quarta-feira, 18 de maio de 2011

Os Evangélicos 02


                    Martinho Lutero

O médium vê uma grande massa de luz, tendo a altura de um homem 
e formada por feixes de raios luminosos 
brancos, verdes, azuis, roxos e solferinos aveludados. 
O médium distingue vagamente, no meio dessa luz intensa 
que lhe faz doer a vista, o vulto apagado do espírito que 
diz ser Martinho Lutero
                                   
         

Aqui está Martinho Lutero, meus amigos e irmãos amados; aqui estão o espírito daquele que no mundo de provas de amor à verdade ensinada por Jesus Cristo, combatendo o erro e a mentira, defendendo a liberdade de consciência e de exame; mas está também a alma daquele que praticou atos de orgulho, deu provas de ambição de glória e de renome! Tendes diante de vós este espírito que não soube salvar a humanidade, que não teve a verdadeira compreensão da sua missão na Terra, deixando-se arrastar pela sede de glória, ambição de domínio: governar os homens, destruir o que existia, para implantar o que só servia para satisfação dos seus desejos e intentos demolidores.
          Venho perante vós, homens da Terra, confessar os meus erros e as minhas fraquezas como chefe do movimento liberal que se operou no mundo, onde até então reinara o despotismo e a tirania espirituais, expresso na fórmula “Crê ou morre”, arma terrível de que se serviam os chefes espirituais, os diretores das consciências de então.
          Fui inimigo implacável dos abusos e contravenções praticados em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo.
          Combati as aberrações filosóficas do meu tempo, os sofismas e as falsidade apregoadas em nome de DEUS e de Jesus.
          Lutei pela moral, pela razão, pela verdade e pela liberdade das consciências oprimidas sob o jugo ferrenho do romanismo dissoluto e impiedoso.
          Sacrifiquei as minhas aspirações políticas ao ideal religioso pelo qual lutei com as armas de que dispunha naquela época: a palavra, a lógica, o raciocínio, a razão e o Evangelho, que era constantemente violado pelos que tinham interesse em manter oculta a verdade e o espírito as leis estabelecidas por Nosso Senhor Jesus Cristo nesse código sublime, nesse estatuto pelo qual se regulava, ainda se regula e se regulará para todo o sempre a humanidade terrena o evangelho de Jesus.
          Combati energicamente as explorações e os embustes dos que preferiam mentir a manter o brilho  de uma verdade superior, grandíloqua porque, para sustentar essa verdade luminosa, era de mister despojarem-se do orgulho e da vaidade, sacrificando ao mesmo tempo, a essa verdade sublime, interesses, ambições, convenientes, gozos, prazeres, pompas, riquezas, caprichos e volúpias criminosas.
          Para proclamar e defender  a verdade contida no Evangelho era preciso o sacrifício e a renúncia dos bens e gozos terrenos, das posições elevadas, das honras e distinções que o mundo confere aqueles que subordinam a felicidade e as alegrias celestes aos prazeres e doçuras da vida material, as delícias e gozos da Terra.
          Combati, sem tréguas, em favor da fé apoiada na razão; preguei o livre exame, a liberdade de pensar e de agir em matéria religiosa.
          Discuti e contestei a infalibilidade do que era falível e mortal e portanto indigno de ornar-se com os atributos pertencentes exclusivamente à Divindade.
          Neguei o que era criação dos homens, fruto da sua imaginação excitada por desejos insaciáveis, pela ambição de gozo material e preocupação de desfrutar as delicias da carne.
          Procurei apagar o que fora escrito unicamente para ser interpretado pelos interessados em arrastar a humanidade para o caminho da idolatria, dos cultos exteriores, ridículos e indecorosos, até das grotescas exibições de cenas primitivas dos antigos cultos pagãos.
          Condenei as fórmulas e rituais tomados de empréstimo a outros cultos, símbolos de outras Igrejas, cerimônias características de povos menos cultos que os do ocidente, aos quais foram adaptadas essas pompas.
