quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

15 'Doutrina e Prática do Espiritismo'





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            De todos os tempos, fenômenos insólitos, não raro exagerados pela superstição ou desfigurados por um errôneo conceito da sobrevivência, têm feito o homem acreditar em "almas do outro mundo." Aparições de denominados defuntos, vozes, ruídos, perturbações de várias ordens, fazem parte da tradição e da crônica de todos os povos. Sentinelas avançadas da outra margem desta vida, dir-se-ia que os agentes misteriosos de tais manifestações tinham precisamente por mister fazer reboar de região em região, de povo em povo e de século em século, aos ouvidos dos humanos, tão exclusivamente absorvidos nas frivolidades terrestres, o brado de alerta! que os prevenisse de que nem tudo acaba neste mundo. A seu turno, os livros sagrados de todos os povos avocam para as suas revelações uma origem extra-humana e a história religiosa de todos os tempos se ilustra da aparição de anjos e santos, como também de "demônios" tentadores.

            Relegados, sem exame, para o domínio do maravilhoso e da superstição, rotulados gratuitamente com o titulo de alucinações, tais fenômenos, por sua espontaneidade e intermitência, haviam, até há meio século. escapado às possibilidades de uma sistematizada e metódica observação. Daquele período para cá, entretanto, como se uma direção providencial regesse a marcha de todos os sucessos e fizesse cada coisa surgir em sua hora própria, de um lado aquelas manifestações se multiplicaram simultaneamente na Europa e na América, com um significativo caráter de generalidade e persistência, e do outro -  porventura secretamente estimulados pela iniciativa de Allan Kardec, o excelso missionário, de cuja obra nos ocuparemos na segunda parte - não faltaram observadores independentes e esclarecidos que, solicitados mesmo pelo ruído causado no ânimo público por aqueles insólitos fenômenos, se aplicassem, com ponderado critério, a observa-los, constituindo uma brilhante falange de colaboradores no movimento de renovação espiritualista que em nossos dias veio promover o Espiritismo.

            Fácil nos seria mencionar nomes ilustres em todos os departamentos do saber que, assim nas três Américas, como nua principais circunscrições da Europa - Inglaterra, França, Rússia, Itália, Suíça, Alemanha, Espanha, România, etc. (1) - têm trazido à veracidade da fenomenologia espírita o seu testemunho imparcial, se nos detivesse uma preocupação de estatística. Acreditamos, porém, que os fatos falam por si bastante alto, para dispensarem, a favor de sua possibilidade, a sugestão dos grandes nomes.

            (1) Na MEMORIA HISTÓRICA DO ESPIRITISMO,  publicada em 1904 pela Federação Espírita Brasileira, figura como apêndice uma relação, todavia incompleta, de cinquenta e sete homens notáveis daqueles países que têm estudado o Espiritismo, ou simplesmente observado os seus fenômenos, não se contando naquele número patrícios nossos de assinalado renome que o têm feito igualmente, com proveito para si e para a divulgação da nova doutrina.

            Não ignoramos ao mesmo tempo - e disso oportunamente nos ocuparemos - quão difícil é, com uma perfeita observação, a rigorosa classificação dos fenômenos, em que, segundo o tem a experiência demonstrado, se insere frequentemente a atividade subconsciente, posto que involuntária, dos médiuns. O número, entretanto, dos fatos com um cunho positivo de autenticidade, que exclui toda hipótese de subconsciência, fraude ou sugestão, é suficientemente expressivo para que possamos sem temeridade nem exagero assegurar que a prova da sobrevivência do espírito não está por fazer-se: já está feita.

            Esses fatos, relatados nas obras espíritas, que se contam por dezenas, e divulgados pelas revistas que ao mesmo assumpto se consagram, publicadas em todos os países a que aludimos, se multiplicam dia a dia. Contentar-nos-emos por nossa parte com assinalar um reduzido número, próprio, contudo a documentar com irrefragável precisão a nossa tese.

