatizados em preceitos religiosos que lhes encubram o forte
sentimento de culpa que carregam dentro de si mesmos? Consagraria Deus a pena
de morte?
Seria Ele (como afirmam muitos), acima de infinitamente bom, supinamente
justiceiro? Que justiça, a dizer-se perfeita, poderia consagrar, em última
análise, o assassínio? Todas essas são indagações que bombardeiam o ser humano,
intranquilizando-o, levando-lhe ansiedade, receio, inconformismo.
Na realidade, o estudo bem orientado
da Doutrina Espírita traz-nos a convicção da inexistência
de contradição e, pelo contrário, da presença de uma viva unidade, unidade essa
manifesta globalmente em essência e especificamente, à medida em que damos mais alguns
modestos passos rumo à perfeição.
Isso porque é necessário se entenda
que nem tudo o que se encontra dito no Antigo Testamento, comparado com a
revelação expressa no Decálogo, dimana de fonte divina. Ao contrário...
Moisés - o legislador, o espírito em encarnação material humana, falido e
falível, no uso de suas faculdades intelectuais, emitiu uma série de preceitos
gerais, atribuindo-lhes
origem divina, elevando-os à categoria de norma de conduta rígida, com o fito
de aplacar os exaltados ânimos do povo que conduzia. Somente pela divinização
aceitaria o povo a sua instituição como regra obrigatória, uma vez que somente
a força e a intimidação
eram fatores suficientes para impor respeito e, conseguintemente, ordem onde a
indisciplina reinava desimpedidamente. Somente a severidade extremíssima era
hábil o bastante para coibir o barbarismo execrável, bem como as manifestações
de estupidez quase histérica das multidões precipitadas. Apenas assim, como
vemos, conseguimos entender a palavra áspera da legislação antiga, em geral, e
moisaica, de um modo especial, apropriada à disciplinação de um povo que, ainda
há poucos séculos, defendia costumeiramente o uso da vingança privada (“vendeta”)
onde não havia a menor proporcionalidade entre agressão e reação; onde, frequentemente,
a família do ofendido - muitas vezes sem que houvessem surgido implicações
pessoais ou danos diretamente ligados a vida - reagia animalescamente,
dizimando famílias inteiras, impondo a seus membros inocentes as mais
revoltantes torturas, a desonra, a difamação.
Pelo crime dos pais (e o conceito de
crime, em tal época, era monstruosamente assustador, abrangendo um sem número
de situações) pagavam os filhos, o que equivale à consagração do traducianismo,
dogma estabelecido e contra o qual Léon Denis tanto lutou, abordando
incessantemente o seu conteúdo absurdo e esdrúxulo.
É fácil entender que o problema da
pena de morte antecede a fase de consolidação do Direito, existindo,
praticamente, desde a época em que o homem passou a viver em sociedade, nas
múltiplas exteriorizações possíveis ao termo sociedade: família, fratrias, cúrias,
tribos, cidades, etc...
A vingança privada - ainda em voga,
infelizmente, em algumas regiões da Sicília, com
o nome de “vendeta” - era um como “costume de morte” que, antes extensivo a todos
os membros da família do agressor, apenas vinculado ao bom senso de cada um (quando
existisse), tornou-se relacionado apenas com a figura autora do delito, já
evidenciando alguns rudimentos de evolução moral.
Desde que o homem passou a
raciocinar (deixado o período do princípio espiritual em evolução) a vida lhe
surgiu como um bem preciosíssimo, inalienável e intransferível, uma presença
sempre atuante, constante, uma realidade que - conforme explicitam os Amigos
Espirituais - “ele dispõe a seu bel-prazer”. Mas, é bem verdade, jamais
poderíamos esperar do homem pensante antigo, embrutecido, a compreensão de
verdades que transcendem a esfera da banalidade ou de um bizarro simplismo que,
ainda hoje, encontramos com alarmante frequência.
De início, predominou a lei do mais
forte e, paralelamente, o talião que, em primórdios de evolução, exorbitava,
superava em muito o “olho por olho, dente por dente”. Na verdade tínhamos uma
proporção descabida: o efeito não era proporcional à causa. Até que o homem
compreendesse que o talião é Lei de Deus (in “Os Quatro Evangelhos”, de Roustaing)
e que somente a Ele cabe a sua aplicação, uma vez que somente a Justiça das justiças
e a Bondade das bondades saberia lidar com ele... até que isso acontecesse,
decorreria extenso lapso de tempo.
A lei, de um modo geral
estreitamente vinculada à religiosidade das primeiras eras, mais
tarde passa a atuar em visíveis moldes de transição, muito embora, ao mesmo
tempo, ainda
se atenham os seus efeitos a uma concepção materialista e inapta da vida. De
tal modo,
aqueles que morressem em desonra, por meio da pena capital, sofriam uma espécie de
“pena acessória”, tida, muitas vezes, como pior do que a própria morte:
ficariam privados de sepultura, mais grave do que a eliminação do “quisto
social”. Explica-se tal reação,
à primeira vista incoerente. O Direito, os usos e costumes e as religiões
antigas ainda não haviam sido abençoados com as luzes do Cristianismo, muito
embora a iniciação se verificasse em santuários diversos, obedecendo à lei do
progresso. (1)
(1) Essa iniciação afirmava a unidade de
Deus, constituindo-se em privilégio de poucos. O povo, em si, continuava fiel
ao entendimento do politeísmo, com os deuses e filhos dos deuses. Fora uma
"tradição" herdada do' Oriente que, no entanto, no advento da era
hebraica, encontrou o descrédito e a afirmativa de absurdo. (Veja-se o IV vol.
de "Os Quatro Evangelhos", de Roustaing.)
