segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Lendo e Comentando (5)



Lendo e Comentando (5)
por Hermínio C Miranda

in Reformador (FEB)  Março 1970

            Silver Birch, falando a um casal visitante, eficientes trabalhadores da seara espírita, refere-se com entusiasmo ao trabalho de implantação dos conceitos espirituais.

            - Estamos lutando numa batalha cujo fim é a vitória. As forças da oposição estão em crescente desordem. Há confusão e caos nas fileiras daqueles que tentam opor-se ao triunfo progressivo e inevitável do espírito sobre a matéria. Que ninguém se iluda a respeito. Nós
- e falo apenas como um porta-voz - nós estamos aqui para ficar no mundo de vocês. Nenhum poder terreno, nenhuma combinação de poderes terrenos terão forças para nos desalojar.

            Quanto aos encarnados, desempenham sua parte nessa tarefa e sua colaboração é preciosa porque Espíritos e homens bem intencionados são os construtores do mundo de amanhã.

            Percy Wilson, a quem as observações são dirigidas, declara, a seguir, que, tem conhecimento de um plano elaborado no mundo espiritual para as novas conquistas e realizações do futuro. Como não conhece os pormenores do plano, pergunta a Silver Birch se ele poderia dizer algo a respeito.

            - Deixe-me dizer-lhe tanto quanto me é possível - responde o Espírito -, pois há limitações que me são impostas. Há um plano geral, elaborado por seres espirituais altamente evoluídos. Esse plano existe há muito tempo. Quando me recolho do vosso mundo, regresso à esfera a que pertenço. Tenho o privilégio de encontrar-me com os seres que me pediram para aceitar esta missão, na qual estou empenhado há tanto tempo com algum êxito. Nesses festivais, porque são realmente festivais, sou informado do progresso que está sendo realizado no desdobramento do plano. Às vezes me mostram estágios subsequentes, aquilo que ainda está por realizar-se.        

            Declara, a seguir, que falamos muito a respeito de Jesus - chamado carinhosamente de
o Nazareno - mas sabemos muito pouco a respeito dele. Diz que viu o Mestre no mundo espiritual ,e pode declarar sem temor de contradita que é ele que «dirige todos os nossos esforços e os coordena de modo que não deve existir nenhum receio de que estejamos agindo contrariamente a qualquer aspiração religiosa. Isso - prossegue o Espírito - pode ser difícil para os ultra ortodoxos ou para os convencionais conservadores aceitarem, mas, infelizmente, não é possível causar nenhum impacto espiritual sobre eles porque estão espiritualmente mortos. O que deveis compreender é que o espírito é vida ... »

            Quanto à inquietação dos jovens, parece que Silver Birch não está muito preocupado com ela. Acha que essa fermentação resulta da desconfiança quanto às pessoas que não têm poderes para prevenir destruições ainda mais graves num mundo que já foi tão destroçado materialmente. Os jovens desejam também saber o porquê das coisas, e isso as «velhas religiões e filosofias não podem dar-lhes»,

            O pensamento espírita tem muitas dessas respostas e Silver Birch lembra que recebemos com simpatia perguntas honestas. O qualificativo é perfeitamente legítimo e oportuno. A honestidade da pergunta é condição essencial ao esclarecimento das questões envolvidas. Se nos fazem perguntas visando a obter respostas dúbias ou orientadas num certo sentido, então é porque não há honestidade naquele que pergunta nem desejo genuíno de compreender os problemas sob discussão - apenas a intenção de buscar, a todo custo, modos e meios de continuar a crer naquilo que não deseja deixar de crer.

            O Espiritismo é uma doutrina límpida; diz claramente o que deseja e como espera alcançar as suas metas: através da evolução intelectual e moral do espírito humano. Compreendemos perfeitamente que a natureza não dá saltos e nem toma coisa alguma de assalto e que a paz entre os homens somente se realizará quando os homens tiverem a paz dentro de si. Buscar a paz pela guerra é tumultuar ainda mais o que já está tumultuado. Não é odiando que se obtém amor, não é matando que se compreende a vida, não é de armas na mão que se alcança o entendimento, por mais nobres que sejam aparentemente os motivos. Muita violência - sempre inútil e perniciosa - tem tido origem em motivos supostamente nobres.

            Não obstante a confusão e a desorientação que dominam tantos setores da vida em sociedade, o Espiritismo segue adiante. - Ganharemos as pessoas - diz Silver Birch - pela evidência fornecida pela mediunidade ou pelo teor racional dos nossos ensinamentos. Uma vez obtida sua adesão, ficarão conosco para sempre. Quando vocês trazem alguém para o círculo magnético onde opera o poder espiritual, produz-se um elo que não se quebra jamais. Ele se torna então acessível a mais e mais desse poder. Nada acontece no mundo de vocês que nos possa causar receio.