            Começaremos pelo seguinte, de que nos dá conta o eminente escritor Léon Denis (2):

            (2) Ver NO INVISÍVEL –ESPIRITISMO E MEDIUNIDADE, CAp.  XIX, págs. 321, da 1ª edição.

            “A 13 de janeiro de 1899 - refere ele, à vista de um relatório, cujo original, acrescenta, se acha em seu poder -- doze pessoas se haviam reunido em casa do Sr. David, à praça Corpo Santo nº 9, em Avignon, para a sessão hebdomadária de Espiritismo.

                "Após um instante de recolhimento, vimos o médium, a Sra. GalIas, em estado de trance, voltar-se para o lado do Sr. abade Grimaud e lhe falar na linguagem dos sinais empregados por certos surdos-mudos. Sua volubilidade mímica era tal que foi preciso pedir ao espírito que se comunicasse mais devagar, o que imediatamente fez. Por precaução, cuja importância vai ser apreciada, o Sr. abade Grimaud se limitava a enunciar as letras, à medida que eram transmitidas pelo médium. Como cada letra isolada nada significa, era impossível, mesmo que o tivéssemos querido, interpretar o pensamento do espírito, e só no fim da comunicação foi que ficamos conhecendo o seu conteúdo, tendo sido feita a leitura por um dos dois membros do grupo encarregados da transcrição dos caracteres.

                "Ao demais o médium empregou um duplo método: o que consiste em enunciar todas as letras de uma palavra, para lhes indicar a ortografia, única forma perceptível à vista, e o que enuncia a articulação sem se preocupar com a forma gráfica, método inventado pelo Sr. Fourcade e que só é empregado no Instituto dos surdos-mudos de Avignon. Estas particularidades são fornecidas pelo abade Grimaud, diretor e fundador do estabelecimento.

                "A comunicação, relativa a obra de excelsa filantropia a que se dedicou o Sr. abade Grimaud, estava assignada "irmão Fourcade, falecido em Caen. "Nenhum dos assistentes, com exceção do venerável  sacerdote, conhecera nem podia conhecer, quer o autor d essa comunicação, posto que ele tivesse passado, há trinta anos, algum tempo em Avignon, quer o seu método."

            Depois de transcrever as assinaturas dos membros do grupo, o Sr. Léon Denis acrescenta:

            "Junto ao relatório vinha o seguinte atestado: "Eu, abaixo assignado, Grimaud, padre, diretor-fundador do Instituto dos enfermos dos órgãos vocais, surdos-mudos, gagos e crianças anormais, em Avignon, certifico a absoluta exatidão de tudo o que acima é referido. Devo, em testemunho da verdade, dizer que estava longe de esperar semelhante manifestação, de que compreendo toda a importância, no ponto de vista da realidade do Espiritismo, ele que sou fervoroso adepto. Não tenho a menor duvida em o declarar publicamente. - Avignon, 17 de abril de 1899. (Assinado). – Grimaud, padre."

            A autenticidade de tal manifestação - comentaremos de passagem - ressalta inconfundível da circunstância, apontada no relatório, de que nenhuma das pessoas presentes, o médium inclusive, conhecia a linguagem mímica empregada pelos surdos-mudos. Como poderia tê-la improvisado o médium? Por uma instantânea sugestão do abade Grimaud, que era o único a conhece-la - Seria maravilhoso. Porque, se a sugestão puramente mental não somente se concebe, como está demonstrada por numerosas experiências, já não é tão fácil admitir que habilite de improviso um indivíduo (o médium) a empregar com rapidez e precisão a mímica dos surdos-mudos, que toda gente, que já os viu conversar, não ignora que consiste em variadas inflexões dos dedos, cada uma correspondendo a determinada letra do alfabeto.

            Tudo indica, portanto, que no médium atuava um espírito conhecedor de tal linguagem. O próprio Fourcade, autor do outro método de conversação daquele gênero a que faz alusão o relatório? As circunstâncias e o próprio testemunho do abade Grimaud militam em favor da afirmativa.





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