Assim é que os antigos acreditavam
na vida do Além-Túmulo, inobstante dela retirassem o elemento básico, o
alicerce central, a viga-mestra: a amplitude, a liberdade com ordem.
Circunscreviam a morada dos entes queridos - que divinizavam nas figuras dos
lares (os
Lares eram cultuados no culto doméstico dos romanos como personificações de
seus antepassados),
manes (Na
mitologia romana, os Manes eram as almas dos entes queridos falecidos) e penates (Na mitologia
romana, os penates eram os deuses do lar) a tumbas colocadas, em geral, em amplos
descampados, onde deveria ser depositado o alimento necessário à manutenção da
vida do falecido, assegurando-lhe o respeito além das portas desconhecidas “até
certo ponto”. Assim raciocinando, ligando a figura do espírito vivo, que hoje
sabemos ser o plano espiritual, a determinado terreno santificado, onde se
edificava o túmulo, os homens da lei instituíram a pena da “privação de
sepultura”, acessória nos casos de pena de morte. Nada mais terrível... ainda
pior do que a posterior excomunhão. O morto, sem morada determinada pelo
mármore brilhante, vagava atormentado, sendo alvo de todo tipo de investidas,
dos mais exasperadores tormentos. Como se vê, a Lei antiga era severa; “nunca
fazia considerandos. Para que precisava ela de os ter? Não necessitava de
explicar razões: existia porque os deuses a fizeram. A lei não se discute;
impõe-se”. (“La Cité Antique”, Fustel de Coulanges, pág. 234.)
Prosseguindo nossa análise, veremos
que mais não haverá o talião (A lei de talião, do latim lex talionis (lex: lei e
talio, de talis: tal, idêntico), também dita pena de talião, consiste na
rigorosa reciprocidade do crime e da pena — apropriadamente chamada retaliação.
Esta lei é frequentemente expressa pela máxima olho por olho, dente por dente),
muito
embora a intransigência legal ainda se apresente em larga escala. Não obstante
a lei antiga se plasmasse na religião um tanto bizarra dos deuses, começam a
surgir lampejos de um progresso mais atuante.
Organizaram-se, anteriormente, as
cúrias (divisão
das tribos romanas); e as fratrias (reunião de vários clãs); já eram agora as
cidades, com predomínio do interesse coletivo, estatuindo-se
a ordem constituída. A teoria da época era a de que “punia-se porque se pecou”
(“punitur quia peccatum esb”). E com tal premissa atravessamos milênios,
alcançando a escuridão da Idade Média, quando os temores intensos parecem
recrudescer e atacar com mais intensidade, era em que cada sombra é tida como
instrumento do mal, tempos em que o medo acumulado por séculos e séculos vem à
tona, em um dos mais impressionantes processos catárticos de que se tem
notícia. Generalizava-se o pavor... No entanto, o medo precisava
emergir para que fosse orientado e vencido. Qualquer hábito realizado durante o
“reinado das trevas” era considerado artimanha do demônio, bruxaria. Gritava-se
a morte aos feiticeiros e, paralelamente, implantavam-se os mais hediondos
métodos de tortura, técnicas desumanas. Inúmeros felinos foram sacrificados por
serem animais de hábitos noturnos. E os Espíritos de luz que tiveram seus
corpos de carne sacrificados nas fogueiras?! Surgiram a roda, a decapitação, a
imersão do indivíduo em chumbo derretido (??!!!), enfim, a consagração do
anticristianismo. Em realidade, é a isso que conduz o fanatismo.
Surge o século XVI... Novas luzes?
Mais entendimento? Raciocínio? Em alguns pontos, sim;
em outros, não ... Naquilo que por enquanto abordamos, reina ainda a mais
completa confusão. Já os práticos do século XV romanizaram-se, levando a
repressão a extremos de
monstruosidade; recrudesciam as penas. Os Tribunais Eclesiásticos, em nome de
Deus, queimam
esperanças na Terra, mas não logram destruir a fonte de onde elas provêm. Irrompe
o século XVIII e brilha uma nova luz na figura de Cesare Bonesana, o Marquês de
Beccaria, que, compreendendo as necessidades de humanização do Direito Penal,
lança mãos à obra e, em 1764, em Milão, entrega ao mundo o excepcional “livrinho”
“Dei delliti
e delle pene”, primeiro grito na gigantesca reforma penal que nos trouxe ao
moderno penitenciarismo. O “pequeno grande livro”, na feliz definição de
Faustin Hélie, em 1856,
contém todas as “outlines” da humanização do penalismo, em especial no que concerne
à questão ímpar da pena de morte, na mais clara e evidente prova de que o
espírito sopra onde quer.