            Palavra tranquilizadora essa, mas que não significa que devemos cruzar os braços e esperar que tudo nos saia milagrosamente bem. Nós, encarnados, temos nossa parte nessas tarefas, especialmente os jovens, aos quais os mais velhos vão entregando os seus postos dentro e fora do movimento espírita. A eles compete vigiar para que o Espiritismo não seja como tantos outros movimentos legítimos do pensamento, convertido sutilmente em instrumento de poder pessoal, utilizado para conquista de posições, de semeadura de ódios e inquietações, num mundo onde já existe turbação em demasia. Nossa tarefa é espalhar a concórdia e o entendimento, indicando que somente através da paz interior, realizada em nós próprios, podemos alcançar o ideal supremo de ver em paz a sociedade em que vivemos. As comunidades humanas são a soma dos indivíduos que a compõem. Explodirá em ódios e violências, enquanto predominarem sentimentos pessoais de rancor. 

Natal - Ainda é tempo...


Lendo e Comentando (4)

            Barbanell refere-se em seu editorial de Dezembro à extrema comercialização do Natal, aos excessos à mesa, às cortesias artificiais costumeiras, tudo isso incompatível com os princípios espirituais que regem a comemoração natalina. A maioria nem mesmo se lembra de que a festa tem conotações religiosas tão significativas. O articulista cita a anedota da criança que perguntou à mãe «- Porque razão estragam o Natal com as comemorações religiosas?» .

            Infelizmente essa é realmente a tônica nos festejos que, de início, lembravam apenas a vinda de Jesus à Terra para a sua difícil e valiosa missão de paz.


por Hermínio C Miranda

in Reformador (FEB)  Março 1970


31 de Outubro



31 Outubro

Desigualdade de ideias?
Um fato dos mais comuns.
Nem todos podem viver
Dos privilégios de alguns.


Fidélis Alves
por Gilberto Campista Guarino
in ‘Centelhas  de Sabedoria”  (1ª Ed. FEB  1976)

domingo, 30 de outubro de 2011

72 Trabalhos do Grupo Ismael




72


SESSÃO DE 11 DE DEZMBRO DE 1940


Segunda manifestação sonambúlica do mesmo Espírito que, com o intento de mistificar,
se apresentara na sessão anterior e que, ao retirar-se, prometera voltar.


Médium: J. CELANI


            Espírito. - Não me sinto á vontade.

            Diretor: Porque meu irmão?

            E. - Sei lá!

            D. - Mas, tu aqui estás por tua livre vontade.

            E. - Quem te disse isto?

            D. - Suponho que não ages inconscientemente.

            E. - Quando deliberei vir aqui, trazia planos a executar. Vejo-me, porém, tolhido.

            D. - E porque te sentes mal? Só porque não alcançastes o teu objetivo?

            E. - Porque?  (Com ironia). Sabe-lo–ás depois.

            D. - Porque não desde já?

            E. - É cedo... Vocês têm finalidade diversa... É... trazíamos planos; mas, estes se foram... Sabes o que é um cérebro cansado, embotado, por excesso de labor?

            D. - Mas, tu tens cérebro?

            E. - (Com enfado). É um modo de falar.

            D. – Então, deverias ter refeito as forças, antes de entrares na refrega.

            (Alguns Instantes de silêncio).

            E. - Traidores!... Obra de traidores!...

            D.- A quem te referes?

            E. - Eles sabem.

            D. - Eles, quem? Nós não vemos os traidores de quem falas.

            E. - Eu também não vejo. Mas (com ar irônico), não adivinhas?

            D. - Meu amigo, ponhamos as cartas na mesa.

            (Breve silencio).
           
            E. - Que livro é este?

            D. - É o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, comentado em espírito e verdade, pelos próprios Evangelistas e pelos Apóstolos, para a época atual.

            E. - Garante isso?

            D. - Garanto.

            E. - Traz o Imprimatur?

            D. - Sim, traz o ‘’imprimatur’’ da nossa consciência, que é livre, porque só pertence a Deus.

            E. - Meras palavras.

            D.- Não há aí meras palavras; mas a expressão sincera do nosso sentimento.

            E. - Não pretendo penetrar no íntimo de quem quer que seja. Sem ser uma vestal, sempre fui e continuo a ser uma criatura educada. Vim expor e debater ideias e não sondar podridões ou auscultar virtudes. Não é esse o meu papel.

            D. - Meu irmão, nós, aqui, como o podes verificar, estamos tentando reformar-nos.

            E. - Reformar erros!... Oh! mudemos de assunto. A humanidade, meu amigo, não se reformará. A humanidade é isso que vês, quer se abrigue nos templos católicos, quer nos protestantes, ou nos da vossa seita, ou crença. Não sei mesmo que nome lhe possa dar.