          Suprimi tudo que pudesse falar ao egoísmo humano ou despertar a cobiça e a vaidade do homem; simplifiquei, reduzi, limitei, restringi as grandezas e pompas eclesiásticas.
          Disputei para todos os cultos o direito de serem considerados divinos, podendo a investidura sacerdotal ser dada aquele dos fieis que, pelas suas visões e méritos, se mostrasse digno de dirigir os trabalhos do culto de DEUS.
          Aboli a casta sacerdotal, abolindo também hierarquias inúteis, categóricas, cargos, títulos, ordens honoríficas, dignidades e nobrezas pontifícias.
          Consolidei, organizei os ensinos evangélicos; estabeleci novas praxes e costumes que me pareceu conveniente criar em substituição dos existentes, cheios de lacunas, falhos, quase sempre, do espírito cristão.
          Proclamei a inutilidade dos dogmas e a incapacidade dos seus criadores para decidirem questões que só a DEUS competia resolver.
          Neguei os falsos santos e as ilegítimas distinções conferidas aos seus próprios instituidores, as beatificações de amigos e parentes, as canonizações em vida e também post mortem.
          Impugnei as concessões criminosas feitas aos nobres, senhores e reis a troco de honras profanas, por estes últimos concedidas aos chefes espirituais que disputavam tais honrarias, sacrificando interesses religiosos, prejudicando a causa da fé e a religião de Jesus Cristo.
          Abri um novo caminho, nova estrada, edifiquei uma nova Igreja mais de acordo com as aspirações do momento que o mundo atravessava. Tracei uma rota pela qual a humanidade se condizia diretamente ao seio de DEUS e aos braços de Jesus; acendi uma luz mais brilhante, mais viva, no caminho do homem; coloquei a moral acima de todas as conveniências e de todos os interesses, o Evangelho ao alcance de todos, os ensinamentos de Jesus em todos os lábios, a sabedoria divina em todas as bocas, a fé em todos os corações, a verdade em todas as consciências.
          Criei nova ordem moral e religiosa, alarguei os horizontes cristãos, libertei as consciências do cesarismo religioso, realizei o que fora sonhado por outros espíritos que não logravam iniciar esse movimento benéfico e salutar, que trouxe, em parte, mais luz para os espíritos abatidos, humilhados perante o absolutismo romano.
          Estou fazendo sumariamente a resenha dos meus atos e ações no campo puramente religioso, onde, de fato, a minha ação foi até certo ponto benéfica; mas devo também mostrar-vos como foi perniciosa essa mesma ação no ponto de vista social e político.
          Tudo fiz para combater o despotismo romano e libertar as consciências da tutela dos papas, mas, por outro lado, no campo político transigi, admitindo a tirania do governo com que mantinha relações de amizade e aos quais me achava ligado por interesses de ordem particular e privada, tendo, por isso, para esses chefes de estado todas as atenções e deferências, ao ponto de sacrificar em grande parte a Reforma; assim, prejudiquei grandemente interesses religiosos, fazendo perigar a nova ordem de coisas que, à custa de ingentes esforços eu estabelecera no mundo.
          Por amor à política, em que muita vez me envolvi, abandonei princípios básicos sagrados; tendo essa minha conduta contribuindo para que o movimento reformador degenerasse, perdendo muito do seu primitivo esplendor.
          Advoguei a causa política de alguns estados religiosos, junto aos governos que aceitavam a Reforma. Representei mais de uma vez esses estados nas reuniões e assembléias que tinham por fim decidir da organização político-religiosa dos mesmos estados. Fui mediador, árbitro em várias contendas havidas entre governos; fiz parte, secretamente das juntas governativas dos pequenos estados, que reorganizaram política e religiosamente estas nações. Fundei igrejas, organizei associações, escolas, centros e colégios onde eram ministradas, noções sobre a Reforma.
          Preguei, fiz conferências, escrevi obras, publiquei livros de moral, religião e filosofia.
