b/c O Mandamento do Senhor
Ernani
Cabral
Reformador
(FEB) Fevereiro 1959
Finalmente,
este amor que nós devemos, manifesta-se também de modo material: cuidando do
corpo; cuidando dos bens; cuidando da família, que é o desdobramento ou a
multiplicação de nosso próprio "eu".
Consoante
se infere de João, 2 :21, o corpo é o santuário ou o templo do Espírito.
Portanto, devemos tratá-lo bem e jamais malbaratarmos nossa saúde. Tenhamos o
devido cuidado com o corpo. É oportuno a esse respeito o conselho de Paulo, em
I Cor., 6:15 a 20:
"Não sabeis vós que os vossos corpos
são membros do Cristo? Tomarei pois os membros do Cristo e fá-los-ei membros de
uma meretriz? Não, por certo.
"Ou não sabeis
que o que se ajunta a uma meretriz, faz-se um corpo com ela? Porque serão,
disse, dois numa só carne.
"Mas o que se
ajunta com o Senhor é um mesmo em espírito.
"Fugi da
prostituição. Todo o pecado que o homem comete é fora do corpo; mas o que se
prostitui peca contra o seu próprio corpo.
"Ou não sabeis
que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos?
"Porque fostes
comprados por bom preço; glorificai pois a Deus no vosso corpo e no vosso
espírito, os quais pertencem a Deus."
Vítor
Hugo disse algures: "O corpo, por
mais doente ou disforme que seja, é uma bênção para nosso Espírito, cheio de
culpas."
É
através do corpo que o Espírito se redime, neste mundo de provas e de
expiações...
Finalmente,
cuidar de nossos bens ou tratar de nossos interesses materiais, certo que é
dever respeitável.
A
Religião não deve fazer-nos desinteressados das coisas materiais justas,
porque, se assim fosse, não haveria progresso no mundo, e estaríamos tocando às
raias do fanatismo, que é um grande mal.
Mas
todas aquelas condições de amor a nós mesmos são também cumprimento do dever, e
este é indispensável à retidão da conduta ou à manifestação de nossos
sentimentos cristãos, no lar ou na sociedade. Ai de quem não cumpre com o
dever! Ai de quem procura desfazer-se da cruz de sua redenção!
Porém,
na luta pela vida, na aquisição de certas utilidades, na multiplicação de nossa
fortuna, visando ao bem-estar próprio e da família, devemos ter o devido
cuidado para não lesarmos nosso irmão, nem pisarmos no direito alheio. Infeliz
daquele que trai, que prejudica ou que se locupleta com o sofrimento do
semelhante.
Assim,
o amor a nós mesmos deve fugir de qualquer manifestação do egoísmo, que é a hipertrofia
da personalidade, sempre danosa ou prejudicial a terceiros. Quem motivar o
sofrimento alheio, cedo ou tarde colherá o fruto triste e doloroso do que
plantou, pois "a cada um segundo suas obras". (Mateus, 16 :27.) É
como se explicam certos padecimentos e certos desastres, que são expiações ou
reparações de débitos de vidas pretéritas. O esquecimento da culpa de outras
existências é uma bênção divina, a fim de não perturbar o Espírito com a
recordação de seu passado delituoso. Mas sendo Deus justo, nada é arbitrário,
tudo tem sua razão de ser. Deste modo, a lamentação não adianta, é preciso que
nos conformemos sempre com a vontade de Deus. Não se move uma folha sem a Sua
vontade e Ele sempre sabe o que faz. Confiemos, entretanto, em Sua bondade,
pois "após a tempestade vem a bonança". E a misericórdia do Senhor,
quando tarda, vem a caminho...
O
amor à família é o amor a nós mesmos, refletindo-se na prole ou no cônjuge, que
é nossa própria carne (Mateus, 19:6).