Na realidade, já anteriormente os
enciclopedistas haviam protestado calorosamente contra
a teoria da intimidação arbitrária. Voltaire, Holbach, D'Alembert e, sobretudo,
Jean-Jacques
Rousseau opunham-se ferrenhamente à
instituição de um terror constante que, caso houvesse sido consagrado,
reimplantaria a anormalidade medieval. Mas, na verdade, foi Beccaria o estopim
da humanização da pena, tendo influenciado a Revolução Francesa nas
preceituações contidas na Declaração dos Direitos do Homem. Finalmente se
instituía o princípio
da personalidade das penas! Punia-se exclusivamente o criminoso e terminavam os
processos contra defuntos, a desonra de descendentes, bem como o confisco geral
dos bens.
Estribado em Beccaria, o Código
Francês de 1791 suprimiu as penas consideradas cruéis,
exterminou o suplício e diminuiu sensivelmente os casos de aplicação da pena
capital.
É interessante notar que Beccaria se
embasa na teoria do Contrato Social, de
Rousseau,
e, no entanto, mais inspirado, raciocina sobre ela com mais lógica do que seu próprio
autor. Diz Beccaria:
“O homem, cedendo uma parcela mínima
de sua liberdade, para tornar possível a vida em coletividade, não se privou de
todos os seus direitos; não poderia conferir a outrem o direito de matá-lo.
Portanto, a pena de morte é desautorada pelo Contrato Social.”
Observe-se bem um dos fundamentos da
Doutrina Espírita: só Deus nos deu a vida e
só Ele nos poderá retirá-la.
“A contrario sensu”, Rousseau
assevera: “A violação da lei penal, praticada pelo delinquente,
infringe o Contrato Social. Violando-a, o delinquente torna-se inimigo da sociedade.
Tem esta o direito de guerrear os seus inimigos. Ataca, pois, o delinquente,
aniquilando-o.”
Perguntaríamos nós: Se ela tem o
direito de guerreá-lo, qual será o seu dever? Será o de
destruí-lo, como diz Rousseau?.. Ou o de recuperá-lo, como deseja Beccaria? É o
célebre problema dos direitos e dos deveres... Como vemos, o Contrato Social, examinado à luz
do Espiritismo, é programa de renúncia, único meio de se conviver em paz. E
isto Beccaria percebeu, mas Rousseau não. Por isso, aquele relembra o perigo da
má interpretação da Lei, o que nós, espíritas, em sentido mais amplo, diríamos
ser a imperiosidade de retirar da letra que mata, o espírito que vivifica.
Diz-nos o Marquês:
“Quando alguém pratica determinado
ato que vai ser julgado, o acontecimento pode ser reduzido a um silogismo,
cujas proposições são as seguintes: em primeiro lugar, a Lei; em
segundo, o fato conforme ou contrário à Lei: em terceiro, a absolvição ou
condenação do
imputado, inocente ou não, quando seja o fato consentâneo ou não à Lei.” “O
trabalho interpretativo
é perturbador, porque pode incluir outra proposição: a opinião do juiz.
Ter-se-iam, então: a Lei, a interpretação do magistrado, o fato contrário ou
conforme à Lei; e, em quarto lugar, a condenação ou absolvição. Já não haveria
um rigoroso silogismo.”
Em realidade, achamos nós, ainda
existiria um silogismo; mas ele seria pontilhado de
imperfeição, o que obstacularia a plena maturação do problema, de onde surgiria
um julgamento
eivado de personalismos, em sua maioria profundamente prejudiciais. Inobstante,
todo julgamento - e isto é facilmente observável - vem impregnado dos mais
variados juízos de valor, o que se explica pela própria existência do julgador,
que é imperfeito. Mas, conquanto imperfeito, nada impede que semelhantes
opiniões sofram o policiamento do bom senso e da noção de responsabilidade,
originando-se daí um veredicto digno, humano (no sentido de caritativo; seria
melhor dizermos humanitarista), no qual a justiça conseguisse ser cega e,
concomitantemente, leal aos princípios do amor e da caridade.
E é exatamente aqui, voltando à exposição
de Beccaria, que ressurge o problema da
interpretação da Lei que, principalmente em termos de penalismo - mais ainda em
se tratando
de pena de morte - precisa, como já dissemos, ser orientada pela fraternidade, da
qual é molde vivo o Evangelho, entendido em espírito e verdade. Por isso mesmo,
o Direito
Penal atual procura humanizar-se e, felizmente, já se cuida de julgar menos o
ato e
mais o homem, examinando-o, perscrutando-o, sentindo-o do melhor modo possível. Aliás,
é isso que os Espíritos responderam a Allan Kardec, na pergunta nº 747, de “O
Livro dos Espíritos”:
- “É sempre do mesmo grau a
culpabilidade em todos os casos de assassínio?”
“Já o temos dito: Deus é justo;
julga mais pela intenção do que pelo fato.”