          Convoquei reuniões de homens eruditos do meu tempo para decidirem questões religiosas teológicas, sociais e políticas. Foi grande e desenvolvida a minha ação na Terra, enorme o meu prestígio no mundo, mas foram também grandes as minhas ambições, o meu orgulho, vaidade e despotismo.
          Para defender a liberdade, sacrifiquei a própria liberdade; para libertar as consciências da tirania romana, fui também tirano; para organizar o que me parecia fora de ordem, perturbei essa mesma ordem; para fundar uma sociedade mais cristã, vivendo de acordo com o Evangelho, prejudiquei esse Evangelho; para destruir o fanatismo, criei outro que ainda está produzindo efeitos danosos; para que não fosse violenta a doutrina de Jesus, violei essa doutrina, consentindo que se criasse outras Igrejas, novas seitas, novos cismas, e daí a desordem espiritual reinante na Terra, a crise moral, a falência do verdadeiro espírito cristão, o ofuscamento do brilho e esplendor do Evangelho, das gloriosas verdades semeadas por Nosso Senhor Jesus Cristo.
          Foram, pois, negativos muitos dos atos que pratiquei com intenção de regenerar, aperfeiçoar os costumes religiosos; inúteis os esforços feitos para restituir à doutrina de Jesus a majestade e brilho que me parecia haver ela perdido naquela época; vãs muitas das tentativas feitas com os mais nobres intuitos reformadores, com a mais tenaz energia reconstrutora do grande edifício da fé, que vinha se esboroando através dos séculos; improfícuas as lutas que sustentei em prol da liberdade moral e religiosa, do livre exame, da independência das consciências cristãs, do espírito religioso do meu tempo.
          Martinho Lutero, homem dotado de espírito enérgico, mas propenso às fraquezas do caráter, no tocante a interesses de ordem e privada; espírito forte, mas com tendências para as debilidades morais dos orgulhosos e dos fátuos; ânimo varonil, mas tendo decidido pendor para despóticas violações das leis sagradas, a bem dos interesses egoísticos que sempre agasalhou no fundo da sua alma, para as tirânicas oposições ao que parecia contrariar a sua vontade e o seu capricho ─ Martinho Lutero é, perante DEUS e a sua própria consciência, criminoso digno de maldições que devem cair sobre os que neste mundo deixam de cumprir as suas missões, para se entregarem às paixões e sentimentos inferiores, aos quais sacrificam o que é digno de respeito e veneração, o que deve ser mantido ainda mesmo à custa do sangue e da vida daquele a quem DEUS confia a nobre e santa missão de apressar o adiantamento do planeta. Martinho Lutero foi mais homem que apóstolo, mais interesseiro que crente, teve mais egoísmo que fé, mais vaidade e orgulho que  humildade ─ a maior e mais santa virtude que deve possuir todo homem que na Terra tem sobre os braços a pesadíssima tarefa de salvar a humanidade.
          Tendes na vossa presença o reformador, o demolidor, o destruidor, o lutador do Evangelho de Jesus; mas aqui está também, perante este grandioso tribunal que DEUS mandou organizar, presidido por Jesus Cristo, o maior de todos os pecadores, de todos os orgulhosos, o mais autoritário dos homens que tem a Terá; o mais cruel e desumano sacerdote que, neste planeta, se tem paramentado com os símbolos da religião do crucificado; o mais ambicioso dos espíritos que na Terra tiveram a missão de orientar os seus irmãos; o mais impiedoso de todos os fundadores de doutrinas que o mundo tem conhecido.
          Tendes na vossa presença o espírito de  um frade que nunca se humilhou, jamais obedeceu e jamais se subornou a DEUS e às leis da sua ordem, que sempre desrespeitou e violou; tendes aqui a alma de Lutero, em que foi castigada a soberba, o orgulho, a vaidade, o amor próprio e o espírito irrequieto, impetuoso, fanático, mas a quem foi dada esta luz que o circunda pelos esforços que fez para salvar a doutrina de Jesus, encaminhando a humanidade para a felicidade eterna; tendes junto de vós, na superfície do vosso planeta, o espírito de Martinho Lutero, que acaba de cumprir as provações que lhe foram impostas em existências sucessivas, nas quais limpou o seu espírito para poder comparecer perante vós cercado da luz que o envolveu, cuja descrição o médium acaba de fazer-vos.