            D. - Repara que esse conceito está em contradição com as palavras do Cristo. Nota que muitos já são os emancipados do erro.

            E. - São esses os traidores. Até que, enfim, chegaste a eles.

            D. - Não, meus amigo, não são traidores. Deixaram, ao contrário, de ser traidores, pois que voltaram ao colégio do Cristo e nele procuram permanecer.

            E. - No teu modo de entender, não no meu, visto que considero colégio do Cristo a Igreja Católica. Não tirei o direito de o afirmar?

            D. - Tens. Pergunto-te, porém: és feliz com esse modo de pensar?

            E. - E tu o és?

            D. - Sou, porque já vou compreendendo que não basta crer, que é preciso amor, para ser feliz.

            E. - Eu só admito uma felicidade: satisfazer aos meus desejos. Tudo mais é ilusão: amor, miséria, amizade, tudo é ilusão, meu amigo.

            D. - Estás enganado. O amor e a caridade existem. Negas, por acaso, o amor do Cristo?

            E. - O chefe dessa humanidade, que se estraçalha, como se fora composta de hienas?

            D. - Não blasfeme. O teu Colégio é que não soube conduzir a humanidade, embora dizendo-se cristão.

            E. - E vocês agora querem substituir esse colégio? Ele errou e vocês o vêm corrigir!

            D. - Nós apenas cremos nos ensinos evangélicos e procuramos difundir essa crença, com sinceridade.

            E. - Outra balela: onde existe a sinceridade?

            D. - Porque hás de ser tão pessimista?

            E. – Por fruto da observação. Sinceridade! Onde existe isso? Entre os homens que mutuamente se enganam a todos os instantes? Se houvesse alguém que pudesse imitar as obras do Cristo, que as criaturas religiosos debuxam, esse alguém não poderia viver entre hienas.

            (Alguns momentos de silêncio)

            E. - Dizias, então, que este livro é obra dos Apóstolos do Cristo.

            D. - Sim, trazida até nós pela via da mediunidade.

            E. - Arma perigosa essa – a mediunidade.

            D. – Se-lo-á para a tua igreja. Mas, que importa isso, se o Cristo lhe sancionou e sanciona o uso? Quererás lutar com Cristo?

            E. - Não, não quero lutar; quero estudar. A luta por si só e improfícua, nada produz. O homem ou o ser, uma vez capacitado de que é improfícua a luta, deve baixar as armas e meditar, a fim de escolher outros meios de conseguir os seus fins. Não disseste que fossem postas na mesa as cartas?

            D. - Meu amigo, o caso já não é conosco. Tens agora de entender-te como os nossos maiores. Nós somos umas pobres lesmas que nada temos para te dar, senão uma prece.

            E. - E’ o que te concito a fazer.

            (Faz-se uma prece à Virgem).

            E. - (Dirigindo-se a outro desencarnado): - Também tu!... Ah!  a exemplo  do Cristo, lanças mão de pescadores? O Espírito da Verdade se serve dessas criaturas para a preparação da sua vinda! Respondes assim, dando uma resposta que me bailava na mente, mas que eu por timidez não externava. Queres, então, dizer que o Espírito da Verdade abre a mão do Sacro Colégio e de toda a comunidade católica espalhada  pelo mundo, para edificar um novo templo, uma nova Igreja? E me convidas a colaborar nessa obra! Mas, como? Onde, para isso a inteligência, a clareza  nas ideias, a facilidade de assimilação, de investigação e de exposição? E as posições que se foram por efeito da vossa ação maligna?...

(Voltando-se para outro lado).

            Hum! Também tu por aqui passaste? É extraordinário! Magia!... Sei lá!... Uma personalidade desse tomo!... É de abismar!... Quem havia de supor!... Encontraste o que? A doçura de viver? (Pausa). Séculos e séculos de domínio! Enfim!  Adeus.

            D. - Já te vais? Não nos queiras mal.

            (Silêncio)

            E. - Perdoa-me. Sabes o que é um desmoronamento e o vazio que se lhe segue? (Com firmeza). Eu te desejo as bênçãos de Nosso Senhor Jesus Cristo. Adeus.



*


Comunicação final,  sonambúlica

            Tocado pela graça da Virgem, qual o recurso que resta ao visitante que se fora. -  Incompreensão do mundo para as obras desta natureza.- Sublimes lições a serem guardadas no coração.- Necessidade de formar-se o colégio cristão dos doze apóstolos. - A obra em curso é obra de constância, que reclama anos e anos. - Porque são poucas as obras duradouras nos arraiais espíritas. - Como devem as sessões ser encaradas. - Para ser apóstolo, o que se faz preciso. - O que alcançarão os que souberem imitar os Paulo. – Dificuldade que no mundo atual oferece a conquista de tão grande superioridade moral. – Exortação para uma prece à Virgem.


