Amália Domingo y Soler
- Valorosa Mulher Espírita -
por Silvio Brito Soares
Reformador (FEB) Setembro 1959
No calendário humano, o dia 30 de
Abril de 1909, sexta-feira, assinalou, a 1 hora da madrugada (1), a
desencarnação, na cidade de Barcelona (Espanha), de uma veneranda mulher,
notável sob vários aspectos, embora sem projeção na vida social mundana, pois
nasceu pobre, viveu pobre, e pobre morreu. E, não obstante isso, conseguiu
impor-se e ser muito querida não só dentro das fronteiras do seu país de nascimento,
como além, muito além desses limites geográficos, pois que se tornou conhecida
e admirada de todos os espíritas de fala castelhana e bem assim em Portugal e no
Brasil.
(1) ‘La Voz de la Verdad’, de Barcelona, Maio de 1909.
Alguma coisa de singular, sem
dúvida, possuía essa mulher, que teve o nome
de Amália Domingo y Soler, para conquistar tamanha simpatia e, diremos mesmo, veneração geral. De fato, ela era possuidora de um tesouro inigualáveI, tesouro que, apesar de distribuí-lo a mancheias, mais se avolumava nas delicadas arcas de seu coração boníssimo.
de Amália Domingo y Soler, para conquistar tamanha simpatia e, diremos mesmo, veneração geral. De fato, ela era possuidora de um tesouro inigualáveI, tesouro que, apesar de distribuí-lo a mancheias, mais se avolumava nas delicadas arcas de seu coração boníssimo.
Amália fora uma fonte viva de amor,
de fraternidade, de sentimento puramente cristão! Não foi sem razão que Confúcio
afirmou: "por muito longe que o espírito
alcance, nunca irá tão longe como o coração.”
Não dispomos de espaço suficiente
para nos estender sobre a vida e a obra dinâmica de Amália Domingo y Soler, em terras andaluzas,
a prol e na defesa do Espiritismo, sempre cheia de coragem, ânimo forte e
inteligência para enfrentar pela pena, adversários tidos e havidos como vultos
de primeira grandeza por sua cultura humanista e teológica.
Vimos, pois, num esforço de síntese,
realçar fatos e atitudes capazes de positivarem e documentarem a têmpera de sua
fé inabalável no Espiritismo cristão.
Precisamos frisar que, durante seus
quase 74 anos de existência planetária, jamais gozou de saúde perfeita; antes
pelo contrário, os padecimentos físicos e morais lhe foram companheiros inseparáveis
e de tal modo a castigavam que, ainda jovem, completamente só no mundo, sem
parentes de espécie alguma e, por assim dizer, cega, pensou certa feita em suicidar-se.
Desde, porém, que a luz espírita lhe penetrou o entendimento, empreendeu ela
admirável jornada de propaganda, pelo jornal e pelo livro, na qual, como muito
bem acentuou Leopoldo Cirne, ao referir-se a essa valorosa mulher, punha menos
os fulgores de sua inteligência solidamente cultivada, que as expansões
persuasivas de seu coração cheio de afeto.
E a razão de ser a sua vida um
perene desfiar de dor e amarguras, ela mesma o explicou num de seus instrutivos
escritos, ao relatar-nos suas vidas pregressas. Nas festas do Carnaval, em que
as multidões se entregam aos prazeres ruidosos, do espírito de Amália sempre se
apoderava indefinível tristeza. Numa dessas ocasiões, tomando do lápis, médium psicografa
que também era, pelo seu Guia lhe foi revelado que aquela tristeza traduzia uma
pungente intuição do seu Espírito, uma espécie de reminiscência esmaecida, de haver
ela, em precedente reencarnação, tomado parte, com esquecimento de tudo, nas
orgias tumultuárias do mundo pagão, malbaratando os sentimentos mais nobres nos
amores fugazes da carne. Daí a razão de ser de sua atual existência, sem família,
sem carinho, órfã das comovedoras alegrias do lar que outrora desprezara.
Verifica-se assim, pelo que ela
própria declarou, que o seu Espírito trouxe do passado erros e culpas, com o compromisso
formal de os reparar, e tão exuberante foi esse desejo de regeneração que
aceitou, sem vacilar, o remédio - dor -, recebendo, em compensação, principalmente
nas horas mais angustiosas e difíceis, o amparo e o auxílio do Alto.