O problema da culpabilidade é dos
mais dolorosos em termos de Lei, principalmente se o enfocarmos segundo os
princípios do Espiritismo. Só examinando o homem poderemos alcançar a intenção
e, muitas vezes, sem certa precisão, casos em que o julgamento se prolonga
angustiosamente e os magistrados - o que, realmente, acontece - passam noites
examinando enormes e intricadíssimos processos, à procura de elementos para uma
sentença justa. Daí, no Direito Penal, os conceitos de dolo e de culpa. Esta
advém de negligência, imperícia ou imprudência; aquele (o dolo)
consubstancia-se em uma intenção preexistente ao fato delituoso, o conhecido “animus”.
E todos esses conceitos, quando vinculados à pena de morte, agigantam-se de tal
modo que - é a única conclusão a que chegamos - somente o seu desaparecimento
pode solucionar o impasse. Surgem, então, perguntas sutis, a partir da premissa
mansa e pacífica que norteia a solução do enigma: como punir? Qual a intenção?
Dolo ou culpa? Agravantes? Legítima defesa? Legítima defesa putativa? (2) Inexigibilidade de
conduta diversa? Estado de necessidade? Qual a condição mental do criminoso?
Oligofrenia? Qual o grau?
(2) A legítima defesa putativa pressupõe um
erro de interpretação duma situação que, se verdadeira, legitimaria a ação. A
grosso modo, é o caso em que alguém atira em outrem que lhe apontava o revólver
descarregado.
Percebamos a imensa dificuldade da
solução do caso: se já perante o mundo o
problema
é tão grave, que dizer da responsabilidade perante... Deus? Como procederemos
nós, que somos adeptos da teoria reencarnatória (por ser a única verdadeira e
essencialmente lógica), nós, que somos cristãos e que pugnamos pela compreensão
mútua?! Como agir o espírita que se ache em semelhante situação? Qual a posição
do juiz que
tenha conhecimento do Espiritismo? E do legislador? Volta-nos ao pensamento a
figura inspiradíssima de Beccaria, na interpretação do Contrato Social; e isso
relembremos face
à pergunta nº 761, de “O Livro dos Espíritos”:
- “A Lei de Conservação dá ao homem
o direito de preservar sua vida. Não usará ele desse
direito quando elimina da sociedade um membro perigoso?”
“Há outros meios de ele se preservar
do perigo, que não matando. Demais, é preciso abrir e não fechar ao criminoso
as portas do arrependimento.”
Aliás, dizemos nós, o que senão isso
nos motivou a reencarnação material humana em que por séculos nos encontramos?
Acaso a Justiça Divina proibiu-nos a recuperação dolorosa? Quantas
oportunidades temos tido? Centenas ... Milhares ... Há os que argumentam que
isso só Deus consegue fazer e que a caridade que o Cristo praticou só mesmo ele
o conseguiria. É bem verdade... Longe de nós quaisquer comparações que, acima
de esdrúxulas, seriam ridículas. Mas é o próprio Cristo, aquele que está em
comunhão com Deus, que nos aconselha o aperfeiçoamento constante pela prática
da caridade. Aliás, é isso o que vemos insistentemente em todos os campos da
natureza. Que espírita verdadeiro justifica sua própria imperfeição?.. Ou sua
pretensão de tudo saber e tudo conhecer?
Raciocinar que o criminoso é como um
tumor maligno no organismo social e que, como
tal, precisa ser extirpado, destruído, é um absurdo em todos os sentidos: jurídico, filosófico,
moral, etc... Lembremo-nos de que, antes da amputação salvadora, pela
intervenção cirúrgica, os médicos lançam mão de inúmeros recursos, sendo a
operação considerada como medida extrema. Além disso, para os que defendem a
tese de que há casos nos quais somente a extirpação é eficaz, gostaríamos de
lembrar que um homem é sempre
um ser vivente, ainda que se ache reduzido a massa inexpressiva sobre um leito, com
severíssimos impedimentos físicos obstando-lhe o livre contato com o mundo exterior.
Como tal, como criação de Deus, pagando pesadíssimas dívidas para com a Lei das
leis, merece todo o respeito, estando acima de quaisquer comparações
semelhantes, que apenas demonstram imediatismo, utilitarismo inconcebível, em
resumo, o mais renomado despautério moral, científico e filosófico. Além disso,
a operação que livra o ser humano do tumor maligno põe em risco todo o
organismo, pelas próprias condições em que deve ser efetuada, podendo ocorrer,
ainda que em margem pequena, a desencarnação. Do mesmo modo, endossarmos a
teoria do mal no organismo social como elemento que precisa ser aniquilado,
implica pôr em risco toda a sociedade. E isso porque o homem, sempre que se vê
investido de grandes doses de poder, imperfeito que é, exorbita, eleva-se a
planos de pseudo conhecimento e superioridade: em pouquíssimo tempo estaríamos
trucidando-nos uns aos outros, “voltando às origens” como dizem muitos daqueles
que pretendem afirmar ser a nossa gênese a bestialidade. Nós, por nossa vez,
sabemos que, conquanto tenhamos todos passado pelos reinos naturais, animalizamo-nos
mais com a falência espiritual - que decretou reencarnações que ficaram entre
animais e homens (sem o que haveria, deveras, involução) -- do que aqueles que,
atualmente, são princípios espirituais em evolução no terceiro reino.