Médium: J. CELANI


              Paz, meus caros companheiros.

              Ele foi tocado por graça da Virgem. Só lhe resta um recurso: confessar-se vencido e renovar, refrescar as ideias, para continuar a sua trajetória da Espírito culto, mas a serviço da verdadeira Igreja, da Igreja do Cristo, a ser edificada sobre as cinzas das fogueiras que o orgulho e o egoísmo acenderam e argamassada com as lágrimas de tantos sofrimentos reparadores.

            O mundo que vos malsina, não compreendendo esta obra, não lhe pode sentir a sublimidade. Não há, por agora, como conseguir que ele a sinta. Entretanto, prossegui, porém medindo os vossos passos e com muita cautela, para que não vos traguem os barrancos do caminho.

            Guardai nos vossos corações estas lições sublimes e lembrai-vos sempre das palavras do vosso companheiro ao comentar hoje o ponto em estudo.

            Há servidores, mesmo legiões de servidores. Contudo, faz-se preciso formar o colégio cristão dos doze apóstolos para que a obra tenha ressonância no coração das massas e venha a multiplicar-se o número dos verdadeiros discípulos do Consolador, que ai está como fora prometido.

            A de que vos falo é obra de constância, demanda anos, contados pelo vosso tempo terreno. Reclama exercício continuado, diário, persistente e muita vigilância. A visão e o pensamento, quando descontrolados, são perigosos.

            Não ignorais que poucas são as obras duradouras nos arraiais espíritas. Por quê? Porque feitas em torno de pessoas. O espírito deve ter por escopo a exemplificação, na medida do possível, dos ensinamentos do Cristo, dentro de coletividades bem organizadas e servidas por criaturas simples e compenetradas de seus deveres.

            As sessões devem constituir verdadeiras festividades para os vossos corações e representar para os vossos espíritos uma verdadeira Páscoa, na qual vos é concedido o alimento que reconforte para a tarefa ingente e dificílima que lhes incumbe.

            Para ser apóstolo, porém, quanta renúncia e quanta humildade se fazem precisas, mesmo dentro dos próprios colégios espíritas.

            Aqueles, no entanto, que souberem imitar os Paulo, que compreenderem, na sua plenitude, a obra do Cristo vencerão e terão a seus pés os potentados, que os respeitarão, impelidos por estranha  força a se curvarem diante da sua superioridade moral.

            Tão difícil é essa conquista, que - quase posso dize-lo - o vosso mundo atual não a comportará. Mas, por isso mesmo, é indispensável muito trabalho, muito esforço, tanto mais indispensável, quanto é certo que o amparo jamais falta àquele que procura servir na Seara do Cristo, servindo a seus irmãos.

            Oremos à Virgem, pedindo-lhe que abençoe o colégio de Ismael, que tome sob sua proteção os médiuns, defendendo-os com o seu amor. Roguemos a Jesus que lhes dê uma partícula de sua inspiração, a fim de que eles se compenetrem das suas tarefas e se preparem moralmente a executa-la com proveito para seus Espíritos e para os de todos os seus irmãos e companheiros de expiação terrena.

            Implorando as bênçãos da Virgem para os que sofrem, para os peregrinos da dor, visíveis e invisíveis, que batem à porta do templo, em busca  do alimento espiritual.

            Peçamos-lhe que afugente da Casa de Ismael a discórdia, a incompreensão e os pruridos de mundanismo, que começam a contaminar muitíssimo as associações coirmãs desta.

            Por último, que Ela interceda pela humanidade, pelos dirigentes dos povos, a fim de que, iluminados, possam eles conduzir os que lhe foram confiados pelas sendas que traçou Nosso Senhor Jesus Cristo.

            Encerrai os vossos trabalhos, compenetrados de que cumpristes o vosso dever.

            Paz fique convosco. – Bittencourt.


71 Trabalhos do Grupo Ismael





71


SESSÃO DE  4 DE DEZEMBRO DE 1940


Manifestação sonambúlica de um hábil mistificador que, todavia não logrou realizar o seu intento.


Médium: J. CELENI

            Espírito. - Recordar é viver ... Na digressão que fiz pelo passado da minha existência de criatura, quantas recordações amargas a mim também me assaltaram! Foi a última prova de fogo para o Espírito que precisava renovar suas ideias.

            Mas, em meio da jornada dolorosa, lobriguei bem distante, envolta nas dobras do tempo, uma etapa feliz e bonançosa. Chocou-me o Espírito essa doce lembrança de uma era longínqua, em que vivi vida simples e sincera, sem os convencionalismos da sociedade e da política. E tudo isto para comprovar a sabedoria da lei, que quer o progresso do Espírito por seu esforço próprio.