Vem
a propósito essa outra lição de Paulo, o iluminado apóstolo dos gentios, em I
Timóteo, 3:5: "Se alguém não sabe governar bem a sua própria casa, terá
cuidado da igreja de Deus?" É claro que não. Todos nós devemos esforçar
para estabelecermos na família um ambiente de calma, compreensão e amor. Isto é
fundamental para o espírita, essencial aos que desejam dedicar-se às coisas de
Deus. E para certas incompreensões o remédio é a paciência, a tolerância, a
bondade, que são outras tantas manifestações do amor ou da caridade. A figura
do tirano doméstico -homem ou mulher-, infelizmente tão comum, é repasto dos
maus Espíritos, que se comprazem com a desavença nos lares...
Os
sentimentos cristãos e a prece, quando sinceramente manifestados, resolvem os
casos mais complexos de tal natureza, desde que haja persistência, esperança e
fé.
O
amor ao próximo como a nós mesmos, é sentimento semelhante ao amor a Deus,
disse Jesus, o Bom Pastor (Mateus, 22 :39) .
Destarte,
a mais nobre manifestação de amor ao próximo como a nós mesmos, está no perdão.
E quando mais difícil este for ao nosso coração, maior, mais agradável ao
Senhor.
O
perdão é uma necessidade para o Espírito, Quem não esquece a ingratidão, a
ofensa ou a injustiça, sofre. E quem resvala pelo abismo do ódio, só pode
encontrar trevas ou desassossego dentro de si mesmo!
O
perdão é bálsamo reparador das energias morais combalidas, é a elevação do
Espírito em busca de Deus, que é a fonte eterna do perdão, Tal o exemplo que o
Cordeiro Imaculado nos deu, no alto da cruz, pedindo-o ainda para os seus
algozes. (Lucas, 23 :34) .
O
Cristo de Deus ensinou, na prece dominical, que implorássemos ao Pai Celestial:
"Perdoa as nossas dívidas, assim como
nós perdoamos aos nossos devedores.
"Porque, se
perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai Celestial vos perdoará
a vós.
"Se, porém, não
perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as
vossas ofensas." (Mateus, 6 :14 e 15.)
O
perdão, portanto, é ainda uma necessidade para a liberação de nossas próprias
dívidas.
Entretanto,
o amor ao próximo manifesta-se ainda por diversos modos, por maneiras infinitas
de fazer o bem, mas, sobretudo, pela caridade.
A
caridade pode ser material, intelectual e; sobretudo, moral. As duas últimas,
genuinamente espirituais, são excelentes, embora a primeira, quando oportuna e
justa, seja também muito útil e generosa.
Realmente,
quem sofre frio precisa de agasalho. Quem tem fome, quer pão. Devemos auxiliar
o necessitado, sempre que pudermos e ainda com boa vontade. Quem dá com
irritação, falta à caridade ou não a realiza bem.
A
caridade intelectual está na elucidação de nosso semelhante. Nosso Senhor
afirmou, em Mateus, 5:14 a 16:
"Vós
sois a luz do mundo: não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;
"Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador,
e dá luz a todos que estão na casa.
"Assim,
resplandeça a vossa luz diante dos homens."
Quem
tem noção da verdade deve propagá-la, a fim de não agir como egoísta. O saber é
uma riqueza, que deve também ser distribuída. Nada justificará o silêncio
daquele que pode elucidar; nem o acanhamento, que é pretexto vão e que pode ser
vencido; nem o temor humano, que é covardia; nem a humildade, que neste caso
será falsa. Se somente o justo falasse ou escrevesse, quem se atreveria
a pregar o Evangelho?
A
causa do Senhor é o que há de mais importante na vida; apesar de imperfeitos,
devemos ser colaboradores da obra de Deus.
A
caridade intelectual consiste, portanto, na elucidação de nosso semelhante. E
quanto o espírita poderá fazer nesse terreno, disseminando a verdade! Mas é
preciso denodo, perseverança e fé, pois...
"Ninguém
que lança mão do arado e olha para trás, é apto para o reino de Deus."
(Lucas, 9:62).
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