Voltando ao assunto, o grande enigma
da aplicação da pena - mais especificamente da pena de morte - rompe as
barreiras da observação puramente material humana, transcendendo os limites do
egocentrismo e lançando raízes nas três revelações trazidas à humanidade: A Lei
Moisaica, mas especialmente o Decálogo; a Revelação Messiânica, consubstanciada
no Evangelho; e, finalmente, a Revelação Espírita, contida na Codificação de
Allan Kardec e obras complementares.
Ao punirmos, exercendo funções de
guardião e de aplicador da Lei, precisamos esclarecer nossa posição filosófica
em relação à pena. Será ela um mero pagamento do mal com
outro mal? Em outras palavras, devemos consagrar a teoria da função retributiva da
pena? Ou adotaremos a teoria da utilidade?.. Então, puniremos não porque “se
haja pecado”,
mas para que “não mais se peque”. Ou, ainda, corroborando nossas asserções no sentido
de que a síntese é o ponto ideal, fiIiar-nos-emos à Escola Eclética, pela qual
há a
pena porque “se pecou” e para que não mais “se peque”? Nós, sempre em busca da ponderação
a que nos concita a Doutrina Espírita, preferimos adotar a terceira posição sem,
porém, conferir excessivo embasamento retributivo à pena a ser aplicada
(pune-se porque
se pecou). Aquele que cometeu um delito põe em risco (em maior ou menor grau) a
segurança da sociedade: logo, merece ser corrigido, não mais através da
tortura, ou da fuzilaria,
ou da forca, ou da guilhotina, ou da eletrocussão, mas por intermédio da
reeducação, com o que ao menos algumas consciências a mais serão despertadas
para a boa conduta ou, ao menos, não encontrarão reverberação de sua
bestialidade na bestialidade da represália.
Em realidade, muitos objetariam,
todas as penas são injustas, considerando-as aprioristicamente mal empregadas.
E prosseguem, em raciocínio apressado, afirmando que, se dizemos não estarmos
capacitados a julgar quem quer que seja, como poderemos aplicar sanções que
acarretem a perda provisória da liberdade ou até mesmo um prejuízo financeiro?
É bem verdade... aquele que não se
acha constantemente contatado com a realidade social do mundo e que, além
disso, demonstra desconhecimento dos problemas jurídicos da sociedade não pode
emitir parecer aceitável. Há ângulos na questão que são desconhecidos daquele
que apenas opina “pelo que ouviu dizer”, ou por alguns trechos ou parágrafos
que, às pressas, retirou de livros de Direito ao alcance de todos. E,
sintetizando, apresentaremos como resposta a seguinte proposta: vamos suprimir
toda e qualquer legislação
a respeito de todo e qualquer assunto porque, na verdade, não podemos julgar
ninguém; é a célebre questão, tão pregada e tão pouco vivida: “A letra mata, o
espírito vivifica” (Paulo, II Cor. 3:6). Repetimos: Se com a lei já somos tão
insubordinados, imagine-se o que faríamos sem ela!..
O presente trabalho não se propõe a
um estudo das religiões antigas, de um modo específico. Isso teremos novas
oportunidades de abordar, quando enfocarmos a presença insofismável do
Espiritismo desde as mais remotas épocas da humanidade, já com o sistema
Sânkhya e a filosofia vedantina, na índia; mais adiante, o mesmo aconteceu com
o Bramanismo.
Interessa-nos, por agora, o problema
da pena de morte.
Vimos a contribuição de Cesare
Beccaria, na sólida argumentação em que se acha vazado o livro “Dos delitos e
das penas”, cuja leitura é obrigatória para quem quer que deseje obter visão
ampla do desenvolvimento do penalismo no panorama mundial.
Mais tarde, a contribuição de César
Lombroso, contida na Antropologia Criminal, inovou mas não resolveu o problema
do criminoso em si: o exagero a que tal corrente foi levada provocou sua queda
no ridículo. E isso porque, muito embora determinados indivíduos, portadores de
altíssimo pendor para o crime (a periculosidade), sejam, de igual modo,
possuidores de dados estigmas que os diferenciam da maioria dita normal, não há
como catalogar um sem número de sinais como “alertas” para a sociedade. Não
obstante a posição
fosse, inicialmente, sadia e inovadora, parece-nos ter havido uma espécie de
paixão pela
tese, o que prejudicou sensivelmente os resultados esperados.
Quanto às paixões, o próprio “O
Livro dos Espíritos” é que nos elucida quanto ao seu
papel: na verdade são elas que, frequentemente, despertam os pendores, as
pretensões, etc... No entanto, “é como um fogoso corcel que necessita do freio
da razão” para
que não assuma a direção da carruagem, atirando-a pelo precipício.
Vimos que Rousseau e Beccaria,
conquanto partissem do contrato social, raciocinavam de modos diversos, cada um
propondo uma solução. E, com tudo o que observamos, pudemos sentir mais uma vez
que “o espírito sopra onde quer”.