            O crime do homem, o crime da sociedade não se apagam com um mero querer. Há mister o resgate para a purificação, para o desaparecimento dos estigmas desses crimes. A cultura da inteligência não açaima os instintos do homem mau e a prova vós a tendes, observando o que se dá com tantas e tantas criaturas visíveis e invisíveis.

            Uns pensam manter presa à idolatria a consciência humana, como meio de domar lhe as fúrias e os pendores criminosos; outros acham que o livre raciocínio, a análise serena de todas as questões que entendem com a inteligência e o espírito conduzam a criatura ao equilíbrio do seu ser, o que quer dizer à posse de uma moral e de uma cultura relativas.

            Pendo para a corrente dos primeiros. Acho que a Igreja caminha certa para consecução de seus fins, porque a fera só teme o domador, enquanto não percebe a força de que dispõe contra ele. Por ai vedes que, solapando o prestígio da Igreja, algumas velhas instituições do mundo prepararam o descontrole dos espíritos e a hecatombe que presentemente se observa.

            Infelizmente, a palavra do Vaticano já não ecoa nas quebradas do mundo. Donde o seu desprestígio? Da obra dessas instituições maléficas. Vós outros quereis renovar a humanidade, esposando a segunda maneira, a que há pouco me referi, de resolver a questão. Julgais possível tal coisa pelo caminho que seguis , através de todas as misérias que vos cercam?

             Não é possível! A tristeza empolga o Espírito, ao ver perdido o labor de tantos séculos. Mas, o Espírito, no espaço, nunca perde tempo, diz aqui uma voz. Mensageiro de quem? O homem tem a infância, a mocidade, a madureza, a velhice, a decrepitude. O espírito tem a eternidade... É’ belo, sim, admirável!... Gozei desses eflúvios naquela etapa passageira que meu espírito vislumbrou na poeira do passado. Depois, veio a fogueira, o mar de fogo.

            (Dirigindo-se ao diretor dos trabalhos): Não dizes nada? Pergunto: acreditas que se possa regenerar as feras, dando-lhes liberdade de consciência e de ação?

            D. - Acredito, pois que tenho a prova comigo mesmo. Sem estabelecer termo de comparação entre mim e os luminares que nos assistem de plano superior, reconheço que grande transformação em mim se operou. De tigre que anteriormente era, em sentido relativo, tornei-me, não direi um cordeiro, porém um ser menos capaz de investir  contra os seus semelhantes, desde que compreendi que uma só é a lei: amar a Deus, amando ao próximo.

            Tu te referiste á falta de ressonância que se nota na palavra do Vaticano e a isso atribuis o que se está passando no mundo. Mas, porque já não ressoa essa palavra, quando o Vaticano dispos sempre de todos os meios, do ponto de vista  mundano, para fazer-se ouvir: honras, poderio predomínio, força e, até imensos tesouros materiais? Porventura, quando a Igreja se achava em todo o seu fastígio, não se perpetravam os mesmos crimes, as mesmas iniquidades, as mesmas ferocidades que se praticam agora? A luz vem, como sempre veio e virá, mas graduada por N. S. Jesus Cristo e não pela Igreja. É belo, disseste. Nós dizemos: é divino!

            E. - Dize-me: porque, depois de ter sido bom, eu me tornei um chacal? Como é possível semelhante retro gradação do Espiritismo?

            D. - Só a tua própria consciência poderá dar o motivo dessa paralisação, dessa estagnação do teu eu, visto que o Espírito não retrograda.

            E. - Sim, no meu passado, sacudi a poeira dos in-folios, perlustrei os fastos de muitas existências; mas, há sempre uma penumbra a me interceptar a visão ampla da minha peregrinação até o momento atual. Há longos anos vivo no espaço cercado de trevas, de nojo, de desesperança. Nem uma voz, nenhum incentivo, um encorajamento. Aqui tenho estado várias vezes; várias vezes já ouvi as vossas pregações; entretanto, volvendo ao meu meio, de novo o silêncio, a treva. Há certamente um enigma de tal sorte tenebroso, que não pude ainda desvenda-lo e me traz preso a esse estado terrífico.

            D. - Meu amigo, não basta compreender, é preciso sentir. Se queres decifrar o enigma, volve-te para o Divino Mestre, a quem de certo não desconheces. Ele permitirá obtenhas essa decifração, não por efeito da palavra e do sentimento precários do homem, mas pelo influxo do seu amor sem limites.

            E. - Eu bem quisera busca-lo; mas, ainda não sou o filho pródigo, ainda não encontrei o caminho que conduz à coisa paterna. Ah! quem me dera! Tal a razão do meu colóquio convosco: obter do vosso amparo essa mercê. Dei, no começo, a este colóquio uma orientação diferente; mas, fui levado, não sei por que força, a esta confissão. Procurar eu o Cristo, que só acolhia os simples e os de coração puro! Não é possível.

