O Natal do
Cristo
Todos
os anos a Humanidade dita cristã celebra bulhentamente o Natal do Cristo,
evocando as cenas tradicionais do presépio divinizado pela presença do Redentor
do mundo.
Os
templos se enchem de fiéis, que vão levar a Jesus a oferenda de sua fé; os
corações vibram de alegria, realizando a
prece muda e eloquente do sentimento. Os homens que se deixaram separar pelo
egoísmo e por preconceitos de natureza vária, confraternizam durante algumas
horas. Nos lares bafejados pela fortuna, o riso se desata, livre, enquanto em
outros, onde a miséria pontifica e a dor tiraniza, a comemoração do Natal se
faz em comovedor silêncio, muita vez entrecortado de lágrimas ardentes. Mesmo
nestes, onde a fome e o desconforto se unem, o Natal é lembrado com emoção. A
mesa está vazia, a casa impregnada de tristeza, mas um raio de esperança
resignada perpassa os sofredores, incutindo-lhes mais fé e mais coragem na
áspera e ingente luta que sustentam, seguindo a escala de suas provações.
Natal!
Quando
o homem compreender a sublimidade das lições evangélicas, o Natal de Jesus será comemorado todos os dias. Não mais se
esperará um ano para glorificar o Mestre através do exibicionismo de atos de caridade mal sentida;
não se esperará tanto para demonstrar espírito fraterno, para deitar um olhar
menos duro sobre aqueles que morrem lentamente, corroídos por enfermidades
terríveis, famintos e seminus, abandonados nas sarjetas imundas, esquecidos nos
bancos de jardim, nos casebres ocultos em socavões de morros vergastados pelo
vento e nas favelas que desafiam a lei de gravidade, onde proliferam endemias.
Natal!
Ó
Jesus, Mestre e Irmão, Irmão e Amigo! Compadece-te de nós, permite que a tua
misericórdia, uma vez mais, além de tantas em que já a desfrutamos, desça sobre
a humanidade volúvel e rebelde, envolvendo-a na luz do teu Evangelho! Perdoa,
Jesus, a nossa impenitência! Torna-nos mais humanos, cristãos em espírito e
verdade, para que possamos festejar-te, ó Mestre não nos templos de alvenaria,
não em solenidades mundanas, mas nos templos do coração, onde o sentimento
fortalece as obras de amor e caridade!
Natal!
Deixaste
no Evangelho todo um código de assistência social, baseado no amor ao próximo,
na exemplificação da caridade em suas múltiplas formas. Permite que
transformemos o teu Natal numa festa perene de evangelização, na qual
cultivemos a cada instante as virtudes que pregaste!
Que
nos adianta celebrar com espavento a tua descida à Terra, se de ti nos
esquecemos nos demais dias? De que nos vale o título de
cristão, se pensamos e agimos contra a tua ética, Senhor?! De que nos serve
patentear publicamente, uma vez por ano, sentimentos de piedade, se matamos o nosso próximo, nos outros
dias, com a nossa farisaica indiferença? Eis porque, Jesus, precisamos também
de caridade, cegos que somos às lições sublimes da Boa Nova! A tua bondade, que
se estende sobre todos os humanos, indistintamente, confortando o fraco,
encorajando o desalentado, aliviando o sofredor, alertando o forte para que não
abuse de sua força, venha também, ó Mestre, por sobre nós! Queremos amar-te,
mas não sabemos exercer o amor puro que predicaste em tua gloriosa peregrinação
terrena! Jesus, a nossa ignorância é maior que a nossa maldade, mas já
aprendemos que a felicidade mora no coração dos simples, está no riso franco
dos que não têm orgulho, no sorriso ingênuo e confiante da infância, no heroísmo
extraordinário dos que sabem sofrer resignadamente suas mais acerbas dores e
viver discretamente suas parcas alegrias!
Natal!
Glória
ao teu nome, Jesus! Que os nossos corações se constituam em templos augustos
das comemorações do teu Natal, a todos os instantes de nossa vida, a fim de que
possas ressuscitar em nós, que te crucificamos com os nossos pensamentos
pecaminosos e as nossas ações malévolas!
Perdoa-nos,
Cristo! Acredita em nossa sincera resipiscência e permite que te evoquemos o
santo nome, Imaculado Mestre!
Glória
a Deus nas alturas e paz na Terra a todos os seres!
Indalício
Mendes
Reformador (FEB) Dezembro 1945
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