Nas poesias que, após a sua
partida para os planos superiores da Espiritualidade, lhe foram dedicadas, como
a do vate Francisco Rios, bem se pode apreciar e avaliar o quanto era querida e
quão grande era o seu amor por todos e mui especialmente pelos que se achavam
submetidos aos aguilhões do sofrimento.
No álbum improvisado, posto à
disposição daqueles que visitavam os despojos da ilustre anciã, consta esta
expansão de sentimento muito verdadeiro de um de seus inúmeros beneficiados:
Amália!
Não tiveste filhos neste mundo, e, no entanto, quantos órfãos não deixas do teu
carinho nesta terra!"
Como boa espírita, Amália ignorava a
existência das grandes virtudes a lhe engalanarem a alma de escol, e, por isto,
aliás com muita humildade, não se cansava de dizer a todos que sua única
virtude consistia em ser agradecida.
Ao seu funeral, realizado no dia 1º
de Maio, às 10 horas da manhã, compareceram representantes de quase todos os
Centros de Barcelona e de alguns de outras cidades vizinhas, não faltando, como
era natural, os companheiros a ela mais ligados, e pertencentes às redações da
revista "Luz y Unión" e do semanário espírita "La Voz de Ia
Verdad". Entre as várias Sociedades beneficentes que se fizeram representar,
mencione-se a "Sociedad Progresiva Feminina", que mantinha diversos
colégios, e da qual Amália era presidente honorária.
Vultos do Espiritismo na Espanha
daquele tempo, como Jacinto Esteva Grau, Cláudio Carbonell, Santiago Durán, Augusto Vives, Quintin Lopez,
AIberto Andren, Matilde Navarro Alonso, Dolores Zea, Armengol Farrás,
lastimaram a partida da grande batalhadora de nossa causa. Ao numeroso cortejo
que rumou para o Cemitério do Sudoeste, em Barcelona, seguiam não só os espíritas,
que também distintas personalidades da Teosofia, do Ocultismo, do
Livre-Pensamento e da Política. E igualmente o povo anônimo, que encheu as ruas
por onde passou o coche mortuário, prestou sua homenagem ao nobre espírito que
pregava mais pelo exemplo que pela palavra.
*
Nasceu ela em Sevilha, no dia 10 de
Novembro de 1835, e, muito jovem ainda, ficou órfã e ao inteiro desamparo. À
custa de seus trabalhos de costura, conseguiu o indispensável para sobreviver e
o interessante é que, mesmo auferindo o insuficiente para a sua subsistência,
em seu modesto tugúrio encontravam acolhida e carinho o menino desvalido; o
débil e abandonado ancião e a viúva aflita.
Aos dez anos começava a escrever
formosas poesias e como nos diz em suas "Memórias": ''figurando-se me que em Madrid meus
escritos alcançariam mais êxito, e, ao mesmo tempo, que o trabalho da mulher
seria ali melhor retribuído que em Sevilha trasladei-me para a Corte, onde, em
realidade, trabalhando, vivia muito melhor que na capital andaluza. Mas tanto trabalhei,
dia e noite, que meus olhos se negaram dai por diante a colaborar em meus
trabalhos, começando então, para mim, uma série ininterrupta de sofrimentos e
de humilhações inexplicáveis.
“Após
dezenove anos de cruento calvário, fui encontrar o Dr. Hysern, que me restituiu
a visão; era médico homeopata e, como ocultista, fazia curas assombrosas. Foi
nessa época que tomei conhecimento do Espiritismo, lendo um número da revista
madrilena El Criterio."
A partir desse dia, prossegue ela em
suas "Memórias", não descansei enquanto não encontrei uma família espiritista
que possuísse as obras de Allan Kardec; pedi-as emprestadas e a pouco e pouco,
e com muito trabalho, comecei a lê-las ou, melhor diria, a estudá-las."
Amália Soler fez da pena, desde
então, uma verdadeira arma da Verdade, e de tal modo a manejou que, com ela,
abriu novos horizontes para a nossa Doutrina, tornando-a respeitada como força
aglutinadora em bem da Humanidade.
Travou sua primeira pugna através da
"Gaceta de Cataluna", contestando um artigo do "Diário de Barcelona"
intitulado "O Mundo dos Espíritos", em o qual se dizia que o
Espiritismo era uma monstruosidade.