            D. - Ele curou leprosos, fez que andassem paralíticos, restituiu a vista a cegos. Para faze-lo, só queria e quer sinceridade, que, sinceramente arrependido, o pecador busque a misericórdia do seu Deus.

            E. - Desvendar o enigma. Em toda a viagem que fiz, jamais descobrir a razão deste estado tenebroso. Errei, pratiquei crimes; porém, crimes praticam todos. Decifra-me o enigma e eu talvez possa encontrar o Cristo de que fui servidor em várias oportunidades.

            D. - Nós não podemos decifra-lo. Podemos, porém, apelar para a Virgem, nossa Mãe celestial, e estamos certo de que o véu se romperá. Permite façamos uma prece?

            E. - Seja.

            (Faz-se uma prece).

            E. - Orgulho e juiz em causa própria! Mas, então, é necessário causticar tanto uma criatura por fatos de tão somenos importância? Nunca di importância a essas coisas; no entanto, elas pesam na balança da justiça. Pequenos nadas.

            Bom, vou-me embora para a escola que, segundo diz um dos vossos amigos, é a escola prática do Espírito; mas voltarei aqui.

            (Dirigindo-se a uma das entidades invisíveis)

            Filiar-me? De fato, senti a transmutação que se operou no meu ambiente, por efeito da oração. Mas dai a fazer profissão de fé nos teus arraiais vai muito grande distância. Não pretendi enganar a ninguém. Sabes que todos os caminhos vão ter a Roma. Eu não tinha o que dizer e fui dizendo o que me veio à mente. Somos da mesma família. À certa altura, enveredaste por uma estrada e eu por outra. Agora, encontramo-nos com ideias diferentes. Tu abjuraste a Igreja; eu me conservo fiel à Igreja... Ah! pois sim! Veremos. Sabes que, em habilidade  e sutiliza, ninguém me leva a palma.

            Hum! Quem  vejo! Mas, que vejo! Vocês têm uma companhia seleta! Dignitários da Igreja e até apóstolos! Onde vim meter-me!

            Não, a este pandego nenhum mal faço. Apenas o atrapalho um pouco. Mas, ele tem quem o defenda.

            Voltarei; porém, não à força, nem constrangido. Voltarei por minha vontade, como espírito consciente de si.

*

Comunicação final, sonambúlica


            Garras de fora, sob a aparência de grande mansidão. - O Espírito que se manifestara e a fereza de seus intentos. - Velho jesuíta, matreiro, insidioso e sutil. - As modalidades várias da sua manifestação. - Porque lhe foi permitido que assim a encaminhasse. - Educação do médium para manifestações cada vez mais edificantes. - No que devem pensar os componentes do Grupo, quando para as suas reuniões se dirigirem.


Médium: J. CELANI


            Glória a Deus nas alturas, meus caros companheiros.

            Mas um vez cumprido foi o dever, mais um estímulo para perseverardes nos vossos esforços.

            No estado atual o mundo, é naturalíssimo que aos vossos trabalhos acorram grandes levas de Espíritos de todas as categorias.

            Este, que daqui saiu, esconde, sob a aparência de grande mansidão, as garras das feras do espaço. Há muito que ele vos ronda com intuito tais, que não lhe permitíamos manifestar-se. É um velho jesuíta, matreiro, insidioso, sutil no apreender as questões e habilíssimo em expor seus pontos de vista. Não lhe percebestes a maneira de conduzir-se? Quantas modalidades apresentou a sua manifestação! Consentimos que ele assim a encaminhasse, para compreenderdes qual a personalidade que tínheis momentaneamente no vosso convívio e a fim, portanto, de encarecemos a necessidade do vosso cuidado, da vossa preparação mental para estes trabalhos, o que de nenhum modo é supérfluo.

            Estamos educando o médium. Para seu aprendizado e vosso, trazemos aqui Espíritos à  feição do seu preparo. À medida que o preparo do Grupo o permitir, as manifestações serão cada vez mais edificantes, para estímulo e conforto dos vossos Espíritos.

            Quando para aqui vos dirigirdes, pensai que em torno de vós caminha, acompanhando-vos, mais de uma dezena dessas criaturas, em busca de uma côdea do pão que recebeis de acordo com o vosso estado da alma.

            Deveis separar o material do espiritual, porque o primeiro obscurece o segundo. Só com os pensamentos adstritos ao objetivo que vos congrega  podereis obter boa recompensa a estes trabalhos, para renovação das vossas forças e robustecidos vossos conhecimentos teóricos da doutrina.

            Não são uma impertinência de minha parte estas constantes advertências que, aliás, sei,  todos vós acolheis com carinho.

