Consciências
Irmão
X
por Chico
Xavier
Reformador (FEB)
Maio 1964
Ao rei Tajuan,
do Iémen, numa audiência rotineira, foram trazidos cinco malfeitores que lhe haviam requerido proteção e misericórdia.
Seguido de
guardas vigilantes, aproximou--se o primeiro e rogou em lágrimas, após beijar o
escabelo em que o soberano punha os pés:
- Perdão, ó
rei! Juro pelo Altíssimo que não matei com intenção... Comecei a discutir com o ladrão de meus cavalos e, em certo momento,
senti a cabeça turva ,.. Rolei no chão sobre o meu contendor e, quando me dominei, o
gatuno estava morto! Piedade! piedade para mim, que não tive força de governar o coração!..
Só agora, na prisão, ouvi a palavra de um homem que repetia as lições do
Profeta... Só agora, compreendo que errei! ...
O soberano
chamou o vizir que o acompanhava e determinou que entregassem o réu aos cuidados
de um médico, a fim de que fosse julgado com indulgência, depois do tratamento preciso.
Adiantou-se o
segundo e clamou, submisso:
- Glorificado
seja Alá, em vossa presença, ó rei generoso! Compadecei-vos de mim, que sou ignorante
e mau! Jamais pude ler uma só frase dos Sagrados Preceitos e somente agora, depois de embriagar-me e espancar meu pai, inconscientemente,
é que vim a saber que o homem não deve crescer como as bestas do campo!..
O rei fitou-o,
compassivo, e determinou que o denunciado fosse prontamente admitido à escola.
Veio o
terceiro e implorou:
- Clemência
para mim, ó representante de Alá!.. Sou analfabeto. Desde a infância, trabalho
no mercado para sustentar meus avós paralíticos... Observando que vários negociantes
obtinham maiores lucros, roubando nos pesos, não hesitei seguir lhes os maus
exemplos. Juro pela memória de meus pais que não sabia o que andava fazendo...
Tajuan,
complacente, recomendou medidas para que o desventurado permanecesse, largo tempo,
sob as lições de um guia espiritual.
O quarto réu
abeirou-se do estrado real e suplicou:
- Perdão,
perdão, ó rei justo! Assaltei a casa do avarento Aquibar, porque não mais suportava
a penúria... Tenho mulher e nove filhos
famintos e enfermos!. .. Sou um cão batido pelo sofrimento... Cresci na areia, sem ninguém
que me quisesse.... Sei que Alá existe, porque é impossível haja sol e caia a chuva sem um
pai que nos olhe do Céu, mas nunca aprendi a soletrar o nome do Eterno!..
Extremamente
comovido, Tajuan solicitou ao ministro expedisse socorro urgente à choupana do
infeliz e ordenou que um mestre o instruísse nos deveres do homem de bem, antes
que a falta subisse a mais ampla consideração dos juízes.
Por último,
apresentou-se um homem de porte orgulhoso, que fez a reverência de estilo e solicitou:
-
Sapientíssimo Rei, peço a vossa benevolência para mim, que tive a desventura de furtar um adereço de brilhantes, na festa de Joanan
ben Kisma, judeu rico e preguiçoso, conhecido inimigo de nossa raça. .. Conheço as leis
que nos regem e acato os ensinamentos do Profeta, mas não pude resistir à tentação de
levar comigo uma joia do usurário que as possui aos montões... Benevolência, ó Rei Tajuan!
Rogo a vossa benevolência!..
O soberano,
porém, franziu a testa, contrariado, e, com assombro de todos os circunstantes,
determinou que o árabe culto recebesse, atado a um poste, trinta e seis
chicotadas, ali mesmo, diante de seus olhos, para, em seguida, ser trancafiado
no cárcere por dois anos.
- Pela glória
de Alá, ó rei sábio! - exclamou, confundido, o vizir a cuja autoridade se
rogara auxílio para o distinto acusado - como interpretar a' vossa
munificência? Destes medicação a um criminoso, escola a um ébrio e
socorro material e moral a dois ladrões, e indicais pena assim tão cruel a um
filho de nosso povo que venera o Profeta, unicamente pelo fato de haver desaparecido uma joia dos tesouros
de um agiota desprezível?
- Por isso
mesmo, ó vizir, por isso mesmo! - falou Tajuan, desencantado - por saber tanto, é mais responsável... Os quatro primeiros
eram ignorantes e todos os ignorantes são infelizes, mas o quinto culpado é um homem finamente
instruído e sabe perfeitamente o que deve fazer!..
...................................
Há quem afirme que nós, os que nos fizemos
espíritas, encarnados ou desencarnados, sofremos mais que os nossos
semelhantes, carregando aparentemente cruzes mais pesadas; no entanto, nós, os
espíritas, conhecemos as leis que nos governam os destinos e, por essa, razão, mais
responsáveis somos pelos nossos atos.
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