domingo, 12 de abril de 2015

Palavras que confundem

Palavras que confundem
Editorial
Reformador (FEB) Maio 1971

            Se há aviso que não pode ser esquecido pelo espiritista é aquele que adverte: “a letra mata; o espírito vivifica”. Isto quer dizer, em suma, que o estudioso da Doutrina deve libertar-se, a começar da leitura do Evangelho, do significado literal das palavras e das locuções verbais, desprezando o vocábulo grafado para apreender e reter o seu conteúdo espiritual.

            Ante recomendação de tal importância torna-se óbvio, em contrapartida, que o espiritista deve alertar-se quanto ao modo de falar e, em especial quanto à maneira de escrever. Ele precisa cuidar-se no emprego das palavras, evitando que se transponham para a área das atividades doutrinárias ideias e conceitos estratificados no significado dos termos e expressões da linguagem comum.

            Espiritismo não é somente uma maneira renovada de interpretar e desvendar os problemas de ordem espiritual. Ele é também um renovador vigoroso das concepções que os homens formam da vida e das circunstâncias imperantes na crosta planetária. Em virtude disso, é de ponderar que nem sempre as palavras consagradas pelo uso do mundo são apropriadas para traduzir o sentido espiritual das exteriorizações doutrinárias, por oferecerem o perigo da deturpação ou do amesquinhamento.

             Quando enunciamos o propósito de difundir a Doutrina, será que a ideia que queremos expressar é exatamente aquela que a palavra difusão sugere? Se a Doutrina tem uma mensagem a veicular, como faze-lo? Nos nossos próprios círculos essa atividade se tem desdobrado sob a prevalente feição de ensino. Todavia - é forçoso reconhecer - o vocábulo ensino pressupõe, no mundo, o professor de um lado e, do outro, o aluno... Ora, ninguém poderá sustentar, neste plano da vida, o título de professor de Espiritismo. Concebemos que os haja, porém, somente no plano dos invisíveis, uma vez que, na carne, somos todos estudantes e, por sinal, muito bisonhos...

            Se estamos certos de que é, ou é bom, aprender o Espiritismo (ou, no Espiritismo? ou, com ele?), subentenderemos incoercivelmente que se faz necessário haja quem ensine a quem quer aprender; e ensinar a quem quer aprender implica métodos didáticos e pedagógicos que só encontram ambiente propício em recintos denominados escolas, as quais, por sua vez, tem seu significado estreitamente ligado a currículos, séries, classes, aulas, aprendizado, disciplinas, cursos, que finalizam normalmente (ou ainda que virtualmente) com a expedição de um certificado declarando seu portador habilitado a exercer uma atividade profissional ou uma especialização técnica. Mas esta, todos concordarão, não é a meta do estudante do Evangelho.

            Não se pode negar que o adepto do Espiritismo deve ser um estudioso. Isto implica absorver conhecimentos, mediante uma dada técnica ou método de transmissão, de assimilação de cabedais já sistematizados e coordenados. Os métodos racionais e provados devem, é bem verdade, ser utilizados. Porém, não menos inegável é que os espíritas estão conclamados a encarar esses problemas de maneira totalmente renovada, sobretudo para equaciona-los em moldes diametralmente opostos às convenções reinantes no mundo.


            As palavras de ordem hão de ser, por certo, fraternidade e solidariedade, que nos impõem o dever de ajudar-nos uns aos outros. Ajudemo-nos, pois, a instruir-nos, de acordo com a recomendação do Espírito da Verdade. E - quem sabe? - seja o espírito de semelhante recomendação o de que saibamos estudar, aprendendo a “estudar sem mestre”... 

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