          Martinho Lutero, por não ter bem cumprido a sua missão na Terra, fazendo tudo quanto podia e devia ter feito, foi, após a morte, lançado no meio das trevas que o envolveram a sua consciência, fazendo-o padecer duros tormentos, experimentar cruéis aflições, ante os quadros dos seus erros a se desenrolarem na sua presença, perante a Justiça Eterna, que a cada instante o chamava a contas, despertando-o desse sonho tétrico em que foi mergulhado o seu espírito culpado, apelando para a sua consciência e razão, chamando-o ao arrependimento, que custou a vir, mais que chegou afinal, para lhe dar alívio, por termo ao seu tormento, ao seu desespero e aflição, por termo ao seu tormento, ao seu desespero e aflição.
          DEUS perdoou-me, concedeu-me a graça de reparar os meus crimes em vidas sucessivas.
       Já três existências tive no vosso mundo, depois de haver tentado reformar a moral e os costumes religiosos.
          Aqui tendes esta confissão, que vos trago por amor da verdade e em nome de Jesus. Aqui estou colaborando na “Revelação dos Papas”, para concluir hoje o que há 500 anos comecei, e prestando publicamente esta homenagem à justiça de DEUS, à perfeição e sabedoria infinitas da obra do Criador.
          Tenho agora a luz necessária para poder falar aos homens de boa vontade, aos que seguem o rumo que lhes tracei na Terra.
         Somente no Espiritismo podereis encontrar a verdade, só nesta doutrina achareis conforto e luz necessários aos vossos espíritos; unicamente na doutrina dos espíritos obtereis os esclarecimentos indispensáveis afim de poderdes encaminhar-vos para o bem, para a verdade, para Jesus e para DEUS.
          Não tenhais dúvida; tudo quanto preguei nada vale diante do que sei, do que tenho visto e aprendido; nada do que sabeis possui o cunho da verdade absoluta, que só o Espiritismo poderá fornecer-vos. Todas as vossas crenças estão em completo desacordo com a verdade, em antagonismo com o que tenho visto no mundo espiritual.
          Não vos deixeis iludir, nem vos desvieis do caminho traçado pelo Espiritismo abundando a verdade pura pelo erro e pela mentira.
          DEUS é quem me envia para dizer-vos tudo isso, Ele vos quer muito, está disposto a ajudar o vosso progresso e, por isso, manda os espíritos esclarecedores ao vosso encontro, para vos explicarem a verdade. Deveis, portanto, ouvir as palavras e os conselhos dos vossos irmãos desencarnados que vem à Terra  por amor de vós outros, compadecidos das vossas fraquezas, miséria e atraso, da cegueira que não vos deixa ver o que existe por toda a parte e vos cerca por todos os lados, sem que vos apercebais. Tende fé e piedade, procurai o melhor possível os vossos deveres cristãos, praticando a caridade, o bem, e o amor. Não vos fanatizeis, procurai sempre apoiar a vossa fé na razão e na ciência, nos fatos positivos, reais, nas provas materiais, palpáveis, que o Espiritismo vos fornece todos os dias. Nada mais existe além dessa grande e incomparável verdade espírita podeis ficar certos.
          Nada mais poderá consolar-vos, dar-vos a paz e a tranqüilidade das vossas consciências, a não ser essa doutrina sábia e santa.
          Não acrediteis no que vos contam unicamente com o fito de dominar as vossas consciências; não acrediteis no diabo e no inferno, que são meras ficções, não tem existência real.
          DEUS é pai, a personalidade da bondade, da justiça, do amor e a misericórdia infinita.
          Ficai tranqüilos, porque todos vós sereis salvo no dia em que vos arrependerdes dos vossos crimes e vos dispuserdes a resgatar as vossas culpas em existências sucessivas.
          DEUS está convosco, Jesus é o vosso guia neste momento; é, pois, em nome de ambos que vos fala aquele que na Terra se chamou
          Até sempre!
                                                           Martinho Lutero

(Setembro de 1915)




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