No mês de Abril de 1878, conforme
consta nas aludidas "Memórias", El Comercio de Barcelona", referindo-se
a uma conferência de Don Manuel Lasarte no Ateneu, declarou que esse senhor
havia dito que a vulgarização da Ciência na Espanha lutava com antigas
preocupações e com o grave inconveniente de abandonar um fanatismo por outro, de
passar da Inquisição para o Espiritismo. Amália Soler entrou em campo e arrasou-o
com brilhante artigo, cujas palavras finais foram estas: “A Inquisição de ontem dizia: "Fora da Igreja não há
salvação", e o Espiritismo de hoje
exclama: Humanidade! és livre para crer! A razão derribou os deuses e hoje a
razão é deusa! Para Deus, pela caridade e pela Ciência! Esta é a síntese do
Espiritismo!"
Em Novembro do mesmo ano, o notabilíssimo
orador sacro dom Vicente de Manterola criticou o Espiritismo nos templos de
Sant'Ana e Santa Mônica. E essa arremetida contra a nossa Doutrina propiciou a
Amália a publicação de seis artigos na “Gaceta de Cataluna", refutando,
com energia, as afirmativas desse
sacerdote.
A respeito desta sua luta com tão
proeminente vulto do Catolicismo espanhol, disse ela: "Quando eu via o afã com que eram lidos os
números da "'Gaceta de Cataluna" que traziam os meus artigos, lágrimas
de profunda gratidão me brotavam dos olhos”. E mais adiante acrescentou:
"'No começo do ano de 1879, Manterola publicou "O Satanismo ou seja, a cátedra de Satanás, combatida desde a cátedra do
Espírito Santo. - Refutação dos erros da escola espiritista", e a 5 de
Março desse mesmo ano de 1879 principiei a rebater a dita obra, escrevendo 46
artigos, os quais, acrescidos dos anteriores, o editor Don Juan Torrents
enfeixou no livro ''El Espiritismo -
refutando los errores del Catolicismo romano", impresso em 1880.
Em 20 de Setembro desse ano, a
"Gaceta de Cataluna" publicou os retratos de Manterola e de Amália
Soler, a respeito dos quais disse o seguinte:
"Não
precisamos, ao estampar estes retratos, escrever biografia completa de ambas as
personagens. A primeira, dela não necessita; a segunda, de certo modo, pode-se
dizer que não na tem. O Sr. de Manterola, ex-deputado carlista, antigo
conselheiro de D. Carlos durante boa parte da guerra civil e na atualidade ex-pároco
de importante paróquia da Corte e, segundo o que os jornais insinuam, candidato
a todas as mitras vacantes que se apresentem, é um sacerdote fogoso e apegado
às ideias ultramontanas e dotado de indiscutível talento.
"A
Sra. Domingo, que nasceu em Andaluzia, teve sempre uma existência modesta,
sendo apóstolo das ideias espiritualistas. Vive humildemente no seio de sua
igreja, é querida e considerada por seus correligionários, em todas as regiões
da península por ela percorridas.
"Levada por inextinguível e desinteressado zelo em favor das ideias
que professa, soube deixar pegadas brilhantes de seu talento, honrando, com
seus fervorosos e cultos escritos, as colunas de grande número de periódicos."
De sua polêmica com Manterola nasceu
o "Credo Espírita," abaixo, excelente síntese dos postulados fundamentais
do Espiritismo:
"Cremos na existência de Deus, na imortalidade
da alma, na preexistência e na reencarnação.
"Cremos na pluralidade dos mundos habitados.
"Cremos no progresso indefinido, no trabalho como meio de realizá-lo, e na prática do bem.
"Cremos nas recompensas e expiações futuras, como consequência dos nossos atos voluntários, e cremos na reabilitação e no destino final para todos.
"Cremos na pluralidade dos mundos habitados.
"Cremos no progresso indefinido, no trabalho como meio de realizá-lo, e na prática do bem.
"Cremos nas recompensas e expiações futuras, como consequência dos nossos atos voluntários, e cremos na reabilitação e no destino final para todos.
"Cremos na comunicação
universal dos seres, na comunicação com o mundo dos Espíritos, provada por fatos
que são a demonstração física da existência da alma.