Atualmente, o sopro imenso de que é
portadora a Doutrina Espírita, o alento novo dentro
de cada criatura, impulsiona os homens de boa vontade ao almejado encontro com
a paz interior, único modo de entrarmos em perene comunicação com as esferas
mais luminescentes.
E a argumentação cerrada e hiperlógica que a Codificação e obras complementares
nos oferecem não deixa a mais leve dúvida quanto ao problema da Justiça na
Terra: o homem precisa libertar-se dos instintos inferiores, precisa
pacificar-se interiormente, precisa dobrar a crista do orgulho perante Deus,
para que cumpra, com dignidade, a missão que é de toda a humanidade: a
co-criação.
Atualmente (louvado sejas, Senhor!),
já não se julga tanto o fato, mas se procura, principalmente, levar em
consideração o HOMEM.
Obviamente, o fato tem enorme
importância; mas o exame da criatura tem evitado alguns
erros monstruosos. No entanto, a sabedoria eterna não tem vinculações com o
mal: a escolha foi inteiramente nossa... fomos nós mesmos que nos atiramos ao
vício e ao desentendimento; o mal não é fatalismo (e.g. “O mal: sua opção ou seu fatalismo”, Newton
Boechat, in “Reformador” de novembro de 1972) postado abaixo. E já que assim
escolhemos, arquemos com a responsabilidade de nossos atos, lutando agora, com
denodo, para desemaranhar o caótico novelo que fizemos de nós mesmos. É por nossa
causa que nossa justiça é falha; nossa inconsequência impede seja ela projeção
da Justiça Divina; nosso egocentrismo nos leva a pensar apenas em direitos;
poucos, ou quase nulos são os devedores que reconhecemos em nós mesmos. Por
isso ainda há homens sendo assassinados nas câmaras de gás e nas cadeiras
elétricas; a guilhotina ainda funciona, meus amigos! (em 10 de Setembro
de 1977 foi utilizada pela última vez na França - Wikipedia)... O mesmo
acontece com a forca! (Índia,
Japão e alguns países árabes seguem utilizando a forca -Wikipedia)... Parece que,
ultimamente, a bestialidade tem crescido dentro de nós e que estamos voltando
às origens do erro primordial. Que adubo pestilencial será o que estamos
aplicando? Decerto não há de ser o do Evangelho.
Cuidemos de renovar-nos bem
depressa, imediatamente, porque já abusamos demais do amor que nos mantém a
vida. Se Deus é infinitamente misericordioso, tratemos de ao menos respeitar
sua indefinível grandiosidade. Se jamais lograremos alcançá-Lo em Sua perfeição,
sejamos ao menos dignos do Seu amor. Foi a Sua tolerância que nos deu Jesus
como governador e mentor sublime. Correspondamos a tanto carinho!
A pena de morte, bem como qualquer “justiça”
que contrarie as eternas e imutáveis leis universais, não se coaduna com o
proceder espírita, razão pela qual deve ser constantemente
combatida. Somente a Deus hipotequemos nossas vidas, na mais ampla conotação
que a palavra possa apresentar; e observemos que nem mesmo Ele no-la
arrebatará. Não se trata, bem se entende, de combater apenas por combater;
trata-se de pugnar pela elevação da criatura humana, porque já é tempo de nos
renovarmos.
Não há contradição entre a Doutrina
Espírita e o Antigo Testamento. Já isso foi
demonstrado.
Tendo sido o erro a nossa opção, arquemos com as consequências de nossos atos.
O Espiritismo prosseguirá ainda que o não queiramos, “com os homens e apesar
dos homens”.
A pena de morte, esta sim, é um
quisto que precisa ser extirpado urgentemente do organismo
social. Por isso poderemos dizer, por nossa vez, sem receio de cairmos em
contradição:
morte a ela!... Às feras de sua própria animalidade com ela!...
A
pena de morte e a evolução
Gilberto
Campista Guarino
Reformador (FEB) Agosto 1974
.....................................................
O artigo do
Boechat mencionado acima inicia-se aqui...
Quando o codificador Allan Kardec pergunta
aos lúcidos Mensageiros que lhe transmitiram a Consoladora Doutrina “por que é
que alguns Espíritos seguiram
o
caminho do bem e outros o do mal”, as entidades lhe responderam que assim
ocorreu porque
são eles dotados de livre arbítrio (p. 121).
Evidentemente, o livre arbítrio
existe para que o ser possa optar. Se a vontade dele estivesse,
de antemão, condicionada ao bem de maneira definitiva, ou ao mal, não haveria livre
arbítrio. Os Espíritos têm tanta aptidão para uma como para outra coisa.
Na resposta à pergunta 122 de “O
Livro dos Espíritos”, os instrutores invisíveis ainda são
mais claros, informando que “já não haveria liberdade, desde que a escolha
fosse determinada
por uma causa independente de sua livre vontade”; “uns cederam à tentação, outros
resistiram”.
Há, portanto, uns e outros, uns que
querem e sulcam vibratoriamente o campo íntimo naquilo que especificamente
desejam, outros não. Mas, “chegados ao grau supremo da perfeição, os Espíritos
que andaram pelo caminho do mal têm aos olhos de Deus tanto mérito
que os outros”, pois “Deus olha de igual maneira para os que se transviaram e para
os outros e a todos ama com o mesmo coração.” (p. 126).