            Que o manso Cordeiro de Deus vos auxilie nos esforços que empregais por adaptar-vos à sua moral, são os meus votos e dos companheiros e amigos que convosco trabalham na mesma cruzada. Que as bênçãos da Virgem coroem esses vossos esforços, se estendam aos vossos lares e acompanhem  perenemente os atos da vossa  vida de relação, a fim de vos manterdes atentos à obra cuja realização vos impusestes, para engrandecimento e elevação dos vossos Espíritos.

            Paz vos acompanhe sempre. Deus vos abençoe. – Bittencourt.



70 Trabalhos do Grupo Ismael





70


SESSÃO DE 20 DE NOVEMBRO DE 1940

Manifestação sonambúlica

            Segunda do mesmo ex sacerdote e alto dignatário da Igreja que se manifestara  na sessão anterior.- Sua conversão do Cristianismo do Cristo.


Médium: J. CELANI

            Espírito. - O livro!... Ruiu o castelo! Sim, o castelo edificado pelo orgulho! Com efeito, é a verdade sem véus sobreposta á mentira. E o Espírito, preso por séculos a ideias errôneas, a sistemas sem base, encontra-se, afinal, como nau desarvorada sobre ondas revoltas. Edifiquei na terra o meu castelo de ilusões e, daí chegando ao plano espiritual, nada vi que confirmasse os ensinos da minha Igreja,  nem a bem aventurança que eu esperava por ter sido um fiel sustentador de todos os dogmas e observador rígido de todas as fórmulas. Presunção... Mero orgulho... Abatido este, revoltei-me, exasperado, e me enchi de ódio, de desesperos e anseios de vingança contra tudo e contra todos.  Com isso, o sofrimento, a cegueira e uma ânsia insopitável cada vez mais me envolviam nos tentáculos de uma dor horrível, de todos instantes.

            De súbito, sem que eu soubesse por que nem como, fui atraído por uma voz suave e cariciosa ao vosso meio. Vim cheio de revolta e de maus intentos contra a humanidade em geral; mas, inesperadamente, me vi tolhido por força invisível e superior, durante os momentos em que aqui estive. Ouvi as vossas rezas e, depois delas, que efeito!... Transmudou-se como por encanto o  meu estado da alma. Sobreveio e entrou a dominar-me uma tristeza imensa. Fez-me em torno de mim o vácuo. Não me sinto nem lá, nem cá.

            Lá consideram-me traidor, desertor; cá, não me acodem, porque precários são os meus sentimentos. Que hei de fazer? A inação agrava o meu estado. Preciso fazer alguma coisa, agir, trabalhar...

            (Seguem-se alguns momentos de silencio, durante os quais o manifestante toma a atitude de quem está a ouvir o que alguém lhe diz).

            Ah! a alma que muito errou precisa ressarcir o tempo que perdeu na prática do mal: eis a sentença que me deram! Mas, em que empregarei o tempo?

            (Breve silencio).

            Converter-me, perdoar! Sim, bem vejo: todos são vítimas de si mesmos. O orgulho sempre o orgulho, sempre o amor próprio são a causa da perdição do Espírito. O sacerdote que vilipendia a sua missão sagrada entre os homens não se conforma com a situação de sofredor nos espaços infinitos. Daí a teimosia em conservar-se aferrado às suas ideias. Tudo ao seu derredor o contradiz.


            Judas? A que vem aqui o seu nome? Malsinado pela Igreja, ele então é hoje um luminar do Cristianismo? Só a consciência dos crimes cometidos, o arrependimento seguido de um trabalho ingente na senda do bem são capazes de produzir a cessação dos efeitos decorrentes das ações maléficas?... Sim tu és bom, és bom e és feliz, visto que a esmola que dás não traz o azinhavre do pecado, das intenções malévolas e criminosas!  És bom, porque sentes o Cristo. Eu pregava o Cristo e o advento do seu reinado, mas sem compreender, nem sentir.

            Que diferença: tu és simples! Com a tua simplicidade atraías os pobres e os humildes cujos corações confortavas nas horas dolorosas da expiação! Eu, o clérigo das catedrais pomposas, procurado pelos grandes da sociedade do meu tempo, mal me dignava de baixar os olhos para os da plebe que buscavam os templos, desejosos de confortar na oração suas almas doloridas.

            Que diferença! Tu concitavas as donzelas, as virgens à defesa de suas virtudes e lhe plantavas no íntimo dos corações  a pureza  da Maria! E eu? Eu as confessava. Ah! que horror! Desenvolvendo tenebrosa ação, maculava lhes as almas e lhes conspurcava os corações! Assim praticava, sem duvida, o maior dos crimes!

            É dessa diferença que se origina o meu estado de alma. Tu, alma simples e boa, depois do longo tempo transcorrido após a nossa convivência, vens retirar do negror da treva o miserável, para que se redima!...  Obrigado! Continua a ajuda-me, pois que dolorosíssima tem de ser a minha peregrinação expiatória, afim de pagar centil por centil os crimes que cometi.