"Cremos que devemos caminhar para
Deus pelo amor e pela ciência, conservar a fé racional, a esperança e a
resignação e ter caridade para com todos."
Por ai bem se pode formar um juízo
acerca do valor de Amália Domingo y Soler, que foi, sem favor algum, grande
escritora espiritista, brilhante cultora das belas letras, segura polemista,
ardente defensora de nessa Doutrina, doce e inspirada poetisa, espírito superior cuja personalidade
se engrandece com a prática da mais elevada caridade.
Foi pelos seus inúmeros admiradores cognominada
a "Cantora do Espiritismo", a
"Poetisa das Violetas". Este último cognome lhe adveio por causa dos 4 volumes dos seus "Ramos de
Violetas", coleção de poesias e artigos espiritistas, dados a público a principiar
de 1903.
Dezenas e dezenas de poesias, curtas
e longas, escritas por Amália e não registradas em livro, acham-se espalhadas
pelas revistas espíritas de dois continentes. Em todas elas alia-se à
espontaneidade e à beleza da forma, a doçura do sentimento e as luzes esclarecedoras
do espírito. Seu estro, em muitas ocasiões, se equipara mesmo ao dos melhores
vates.
Oferecemos, tomadas ao acaso, duas
pequenas estrofes de uma poesia sua, recitada nas homenagens que os argentinos
lhe prestaram por motivo de sua desencarnação, e nas quais o estro surge profundamente
espiritualizado.
Cuando en mi mente habrá luz
Sintiendo em mi corazón
Sintiendo em mi corazón
Esa suprema
pasion
Que Cristo
sintió en La cruz?
Cuando dejaré el capuz
Cuando dejaré el capuz
Que hoy aprisiona
mi sién?
Cuando diré
al hombre: "ven,
Yo consolaré tus penas,
Yo consolaré tus penas,
Yo romperé
tus cadenas"
Y el mal
pagaré com bien!
Yo busco la
perfección
De armonia
universal;
EI eterno pedestal
De la civilización
'La gran regeneración
Que nos salve
del abismo,
Que domina
el egoísmo
Que nuestro
ser avasalla.
Y en donde
ese bíen se halla'?
Sólo en el Espiritismo.
Sólo en el Espiritismo.
Fundou
e dirigiu dois periódicos espíritas: "La Luz deI Porvenir" e "EI
Eco de la Verdad"; tendo sido também redatora-chefe da revista, Luz y
Unión”, órgão de grande projeção nos meios espiritistas da Espanha daquela época.
Em 1880, Amália escreveu para
"La Luz Del Porvenir" quinze artigos, reproduzidos pela "'Gaceta
de Cataluna"" nos quais ela refutou a parte alusiva ao Espiritismo
que constava nos três volumes das conferências científico-religiosas do padre
Llanas. Esse sacerdote nada contestou, mas, curioso é que ao terminar esses seus artigos, um dos amigos dela
perguntou ao padre, de quem era também amigo o porquê do seu silêncio, ao que o
padre Llanas respondeu: "Nada tenho a objetar", acrescentando, para estranheza do interlocutor:
"Dentro de minha Igreja, sou
sacerdote; fora dela, respeito todos os ideais que aspirem ao engrandecimento
da humanidade."
O padre Sallarés, em Março de 1884,
proferiu, na Catedral de Barcelona, uma série de conferências de combate ao
"falso sobrenaturalismo da seita dos espiritistas" e a nossa
biografada logo lhe foi ao encontro, escrevendo dez artigos esclarecedores,
então publicados no "El Diluvio" e em "La Luz Del Porvenir".
Pouco depois, em Fevereiro de 1885,
o padre Fita, da Companhia de Jesus, do púlpito da Catedral de Barcelona entrou
a deblaterar contra o Espiritismo, e Amália, como era de esperar, imediatamente
tomou da pena e redigiu nove artigos, publicando-os nos periódicos retro-mencionados,
refutações essas que alcançaram tão grande aceitação que os espiritualistas de
Cienfuegos· com eles formaram um livro intitulado "Impressões e Comentários sobre os Sermões de um Jesuíta".
Entre os vice-presidentes do
Primeiro Congresso Espiritista Internacional, realizado em Barcelona, no mês de
setembro de 1888, figurou a pessoa de Amália Soler. Nas solenidades do
Congresso, ela ocupou o lugar à direita do presidente, o grande Visconde de Torres-Solanot.
