Eles
viverão
Irmão
X
por Chico Xavier
Reformador (FEB) Jan 1959
Onze
anos após a crucificação do Mestre, Tiago, o pregador, filho de Zebedeu, foi
violentamente arrebatado por esbirros do Sinédrio, em Jerusalém, a fim de
responder a processo infamante.
Arrancado
ao pouso simples, depois de ordem sumária, ei-lo posto em algemas, sob o sol
causticante...
Avançando
ao pé do grande templo, na mesma praça enorme em que Estêvão achara o extremo
sacrifício, imensa multidão entrava-lhe a jornada.
Tiago;
brando e mudo, padece, escarnecido.
Declaram-no
embusteiro, malfeitor e ladrão.
Há
quem lhe cuspa no rosto e lhe estraçalhe a veste.
"-
À morte! à morte!.."
Centenas
de vozes gritam inesperada condenaç
ão, e Pedro, que de longe o segue,
estarrecido, fita o irmão desditoso, a entregar-se humilhado.
O
antigo pescador e aprendiz de Jesus é atado a grande poste e, ali mesmo, sob a
alegação de que Herodes lhe decretara a pena, legionários do povo passam-no
pela espada, enquanto a turba estranha lhe apedreja os despojos.
Simão
chora, sozinho, ao contemplar-lhe os restos, voltando, logo após, para o seu
humilde refúgio.
Depois
de algumas horas veio a noite envolvente acalentar lhe o pranto.
De
rústica janela, o condutor da casa inquire o céu imenso, orando com fervor.
Porque
a tempestade? porque a infâmia soez? O pobre amigo morto era justo e leal... Incapaz
de banir a ideia de vingança, Pedro lembra os algozes em revolta suprema.
Como
desejaria ouvir o Mestre agora!.. que diria Jesus do terrível sucesso?!..
Neste
instante, levanta os olhos lacrimosos, e observa que o Cristo lhe surge, doce,
à frente.
É
o mesmo companheiro de semblante divino.
Ajoelha-se
Pedro e grita-lhe:
-
Senhor! somos todos contados entre os vermes do mundo!.. porque tanta miséria a desfazer-se em lama? Nosso nome é pisado e o
nosso sangue verte em homicídio impune... A calúnia feroz espia-nos o passo...
E
talvez porque o mísero soluçasse de angústia, o Mestre aproximou-se e disse com
carinho, a afagar lhe os cabelos:
-
Esqueceste, Simão? quem quiser vir a mim carregue a própria cruz...
-
Senhor! - retrucou, em lágrimas, o apóstolo abatido - não renego o madeiro, mas
clamo contra os maus ... Que fazer de Joreb, o falsário infeliz, que mentiu
sobre nós, de modo a enriquecer-se? que castigo terá esse inimigo atroz da verdade
divina?
E
Jesus respondeu, sereno, como outrora:
-
Jamais amaldiçoes. .. Joreb vai viver...
-
E Amenab, Senhor? que punição a dele, se armou escuro laço, tramando-nos a
perda?
-
Esqueçamo-lo em prece, porque o pobre Amenab vai viver igualmente...
-
E Joachim ben Mad? não foi ele, talvez, o inspirador do crime? o carrasco sem
fé que a todos atraiçoa? Com que horrenda aflição pagará seus delitos?
-
Foge de condenar, Joachim vai viver...
-
E Amós, o falso Amós, que ganhou por vender-nos?
-
Olvidemos Amós, porque Amós vai viver...
-
E Herodes, o rei vil, que nos condena à morte, fingindo ignorar que servimos a
Deus?
Mas
Jesus, sem turvar os olhos generosos, explicou simplesmente:
-
Repito-te, outra vez, que quem fere, ante a lei será também ferido... A quem
pratica o mal, chega o horror do remorso... E o remorso voraz possui bastante
fel para amargar a vida... Nunca te vingues, Pedro, porque os maus viverão e
basta lhes viver para se alçarem à dor da sentença cruel que lavram contra eles
mesmos...
Simão
baixou a face banhada de pranto, mas ergueu-a em seguida, para nova
indagação...
O
Senhor, entretanto, já não mais ali estava.
Na
laje do chão só havia o silencio que o luar renascente adornava de luz...
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