            Obrigado também a vós outros, trabalhadores da nova cruzada. Que Deus, a quem tão mal servi, conforte os vossos corações. Rogai por mim Aquele a quem tanto ofendi, Nosso Senhor Jesus Cristo. Orai por este desgraçado. Não me irei sem a vossa oração.

            (É feita uma prece)


*


Comunicação final, sonambúlica


            Inúmeras almas aguardam uma palavra, um lampejo de sentimento para despertarem do letargo em que caíram. - Desperta-las é o labor das associações espíritas bem organizadas. - A propaganda não deve cingir-se aos encarnados; precisa estender-se à humanidade do infinito. - Como, porém, deve ser feita para dar resultado. - Grandiosidade da obra do Cristianismo em espírito e verdade. - O orgulho, causa única de todos males. - O que produz nas fileiras espíritas.- O remédio a esse mal. – As palestras levianas, antes da reunião para os trabalhos mediúnicos. - Os que se agrupam em torno dos que a esses  trabalhos se entregam. - A coesão e o sentimento da verdadeira caridade cristã.


Médium: J. CELANI


            Paz, meus caros companheiros.

            Quantas e quantas almas aguardam apenas uma palavra, um lampejo do sentimento, para despertarem do letargo em que se encontram, para compreenderem o erro do passado, a persistir no presente, que precisa ser modificado, para que elas possam caminhar em busca de um futuro radioso. Não é outro labor que compete às associações espíritas bem organizadas. A propaganda não deve restringir-se exclusivamente aos encarnados; precisa estender-se à humanidade do infinito à parte, pelo menos, dessa humanidade que apenas se diferencia dos seres terrenos pelo seu estado de desencarnação. Ela se compõe de Espíritos que, tendo à volta de si todas as claridades, nada veem; todos os compêndios da sabedoria divina e não os leem.

            Mas, para eu entre esses seres a propaganda produza efeito, é mister que as palavras sejam ungidas de sentimento cristão, porque só assim elas penetram nas almas, tocam os corações mais empedernidos, tornando certa a conversão, para estímulo de todos os que compõem os colégios cristãos.

            Obra admirável, meus companheiros, a do Cristianismo em espírito e verdade! Nascida no estábulo humilde, servida por humílimos pescadores, é hoje, na sua renovação, trabalhada principalmente pelos simples e humildes, sob o aspecto da condição social, e por alguns poucos intelectuais no verdadeiro sentido da expressão.

            Disse bem o espírito que acaba de manifestar-se.
            É o orgulho, sempre o orgulho a causa de todos os males. Não vedes o que se passa nas vossas fileiras? Donde nasce nelas as dissenções, as divergências em torno de coisas insignificantes?  Do orgulho, sempre do orgulho. Como remediar a esse mal e conduzir a barca do Evangelho por mares assim encapelados? Adquirindo humildade, procurando estudar o Cristo na sua obra, nos seus ensinos. No mais insignificantes conceitos do Evangelho, encontrará o estudante de boa vontade uma indicação, um roteiro para seu labor na Seara! Quantas vezes só uma palavra bem apreendida produz extraordinária modificação na criatura!

            Quantas vezes vós, aguardando aqui a hora de iniciardes os vossos trabalhos, entabolais desatentos uma palestra que por menos acorde com os motivos que aqui vos trazem causa efeitos que não podem avaliar! São delicados estes trabalhos, meus caros companheiros, mesmo delicadíssimos. Para eles toda atenção, toda vigilância se fazem necessárias, pois que deles sois vós os primeiros a recolher dos bons ou maus frutos.

            Em torno de vós estão, não há dúvida, os vossos amigos; mas, também estão, aqueles cuja presença é permitida para edificação. Eles não poderiam compreender o pensamento puramente espiritual, porque, como eu disse em começo, ainda se acham adstritos à materialidade terrena. Se se não sentires confortados e recebidos misericordiosamente, inútil se torna o nosso esforço. Não deve, pois, haver a menor quebra de afinidade entre vós, de indivíduo para indivíduo e do conjunto para conosco.

            Por isso é que se vos fala de coesão, coisa que ainda tanta estranheza vos causa. É imprescindível, porém, para a produtividade dos vossos trabalhos, que entre vós reine o sentimento da verdadeira caridade.

            Meus caros companheiros, convosco fiquem a paz e o amor da Virgem. Que Ela receba sempre as vossas súplicas e as leve, purificadas pelas suas virtudes, ao seio de Jesus, a fim de que Este as faça chegar ao Pai.

            Afervorai a vossa fé e aguardai os acréscimos prometidos pelo Mestre divino.

            Deus vos abençoe. – Richard