*
Acreditamos que, por este retrospecto, os
nossos leitores bem podem fazer uma ideia da vida apostolar dessa
extraordinária mulher nas lides espiritistas, que nos assombra pela sua coragem
e intrepidez, mormente numa época e num país onde o poder clerical tinha e ainda
tem preponderante influência nas esferas governamentais.
Sabemos que seus escritos receberam tradução
na Itália, França, Inglaterra. Portugal e Brasil, e até hoje; de quando em vez,
os periódicos espíritas os transcrevem.
Aqui no Brasil, Amália Domingo y SoleI tornou-se
muito admirada e querida, tendo sido numerosos os seus artigos publicados pelo
"'Reformador" e por outras folhas espíritas do País. E na sessão de
1º de Agosto de 1884, a Federação Espírita Brasileira concedeu a ela o título
de sócia honorária,
É, entre nós, bem conhecido e
bastante apreciado o livro' "Fragmentos das Memórias do Padre Germano",
coletânea de comunicações obtidas pelo médium falante Eudaldo Pagés no Centro Espiritista
“La Buena Nueva", da vila de Gracia (Baecelona), comunicações que, copiadas
e retocadas por Amália, foram dadas à publicidade em “La Luz deI Porvenir” de 1880 a 1884. Em 1900,
graças a um dos fundadores do mencionado periódico, o editor Juan Torrents, e com
a inteligente colaboração de Amália, é que saiu a público o livro a que nos
referimos, verdadeiro tesouro de amor, esperança e consolação para todos os aflitos
e oprimidos.
Pelo mesmo médium falante, e no
mesmo Centro de Gracia, foram ditadas a Amália as “Memórias de um Espírito”, de
1897 a 1899. Só em 1904, depois de corrigidas e ordenadas por Amália, saíram em
livro sob o título “Perdoo-te”.
Como já dissemos, muitos e muitos
artigos doutrinários ela escreveu, sobre os mais diferentes assuntos. A clareza
e a segurança dos argumentos, secundados por uma lógica convincente, são o
característico de suas páginas, nas quais jamais falta a palavra amorosa e
persuasiva do seu coração.
Vários escritos dedicou à mulher, e
num deles, replicando a uma bela e inteligente jovem espírita que achava ser
prejudicial o casamento à mulher que se dedica à difusão do Espiritismo,
aconselhou-a unir-se a um homem de bem, explicando-lhe:
"Supões que não há outros meios de fazer propaganda senão comparecer aos
Centros espíritas e realizar conferências e sustentar polêmicas com ateus e
fanáticos religiosos? A verdade se manifesta de muitas maneiras, e uma mãe de
família, que
tenha estudado a fundo o Espiritismo, é a melhor propagandista da religião do porvir."
tenha estudado a fundo o Espiritismo, é a melhor propagandista da religião do porvir."
E mais adiante acrescentava a grande
escritora: "O Espiritismo não precisa de sacerdotisas nem de apóstolos
especiais; todas as mulheres podem ser sacerdotisas dentro de seu lar, e os homens
podem ser apóstolos na oficina do operário, nas lucubrações do artista, nos
afazeres do comerciante, no fundo das minas, nos cumes das montanhas, quebrando
pedra ou servindo de mergulhador para arrebatar aos mares os seus tesouros
escondidos; em toda a parte pode o homem manifestar os seus bons sentimentos, a
sua paciência, a sua tolerância, a sua resignação, a sua íntima convicção de
que o que não se ganha não se obtém.”
Ainda se dirigindo seus à jovem e
entusiástica propagandista do Espiritismo, diz-lhe:
"E acredita-me, minha filha, se te casas - e a seu tempo devido se vai
povoando o teu lar de alegres pequeninos, velas o sono deles, e te comprazes em
inculcar em seus ternos corações os princípios da moral mais pura, e os levas a
visitar os enfermos e os acostumas a repartir as suas economias com outros
meninos que não têm pão nem brinquedos, vais despertando em teus filhos os mais
generosos sentimentos; não te parece que fazes a melhor propaganda do Espiritismo?"
Assim era Amália Domingo y Soler.
