João,
o discípulo amado
por Pedro de Camargo, o Vinícius
in (Reformador (FEB) página 240 Ano 1933
“João, o evangelista, é conhecido
como o discípulo amado. Porque? Dar-se-á que Jesus tivesse por ele
predileção? Ama-lo-ía o Mestre mais que
aos outros?
O amor de Jesus é o reflexo do amor
de Deus. Ele veio revelar o Pai em todo o sentido, sob todos os aspectos.
Portanto, o seu amor é invariavelmente o mesmo para todos. A diferença para
mais ou para menos procede dos homens. Aquele que mais se identifica com o
ideal que Ele incarna, mais recebe e melhor sente o influxo de seu afeto.
Jesus não mede o seu amor. A medida
maior ou menor é o homem que estabelece. “quem tiver sede, venha a mim e beba.”
Perceber, pois, o seu amor em maior ou menor intensidade, depende do homem,
isto é, da sua capacidade de sentir.
Se mergulharmos na imensidade do
oceano um dedal, só recolheremos a porção de água relativa a capacidade daquele
utensílio. Será bem pouca a quantidade; porém, não pode ser mais, em virtude
das diminutas proporções do recipiente.
Tal é a relação entre o amor de Deus
revelado em Cristo Jesus e a capacidade maior ou menor do coração humano para
conte-lo. É ainda semelhante ao sol que nos ilumina, aquece e vivifica. Se nos
expusermos totalmente aos seus raios, receberemos todos os efeitos e
influências que deles dimanam; se, porém, nos afastarmos, fugindo à sua ação,
tanto menos a perceberemos, quanto mais nos distanciarmos.
Possuindo o jovem apóstolo um
coração simples, meigo e sensível, aberto aos esplendores do bem e do belo;
sentimentos afinados em alta diapasão, vibrando às mais suaves e doces emoções
espirituais, era, por isso, o que melhor percebia o amor de Jesus, em cujo seio
aprazia em reclinar-se.
João, portanto, não era o mais
amado, mas o que mais amava, o que mais se embebia no amor do Mestre, porque a
grandeza de seu coração excedia à da dos seus companheiros de apostolado.
Igual critério deve prevalecer com
ao caso de Jesus aparecer à Madalena em primeiro lugar, quando ressurgiu.
Sendo uma mulher, foi, todavia, a
única pessoa que, afrontando perigos e expondo-se à ojeriza dos Judeus, se
dirigiu ao túmulo de Jesus pela madrugada, ainda escuro, para inteirar-se do
que era feito daquele a quem tanto amava. Vendo a pedra removida, apressa-se a
procurar Pedro, afim de po-lo ao corrente do sucedido. Corre, então, este
apóstolo, em companhia de outro discípulo e verificam ambos a realidade do
fato. Voltam para casa. Madalena, porém, chumbada ao sepulcro, ali permanece,
só e triste, pranteando a ausência do Senhor.
Como, pois, não havia Jesus de se
manifestar a ela antes que aos demais, se foi ela a primeira pessoa que o
procurou e a única que permaneceu à beira do túmulo que guardara seus despojos?
A preferência, portanto, não partiu de Jesus. Maria de Magdala é que teria
sido, talvez, o cérebro que melhor o compreendeu e o coração que mais
ardentemente o amou neste mundo.
É assim o amor de Deus revelado pelo
maior expoente de sua divindade: imensurável, infinito. Cada um toma desse amor
tanto quanto seja capaz de comportar - ‘ad libitum’.”
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