E, finalmente, na p. 262, Kardec
inquire: “Como pode o Espírito que em sua origem é
simples e ignorante e carecido de experiência, escolher uma existência com
conhecimento de causa e ser responsável por essa escolha?”
As entidades espirituais lhe
respondem que “a inexperiência é suprida por Deus, que lhe traça o caminho que
deve seguir como fazeis com a criancinha. Deixa-o, porém, pouco a pouco, à medida que
seu livre arbítrio se desenvolve, senhor de proceder à escolha, e só então
é que muitas vezes lhe acontece extraviar-se tomando o mau caminho, por
desatender aos conselhos dos bons Espíritos. A isso é que se pode chamar a
queda do homem”. (Todos os grifos são
nossos.)
Ora, de maneira explícita, nas
respostas que os Espíritos deram a Allan Kardec está considerada
a não necessidade do mal no caminho do Espírito e sim a sua possibilidade. Existem
os que andaram pelo caminho do mal e os outros... Somente quando é senhor de proceder
à escolha, só então, é que muitas vezes lhe acontece extraviar-se.
A queda, destarte, não ocorre para
todos os Espíritos. Há os infalidos e que assim vão até
à perfeição; há os infalidos até o momento em que queiram cometer infrações na
harmonia das Leis Divinas; e, finalmente, os há falidos desde que começaram seu
jornadear espiritual. Três modalidades, portanto.
Da forma como situam o problema da evolução
alguns espiritualistas, nota-se lhes uma
discordância com “O Livro dos Espíritos” e “Os Quatro Evangelhos”, que tratam
exuberantemente do assunto. Estratificou-se, erroneamente, na formação de
vários companheiros de tentames espiritistas, a postiça ideia de que o mal é
necessário e que sem ele não se pode entender o bem; os Espíritos começariam,
assim, a sua evolução em meio agressivo, com a pressão ou opressão do meio
ambiente. Intuitivamente, porém, sente-se que o plano de Deus para o
desdobramento espiritual de Suas criaturas não poderia estar inquinado de
negação; a brutalidade não pode e nem deve ser tônica comum, a competição jamais
poderia existir para se selecionar esta ou aquela capacidade. Se estas coisas
ocorrem em
nosso mundo, isto se deve a que ele é de provas e expiações, corretivo de
quedas havidas no plano evolutivo original, mundo ainda atrasado, existindo
mesmo aqueles mais atrasados
do que a Terra, verdadeiros cárceres de segregação, como esclarece Emmanuel em
“O Consolador”.
Lançar em mundos primitivos,
sumamente concretos, em ambiente hostil, Espíritos singelos
que simplesmente começam o longo caminho fora, sem dúvida, por antecipação, fazê-los
cometer infrações, devido a uma série de fatores coativos e limitantes.
A trajetória normal de evolução do
Espírito é o mundo espiritual, “que preexiste e sobrevive
a tudo”. O mundo material poderia “deixar de existir ou nunca ter existido, sem que
a essência do mundo espiritual se alterasse” (p. 86).
A trajetória do Espírito em mundos
físicos ou semi materiais é oriunda de desarmonia por queda, é proveniente de
infração (não uma necessidade em si).
Além de “O Livro dos Espíritos”,
outros esclarecimentos poderão ser colhidos em “Os Quatro
Evangelhos”, coordenados por Roustaing, 5ª Edição, FEB, páginas 297 e 298.
O
mal, sua opção ou seu fatalismo
Newton Boechat
Reformador (FEB) Novembro 1972
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Ainda sobre
o mesmo tema... Joanna de Ângelis!
Em razão do crescente surto da
delinquência na sua multiplicidade chocante, que se
espalha na Terra de forma avassaladora, em que o crime se impõe desarvorado,
esmagando as florações da esperança e da bondade, legisladores de toda parte
voltam a interrogar e sugerir quanto à necessidade da aplicação da pena capital
diante de determinados desrespeitos ao código dos direitos do homem, à sua vida e liberdade ...
O problema, porém, não obstante a
gravidade de que se reveste, não poderá ser solucionado por processos análogos
que defluem da violência do próprio crime ulteriormente tornado legal pelo
Estado.
Lactâncio, cognominado o Cícero
cristão, já enunciava no século III que "a eliminação da
vida de um homem é sempre uma afronta a Deus".
A vida é patrimônio por demais
precioso para ser ceifada seja por quem seja. A ninguém, individual ou
representativamente pelo Estado, cabe o direito de eliminar o homem, mesmo
quando este delinque da forma mais grotesca ou vil. Se o Estado o fizer,
torna-se igual ao delinquente que roubou à vítima sua vida.
Em cada criminoso vige um alienado
necessitado de assistência competente, de modo a reorganizar as paisagens
íntimas por meio de terapêutica especializada, a fim de se tornar cidadão útil
a si mesmo e à comunidade onde se encontra situado pelos impositivos da vida. A
tarefa que compete às leis é a de eliminar o crime, as causas que fomenta, não o
equivocado criminoso. A morte do delinquente não devolve a vida da vítima.