Seu amantíssimo coração estava sempre aberto a todos os pedidos de conselhos, a
todas as queixas, a todos os infortúnios. Para tudo tinha uma resposta serena,
compreensiva e esclarecedora.
Cartas e mais cartas lhe chegavam diariamente
de todas as terras onde se fala o castelhano e o português. E não eram poucas
as pessoas que iam procurá-la em sua própria casa. A todos recebia como Irmãos, membros de sua grande e querida família.
Frequentes visitas fêz Amália a vários
presídios da Espanha, a fim de confabular com os desventurados párias da sociedade
, "Sempre que pude - escreveu ela certa vez - vim à fala com eles e nunca me
arrependi de haver procurado diminuir a distância entre mim e um assassino."
Certo dia, ela visitava a Penitenciária
de Tarragona, quando, em dado momento, fixou seus serenos olhos num presidiário
cujo rosto, sede de um tumor, revelava sofrimento. Condoída, deixou escapar
esta palavra em acento triste: Pobrezinho!
O homem consegue ouvi-la; levanta o
olhar e, voltando-se para os companheiros, brada-lhes alegremente: - Olhem! É
Amália! é Amália! E todos aqueles infelizes dirigem os olhos, com afetuosa curiosidade
para aquela bondosa mulher. Um dos funcionários da Penitenciária explica então
a Amália:
- "O condenado, que você acaba de
reconhecer, era o terror do presídio; tem mais crimes na consciência do que
todos os seus companheiros. Graças, porém, aos vossos escritos, é atualmente um
enfermeiro modelo. Hoje o chamam para intervir junto aos presidiários mais
ferozes. Aos domingos, à tarde, vai ler "La Luz del Porvenir", e dá
explicações do que lê aos amigos . Até o nosso capelão lhe quer muito e
chama-lhe o bom cristão."
Este dia ficou para sempre gravado
na lembrança de Amália como dos mais felizes para a sua alma,
Nas prisões, converteu, em verdade,
muitos incrédulos e revoltados, e minorou muitas dores morais. Estava ela
segura, segundo suas próprias palavras, de que "assim como nas entranhas
da terra encontram os mineiros metais preciosos, assim também se encontram nas
penitenciárias almas dispostas a ir para diante, se uma voz amiga lhes fala: Levantai-vos
e andai! Ressuscitei, porque dos ressuscitados é o reino dos Céus!"
*
Em carta de 12 de Janeiro de 1906 à
"Constancia", revista espírita argentina, na época sob a direção do
inesquecível Cosme Mariño, acusando Amália o recebimento de novecentos pesos
coletados por essa revista, em socorro de sua indigência, disse: "Meus irmãos, mais uma vez vocês me
ampararam na minha atual existência expiatória, ameaçada pela miséria e por
falta de saúde. Trabalhei intelectualmente tanto quanto me foi possível e
quanto sei; acontece. porém, que meus esforços se tornariam completamente
nulos, sem a ajuda de vocês.
"A
neve de setenta invernos cobre a minha cabeça, com um corpo anêmico e dois
filhos adotivos, aos quais, por gratidão ao pai deles e por humanidade prestei
abrigo e não fossem vocês, ver-me-ia forçada a deixar meu lar com profundo
sentimento. Graças, porém, a vocês, viverei algum tempo mais na casa de meu
Centro. rodeada dos filhos de Eudaldo Pagés, médium inolvidáveI que pelo espaço
de 25 anos difundiu a luz do Espiritismo com suas admiráveis
comunicações."
Seus últimos anos na Terra, Amália
os viveu com a saúde bastante abalada, mas, graças aos cuidados do bom médico e
amigo Dr. Roure, e ao carinho dos que a rodeavam, ainda se animava a escrever e
a fazer algo pelo próximo, dentro de suas parcas possibilidades.
A desencarnação da viúva Sra. de
Senillosa, sua boa protetora, veio, contudo, afetar-lhe ainda mais o estado de
saúde, abrindo campo à bronco-pneumonia, que a levou à desencarnação em poucos
dias.
........................................................................
A maior obra que Amália Domingo y Soler
deixou foi o exemplo de sua própria vida. Laboriosa, honesta, resignada, e inteiramente dedicada ao bem de seus
irmãos em Cristo.
Honremos-lhe a memória, sim; mas,
sobretudo, busquemos imitá-la.