Ao invés da preocupação de matar,
encontrar recursos para estimular a vida. Educar, reeducar são impositivos inadiáveis;
punir não.
Tenhamos tento!
Não há, no Evangelho, um só versículo
que apoie a pena de morte.
Quando o homem cai nas malhas do
crime e culmina sua ação nefanda no extermínio de
vidas ou atenta contra a propriedade por meios da violência, justo que seja
afastado do
convívio social, a fim de tratar-se, corrigir-se, resgatar as faltas cometidas,
mediante processos
compatíveis com as conquistas da moderna civilização.
De forma alguma a pena de morte faz
diminuir a incidência da criminalidade. Ao contrário,
torna-a mais violenta e selvagem, fazendo que o tresloucado agressor, que sabe o
destino que lhe está reservado, mais açuladas tenha as paixões destruidoras,
arrojando-se irremissivelmente nos dédalos das alucinações dissolventes.
Compete ao Estado deixar sempre
acessível a porta para o ensejo de reparação ao sicário
impiedoso ou ao flagelo humano que se converteu em vândalo desavisado. Se o
Estado ceifa a vida de um cidadão, não tem o direito de exigir que outros a
respeitem. A
morte não destrói a vida. Libertando o criminoso do domicílio carnal,
intoxicado pelo ódio
dos instantes finais, fá-lo vincular-se psiquicamente àqueles que lhe infligiram
tal punição,
mantendo comunhão mental de rebeldia por meio da qual mais torpes e sombrias
faz as paisagens humanas...
Processo bárbaro, a pena de morte é
tratamento da impiedade e do primitivismo que aniquila
a esperança por antecipação, marcando a data da punição destruidora, fora de qualquer
possibilidade redentora, que há de desaparecer da legislação terrena.
O criminoso não fugirá à consciência
nem à injunção reparadora pelas supremas leis da Vida. Justo, portanto,
facultar ao revel ensanchas de recompor-se e reparar quanto possível os males
perpetrados.
Nesse sentido, a Penologia dispõe de
salutares programas de redenção para os transgressores da ordem e do direito,
trânsfugas do dever e da responsabilidade, nossos irmãos atormentados da senda
evolutiva.
Obviamente, a questão se situa na
anterioridade da alma, no seu processo depurador...
Necessário implantar na Terra,
quanto antes, as condições morais saudáveis de que nos
fala o Evangelho, a fim de auxiliarmos tais Espíritos enfermos que retomam para reajustar-se,
defrontando desafetos e adversários que a morte não aniquilou, tornando-os irmãos
e amigos.
Sem dúvida, as condições sociais que
promovem o crime e fomentam a existência dos criminosos devem merecer melhor
tratamento humano a fim de que aqueles que vigem nos escabrosos e sórdidos
guetos de miséria conheçam dignidade e sejam com honradez considerados.
Aristóteles, na sua ‘Política’
preceituava que o homem, para ser virtuoso, necessitava possuir
alguns bens: do espírito, do corpo e das coisas exteriores, sem os quais germens criminógenos
poderiam levá-lo ao desequilíbrio.
A era tecnológica, mais preocupada
com os valores objetivos e os da indústria do supérfluo e da inutilidade, vem
esquecendo os legítimos objetivos do homem, seus pendores espirituais, suas
realizações éticas, seus sonhos e ideais de enobrecimento, Emulando para as
aquisições de fora, facultando comodidade e prazer imediatos, faz anular a
felicidade no seu sentido profundo, que independe das conquistas transitórias
para as realizações essenciais e imorredouras do ser...
Aos cristãos legítimos cabe o
indeclinável labor de persistir na bondade, na equidade, na paciência. A
perseverança no amor, mesmo com resultados demorados, consegue a modificação da
face externa das coisas e da intimidade humana para as realizações do
enobrecimento.
Matar, nunca!
Um crime não pode ser solucionado
por meio de outro, de-se-lhe o nome ou a posição legal que se lhe queira dar:
jamais terá validade moral.
Diante, portanto, da agressividade,
revida com a tolerância.
Ante a ira, resposta com a benevolência.
Junto ao ódio, dissemina o amor.
Ao lado da hostilidade sistemática,
propõe o perdão indistinto.
Perante o acusador gratuito, oferece
a paciência gentil, tradutora da inocência.
Só o bem tem existência real e permanente,
conseguindo triunfar mesmo quando aparentemente campeia e domina o mal.
Não engrosses as fileiras dos que,
violentos, pensam em eliminar... São capazes, também, na sua revolta, de
cometer crimes equivalentes àqueles para os quais, veementemente, pedem a punição
capital do infrator.
Ignoras tuas forças. Não sabes como
te portarias na posição daquele que agora é o algoz.
Esparze e semeia o amor, sim, criando
condições joviais e felizes para todos, oferecendo o teu precioso contributo -
mesmo que seja a coisa mais insignificante -, a fim de modificar o estado atual
do mundo, e o crime baterá em retirada, constituindo no futuro triste
sombra do passado, conforme nos promete Jesus.
Pena de Morte
Joanna de Ângelis
por Divaldo
Franco
Reformador (FEB) Agosto 1974
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